Rascunhos sobre a conferência de Dom Bertrand no Círculo Católico

Ontem à noite eu fui ao Círculo Católico para assistir à palestra de Dom Bertrand. O tema originalmente previsto era a «Psicose Ambientalista», título do seu livro cujo lançamento ocorrera na véspera, na Livraria Saraiva do Shopping RioMar; mas Sua Alteza, orador valoroso, com muita graça discorreu também sobre diversos outros assuntos, brindando a platéia com os seus vastos conhecimentos sobre temas gerais de história, catolicismo, civilização.

Sobre o tema do ambientalismo em si, ele teve o cuidado de separar o – necessário! – cuidado do planeta do lobby moderno que, imbuído de um forte viés ideológico anti-cristão, intenta produzir nas pessoas um sentimento de pânico e de paranóia ante um alegado cataclismo global climático iminente. Deus Nosso Senhor criou a Natureza para o homem e, este, foi colocado pelo Altíssimo no Jardim do Éden para o cultivar e guardar, como lemos nas Escrituras Sagradas. É óbvio que não podemos dilapidar a Criação do Todo-Poderoso; mas é preciso ter bem claro que o catastrofismo corrente não nos ajuda a preservar melhor o planeta que Deus nos deu. Em particular, os brasileiros não somos os irresponsáveis poluidores que uma superficial leitura da nossa mídia pode nos levar a crer: embora sejamos o quinto maior país do mundo, a nossa “contribuição” para a poluição atmosférica é de menos de 2%. Ficamos (muito) atrás de países como a China (esta sim a grande poluidora, responsável por cerca de 20% da emissão global de gases poluentes), os Estados Unidos, a Índia e a Rússia. Em números absolutos, somos o décimo-alguma-coisa; se os colocarmos em termos proporcionais à população e considerarmos a poluição per capita, ficamos para lá do centésimo lugar: o que, bem dito, significa que somos um dos países que menos poluem atualmente.

Citando estudos (se a memória não me trai) da Embrapa, Dom Bertrand opôs ao terrorismo midiático alguns dados bem menos apocalípticos. O nosso bioma amazônico ainda está em sua esmagadora maior parte intacto, e a relativa derrubada da Mata Amazônica necessária para abrigar (e sustentar) as nossas cidades é um preço bem razoável a ser pago para que tenhamos hoje uma civilização que Cabral não encontrou quando atracou nesta então chamada Ilha de Vera Cruz. A temperatura média global ao longo dos últimos cem anos variou menos de um grau centígrado; e, se as calotas polares do Pólo Norte estão de fato reduzindo, as geleiras do Pólo Sul (substancialmente mais densas do que as árticas) ainda estão crescendo. Lembrando alguns dados históricos que os eco-terroristas soem esquecer, Sua Alteza falou-nos da Groenlândia – hoje praticamente só gelo -, que tem o nome derivado justamente de “Green Land”, “Terra Verde”: na Idade Média, o clima lá era muito mais quente do que hoje em dia, o que possibilitava a existência de plantações e campos tão vastos que batizaram o território com a cor de sua vegetação. E, sobre emissões de CO2, o Príncipe lembrou-nos o singelo fato [p.s.: decerto mais retórico-ilustrativo do que estatisticamente rigoroso] de que uma única erupção vulcânica é capaz de lançar na atmosfera mais gás carbônico do que toda a atividade humana acumulada da Revolução Industrial até hoje. Obviamente, nada disso nos exime do cuidado com o planeta e não pode ser usado como desculpa para o mau uso dos recursos naturais: mas serve para que as coisas sejam colocadas em perspectiva e para nos ajudar a distinguir os fatos das ideologias.

