A incoerência do relativismo contemporâneo

Mais um texto do pe. Anderson Alves (a se somar aos outros que já foram recomendados aqui), pertinente e atual como de costume. Remeto à leitura da íntegra e apenas trago um curtíssimo excerto – uma frase, somente! – que julgo lapidar:

Da dignidade do ser humano, de fato, não se deduz a verdade de todos os seus conhecimentos, nem a bondade moral de todos os seus atos.

Nestes tempos enlouquecidos onde um padre que se aproveita da Igreja para apregoar em público uma doutrina espúria e contrária a tudo o que a Ela ensina é tratado como vítima enquanto a Igreja que Se defendeu dizendo que ele não fazia parte d’Ela é apresentada como vilã e opressora, convém denunciar abertamente a incoerência do relativismo contemporâneo. Isso faz mal não apenas para a alma, mas também para a inteligência. Acreditar em coisas contraditórias é não somente pecado, mas também defeito intelectual da maior gravidade.

Após corromper a juventude com seus discursos escandalosos, padre Beto é excomungado para a maior glória de Deus

Publico abaixo na íntegra o Comunicado da Diocese de Bauru referente à excomunhão do Reverendíssimo Pe. Roberto “Beto” Francisco Daniel, que escandalosamente divulgou na internet material daninho às almas em matéria sexual e, não aceitando a reprimenda feita pelo seu bispo, Dom Frei Caetano Ferrari, desgraçadamente preferiu o orgulho à humildade, dando mais valor às suas próprias idéias e “reflexões” do que ao ensinamento multissecular da Igreja Católica que é Mãe e Mestra Infalível.

Antes mesmo da excomunhão ser declarada, diz-se que “centenas de fiéis” lotaram a igreja no último domingo (28) para a sua missa de despedida. Entre estes “fiéis” contam-se, por exemplo, «o pai de santo umbandista Ricardo Barreira», segundo a mesma reportagem. Ainda, uma vez que a Missa – toda e qualquer Missa, celebrada pelo Papa em Roma ou pelo mais humilde sacerdote da mais humilde paróquia de vilarejo – é o mesmíssimo Sacrifício de Cristo e como é bastante óbvio que a piedade católica manda procurar nas igrejas não o sacerdote que porventura esteja celebrando a Missa, mas sim Nosso Senhor que no altar é imolado misticamente, cabe perguntar se estes “fiéis” que ontem lotaram a igreja de Santo Antônio realmente merecem esse adjetivo que lhes foi dado pela Folha de São Paulo.

Ao saber da notícia, certamente padecendo comichões e fatigada devido à caça permanente de qualquer coisa que possa servir para denegrir a imagem da Igreja Católica, a Carta Capital não poupou nem a gramática e vomitou uma «excomungação (sic) do clérigo por heresia e cisma»:

excomungacao-carta-capital

Quanto a nós, parabenizamos por sua coragem e seu zelo louvável o bispo de Bauru, Dom Frei Caetano Ferrari, que soube agir com firmeza quando a Fé da Igreja se viu ameaçada e não retrocedeu mesmo tendo contra si a opinião pública anti-clerical. Que saiba Sua Excelência que se os lobos uivam e o inferno vomita impropérios, é porque o golpe foi certeiro e, o alvo, muito bem escolhido. Que a Santíssima Virgem defenda e guarde sempre o seu ministério episcopal.

* * *

Comunicado ao povo de Deus da Diocese de Bauru
sobre o Rvedo. Pe. Roberto Francisco Daniel

