Neymar, o COI e as manifestações religiosas nas Olimpíadas

A história envolvendo Neymar, a faixa com “100% Jesus” e a reclamação do Comitê Olímpico Internacional é uma falsa polêmica — ou melhor, uma polêmica à qual se está dando mais atenção do que ela merece. Resumindo a história, o Brasil ganhou no último sábado a sua primeira medalha de ouro de futebol nas Olimpíadas. Durante a cerimônia de premiação, o capitão do time brasileiro subiu no pódio com uma faixa amarrada na cabeça com a inscrição “100% Jesus” — não é a primeira vez que ele o faz. O COI disse que iria enviar uma carta de protesto à delegação brasileira afirmando que o ato era inaceitável no evento. Houve protestos por parte da mídia cristã.

Como já antecipei, penso que se trata de uma falsa polêmica. Primeiro porque a manifestação não é a melhor expressão de Fé do mundo; segundo porque não vale a pena mendigar o reconhecimento do Comitê Olímpico Internacional; terceiro porque o próprio COI disse que não haveria sanções associadas ao incidente — ou seja, tudo se trata de mera vontade de espezinhar.

A primeira questão é talvez a mais relevante aqui. Sinceramente, eu desconheço o testemunho público da Fé Cristã de Neymar — ou ao menos o testemunho público que vá além de usar uma bandana com o Santíssimo Nome de Nosso Senhor nas cerimônias onde ele é premiado. O craque parece levar uma vida em tudo indistinguível da de todos os outros atletas jovens, ricos e famosos — festas, mulheres, brigas. Neste último fim de semana mesmo, com o nome de Cristo na testa e tudo, o atleta ganhou as manchetes dos jornais por conta de ter xingado um torcedor! É certo que a Fé Cristã deve ser difundida; mas será que não estamos fazendo isso errado? Sinceramente eu não sei quem presta maior desserviço ao Cristianismo: o COI, que não quer atletas fazendo referências a Cristo, ou o atleta que, fazendo questão de dar mostras públicas da sua Fé, comporta-se de ordinário como alguém que nada deve à mensagem evangélica!

neymar-yves-herman-reuters

Não se trata de condicionar o apostolado à perfeição moral, evidentemente. O ponto é preservar o Evangelho do escândalo. Irritamo-nos, e com toda a razão do mundo, quando os burocratas ateus do COI desprezam a Fé do povo e querem afastar dos olhos do mundo quaisquer referências públicas ao Divino Salvador; ora, por que razão não nos irritaríamos, também e com até maior medida, quando um atleta amarra uma faixa com o nome de Cristo na testa e vai arrumar confusão com os torcedores a ponto de precisar ser contido por seguranças? Porventura isso não é também um desprezo terrível para com os símbolos cristãos?

[O medalhista Usain Bolt é outro atleta que deu recentemente muito mau testemunho ao ser filmado nas boates cariocas de maneira bem pouco casta, para dizer o mínimo: o mesmo Bolt que há bem poucos dias foi divulgado como sendo devoto de Nossa Senhora das Graças. Aqui, no entanto, a questão é toda outra; não me recordo de ter visto o velocista ostentando a sua Fé Católica pelos pódios nos quais subiu durante as Olimpíadas. A Medalha Milagrosa cai muito bem sobre o peito dos pecadores: que a Virgem da Rue du Bac proteja o jamaicano das brasileiras oportunistas! O problema não é ser cristão e cometer pecados — ser pecador é aliás pré-requisito para ser cristão. O problema é preocupar-se mais com dizer-se cristão do que com portar-se, ou ao menos tentar portar-se, de acordo com as exigências deste nome. Sigamos.]

Há uma outra razão pela qual a revolta parece errar o alvo: parece que, com ela, concede-se aos organizadores dos jogos olímpicos uma autoridade e um prestígio que eles, absolutamente, não detêm. O que tem o COI a ver com a Fé dos atletas, com os símbolos que eles usam, com os gestos que eles fazem, com as preces que eles recitam? Que necessidade existe da aprovação destes senhores?