Aproveitando o espaço e a receptividade do público, Dom Bertrand falou-nos ainda de diversas amenidades. Cito duas. Uma: a idéia de se construir a estátua do Cristo Redentor (que hoje pode-se encontrar embelezando o Rio de Janeiro) partiu da Princesa Isabel após a assinatura da Lei Áurea: diante da euforia do povo que a queria homenagear com um monumento em sua honra pela remissão da escravatura, a monarca disse que eles deviam era erigir uma estátua em honra de Cristo, o verdadeiro Redentor da humanidade. Outra: na época da Colonização, havia na Patagônia uma tribo de índios bem peculiar. Monoteístas e monogâmicos, havia entre eles uma lenda antiga – passada de pai para filho – de que, um dia, viriam uns homens de preto que lhes instruiriam a respeito das coisas do Céu. Quando os missionários (salesianos, se a memória não me falha) chegaram, os índios os receberam com grande júbilo e docilidade, e abraçaram maciçamente a Fé Católica que aqueles sacerdotes tinham atravessado o oceano para lhes transmitir.

A conferência foi edificante, a noite foi bastante agradável, o evento foi deveras proveitoso. Os nossos agradecimentos ao Círculo Católico de Pernambuco, que proporcionou este encontro, e a Sua Alteza Dom Bertrand, que tão generosamente aceitou falar-nos ontem à noite. Que a Virgem Santíssima os possa recompensar. E a nós, nutridos pelas palavras que ontem ouvimos, cumpre fazermos a nossa parte nesta luta pela Civilização Cristã: guardando, defendendo e transmitindo o que de nossos pais recebemos. É um combate no qual temos a ajuda dos Céus! Que Deus nos faça, a cada dia, menos indignos do papel que Ele nos reservou neste mundo.

Mais petróleo do que oração na CF-2011

O próximo domingo já é o Domingo de Ramos e, até o presente momento, a CNBB não disponibilizou no seu site o texto-base da Campanha da Fraternidade 2011. Procurando na internet, encontrei-o aqui; 63 páginas que, pelo que vi, contêm a íntegra do documento. Caso alguém identifique algum problema na integridade do texto, gentileza me informar.

Como fiz nos anos passados (2010 e 2009), trago aqui mais uma vez algumas simples estatísticas mostrando os temas que, na visão dos responsáveis pela produção do referido documento, são mais dignos de menção e meditação durante este tempo quaresmal. Mais uma vez, trago-os divididos em dois grupos: o que se poderia esperar de uma sadia espiritualidade quaresmal primeiro e, em seguida, os vocábulos mais empregados ao longo das páginas do texto base da Campanha da Fraternidade. Como no ano passado, a metodologia foi a mais simples possível: uma pesquisa simples (ctrl + shift + f) no arquivo .pdf, que pode ser facilmente reproduzida por qualquer um que tenha curiosidade sobre o assunto. Na lista abaixo, o termo simples, entre aspas, foi pesquisado da maneira como se encontra; quando aparece “e derivados”, é porque a busca foi feita pelo radical (p.ex., “penit”, que incluiria tanto “penitência” quanto o verbo “penitenciar-se”, o adjetivo “penitente”, etc.).

Termos que indicam visão sobrenatural:

  • “Deus”: 155 ocorrências.
  • “Eucaristia”: 16 ocorrências.
  • “Jesus”: 14 ocorrências.
  • “Pecado” (e derivados): 11 ocorrências.
  • “Papa”: 8 ocorrências.
  • “Santificação” (e derivados): 7 ocorrências.
  • “Católica” (e derivados): 6 ocorrências.
  • “Bíblia”: 6 ocorrências [mais duas no título de duas citações, à página 32].
  • “Salvação” (e derivados): 5 ocorrências.
  • “Nosso Senhor”: 5 ocorrências.
  • “Oração”: 4 ocorrências [sendo três nas primeiras páginas e uma referência à oração de São Francisco em louvor pelas criaturas].
  • “Conversão” (e derivados): 4 ocorrências [além de mais 3 ocorrências, às páginas 14 e 37, que falam em conversão de energia cinética do vento (!) e no mundo que corre o “risco de converter-se em fábricas que poluem” (!!); há aínda, à página 43, uma referência a “conversão ecológica”].
  • “Jejum”: 2 ocorrências.
  • “Diabo”: 2 ocorrências.
  • “Caridade”: 2 ocorrências.
  • “Maria”: 1 ocorrência [“Virgem Maria”, nenhuma, e nem “Nossa Senhora”].
  • “Penitência” (e derivados): 1 ocorrência.
  • “Cruz”: 1 ocorrência.
  • “Sacerdote”: 1 ocorrência.
  • “Sacramento”: 1 ocorrência.
  • “Missa”: 1 ocorrência [esta, no título da citação de um ensaio de Teilhard de Chardin (!)].
  • “Arrependimento” (e derivados), esmola, Magistério, confissão (e derivados), inferno, purgatório: nenhuma ocorrência.