mitra-bauruÉ de conhecimento público os pronunciamentos e atitudes do Reverendo Pe. Roberto Francisco Daniel que, em nome da “liberdade de expressão” traiu o compromisso de fidelidade à Igreja a qual ele jurou servir no dia de sua ordenação sacerdotal. Estes atos provocaram forte escândalo e feriram a comunhão eclesial. Sua atitude é incompatível com as obrigações do estado sacerdotal que ele deveria amar, pois foi ele quem solicitou da Igreja a Graça da Ordenação. O Bispo Diocesano com a paciência e caridade de pastor, vem tentando há muito tempo diálogo para superar e resolver de modo fraterno e cristão esta situação. Esgotadas todas as iniciativas e tendo em vista o bem do Povo de Deus, o Bispo Diocesano convocou um padre canonista perito em Direito Penal Canônico, nomeando-o como juiz instrutor para tratar essa questão e aplicar a “Lei da Igreja”, visto que o Pe. Roberto Francisco Daniel recusa qualquer diálogo e colaboração. Mesmo assim, o juiz tentou uma última vez um diálogo com o referido padre que reagiu agressivamente, na Cúria Diocesana, na qual ele recusou qualquer diálogo. Esta tentativa ocorreu na presença de 05 (cinco) membros do Conselho dos Presbíteros.

O referido padre feriu a Igreja com suas declarações consideradas graves contra os dogmas da Fé Católica, contra a moral e pela deliberada recusa de obediência ao seu pastor (obediência esta que prometera no dia de sua ordenação sacerdotal), incorrendo, portanto, no gravíssimo delito de heresia e cisma cuja pena prescrita no cânone 1364, parágrafo primeiro do Código de Direito Canônico é a excomunhão anexa a estes delitos. Nesta grave pena o referido sacerdote incorreu de livre vontade como consequência de seus atos.

A Igreja de Bauru se demonstrou Mãe Paciente quando, por diversas vezes, o chamou fraternalmente ao diálogo para a superação dessa situação por ele criada. Nenhum católico e muito menos um sacerdote pode-se valer do “direito de liberdade de expressão” para atacar a Fé, na qual foi batizado.

Uma das obrigações do Bispo Diocesano é defender a Fé, a Doutrina e a Disciplina da Igreja e, por isso, comunicamos que o padre Roberto Francisco Daniel não pode mais celebrar nenhum ato de culto divino (sacramentos e sacramentais, nem mais receber a Santíssima Eucaristia), pois está excomungado. A partir dessa decisão, o Juiz Instrutor iniciará os procedimentos para a “demissão do estado clerical, que será enviado no final para Roma, de onde deverá vir o Decreto.

Com esta declaração, a Diocese de Bauru entende colocar “um ponto final” nessa dolorosa história.

Rezemos para que o nosso Padroeiro Divino Espírito Santo, “que nos conduz”, ilumine o Pe. Roberto Francisco Daniel para que tenha a coragem da humildade em reconhecer que não é o dono da verdade e se reconcilie com a Igreja, que é “Mãe e Mestra”.

Bauru, 29 de abril de 2013.

Por especial mandado do Bispo Diocesano, assinam os representantes do Conselho Presbiteral Diocesano.

Curtas: “Casamento Gay”, aborto na Irlanda e comunhão de joelhos

Três notícias que peço perdão por não aprofundar, mas que julgo não deverem passar em branco.

1. La aprobación del matrimonio gay en Francia no desactiva la oposición, vindo ao encontro do que eu falei aqui ontem. Não temos o direito de desanimar, há muita coisa que pode e deve ser feita. As tiranias um dia caem. Não esqueçamos.

2. Comissão médica derruba pretexto para legalizar aborto na Irlanda – lembram-se do caso? «Os médicos designados para a tarefa, felizmente, não cederam e apresentaram no relatório aquilo que constataram: a morte não teve nada a ver com o feto». Fica assim desmascarado mais um expediente escuso dos pró-aborto: a gritaria inicial não passava de gritaria mesmo, vil tentativa de manipular a opinião pública com base em mentiras. Não nos esqueçamos de que é assim que eles agem.

3. Nos passos de Bento XVI, o Papa Francisco continua distribuindo a Sagrada Comunhão somente na boca, e negando-A aos que tentam pegá-La com as mãos. Negando-A [p.s.: na verdade, o homem que tentou comungar na mão fê-lo não com o Santo Padre, e sim com um diácono, tendo sido este quem lhe A negou. Seguindo os passos do seu predecessor, o Papa Francisco distribuiu normalmente a comunhão (por intinção) diretamente na boca dos comungantes]. Eis um detalhe que devemos gentilmente lembrar aos que nos vierem opôr o Sumo Pontífice ao seu predecessor.

