Não, Bento XVI não fracassou como papa

Um pouco instigado pela curiosa peculiaridade intelectual de um comentarista do blog que conseguiu a proeza de recomendar um texto de um autor que acabara de desqualificar, peço licença aos meus leitores para voltar um pouco ao Pondé. Um outro leitor, por email, já me solicitara algumas considerações sobre o mesmo texto; de modo que, tecendo-as agora, procuro atender a ambos.

O texto em questão, que se pretende uma “Análise” do atual pontificado, defende a tese de que Joseph Ratzinger «é brilhante como teólogo, mas fracassou como papa». A análise é terrivelmente injusta e já o digo o porquê; antes, porém, duas palavras sobre o articulista. Não concordo que o Pondé seja simplesmente “do contra”, como foi comentado aqui; parece-me, isto sim, que os seus textos são via de regra pessimistas. Isto não é de per si um demérito; apenas exige um pouco de contraponto, a fim de que a compreensão da realidade não fique prejudicada pelo único viés negativo a partir do qual o colunista costuma escrever os seus textos. Ainda: ser pessimista não implica em ser superficial. Ser levianamente “do contra” é uma invectiva que de modo algum merecem os textos do Pondé, ao menos não os que eu já li e comentei aqui.

Sem mais delongas, ao texto. Não posso concordar mais com o articulista quando ele fala que «Bento 16 foi um duro crítico da ideia de que a igreja deva aceitar soluções modernas para problemas modernos»; ao mesmo tempo, contudo, quando ele fala que «[s]ua ideia de igreja é a de um pequeno grupo coeso de crentes, fiéis ao magistério da igreja (conjunto de normas para condução moral da vida), distante das “modas moderninhas”», não posso discordar mais dele.

Por diversas razões. Primeiro porque o Papa não tem nenhuma “idéia” eclesiológica diferente das diversas definições de “Igreja” que o Magistério multissecular legou à humanidade – e, portanto, em se tratando do Papa Bento XVI, falar em “idéia de Igreja” é até incorreto.

Segundo, porque a referência ao “pequeno grupo coeso de crentes” é recorrente em Ratzinger e não tem, absolutamente, o sentido que Pondé lha dá. Ela aparece, p.ex., n’O Sal da Terra e em Dios y El Mundo (excerto aqui, pág. 43), sempre contraposta à noção de “Igreja de massas” e sempre como constatação do fenômeno moderno da diminuição do número de cristãos no mundo – nunca como um ideal a ser buscado ou um “modelo” de Igreja a ser perseguido.

Terceiro, porque a fidelidade ao Magistério é conditio sine qua non para se pertencer à Igreja, quer se esteja falando de Igreja de massas, quer de minorias. Isto não é uma “visão” ou uma “idéia” exclusiva do Papa Bento XVI, é uma decorrência necessária do significado de “Igreja” dentro do Catolicismo. Não existe e nem pode existir Igreja de outra maneira.

Quarto, porque o Magistério não se refere somente à forma como se deve agir (= “conjunto de normas para condução moral da vida”), mas também e principalmente àquilo em que se deve crer. Sem fazer referência sequer remota à Fé, o articulista induz o leitor a cair na velha dicotomia entre ortodoxia e ortopráxis – ironicamente, tendo sido esta última condenada pelo próprio Cardeal Ratzinger, então prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, na sua famosa Instrução sobre alguns aspectos da Teologia da Libertação.

Por fim, quinto, porque o “distante das modas moderninhas” que o Pondé emprega para dizer como os cristãos (na alegada visão do Papa!) deveriam agir passa uma forte impressão de sectarismo ou de fuga do mundo, e nada pode ser mais contrário ao Catolicismo do que isso. Os fiéis, embora obviamente devam evitar as más práticas do mundo (do moderno, do renascentista ou do medieval, tanto faz), devem ser para este o fermento que leveda a massa e não têm o direito de se furtar a esta missão. É isso o que diz o Cardeal Ratzinger no Dios y El Mundo citado, falando exatamente sobre a igreja “pequena”:

A Igreja não pode ser um grupo fechado, auto-suficiente. Devemos, sobretudo, ser missionários, no sentido de voltar a propor à sociedade aqueles valores que são os fundamentos da forma legal que a sociedade deu a si mesma, e que estão na base da própria possibilidade de construir qualquer comunidade social verdadeiramente humana. A Igreja continuará a propor os grandes valores humanos universais.

