[OFF] Eu, com câncer (II): retrospectiva e primeiro ciclo de Quimio

Antes de mais nada, preciso dizer que tenho uma dívida de justiça e de caridade para com todas as pessoas que, nos últimos dias, me enviaram mensagens de ânimo e me asseguraram as suas tão valiosas orações. Foram emails e comentários no blog, mensagens de Facebook e de celular, telefonemas e visitas, tantas coisas, tantas, que estou certíssimo de que, no tocante à generosidade dos que me estimam, eu estou muitíssimo mais bem servido do que mereço. Obrigado, do fundo do coração, a todos e a cada um de vocês. Tenham a certeza de que uma parte dos incômodos dessa etapa da minha vida está e continuará sendo oferecida em retribuição aos que tão generosamente correram em meu favor assim que souberam dos meus infortúnios. Que o Bom Deus, que é rico em misericórdia, possa recompensar-lhes esta (tão grande!) caridade com toda a munificência da qual só Ele é capaz.

Alguém me pediu para que fizesse uma pequena retrospectiva do que me levou ao diagnóstico da doença. Quando cheguei na emergência do hospital, no último dia 14 de dezembro, eu tinha quatro sintomas mas somente uma queixa: dificuldade respiratória, acúmulo de líquido abdominal (ascite), perda de peso e aumento dos gânglios linfáticos (perceptíveis na região das axilas, virilhas, etc.).

A minha única queixa era a dificuldade respiratória. Todos os outros “sintomas” me pareciam explicáveis: eu estava já há alguns meses fazendo exercícios diários e intensivos para perda de peso, nunca tive barriga de tanquinho (e sempre ouvira dizer que gordura abdominal (a minha, praticamente congênita) era a mais complicada de se perder mesmo) e os gânglios, inchados mas completamente indolores, até que eram perceptíveis se procurados, mas nunca me passou pela cabeça esquadrinhar meu corpo à caça deles. Quando o médico começa a anamnese você passa a responder “sim, sim, é mesmo”; antes disso, você simplesmente não imagina. Como já disseram com muita propriedade, câncer é doença “dos outros”. E temos a irritante mania de não nos darmos conta de que, para os outros, “os outros” somos nós.

Uma coisa puxou a outra e o resto da história vocês já sabem: a dispnéia era causada por um derrame pleural bilateral, os derrames concomitantes em diversas partes do corpo (dois lados da pleura, cavidade abdominal, etc.) apontavam para um problema sistêmico, os gânglios hipertrofiados faziam suspeitar de linfoma e a biópsia o confirmou. Depois foi mais uma semana para análise do tipo específico do câncer e, só então, o tratamento pôde ser definido e iniciado. Problemas burocráticos impediram a quimioterapia de iniciar no sábado (como eu disse que seria), então a iniciei no dia seguinte, 29 de dezembro, Domingo, festa da Sagrada Família e meu aniversário de 15 meses de casamento.

chemo

É desagradável, mas suportável. Até eu, “mole como um prato de papa” como já me defini a respeito de procedimentos médicos, munido com as orações dos amigos pelas quais já agradeci acima, pude atravessá-la com relativa tranquilidade. Um pouco febril, assomado por ondas violentas de náuseas, tontura permanente, dor de cabeça constante, uma crise de calafrios: é o que lembro daquelas horas de domingo. Passaram. Se aquele coquetel de drogas fizer pelo menos tanto mal à doença quanto parece fazer ao resto do corpo são, creio que ela está sendo muito bem combatida. E o melhor de tudo é o fantástico efeito do dia seguinte, em tudo análogo àquela anedótica sensação de ter ampliado o espaço doméstico após se livrar da vaca que se passou uma semana criando na sala do apartamento: diante das lembranças das horas da QT, na segunda eu me sentia a pessoa mais bem-disposta do mundo.

Hoje escrevo já de casa, pela primeira vez em casa desde o dia 14 de dezembro. Faz muito tempo, e é interessante como isso nos ensina a valorizar as coisas simples da vida: respirar ar puro depois de semanas de ar condicionado e sentir um pouco de sol no rosto após quinze dias apenas o vislumbrando pelas persianas das janelas, por exemplo. É tudo clichê, eu sei, mas parece que a gente não consegue introjetar direito enquanto esse tipo de coisa não acontece com a gente.