A França legalizou o “casamento gay”

Como é sabido, na última terça-feira a França legalizou em definitivo o “casamento gay” no país. Nós acompanhamos o desenrolar dessa tragédia (aqui, aqui e aqui), e o (previsível) resultado de dois dias atrás pode passar a impressão de que nós perdemos, não valeu a pena, foi tudo em vão. Será que é isso mesmo?

Alguém insinuou ironicamente aqui no blog que isso deve ter acontecido porque os argumentos do movimento pró-família francês são tão ruins quanto os seus equivalentes brasileiros. Ledo engano. Na verdade, isso aconteceu porque o mundo moderno anda enlouquecido e absolutamente não dá mais importância a argumentos. Ora, em que lugar do planeta essa discussão é conduzida sobre bases argumentativas? Muito pelo contrário: os arautos da Revolução Moral só sabem agir na base da truculência e do apelo emocional, nada mais. Qualquer pessoa que já tenha tentado discutir esse tema com algum pró-gay sabe perfeitamente do que estou falando, e no próprio Deus lo Vult! é possível encontrar abundantes exemplos dessa curiosa patologia intelectual.

Mas, de uma forma ou de outra, o casamento gay foi legalizado na França, é fato. E agora, simplesmente perdemos? Foi tudo em vão? Penso que é possível sermos um pouco mais otimistas.

A França legalizou o “casamento gay”, mas os gritos de protesto dos que se levantaram contra essa infâmia foram ouvidos no mundo inteiro, e serviram de exemplo e estímulo àqueles que não concordam com a ideologia anti-natural que lhes está sendo imposta.

A França legalizou o “casamento gay”, mas a imprensa foi obrigada a noticiar que, em pesquisa recente, «58% dos [franceses] entrevistados se disse a favor do casamento gay» mas, por outro lado, «uma maioria (53%) se disse contra a adoção [de crianças], contra 45% a favor» – adoção esta incluída na lei aprovada anteontem, na contramão portanto da expressa vontade da maior parte dos franceses.

A França legalizou o “casamento gay”, mas sofreu dura e terrível resistência dos que são contrários à exaltação do vício e à equiparação legal entre “família” e “dupla gay”:  tanto quanto lembro, foi a primeira vez que uma lei desse tipo recebeu resistência pública tão clara e generalizada.

A França legalizou o “casamento gay”, mas não convenceu e nem silenciou os que mantêm a cabeça no lugar. Muito pelo contrário: o La Manif Pour Tous promete continuar protestando, como nos diz o Wagner Moura.

A França legalizou o “casamento gay”, mas a guerra cultural ainda não terminou, e dela ainda precisamos tomar parte – não nos é permitido desanimar. Faz diferença. Diante de um monstro tão grande e tão forte a se lançar sobre nós, qualquer mínimo dissabor que lhe consigamos impingir faz diferença.

Dom Oscar Romero e a Teologia da Libertação

Alguém denuncia: o Papa Francisco I dá uma mãozinha à teologia da libertação (marxista). Nesta fonte, leio que «[o] Papa Francisco I prepara-se, assim, com Óscar Romero, para canonizar a teologia da libertação (marxista); e só lhe fica bem porque demonstra a sua coerência». Perturbador, não?

Nem tanto. Sobre os outros dois nomes citados no texto eu não sei dizer nada. Mas de D. Romero eu posso falar sim: ao que me conste, viveu como devoto filho da Igreja, como se depreende das fontes primárias das quais dispomos. Da carta que consta nesse link, enviada ao Papa em favor de S. Josemaría Escrivá (durma-se com um barulho desse: acusam de ser da Teologia da Libertação um bispo que se rasga de elogios ao Opus Dei!), destaco só duas passagens, curtas mas bem representativas do senso de prioridades do falecido bispo de San Salvador (grifos do original):

Conheço faz muito tempo o trabalho do Opus Dei aqui em El Salvador, e posso testemunhar o sentido sobrenatural que o anima e a fidelidade ao magistério eclesiástico, que caracteriza este trabalho.