Isto, sim, é o que pensa o Papa Bento XVI – não o que o Pondé resumiu em três linhas que, lidas em si mesmas, chegam às raias da falsificação do pensamento alheio. E, compreendidas as coisas da forma como o Papa as compreende, desaparece o modelo de Igreja fadado ao fracasso ao qual a análise da Folha induzia o leitor desatento. Porque o Papa, diferentemente do Pondé, exala em tudo o que diz o doce e revigorante odor do otimismo cristão.

Sobre a dificuldade do Papa em fazer a Doutrina Católica chegar límpida e pura aos fiéis católicos, o colunista da Folha acerta em cheio ao culpar o “fogo amigo” dos sacerdotes – padres e bispos, em geral. Está certíssimo: a Igreja está repleta de sabotadores internos, que dedicaram os últimos anos a dificultar enormemente o trabalho do Papa Bento XVI. Ao contrário do que insinua o Pondé, no entanto, os fiéis não têm papel significativo neste processo diabólico de boicote doutrinário. Embora eles sejam em sua maioria de «países pobres», disto não segue que estejam «mais próximos de um discurso contaminado pelas teorias políticas de esquerda» – a menos, é claro, que não se esteja falando de uma predisposição sócio-cultural, e sim da mera proximidade dos líderes demagogos de plantão.

O que uma análise mais acurada dos fatos nos mostra é que o êxodo católico no Terceiro Mundo é diretamente proporcional à cantilena marxistóide que substituiu o gregoriano nas nossas igrejas. Os católicos militantes – mesmo aqueles de “países pobres”, e talvez até principalmente estes de países pobres – não suportam o Evangelho falsificado que sói ser hoje em dia pregado nos nossos púlpitos. Nada mudou nesta Terra de Santa Cruz: hoje, como à época do pe. António Vieira, é por culpa dos pregadores que a palavra de Deus não dá fruto nem mesmo nesta abençoada terra em que se plantando tudo dá.

Por fim, sobre os seminários, o Pondé tem toda razão em denunciar o estado lastimável em que eles se encontram, mas comete um enorme erro de perspectiva ao omitir o fato de que, com toda a desgraça, nós estamos hoje incomparavelmente melhores do que há vinte ou trinta anos. Trata-se, mais uma vez, do idiossincrático pessimismo do autor, que o impede de ver os inegáveis avanços concretos que obtivemos nesta questão da educação católica.

É somente este pessimismo, aliás, que o leva a sentenciar que «o papado de Bento 16 fracassou». Ora, mesmo sem considerar as coisas abertamente históricas que ocorreram neste pontificado – a liberação da Missa Tridentina, o levantamento das excomunhões dos bispos da FSSPX, o Ordinariato erigido para os anglicanos -, é forçoso reconhecer que Bento XVI obteve silenciosos sucessos administrativos cuja contribuição para a Igreja será fundamental nos próximos anos: coisas como a demissão de dezenas de bispos, o enfrentamento da pedofilia, a reorganização da Caritas Internationalis, as leis sobre transparência financeira, a transferência dos seminários para a jurisdição da Congregação para o Clero, etc. Como se pode ver, trata-se de um pontificado extraordinariamente profícuo! Sob que ótica é possível dizer que ele “fracassou”? Queríamos, porventura, que todos os chefes de Estado do mundo fossem em romaria ao Vaticano para, de joelhos, jurar vassalagem ao Vigário de Cristo da Terra? Esperar mais do que efetivamente foi feito por Bento XVI não seria um idealismo utópico demais, totalmente irreal dentro das atuais conjunturas?

A provocação final do Pondé é deliciosa, quando ele se refere à Igreja como quem pensa que a vida é «mais do que conforto, prazer e liberdade pra transar com quem quisermos e quando quisermos». Mas a imagem da «Igreja [que] agoniza diante de um mundo que cada vez [Lhe] é mais opaco» é de uma retórica apocalíptica caricata extremamente dispensável. No final das contas, descontados os exageros do texto, é-nos possível vislumbrar um quadro muito mais promissor e reconfortante do que aquele que o Pondé nos pintou originalmente. Oxalá o professor de Filosofia possa perceber a seletividade da sua análise e chegar a uma visão mais equilibrada – e justa! – do que realmente significou, para a Igreja e para o mundo, este pontificado de Bento XVI.