Neste último dia de ano, tenho muito a agradecer. Por estranho que talvez pareça a alguns, agradecer inclusive (e talvez até principalmente) por estas cruzes que me foram enviadas, pelas enfermidades e por todos os atropelos dos últimos dias. É nos sofrimentos que nos sentimos mais amados por Deus, quando nos percebemos com uma capacidade de enfrentá-los que nos é estranha e não pode vir de nós: quando ao (perdão, Senhor!) desespero do primeiro contato com o diagnóstico segue-se, sem razão aparente, a serenidade para os necessários duros passos seguintes. É óbvio que ninguém gosta de sofrimentos; mas o que peço a Deus, antes de que simplesmente me livre deles, é que me conceda o valor de enfrentá-los de pé, de fronte erguida, com galhardia, pela glória d’Ele. É esta a oração cristã, é esta a minha oração, é nisto que peço a Deus que tenha a misericórdia de me sustentar daqui em diante.

As doenças graves têm o salutar efeito de aproximar as pessoas. Falei nos últimos dias com pessoas queridas com as quais há muito tempo não falava; parece que precisamos nos deparar com a consciência da fragilidade da vida para nos libertarmos da síndrome do “Sinal Fechado”. Sou muito grato por isso também.

Por fim, agradeço por estar onde estou agora: com um diagnóstico que, embora desagradável, está longe de ser o pior possível, e com o tratamento já iniciado – ONLY FIVE MORE TO GO! – ainda no final deste ano. Cuidar mais da própria saúde deixou de ser uma utópica resolução de ano novo para se transformar já em ação concreta antes mesmo do Reveillon. O câncer perdeu a sua oportunidade de livre proliferação e, agora, já está sendo combatido. O pior já passou: agora, o caminho pode até ser árduo, mas é para cima.

E é para lá que vamos.

Publicado por

Jorge Ferraz (admin)

Católico Apostólico Romano, por graça de Deus e clemência da Virgem Santíssima; pecador miserável, a despeito dos muitos favores recebidos do Alto; filho de Deus e da Santa Madre Igreja, com desejo sincero de consumir a vida para a maior glória de Deus.

32 comentários em “[OFF] Eu, com câncer (II): retrospectiva e primeiro ciclo de Quimio”

  1. Caro Jorge:Vejo que já começa o seu caminho para a saude e uma vida mais plena.
    Seguramente ajudada pelos resultados do impacto de uma doença grave.
    Não tive câncer( salvo uma besteirinha de pele, já resolvida muitos anos atrás), mas estive seriamente doente por quase um ano, em 2010, e sei mais ou menos como é.
    Sendo que comigo havia um fator complicador: estava com 73 anos. Minha recuperação, um pouco lenta no início, logo se acelerou e estou muito bem.
    Você ,jovem, também estará bem melhor, temos nós todos confiança em Deus, dentro de uns poucos meses. Você tem a vantagem de estar bem preparado, espiritualmente, para aproveitar tudo de bom que uma experiência impactante tem.
    Lamartine

  2. Acho que não tenho muito o que dizer. Bem, eu tenho uma cruz (como todos) que não tem cura, a diabetes. Posso dizer que: a dor é maior quando ficamos na angústia lancinante da dúvida. Quando tiram tua dúvida, mesmo que o diagnóstico te comprometa a vida e a liberdade de ação, há o alívio, porque há pessoas com você,
    você vai saber exatamente o que fazer e como lutar.

    Nossa maior dor decorre da dúvida e da impotência, da inexistência de meios para lutar. Quando você consegue sair à luta e soltar o grito de guerra pela sua Vida, em honra e Glória de nosso Deus, o Diabo da dor que te oprime foge como da Cruz!

    Melhoras e siga em frente! Não pare, não abaixe a cabeça. Abaixar a cabeça é convite para o Diabo cortar sua cabeça. Antes, que São Miguel vá à sua frente e pise na cabeça do diabo e das correntes que queiram te prender!