É bem sabido que as normas do Comitê não têm nada a ver com nenhuma “neutralidade religiosa” (como se isso fosse possível). Trata-se, é notório, de uma deliberada e seletiva perseguição aos símbolos e manifestações do Cristianismo, e não de qualquer religião. Isto é muito fácil de ver. Aqui, no Rio de Janeiro, no início da competição, é impossível não lembrar da mulher que jogou vôlei de praia coberta da cabeça aos pés sob o sol escaldante de Copacabana. A vestimenta, que destoava do contexto muitas ordens de grandeza mais do que a pequena faixa do jovem Neymar, era evidentemente um símbolo religioso — no caso, do islamismo. Não lembro de ter visto o COI reclamar de Doaa Elghobashy. Mais ainda: na mídia houve até festa, dizendo que as atletas estavam quebrando um tabu. Se certos símbolos religiosos são aceitos sem maiores polêmicas enquanto outros ensejam reclamações formais, então é óbvio que o objeto da norma proibitória não é a generalidade das religiões, mas sim uma religião (ou algumas religiões) específica(s).

Ora, se o COI está visivelmente empenhado em uma cruzada anti-cristã sob a desculpa da neutralidade religiosa, o que mais é necessário fazer além de desmascarar-lhe a parcialidade? Apontar a medonha contradição já não é suficiente? Exigir de um órgão incoerente e tendencioso… o quê?, o reconhecimento da licitude dos símbolos e gestos cristãos?, a autorização para falar o nome de Jesus Cristo?, não é dar-lhe uma importância desmedida? Por que os atletas cristãos precisariam da autorização do COI para falar de sua Fé? Por que Nosso Senhor teria que pedir licença aos burocratas de um comitê para subir no pódio conquistado pelos Seus seguidores? Ora, que o Comitê Olímpico se limite àquilo que lhe diz respeito! Quanto aos atletas, que sigam ignorando os seus (do COI) queixumes, que mais que isso é rebaixar a Fé aos caprichos dos organismos internacionais.

A situação seria diferente se o órgão estivesse falando em alguma espécie de punição. Se os atletas estivessem sendo minimamente coagidos na manifestação de suas crenças, se estivessem sob a ameaça de alguma sanção, aí sim seria o caso de dizer com voz altiva que compete obedecer antes a Deus que aos homens, que os comitês organizadores não têm jurisdição sobre a consciência alheia e não podem determinar a quem os atletas oferecem suas vitórias ou a quem deixam de as oferecer. Mas nada disso é assim. Sabendo que não tem legitimidade alguma para impedir o uso de uma faixa com o nome de Jesus por um jogador cristão ao mesmo tempo em que placidamente permite indumentárias islâmicas completas a uma atleta muçulmana, o COI não teve nem mesmo a coragem de ameaçar com sanções. Por outra: disse taxativamente que não haveria sanção alguma. É apenas um protesto vazio, digno de adolescentes birrentos, ao qual não convém conceder mais do que um solene desprezo.

Em suma: se há alguma coisa de censurável na atitude do menino Neymar, tal é o uso meramente externo de um símbolo cristão sem que a isso sejam acrescentados alguns mínimos sinais de que se tem em verdadeira conta a seriedade da mensagem evangélica. A pretensão do Comitê Olímpico de censurar as celebrações dos atletas é descabida e, além do mais, incoerente com a própria atitude do COI diante de outras manifestações análogas — e por isso não merece ser levada a sério. A despeito dos maus exemplos dos atletas cristãos e das picuinhas dos burocratas ateus, o fato é que a Fé não depende nem da coerência daqueles nem do beneplácito destes para ser vivida. E vivê-la inclui professá-la em particular como em público — direito natural contra o qual nada podem as cartas de protesto enviadas por todos os comitês do mundo.

A Mulher por sobre os Tronos e as Potestades

Tenho particular afeição pela festa que se celebra hoje porque penso que, nela, o mistério da Redenção resplandece com um fulgor particular. Hoje se celebra a Assunção da Bem-Aventurada Virgem Maria em corpo e alma; hoje a Igreja canta a Sua coroação como Rainha dos Céus e da Terra. É uma festa que deveria encher o povo cristão de alegria; uma festa que chega mesmo a exaltar aquilo que falta na da Ascensão de Nosso Senhor. Porque na Ascensão é Deus quem Se eleva, glorioso, ao Trono dos Céus que Lhe pertence desde toda a Eternidade; hoje, ao contrário, é uma criatura — é Maria Santíssima! — quem é elevada para ocupar um lugar que até então não ocupava.