Termos que indicam visão materialista rasteira:

  • “Produção” (e derivados): 98 ocorrências.
  • “Desenvolvimento” (e derivados): 74 ocorrências.
  • “Energia”: 69 ocorrências.
  • “Terra”: 69 ocorrências.
  • “Água”: 59 ocorrências.
  • “Ambiente”: 59 ocorrências.
  • “Efeito estufa”: 58 ocorrências.
  • “Aquecimento”: 51 ocorrências [“aquecimento global”, 42].
  • “Consumo” (e derivados): 50 ocorrências.
  • “Ecologia” (e derivados): 37 ocorrências.
  • “Carbono” (e derivados): 36 ocorrências.
  • “Governo” (e derivados): 32 ocorrências.
  • “Economia” (e derivados): 32 ocorrências.
  • “Alimento” (e derivados): 29 ocorrências.
  • “Pobre” (e derivados): 20 ocorrências.
  • “Temperatura”: 23 ocorrências.
  • “Lucro”: 15 ocorrências.
  • “Petróleo”: 10 ocorrências.
  • “Exploração” (e derivados): 10 ocorrências.

Os números falam por si sós. Em comparação com o ano passado algumas coisas parecem ter melhorado. Palavras como “Cruz”, “Sacerdote” e “Penitência” finalmente ganham direito a figurarem em um documento da CNBB para a Quaresma. E, embora eu tenha tentado, não consegui encontrar nenhum termo que aparecesse no texto mais vezes do que “Deus”. Deo Gratias! É também digna de menção a sucessiva redução do tamanho destes textos bases; em 2009 ele tinha 176 páginas e, em 2010, 80. Perto destes monstros, um documento com 63 páginas é uma bênção de Deus.

Entretanto, o resultado final ainda é muito, muito ruim. É óbvio que não dá para se viver corretamente o tempo da Quaresma descuidando da vida sobrenatural para perder tempo com coisas como consumo, energia elétrica, água potável e desenvolvimento – temas que têm lá a sua importância, mas que absolutamente não cabem como guia de vivência do tempo quaresmal. Um texto que trate tanto destes temas poderia encaixar-se muito bem como fruto de um estudo do Governo, de uma ONG, de uma dissertação de mestrado em ciências ambientais, do Greenpeace, de qualquer coisa: mas não cabe, absolutamente, como um texto – e da Quaresma! – da Igreja cujo papel é levar as almas para Deus. Quando uma Conferência Episcopal fala, na Quaresma, mais de petróleo do que de oração, alguma coisa está muito errada. Que os senhores bispos possam perceber este gravíssimo engano (que não é de hoje!) o quanto antes. E que Deus nos ajude a termos uma santa Quaresma – apesar da Campanha da Fraternidade da CNBB.

Mais en passant: o ateu, o Natal, o aquecimento, a consciência

Ateu invade igreja e ofende cristãos. “A Justiça da Espanha condenou nesta sexta-feira um ateu a um ano e dez meses de cadeia por interromper um batizado no momento da oração do Credo. […] O Tribunal descarta a possibilidade de que o réu sofresse problemas mentais e a sentença não admite apelações”.

– Via Wagner Moura: o carteiro da judeia. Exemplar imaginário de um jornal da época do nascimento de Nosso Senhor. Os depoimentos do lado inferior esquerdo da página são impagáveis: o cético, o modernista, o cientificista.