    Feliz 2014!

    In Corde Iesu, semper! :D

  3. Que bom que vc vai bem!
    Continua mandando notícias ok?
    Um 2014 abençoado!

  4. Amado amigo e irmão, sua fortaleza e seu sorriso nos ilumina. Sua casa fincada na Rocha se revela neste momento é nossas orações, sim, lhe acompanham. É assim a vida dos filhos do Céu, uma comunhão de pobres filhos que irmanados no Altíssimo, formam a comunhão. Obrigado por ser luz para nosso caminhar, pois somos contigo no Coração Sagradissimo de Maria.

  5. Caro Jorge, uma alegria saber que já se sente bem melhor depois destes primeiros passos com o tratamento quimioterápico. Que Deus o abençoe e Maria Santíssima o acompanhe neste novo ano que se aproxima. Saúde e Paz meu irmão. Forte abraço.

  6. Parabéns pela coragem e determinação. Feliz 2014 e que Nossa Senhora o proteja. Estaremos em oração pela sua pronta recuperação.

  7. cara, como vc disse acima: é que me conceda o valor de enfrentá-los de pé, de fronte erguida, com galhardia, pela glória d’Ele… ja diz tudo! continue assim primo! sempre o jumbo que conhecemos

  8. Continuarei rezando até a total recuperação, após continuarei rezando, mas oração de ação de graças. Grande beijo amigo Jumbo.

  9. Que bom te ver forte e firme Jorge, e parece-me que tuas palavras conforta-nos mais que as nossa a ti. Vê-lo animado é reconfortante. Mas se um dia a lágrima rolar, não sufoque, seremos muitos a enxugá-la. Esperamos sua pronta recuperação e um livro, você escreve muito bem. Um 2014 de vitória para todos nós.

  10. Como disse muito bem o Johann Salazar …”É assim a vida dos filhos do Céu, uma comunhão de pobres filhos que irmanados no Altíssimo, formam a comunhão”. Estamos todos juntos na alegria, na dor, na oração. Um abençoado ano para você e sua família.

  11. Deus te abençoe, Jorge! Força, que você é um dos cabras mais machos que já vi! :D Continuarei rezando as Ave-Marias sempre que visitar seu site, que é diariamente!

  12. “Os planos de Deus nunca se realizam senão à custa de grandes sacrifícios” (São Cláudio de La Colombiere).
    Feliz ano novo!

  13. Jorge,

    Perdi há 15 dias minha querida mãezinha pela mesma doença(exatamente igual) a sua e ela era para ter durado,segundo os médicos,6 meses,mas durou 5 anos e ainda choro a falta dela…sei que temos diferenças e já tivemos muitos embates pesados neste blog e sei que você passou um bom tempo tendo até raiva de mim,mas agora não é momento para isso e quero te dizer,meu amigo,que estarei suplicando ao Nosso Senhor pela sua vida….o que me acalmou em todo esse tempo foi a leitura do livro de Jó porque passei a entender o propósito dos sofrimentos dos justos nessa terra!

    Meu caro,se cuide e tudo vai ficar bem na sua vida!Me desculpe pelos transtornos causados no seu blog e confesso que mesmo tendo um credo diferente do seu aprendi muito com o seu blog!Você é forte…vai vencer essa essa…Cristo está com você!Abraços

  14. Você é novo e descobriu cedo então a chance de cura é imensa…vai dar certo!

  15. Olá Jorge Ferraz. Não sei o que é passar por uma doença grave pois tenho tido a graça da saúde em minha vida e na de meus familiares, mas posso imaginar que não deve ser fácil. Conte com minhas orações. Um abraço lusobrasileiro!

  16. Caro Jorge,

    Espero confiante que você recupere a plena saúde, com a graça de Nosso Senhor Jesus Cristo. Conte com minhas orações.

    Um abraço!

  17. Caro Jorge, a Paz de Nosso Senhor Jesus Cristo!

    Acabei de saber de sua doença por meio deste artigo, e já comecei a rezar por ti. Fique firme, e aproveite tudo para glória de Deus e o bem da sua alma! Conte comigo também.