nsgloria

Que o Corpo de Cristo não ficasse entregue à corrupção do sepulcro é uma coisa, não digo prosaica, mas até lógica, fácil de compreender e de aceitar: tanto que a aceitam, sem maiores dificuldades, mesmo os protestantes de todas as matizes. Agora que não conheça a corrupção o corpo de uma criatura, de uma filha de Eva…! Tal é uma coisa inaudita e portentosa, tal é a loucura extrema do amor de Deus — a que os filhos de Lutero viram as costas de maneira orgulhosa e farisaica. A Ascensão de Cristo é a glorificação do próprio Deus; a Assunção da Virgem, a divinização da criatura. O Criador ser glorificado é algo que os judeus vêem desde Jacó; a criatura ser divinizada, tal é algo que o mundo viu hoje pela primeira vez — e ainda não tornou a ver, não do mesmo modo, não na mesma medida.

Porque é na festa da Assunção da Virgem Santíssima que a graça de Deus brilha de uma maneira que desafia a nossa inteligência e chega mesmo a desconcertar. Morrer e ressuscitar, aceite-se; salvar o homem do pecado, vá lá. Agora colocar uma criatura — uma Mulher! — por sobre os Tronos e as Potestades, e sentá-la gloriosa sobre as nuvens, e conferir-lhe poder soberano sobre os céus e a terra…! Aí não. Aí já é coisa que nossa inteligência tende a rejeitar, aí já é algo diante do qual o nosso primeiro impulso é dizer “não, aí também já é demais”.

Hoje é a festa em que Deus nos diz que, para Ele, nada é demais. Hoje é a festa que expande o Seu amor para além das fronteiras de nossa justiça e de nossa razoabilidade. Porque a munificência de Deus está além de nossa compreensão; ora, poderia haver prova mais eloquente dessa liberalidade do que ornar uma criatura com todos os privilégios que somente o próprio Deus poderia alcançar?

A glorificação de Cristo é uma exigência da natureza. A glorificação da Virgem não é exigência de nada, é puro rasgo de amor gratuito de Deus — e por isso mais nos assombra, e por isso mais nos deve alegrar. Cristo glorificado não podia ser diferente. A Virgem assunta aos Céus, envolta em glória sobre os anjos, poderia, sim, ser diferente — e é por não ser diferente que é tão maravilhoso, é por isso que a cantamos com toda a pompa devida ao dia de hoje. É por isso que a celebramos e não poderemos nunca deixar de celebrar.

Em Cristo a nossa humanidade é exaltada; na Virgem Maria Deus nos exalta ainda algo mais. Se Cristo sentado em Seu trono sobre as nuvens eleva a natureza humana a um patamar de honra inigualável, na Virgem recoberta de glória algo ainda mais próprio nosso é glorificado: a nossa “criaturidade”. O Deus Onipotente tem natureza humana — é o mistério da Encarnação. Mas Deus não é criatura em nenhum sentido e sob nenhum aspecto; no entanto, hoje uma criatura é coroada Rainha da Criação. Mistério profundo que transcende a própria Redenção, ou melhor, que a culmina de uma maneira admirável — de um modo que não a entendem os pagãos nem os gentios, e nem mesmo os hereges são capazes de conceber.

Salve, pois, ó Virgem da Glória, Rainha assunta aos Céus, em quem Deus revelou os limites do Seu amor e o poder da Sua graça! Lembrai-Vos de nós, pecadores miseráveis que caminhamos neste mundo com o desejo da graça e a esperança da glória. Lembrai-Vos de nós que, hoje, alegramo-nos convosco e com os anjos cantamos os Vossos louvores. Vós, que sois tanto e tanto podes, lembrai-Vos de nós, que bem pouco somos e nada podemos. Rogai a Deus por nós.

A JMJ e a união dos povos

Há quem pense que o esporte é capaz de unir os povos e as culturas. As grandes competições internacionais (como a Copa do Mundo ou, mais atualmente, as Olimpíadas) são por vezes apresentadas como um modelo de congraçamento pacífico e profícuo entre pessoas de diferentes origens e nacionalidades, como um território comum onde os seres humanos podem interagir independentemente das eventuais divergências — políticas, econômicas, ideológicas, religiosas — que possuam.