[…]

Neste mundo tempestuoso, invadido por insegurança e dúvida, a excelente fidelidade doutrinária que caracteriza o Opus Dei é um sinal da graça especial de Deus.

Parece-me evidente, assim, que a canonização de um homem desses não pode jamais ser vista como uma chancela à Teologia da Libertação de cunho marxista, já incontáveis vezes condenada pela Igreja Católica. Ressuscitar este cadáver já putrefato, como já expliquei aqui, seria claramente retroceder os ponteiros do relógio da História – coisa que o Papa Francisco já deixou bem claro que não gosta de fazer.

Curtas: O filo-gayzismo mal-disfarçado de D. Piero Marini e do pe. Beto

D. Marini a favor do casamento civil gay, vejo quase ao mesmo tempo no pe. Z. e no Fratres in Unum. O que dizer? Bom, parece-me que os temores de que o antigo cerimoniário pontifício pudesse ressurgir das cinzas estão agora – graças a Deus! – mais difíceis de se concretizarem. Afinal, todo mundo sabe que o Papa Francisco é um ferrenho opositor tanto do casamento gay quanto dessa sua versão mais “light” chamada união civil gay.

Quanto ao mérito das declarações de D. Piero Marini, remeto às (já tradicionalmente) lúcidas palavras do Everth Queiroz:

E agora, o que vocês vão dizer, com um bispo da Igreja defendendo a união civil gay? – Ora, o mesmo de sempre: que “[em] presença do reconhecimento legal das uniões homossexuais ou da equiparação legal das mesmas ao matrimônio, com acesso aos direitos próprios deste último, é um dever opor-se-lhe de modo claro e incisivo”, como está disposto em um documento da Congregação para a Doutrina da Fé, de 2003. Note-se bem: é um dever opor-se tanto ao “reconhecimento legal das uniões homossexuais” quanto à “equiparação legal das mesmas ao matrimônio, com acesso aos direitos próprios deste último”. E, se as palavras do então Cardeal Joseph Ratzinger valiam com toda a força também para quem não comunga da fé católica, quanto mais para os fiéis da Igreja, quanto mais para seus bispos! Não tem essa de “o que não se pode reconhecer é que esse par seja um matrimônio”. Há o dever de oposição clara e incisiva também ao reconhecimento civil das uniões de pessoas do mesmo sexo.

É simples assim: não há nada de novo sob o sol. Seríamos mais felizes se nos acostumássemos a ignorar o ruidoso vai-e-vem das opiniões humanas (mesmo que sejam emitidas por prelados católicos!) e, ao contrário, repousássemos tranqüilos na solidez permanente do Ensino Moral da Igreja de Cristo.

* * *

– Sobre o mesmo assunto, aliás, o Bispo de Bauru exigiu a retratação de um sacerdote católico que, em um vídeo recentemente popularizado na internet, afirmou (entre outras barbaridades) que «hoje em dia não dá mais para você enquadrar o ser humano em homossexual, bissexual ou heterossexual (nós nos deveríamos ser enquadrados simplesmente seres sexuados), e que o amor pode surgir em qualquer desses níveis. […] Então a Igreja tem que mudar sim. Ela vai ter que mudar».

Soube da publicação da nota via Ecclesia Una, e ela já se encontra devidamente divulgada no site da Mitra de Bauru. Dela (que é curta – leiam lá), destaco:

Determino [o padre Roberto Francisco Daniel (padre Beto)] a se retratar através do mesmo meio utilizado (site, Facebook e YouTube), no prazo até 29 de abril de 2013, confessando humildemente que errou quanto a sua interpretação e exposição da doutrina, da moral e dos costumes ensinados pela Igreja.