Publicado por

Jorge Ferraz (admin)

Católico Apostólico Romano, por graça de Deus e clemência da Virgem Santíssima; pecador miserável, a despeito dos muitos favores recebidos do Alto; filho de Deus e da Santa Madre Igreja, com desejo sincero de consumir a vida para a maior glória de Deus.

17 comentários em “Não, Bento XVI não fracassou como papa”

  1. “Filosofando” um pouco, prezado Jorge: é possível ser um “cristão pessimista”, visto o mundo como é hoje? Ou é “dever” de um cristão ser “otimista”? “Provocações” minhas… ;)

  2. Agradeço sua preocupação com minha “peculiaridade intelectual” assim como sua paciência em ler o texto sugerido. Assim como considero admirável a liberdade de comentários no blog tenho também de chamar a atenção à uma espécie de animosidade quando esses comentários não seguem exatamente o que acredita mesmo quando são feitos com educação e respeito. É uma espécie de reprodução da forma como a igreja católica lida com os não católicos, de uma forma não receptiva, raivosa, que rechaça qualquer aproximação.

    Pondé vai falar bem de evangélicos para uma audiência católica, falar bem de católicos para uma audiência evangélica. Ele não é pessimista, seu negócio é chocar.

    Não imagine que sou capaz de qualquer proeza, a fé é pródiga em proezas insensatas.

  3. Não concordo com algumas opiniões do Pondé em razão do seu ceticismo beirar ao pessimismo com um certo exagero sem entretanto deixar de ser instigante. Com relação ao seu artigo onde afirma que embora Bento XVI seja um brilhante teólogo fracassou como Papa está recheado de ironias, inclusive quando afirma que “fracassou”. O Pondé em momento algum se aventurou em fazer qualquer análise teológica da renúncia do Papa Bento XVI, mas escreveu um texto para o seu público. Faz uma crítica aos que participam dos “jantares inteligentes” que se acham a elite intelectual brasileira e que o odeiam por denunciar esses ambientes repletos de preconceitos, sordidez e hipocrisias.

  4. Também penso que ele não fracassou como papa; mas, as consequências de sua renúncia, só saberemos após a escolha do novo Papa!

    Apesar do sinal de mau agouro: o raio que caiu na Basílica de São Pedro (se é que não é fake ou se isso lá é corriqueiro), ouso pensar que (consciente ou inconscientemente) a renúncia de Bento XV foi, na verdade, mais uma grande jogada de mestre desse grande e sábio Papa.

    Quem sabe, na sua sabedoria, não refletiu ele que seria melhor um soldado já ferido e abatido se sacrificar para deixar avançar o exército da Igreja; e, com isso, chamar a atenção do mundo sobre ela?

    Aliás, quê maior propaganda para a Igreja Católica, nesses tempos tão conturbados em que ela precisa ser tanto ouvida pelo mundo, seria senão a surpresa da renúncia do próprio Papa? Fazendo com que todos os olhos e ouvidos se voltem para a Igreja; não somente para os discursos finais de Bento XVI como também, agora, no período do conclave e nas expectativas do início do novo papado!

    Seja lá o que for, uma coisa é certa: de tolo, esse Papa não tem nada!!!

    Penso que maior propaganda gratuita do que essa para a Igreja Católica, será somente quando o Vaticano liberar (aos poucos) mais uma nova bateria de testes científicos modernos sobre os grandes milagres da Igreja, como: Santo Sudário, Guadalupe, Lanciano, Sangue de São Genaro, Casa de Loreto, etc.; em especial, um novo teste de datação do Sudário de Turim (já que, até hoje, o único teste que deu negativo foi o da datação por C14). Aí sim, ela vai chamar a atenção (por um bom tempo) não só da comunidade científica e da grande mídia, mas de inúmeros ateus, pagãos e pessoas de outras religiões do mundo todo!

    Por exemplo, a mera comprovação da autenticidade do Santo Sudário teria consequências religiosas, filosóficas, científicas, culturais, políticas e sociais inimagináveis em todo o mundo, como: a prova da existência histórica de Jesus e da existência de Deus para os ateus e agnósticos, a prova de que existe ressurreição da carne e não reencarnação para os espíritas, a prova de que Deus permitiu fazer sua imagem para os protestantes, a prova de que Jesus é o messias para os judeus, a prova de que Jesus não foi apenas um profeta para os muçulmanos, a prova da autenticidade da Igreja Católica e da religião cristã para todas as outras religiões do mundo, etc., etc., etc.