Sem dúvidas o estabelecimento de regras internacionalmente válidas para os esportes permite que, neles, compitam pessoas que — por conta de barreiras linguísticas, sociais etc. — teriam muita dificuldade de interagir de qualquer outra maneira. No entanto, a pretensão de uma união fundamental de todos os homens sob — p. ex. — a chama dos jogos olímpicos parece-me estar acima das capacidades do espírito esportivo humano. É possível, sem dúvidas, jogar em paz; não significa que se possa edificar a paz sobre os jogos. A fraternidade universal é um anseio da humanidade; calcá-la sobre os esportes, contudo, é edificar sobre a areia. É uma espécie de pareidolia ideológica, que em tudo imagina enxergar a unidade humana perdida.

Existem eventos que melhor atendem a estes anseios (em tudo legítimos) de interação frutuosa e congraçamento de culturas por sobre as barreiras linguísticas, políticas, nacionais: são as Jornadas Mundiais da Juventude católicas. Estes eventos — de cuja magnitude as copas do mundo ou os jogos olímpicos são apenas um reflexo pálido — conseguem atrair multidões vindas dos quatro cantos do planeta, de todos os idiomas, de todas as raças e nacionalidades. Essas pessoas, durante os dias da Jornada, trocam experiências, fazem amizades, ajudam-se mutuamente — em suma, convivem, em união verdadeira, daquela união que torna a dar esperança no futuro da humanidade. Uma união que revela que, por debaixo da diversidade das línguas e das vestimentas, somos todos humanos, somos todos irmãos.

logo-polonia2016

Infelizmente não pude estar na JMJ da Cracóvia que se encerrou no último domingo. Estive em Madrid, em 2011, e estive no Rio de Janeiro, em 2013; há textos aqui no blog que contam as gratificantes experiências destas duas viagens. Não acompanhei a passagem da «juventud del Papa» pela Polônia, nem mesmo de longe; mas tenho certeza de que aqueles rapazes e moças cumpriram o seu papel e souberam fazer ecoar a mensagem do Evangelho por entre as ruínas da civilização européia. Eu já os vi e sei do que são capazes.

Toda a programação do evento — com todos os pronunciamentos de Sua Santidade — está disponível no site do Vaticano ad perpetuam rei memoriam. Vale uma passagem pela página. De todos os textos disponíveis eu olhei um: o encontro do Papa com os bispos polacos. São quatro perguntas, respondidas pelo Pontífice argentino com toda a informalidade de uma conversa entre amigos. O que me levou a este texto em específico foi uma manchete que vi na mídia secular: “Papa lamenta que crianças aprendam na escola que podem escolher gênero”. Esta colocação do Vigário de Cristo está já no final do encontro, no contexto de uma pergunta sobre como agir diante dos refugiados que chegam à Europa — problema candente e da mais atual importância.

Separemos as coisas. Primeiro a ideologia de gênero. É significativo que o Papa tenha falado sobre o assunto, principalmente se considerarmos que a intervenção pontifícia parece descontextualizada. Ninguém o perguntou sobre isso; ele, espontaneamente, trouxe o assunto à baila. É este o parágrafo que nos interessa aqui:

E aqui gostaria de concluir com um aspeto concreto, porque por detrás dele estão as ideologias. Na Europa, nos Estados Unidos, na América Latina, na África, nalguns países da Ásia, existem verdadeiras colonizações ideológicas. E uma delas – digo-a claramente por «nome e apelido» – é o gender! Hoje às crianças – às crianças! –, na escola, ensina-se isto: o sexo, cada um pode escolhê-lo. E porque ensinam isto? Porque os livros são os das pessoas e instituições que te dão dinheiro. São as colonizações ideológicas, apoiadas mesmo por países muito influentes. E isto é terrível. Em conversa com o Papa Bento – que está bem e tem um pensamento claro – dizia-me ele: «Santidade, esta é a época do pecado contra Deus Criador». É inteligente! Deus criou o homem e a mulher; Deus criou o mundo assim, assim e assim; e nós estamos a fazer o contrário. Deus deu-nos um estado «inculto» para que o fizéssemos tornar-se cultura; e depois, com esta cultura, fazemos as coisas que nos levam ao estado «inculto»! Devemos pensar naquilo que disse o Papa Bento: «É a época do pecado contra Deus Criador»! E isto ajudar-nos-á.