Que beleza, hein? Quem diria! Os nossos mais sinceros e efusivos agradecimentos a S. E. R. Dom Frei Caetano Ferrari, ofm, Bispo Diocesano de Bauru, que Graças a Deus interveio quando a pureza do Ensino Moral da Igreja se viu publicamente ameaçada. Tivéssemos mais atitudes assim, o Brasil estaria em condições bem melhores. Que a SSma. Virgem possa sustentar Sua Excelência nesse santo propósito, e que Ela suscite outros prelados dispostos a imitar o bom exemplo do bispo de Bauru.

São Jorge, rogai por nós!

No meu onomástico, não posso deixar de prestar uma ligeira homenagem a São Jorge; assim, remeto os meus leitores a este texto d’O Catequista hoje publicado, que contém uma pequena biografia do santo (incluindo a parte lendária do dragão).

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Se a memória não me trai, os detalhes da vida do santo da Capadócia só se encontram na Legenda Aurea mesmo, havendo apenas algumas linhas na “História Eclesiástica” de Eusébio que se referem ao militar que foi martirizado sob o Imperador Diocleciano. A escassez de fontes históricas primárias é contudo amplamente suplantada pela multissecular devoção a São Jorge, pela qual as graças alcançadas ao longo da história da Igreja evidentemente exigem um santo [originalmente] de carne e osso a interceder junto a Deus por aqueles que se lhe recomendam.

Que o Glorioso São Jorge possa rogar por nós e nos proteger nos combates desta vida!

A JMJ e as feridas da Igreja Militante

Certo comentarista veio aqui no blog unicamente para chamar a JMJ de “antro de perdição”, fazendo referência a esta postagem de um outro blog que traz algumas imagens, concedamos, impudentes e imprudentes do evento ocorrido em Madrid em 2011. Contra isto eu faço questão de responder antes de qualquer outra coisa: antros de perdição são certos ambientes virtuais ditos católicos, ora bolas!

Estive em Madrid em 2011 e, portanto, falo daquilo que eu vi. E o testemunho de valor e coragem que eu vi aqueles milhões de jovens darem ao mundo não se mede pelo comprimento das roupas que usavam no sufocante verão espanhol. Aliás, é preciso estar totalmente alienado da realidade para jogar fora um evento católico das proporções da JMJ por conta de meia dúzia de fotos mal-comportadas, e isso por si só testemunha o quanto faz mal certo tradicionalismo imbecil de internet e o quanto é fundamental que se afastem dele aqueles que se preocupam com a saúde da própria alma!

Estando às vésperas da Jornada do Rio de Janeiro, há não muito escrevi aqui a minha admiração por esse evento católico. E mantenho tudo o que disse: «não consigo deixar de ver essas tentativas de acabar com a credibilidade da Jornada (…) como um levante orquestrado das forças do Inferno contra um evento católico que está dando frutos para a glória de Deus e a salvação das almas». À época, eu falava dos que queriam introduzir na JMJ elementos estranhos ao Catolicismo, mas isso se aplica também a estes – mesmo católicos – que, munidos de uma visão parcial e preconceituosa do que seja o evento, ao invés de rezarem pelo bom êxito da iminente vinda do Papa ao Brasil preferem empregar o seu tempo em denegrir a Jornada Mundial da Juventude.

Os jovens que vão à Jornada não são o exército impoluto de paladinos em armadura cintilante desfilando solenemente n’alguma festividade comemorativa dos áureos tempos da Cristandade. É óbvio que eles não são e aliás nem se propõem a sê-lo. Ao contrário, são justamente os pecadores confusos destes tempos desgraçados em que vivemos, e é precisamente isto que faz com que a ação divina na JMJ resplandeça com tanta clareza que é preciso ser cego para não ver.

Reproduzo abaixo a foto que coloquei aqui em 2011, em um relato sobre a JMJ de Madrid ao qual remeto quem quiser uma segunda opinião sobre o evento, bem diferente desses vaticínios pessimistas dos neo-fariseus virtuais. A foto retrata, como falei então, um embate verdadeiro e concreto, físico até, entre inimigos da Cruz de Cristo e peregrinos da JMJ. E não se trata de um fato isolado, muito pelo contrário: coisas assim foram de uma monótona regularidade ao longo de todos aqueles dias. Na Espanha, respirava-se este clima de tensão.