    Por isso penso que um dos maiores e mais eficientes meios de evangelização é a divulgação dos grandes milagres permanentes da Igreja. Basta ver que, segundo o Pe. Quevedo, quase todos os cientistas da equipe do STURP que estudaram o Santo Sudário (entre judeus, protestantes, ateus e agnósticos, etc.) se converteram ao catolicismo!

    Mas, isso é um outro assunto!

  5. “Sob que ótica é possível dizer que ele fracassou?”

    Também não gostei do texto do Pondé. Mas fracasso/sucesso podem ser vistos tanto do ponto de vista pessoal como do ponto de vista histórico.

    Acho que o Jorge Ferraz analisou apenas a questão do ponto de vista pessoal; isto é, se o Papa fez aquilo que humanamente poderia ser feito dadas as circunstâncias. Nessa análise, ao que tudo indica, o pontificado de Bento XVI foi um sucesso.

    Creio, contudo, que o Pondé avaliou o sucesso/fracasso em termos de tendências históricas.

    Historicamente, o fracasso/sucesso de um homem mede-se pelo seu legado. Ora, para avaliar o legado de Bento XVI é necessário saber se ele é o início de uma tendência ascendente na Igreja ou apenas um ponto ligeiramente fora da curva descendente iniciada por João XXIII. Interessa mais saber se seus sucessores continuarão sua obra e permitirão que as sementes lançadas por Bento XVI cresçam e frutifiquem ou se seus sucessores retomarão a política morna dos últimos papas.

    Eu sinceramente tenho dúvidas quanto à solidez do legado de Bento XVI. Esperemos mais um pouco para ver quem o Espírito Santo nos dará como pastor. Pode ser que o Espírito Santo, para nos provar e punir, nos dê o Cardeal Tagle como Pontífice. Nessa hipótese, teremos forçosamente que concluir que Bento XVI falhou pela timidez com que empreendeu a restauração.

  6. O sabio e santo Papa Bento XVI renunciou por se sentir sem forças suficientes para enfrentar os problemas do Vaticano: promover uma assepsia geral, varrer de lá falsos padres, bispos e cardeais acaso existentes e teriam sido infiltrados por maçons, comunistas, protestantes e ateus e pela mafia e seriam subsidiarios da NWO, conforme denuncias, cujo intuito seria para gerarem escândalos entre comparsas, facilitarem a divulgação para caluniarem a Igreja, mesmo fora do Vaticano nos diversos países, atuando em dioceses, congregações, midia anti católica, escolas etc., e a desfigurar.
    Assim, o S Padre Bento XVI agiria como noutros tipos de corrupção na administração temporal, como no Banco do Vaticano, contra eventuais lavagens de dinheiro, aliás, onde houvesse irregularidades, onde notasse qualquer traço de descomportamento ético, daí sentindo-se incapacitado de encarar de frente a situação.
    Alguns dos exemplos a mais dos acima: os 300 padres da Áustria querendo mais autonomia, a comunista Teologia da Libertação atuando em muitos países, como no Brasil, Uruguai etc., aqui elegendo comunistas como o PT com ajuda de comunistas sacerdotes, desejando fazer da Igreja uma ONG a serviço do assistencialismo, os RCCs dissensos praticando pentecostalismo protestante, os falsos ecumenismos, grupos rebeldes propondo tolerancia ao homosexualismo, outros ao aborto…
    Quem ajudou eleger partidos comunistas e de alguma forma atentou contra a Igreja também colaborou na exaustão e renuncia do S Padre!

  7. Gosto de algumas posições do Pondé, não concordo com tudo o que ele diz, mas ele mesmo sempre confessou ser um grande admirador do Papa Bento XVI. No entanto, Pondé não é cristão e, até onde me consta, não professa nenhum credo específico, embora, me parece, creia na existência de Deus. É, portanto, alguém que está fora da Igreja e que não compreende inteiramente (se é que compreende) o ponto de vista sobrenatural segundo o qual decisões como a renúncia do Papa são tomadas. Seu artigo, portanto, não pode ser lido com uma “mente católica”. Recheado de ironia, Pondé escreve para o mundo de um ponto de vista de quem está fora da Igreja. Visto assim, podemos ver com bons olhos a dura crítica que ele faz a essa boa parte do clero que não apoiou e se fez de surda aos apelos, pedidos, anseios e desejos do Papa Bento XVI. Ironia e admiração pelo Papa, é o que me transparece do artigo.