Veja-se que interessante: em primeiro lugar, o Papa chama as questões de gênero de «colonização ideológica», ou seja, de uma imposição feita por determinados grupos poderosos sobre populações menos capazes de se defender. Isto coloca a discussão nos seus termos devidos: não se trata de ciência nem de progresso, mas sim de voluntarismo de um determinado grupo de pessoas influentes.

Depois, o Papa Francisco chamou Bento XVI para cerrar fileiras consigo nesta investida. Ao que parece, foi a única fez que o Pontífice reinante citou o emérito nesta viagem. E a referência a Bento XVI nos traz à lembrança aquele discurso de 2012, onde o então Papa, falando sobre este assunto, afirmou claramente que «onde Deus é negado, dissolve-se também a dignidade do homem» — aforismo que deveríamos ter sempre muito claro na memória. O que está em jogo não são os gostos e preferências individuais. É a dignidade humana que é aviltada quando se diz que o sexo pode ser livremente escolhido.

Ainda: o Papa Francisco falou em Estado e em cultura. Ou seja, não se trata de um preceito de católicos voltado somente para católicos. É questão que diz respeito ao Estado, portanto ao direito, às legislações temporais: o fetiche do Estado Laico não nos deve assustar aqui. Identificando o «gender» com o estado «inculto», Sua Santidade afirma ainda que se deixar conduzir por esta colonização ideológica é incultura, é incivilização e selvageria, é, em suma, barbárie.

Finalmente, a referência ao «pecado contra Deus Criador» revela a magnitude deste equívoco. Ora, o Deus «Criador» é o “primeiro Deus” — quero dizer, é a primeira e mais básica compreensão que o homem tem do Ser Supremo. A Santificação (a capacidade de participar da vida de Deus) ou mesmo a Redenção (o perdão dos pecados e o merecimento da vida de glória) são conceitos teológicos razoavelmente refinados. A Criação não. Esta chega às raias de uma evidência: é a própria razão humana natural, sozinha, que é capaz de alcançar o Criador. Revoltar-se «contra Deus Criador», assim, é algo muito mais fundamental e significativo do que rejeitar a Igreja ou Jesus Cristo. Arrisco-me a dizer que se aproxima de um pecado contra o Espírito Santo (na modalidade “negar a verdade conhecida como tal”) — o que expõe a gravidade da situação e a miséria em que se encontra o homem contemporâneo, longe não apenas da Fé Revelada como também dos rudimentos da teologia natural.

Mas volto à questão dos imigrantes — e concluo. Sobre eles basicamente o Papa fala três coisas: primeiro, que o problema está na terra deles; segundo, que cada um precisa acolhê-los na medida da própria capacidade; e, terceiro, que é preciso integrá-los bem. Isso não é um discurso para o Estado ateu; aqui o Papa está falando para bispos católicos. E estes três passos, que para os poderes de César podem significar apenas algumas políticas públicas burocráticas, para a Igreja têm um significado todo diferente.

O problema dos que batem à porta da Igreja está no lugar de onde eles vieram: nas suas falsas religiões, portanto. Embora não seja possível estabelecer formas universais de receber os pecadores, a ninguém é lícito desprezá-los: todo católico está obrigado, na medida de suas capacidades, a acolhê-los. Finalmente, é preciso integrá-los bem; e integrar na Igreja Católica outra coisa não significa que converter.

Porque o problema não é a «cultura», entendido este termo como o conjunto de hábitos, vestimentas, língua, comidas típicas etc.; o problema é a «religião» ou, antes, o problema são as falsas religiões. Há um único multiculturalismo válido e possível: é o da Igreja Católica, que é Universal e, portanto, abraça todos os homens de todos os povos, raças e nações. O Catolicismo não é uma «cultura»; ele transcende a todas elas e a todas integra em si. As bases comuns sobre as quais é possível construir a fraternidade de todos os povos não podem ser outras que as bases da Fé verdadeira. Desta unidade na diversidade — única possível! — dão testemunho, a cada três anos, os católicos que se reúnem nas Jornadas Mundiais da Juventude. Esta concórdia, esta união, esta paz, que os homens em vão buscam nos torneios de futebol ou nas competições olímpicas, somente em torno ao Papa se podem encontrar.