Miles de personas demandan un estado laico ante la visita papal

Eu não vou nem perguntar onde é que estavam os “cruzados virtuais” (*) enquanto os jovens católicos da JMJ recebiam agressões de verdade em ruas de verdade; nem vou questionar onde se encarna melhor o espírito cruzado católico, se na menina que resiste em público a evidentes demonstrações de odium Fidei ou na blogosfera que se compraz em divulgar imagens desabonadoras de outrem. Seria até covardia fazer tais comparações. Vou somente apontar para um pequeno “detalhe” que certas pessoas – na sua ânsia paranóica por roupas curtas a denunciar – não conseguem ver:

Que um católico experiente e exercitado na prática das virtudes suporte perseguições e dê testemunho público de Cristo é coisa esperada e bem lógica até. Que o façam jovens moral e doutrinariamente confusos, é coisa inaudita que exige uma explicação. Que palavras de amor ao Papa saiam dos lábios piedosos de católicos de alma pura é natural; que brotem do coração de jovens imodestas é que é desconcertante. Que dê admiráveis mostras de Fortaleza quem medita diariamente o Sermão da Montanha é coisa banal e simples; que sejam dignos da última Bem-Aventurança (**) jovens que provavelmente não seriam sequer capazes de citá-la corretamente é fato assombroso. Que façam guerra ao mundo, a Satanás e à carne os membros das Ordens de Cavalaria católicas é a ordem natural das coisas; que lute e vença cruzadas o catolicismo medíocre é que é extraordinário.

Não há nada de excepcional nos jovens que vão à JMJ, e é precisamente nisso que reside a excepcionalidade do evento. É provável que os peregrinos católicos não sejam moralmente muito melhores do que os jovens “do mundo” junto aos quais vivem, e é justamente nesta desproporção entre as suas virtudes humanas habituais e o testemunho de Fé que naqueles dias conseguem dar que a mão de Deus se faz evidente, quase palpável. Malgrado os seus muitos defeitos, a maior parte daqueles jovens tinha algum amor à Igreja (e os que não tinham, facilmente se deixavam contagiar pelos demais), imperfeito sem dúvidas (***), mas – e isto é o importante – que Deus não rejeita se Lhe é entregue com pureza de intenção. E, por mais difícil que isso seja de entender, é fato que Deus consegue fazer maravilhas com qualquer coisa (por pequena que seja!) que Lhe ofertemos.

Aqueles jovens que estavam em Madrid estavam longe de serem perfeitos – eu sei, eu vi! Mas há mais catolicismo nas ruas espanhóis apinhadas de peregrinos do que nas amargas rodas de internet que parecem viver de espalhar o desânimo (se justo ou injusto tanto faz). Os murmuradores não suportam o cheiro purulento das feridas da Igreja Militante, mas se esquecem de que Deus faz mais com um leproso que vai à guerra do que com um batalhão de homens saudáveis que prefere ficar jogando conversa fora nos salões palacianos.

* * *

(*) Que adoram xingar muito nas redes sociais a lastimável situação da Igreja, rasgando as vestes e deplorando o miserável estado do catolicismo contemporâneo confortavelmente sentados em casa.

(**) Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem, quando vos perseguirem e disserem falsamente todo o mal contra vós por causa de mim (Mt V 11).

(***) E mesmo assim muito acima da média: nenhum peregrino foi lá fazer campanha pelo aborto ou pela liberação da camisinha, por exemplo.

As melhores homilias do Papa Francisco

O Papa Francisco tem feito homilias sem sombra de dúvidas excelentes. Mas, na minha opinião, as suas melhores homilias são as que não se encontram disponíveis no site do Vaticano. Explico: o Papa tem o hábito (que eu absolutamente não sei dizer se era compartilhado pelos seus predecessores) de improvisar breves homilias em todas as missas que ele celebra, mesmo durante os dias de semana, mesmo diante de um grupo pequeno de pessoas. Como elas são feitas de improviso, os órgãos de imprensa da Santa Sé não as recebem previamente e, portanto, não podem divulgar-lhes o conteúdo pelos canais de comunicação oficiais da Igreja. Temos acesso a fragmentos delas somente mediante as testemunhas auriculares dessas celebrações, às quais por vezes os órgãos de imprensa conseguem ter acesso.