    Um grande abraço e parabéns pelo seu trabalho apologético e esclarecedor na internet.

    Em Cristo e Maria Mãe de Deus, que já intercede por ti,
    Renato.

  18. bom dia Jorge! não nos conhecemos pessoalmente mas aprendi a admirá-lo através de seu blog e de suas entrevistas. vc é um dos que tem me ajudado na minha caminhada…tenho muito que te agradecer! rezarei para que vc se restabeleça o mais breve possivel!

  19. Você permanece em nossas petições diárias ao Bom Deus e, de forma especial, na Santa Missa. Confiamos Nele a sua pronta recuperação. Feliz Ano Novo com muita saúde! Um grande abraço.

  20. Jorge: diariamente, no altar da Santa Missa, colocarei o pedido por sua plena recuperação. Deus lhe guarde! Um abraço! Pe. Luiz

  21. Jorge, desejo melhoras. Minhas orações. Alvaro, meus sentimentos pela sua mãe. Eu sei o que é isso, perdi uma prima no meio de dezembro último. Eu sei como é.

  22. Puxa, Jorge; quando vi que estava em recesso forçado por motivo de doença não imaginei que era algo assim tão grave. Que Deus te de força e te ajude e que Nossa Senhora do Perpétuo Socorro interceda por ti!

    Bom, além das orações, gostaria de deixar uma sugestão. Não sei se você é adepto de remédios naturais; mas, caso se interesse, de uma pesquisada sobre a BABOSA COM MEL divulgada pelo Frei Romano Zago há alguns anos atrás.

    Eu tomo, mais ou menos, uma ou duas vezes por ano só para prevenção; graças a Deus, nunca tive câncer para saber se a babosa com mel funciona mesmo ou não; mas, eu tenho um pensamento: se não faz mal, não custa tentar tomar!

    Tenho certeza que, pelo menos, ela regula o sistema imunológico e reforça a defesa do organismo. Pois, eu vivia com infecção de ouvido e uns 15 dias depois que comecei a tomar a receita da babosa, pela primeira vez, nunca mais tive infecção de ouvido. Um colega meu, que tinha uma grave sinusite, também tomou uma única receita e já ficou curado também.

    Se você se interessar, pergunte ao seu médico se pode tomar; nem que for para minimizar os efeitos da quimioterapia (segundo dizem) e para um efeito psicológico!

    Eis a receita da BABOSA COM MEL:

    http://www.curapelanatureza.com.br/2008/03/receita-de-babosa-contra-o-cncer.html

    OBS.: – eu coloco mais aguardente e hortelã também, pois melhora muito o sabor!
    – para quem já está doente, é bom tomar doses grandes até o fim do tratamento!

    E. também, uma entrevista com o Frei Romano Zago:

    http://www.jornaldaserra.com.br/8Arquivo/babosa.htm

    E, ainda, sobre um estudo feito por cientistas da UNICAMP:

    http://beneficiosdababosa.net/babosa-e-mel

    Conte com nossas orações; se Deus quiser, logo você estará curado!

  23. Senhor Jorge.
    Há tempos acompanho o seu blog e me deparei agora com a notícia da sua doença.
    Estamos unidos na oração para que seja tudo para a maior glória de Deus.
    Olhe só: um dos meus melhores amigos, padrinho do meu filho, teve linfoma de hodkin diagnosticado em julho de 2012 e fez quimio de agosto de 2012 a fevereiro de 2013.
    Com base no que ele passou, ouso te dar duas sugestões.
    Peça pra os médicos instalarem um catéter em você. Não tem veia que aguenta as picadas seguidas da quimio. Bem menos ruim é colocar um catéter.
    Outra coisa que sugiro é um complemento alimentar chamado ENSURE. A quimio debilita muito a pessoa, afeta também o paladar e o apetite e o Ensure dá uma força muito boa, sendo de fácil ingestão.
    Pra terminar, peça a intercessão de Santa Gianna Beretta Molla. A minha Santa é nota dez.
    Força, irmão. Deus está contigo.
    Forte abraço.

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