  8. Segundo a Concepção tendenciosa sim, mas na verdade não é, Giuliano. Todas essas doentias teses já foram desmascaradas. Num deu, Giuliano! Tá querendo vencer a Barbara Gancia no quesito tese bizarra?Tá muito fraquinho.

  9. Caro Lenieverson,

    Ainda é cedo para dizer algo com certeza, mas infelizmente surgiram nos últimos dias notícias que dão crédito à tese de que há uma rede de sodomitas infiltrada no Vaticano e que estaria por trás da renúncia do Papa. No fim do ano passado, na esteira do inquérito sobre o Vatileaks, Bento XVI teria sido informado sobre a existência dessa rede, uma espécie de maçonaria gay que protege padres pedófilos e nomeia gays para cargos importantes na Igreja.

    A renúncia de Bento XVI foi consequência de ver-se incapaz de acabar com a influência dos sibaritas na Igreja, muitos dos quais eram seus auxiliares próximos. Ao renunciar, ele indiretamente trouxe o probelma para a superfície, o que nos permite entender melhor o caos em que se transformou a Igreja nas últimas décadas e permite algumas modestas esperanças de melhora.

    Triste. Muito triste.

    http://www.guardian.co.uk/world/2013/feb/21/pope-retired-amid-gay-bishop-blackmail-inquiry

    http://rorate-caeli.blogspot.com/2013/02/for-record-la-repubblicas-summary-of.html

    http://rorate-caeli.blogspot.com/2013/02/cardinal-ravasis-vice-president-in-deep.html

  10. Que há uma “maçonaria eclesiástica gay” não é novidade para ninguém. Que há muito clérigo (com o perdão do trocadilho) com o rabo preso é assunto já há muito sabido – isso acontece em Roma, isso acontece aqui. Tenho certeza de que o Papa não veio a descobrir isso somente agora.

  11. Sim, Jorge, mas o que é novo é ser isso (se confirmado) a motivar a renúncia de um Papa.

    E creio que o Papa somente agora veio a descobrir que até mesmo alguns de seus cardeais mais próximos fazem parte dessa “maçonaria”. A alternativa – o Papa sabia desde há muito, mas mesmo assim nomeou-os para cargos importantes – é pior.

  12. JB,

    Pois é, e é justamente por isso que este grande “furo jornalístico” não passa de sensacionalismo de tablóide de quinta. Quais são os «cardeais mais próximos» do Papa que ficam chantageando clérigos em troca de silêncio sobre o pecado nefando? Que indícios temos de que foi essa a razão da renúncia do Papa?

    A matéria do La Reppublica não fala em colaboradores mais próximos de Sua Santidade, nem genérica e nem especificamente. Note-se, ainda, que ser vítima de chantagem é muito menos grave do que ser autor dela. A mim, afigura-se muito mais verossímil a hipótese original (inclusive cantada à época na imprensa italiana) de que o Papa já decidira renunciar por questões de idade aos oitenta e cinco anos, meses antes do caso Vatileaks.

  13. É este o ponto, JB. Não sei se o Prefeito do Pontifício Conselho para a Cultura se pode dizer um dos colaboradores mais próximos do Papa (quem se lembra d’alguma coisa que este Dicastério tenha feito nos últimos, sei lá, dezoito meses?) mas, ainda que fosse, trata-se de um nome isolado, para cuja nomeação ser justificada não é necessário dizer que o Papa ignorasse a “maçonaria gay”: bastaria que ele ignorasse, concretamente, que este cardeal faz parte do nefando grupo, ou que ele de fato não o fizesse então, ou que ele ainda hoje não faça e só esteja sofrendo chantagem por algum pecado cometido, ou que não faça de nenhum modo e seja tudo fofoca.

    Basicamente, o que penso é

    1. colocar a descoberta de tráfico de influência gay no Vaticano como uma descoberta bombástica é subestimar a inteligência do Papa; e
    2. imaginar que os colabores mais próximos do Papa estão todos (ou quase todos, ou grande parte, whatever) comprometidos com a rede-gay é leviano e sem evidência alguma.

    Por isso, penso que justificar a renúncia de Bento XVI com base ou na descoberta do óbvio (1.) ou na defesa da existência do inverossímil (2.) é forçado e sensacionalista. A hipoótese original faz muito mais sentido.

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