Trago três exemplos disso que estou falando; nenhuma das datas abaixo consta no calendário (oficial) das atividades do Santo Padre [p.s.: a homilia do dia 23 de abril está disponível aqui; além disso, o site do Vaticano está disponibilizando uma compilação das meditazioni do Papa Francisco, «a cura de L’Osservatore Romano», que é o que de mais próximo temos dos “textos oficiais” dessas homilias do Papa].

06 de abril de 2013, via Sandro Magister, com tradução do Ecclesia Una, que eu já mencionei en passant aqui: «A fé não se negocia. Esta tentação sempre existiu na história do povo de Deus: cortar um pedaço da fé, ainda que não seja muito. Mas a fé é assim, tal como a recitamos no Credo. É necessário superar a tentação de fazer o que todos fazem, não ser tão, tão rígidos, porque precisamente daí começa um caminho que acaba na apostasia. De fato, quando começamos a destroçar a fé, a negociá-la, a vendê-la à melhor oferta, começamos o caminho da apostasia, da não fidelidade ao Senhor».

23 de abril de 2013, via Agência Ecclesia: «[E]ncontrar Jesus fora da Igreja não é possível (…) [O Papa Paulo VI dizia ser] uma dicotomia absurda querer viver com Jesus sem a Igreja, seguir Jesus fora da Igreja, amar Jesus sem a Igreja. (…) Não se pode acreditar em Jesus sem a Igreja, di-lo o próprio Jesus».

22 de abril de 2013, via Avvenire, com tradução livre minha: «Qualquer um de vocês poderia dizer: ‘Padre, o senhor é um fundamentalista!’. Não, simplesmente é isto que Jesus disse: ‘Eu sou a Porta’, ‘Eu sou o Caminho’ para nos dar a vida. Simplesmente. É uma porta bela, uma porta de amor, é uma porta que não nos engana, não é falsa. Sempre disse a Verdade. Há talvez caminhos mais fáceis, mas são enganosos, não são verdadeiros: são falsos. Somente Jesus é o Caminho».

São somente três exemplos que porventura chegaram-me ao conhecimento; quantos outros não existem, sobre os quais eu não fico sabendo nada? E essas sentenças são bastante significativas para compreendermos o pensamento do Papa: ora, uma homilia oficial é aconselhada, redigida (por vezes através de ghost writers…), revisada, criticada, enviada para o Papa, traduzida, etc.; enquanto que nessas homilias espontâneas nós temos o Papa Francisco falando totalmente por conta própria, de improviso, sem influências (boas ou más) de ninguém!

Por isso, faço coro a este pedido do Rorate Caeli: alguém deveria transcrever essas homilias e colocá-las (sob uma seção menos formal da página do Papa, que fosse) no site do Vaticano! Não se compreende que bem pode advir da divulgação apócrifa das palavras de Sua Santidade, nem tampouco que mal causaria a veiculação integral desses ensinamentos tão belos (e tão atuais) do Bispo de Roma.

P.S.: Atendendo aos nossos pedidos, eis as «Meditazioni del Santo Padre Francesco nelle Messe quotidiane celebrate nella cappella della Domus Sanctae Marthae».

O valor espiritual desses oito anos

Era uma terça-feira de 2005; penso já ter dito por aqui que me recordo profundamente daquele 19 de abril. A fumaça branca na chaminé da Capela Sistina – então a primeira fumata bianca da minha vida! – anunciava ao mundo que o sucessor do Papa João Paulo II fora escolhido. Estava na copa da faculdade, diante de uma TV ligada, através da qual eu soube que Joseph Ratzinger assumia o sólio pontifício com o nome de Benedito Dezesseis. “Não, não, Bento XVI”, alguém rapidamente me corrigiu. Daquele dia em diante, pelos próximos quase oito anos, o velho alemão foi o meu pai e o meu general, o meu líder e o meu professor, o meu mestre e o meu amigo. Foi o meu Papa!

