Gado de matadouro

O Brasil é um país violento. Em praticamente qualquer lugar, sair de casa é estar com a terrível sombra da criminalidade pairando sobre nossas cabeças, qual ave de rapina procurando a sua presa. Ninguém parece fazer nada para solucionar o problema. Contudo, repetem-nos o tempo inteiro, como se fosse um novo mandamento dos tempos modernos: não reagirás.

O discurso é impressionantemente uniforme. “Em hipótese alguma tente reagir”, diz a VEJA. “Jamais reaja”, diz o site “Tudo sobre Segurança”. “[O] cidadão comum (…) não deve reagir à voz de assalto do criminoso”, diz uma reportagem d’O Globo. “A principal dica é nunca reagir”, tem até num site português!

Contudo, há quase duas semanas, uma garota sofreu uma tentativa de estupro aqui em Recife. Não seguiu o discurso das autoridades públicas. “Ele disse que ia me estuprar e depois me matar. Como ele ia me matar de todo jeito, o meu raciocínio foi que eu poderia até morrer, mas não iria deixar ele me estuprar. Foi aí que decidi. Reagi e comecei a brigar com ele”. E está viva, e bem, graças a Deus.

Incomoda-me que ninguém procure resolver o problema, e que tentem convencer todas as pessoas a serem gado de matadouro. A impressão passada é a de que as autoridades julgam ser possível até conviver com a criminalidade, mas jamais com uma vítima fatal da sua negligência. Como se a política de “minimizar os danos” servisse tão-somente para impedir as pessoas de verem com clareza e incompetência da segurança pública nacional.