habemuspapam-ratzinger

Há não muitos dias, no aniversário natalício do Santo Padre, eu disse aqui que Bento XVI foi o Papa da minha juventude. Já confessei aqui no blog que eu já era praticamente homem feito quando retornei à prática da religião dos meus pais; o Papa Ratzinger foi, portanto, o Sumo Pontífice cujo pontificado eu acompanhei integralmente. Talvez eu pudesse ser mais ousado e dizer que, na verdade, ele que foi o Pontífice que me acompanhou durante os anos da minha vida que merecem ser chamados de “católicos”; o fato é que, de qualquer maneira, é impossível olhar para o hoje Bispo Emérito de Roma sem um sentimento de profunda gratidão. É impossível não lembrar o dia de hoje: faz oito anos!

Ninguém diria em 2005 que o Papa recém-eleito havia de renunciar alguns anos depois. Por certo sabíamos que o luminoso pontificado de Bento XVI havia de terminar um dia, mas ninguém imaginava que ele entraria para a História dessa maneira. Eu já manifestei aqui no Deus lo Vult! a minha profunda gratidão por tudo o que o Santo Padre Bento XVI fez pela Igreja ao longo desses anos; mas não consigo me livrar da impressão de que, não importa o que eu diga, nunca será o bastante. Se a dimensão histórica daquela Grã Renúncia do dia de Nossa Senhora de Lourdes é incontestável, penso que seria grande injustiça de nossa parte não reconhecer o quanto foi também histórico o Habemus Papam de 2005.

Sobre esses anos muito poderia ser dito, mas por hoje quero me restringir à questão litúrgica. Um amigo sacerdote empregou certa vez a expressão “ressuscitar altares” para se referir ao ato de celebrar a Santa Missa naqueles tantos altares – de tantas igrejas! – que, após a Reforma Litúrgica, foram rebaixados a meros nichos de santos ou suportes de velas ou vasos de flores. Bento XVI – mormente após o Summorum Pontificum de 2007, mas em todo o seu pontificado – deu novo vigor à consciência litúrgica na Igreja e resgatou a capital importância do Sacrifício Eucarístico do Corpo e do Sangue de Deus: ao longo dos últimos anos, quantos altares não foram ressuscitados! Quem será louco o bastante para negar o valor sobrenatural dessas tantas Missas que voltaram a ser celebradas em altares abandonados – em altares originalmente erigidos para oferecer sacrifícios à Trindade Santa, desgraçadamente desviados de sua finalidade durante os negros anos do pós-Concílio?

Recordo-me de um em particular: um antigo e simples altar frontal (não era o altar-mor) da capela do Seminário de Olinda, edifício do século XVI, onde certa vez o Santo Sacrifício da Missa foi celebrado depois de décadas e eu estava presente, junto com mais um ou dois amigos. Éramos uma quantidade ínfima de pessoas, mas conosco estava a totalidade da Igreja, Triunfante, Padecente e Militante. Sobre aquela pedra Cristo foi imolado, nas intenções – entre outras – do Santo Padre Bento XVI, e sinceramente não sei se tal teria sido possível se então fosse outro e não ele o Vigário de Cristo gloriosamente reinante. Penso que somente na Eternidade nós teremos a dimensão precisa das graças que jorraram desses altares e foram derramadas sobre o mundo graças ao zelo litúrgico que Bento XVI impingiu à Igreja de Cristo.

Foi em 2005, e seria vil impiedade não nos lembrarmos com alegria e gratidão do dia de hoje. Neste 19 de abril, suplicamos ao Todo-Poderoso que possa recompensar o seu servo por todo o bem que ele realizou em Seu favor, e também para que não deixe inacabada a obra de restauração iniciada naquela terça-feira de abril. Nós, os herdeiros do legado de Bento XVI, não temos o direito de esquecer tudo isso. Triste coisa seria se deixássemos que tudo fosse em vão. Loucura seria se desprezássemos o valor espiritual desses oito anos.