– Reinaldo Azevedo sobre o aquecimento global. “Atenção! Londres não via nevasca igual desde 1895  — é, a maior em modestos 114 anos. A Costa Leste dos EUA está sob metros de neve. Os serviços entraram em colapso. Washington não teve a maior nevasca dos último 100, 200 ou 300 anos, não. Assistiu à MAIOR DE SUA HISTÓRIA. Obama teve de apressar a sua volta de Copenhague, onde foi debater o aquecimento global, por causa do excesso de… frio! Na Europa, o  clima já matou 50 pessoas em três dias; nos EUA, 8”.

– Não gosto do Olavo falando sobre moralidade e consciência; cheira-me relativista. Também não gosto muito das idéias malucas dele, totalmente contrárias à subsidiariedade mais básica, segundo as quais devemos deixar de lado os problemas pontuais para nos concentrarmos nos ataques ao conjunto. Mas ele está certo quando diz que a destruição do senso moral por meio do bombardeamento de contradições é deliberada. “Escândalos de adultério espoucam a toda hora na mesma mídia que advoga o abortismo, o sexo livre e o gayzismo. A contradição é tão óbvia e constante que nenhum aglomerado de curiosas coincidências poderia jamais explicá-la. Ela é uma opção política, a demolição planejada do discernimento moral”.

Curtas de fim de tarde

Aquecimento global é culpa do Sol, não dos homens, diz cientista russo. “A população não está em condições de influenciar no aquecimento global da Terra, que, após um período de aquecimento, sempre experimenta outro de esfriamento. […] Entre os anos 2012 e 2015, a temperatura global da Terra começará uma lenta redução, que alcançará os níveis mínimos entre 2055 e 2060”.

– Da série “sem tempo nenhum de traduzir”:  10 Reasons Why Homosexual “Marriage” is Harmful and Must be Opposed. “[O casamento homossexual] é a Ponta de Lança [the Cutting Edge] da Revolução Sexual […] Se o ‘casamento’ homossexual é universalmente aceito como a etapa presente da ‘liberdade’ sexual, que argumentos lógicos poderão ser usados para barrar as próximas etapas de incesto, pedofilia, bestialidade e outras formas de comportamento anti-natural? De fato, alguns radicais de certas subculturas ‘avant garde’ já estão defendendo tais aberrações”.

– Da série “recordar é viver”: Marta, Marta… “Marta e Maria são necessárias, e dizer que a parte escolhida por Maria é a melhor [optimam partem] não é a mesma coisa de afirmar ser ruim a parte de Marta. Para dissipar os equívocos e acabar com todo dualismo que possa haver, a Igreja enalteceu a vida ativa, corroborou a ascese e glorificou a vocação leiga canonizando Marta. Não apenas Maria é chamada à santidade, pois Marta também tem a honra dos altares”.

Mais curtas

– Sem tempo de traduzir: Muslim Mob Burns Down 100 Christian Homes in Pakistan. A notícia diz que, na manhã de quarta-feira, cem casas e igrejas cristãs foram incendiadas por muçulmanos no Paquistão. Diz que o ataque foi semelhante a um outro realizado em fevereiro de 1997, quando milhares de casas e igrejas cristãs foram queimadas e centenas de cristãos saíram feridos. A polícia chegou ao local, mas a situação estava fora de controle porque milhares de muçulmanos estavam reunidos. Rezemos pelos cristãos perseguidos.

– Charge contra Dom José publicada na Folha de Pernambuco; aquele sorriso idiota não está senão no rosto dos inimigos da Igreja, que se sentem aliviados por não precisarem mais encarar um Sucessor dos Apóstolos que faz jus ao báculo que empunha. Mas o ódio dos anti-clericais a Sua Excelência Reverendíssima só faz dar testemunho em favor do excelente trabalho realizado por Dom José Cardoso Olinda e Recife: os ataques o honram.

Fetos em 3D; que interessante! A técnica permite que sejam gerados modelos tridimensionais físicos dos fetos ainda no útero – vejam algumas fotos aqui. O projeto é do designer brasileiro Jorge Roberto Lopes dos Santos. Só é de se lamentar a diferença entre a aplicação da técnica no Brasil e no Reino Unido: “Enquanto no Brasil o foco principal é tentar fazer com que mães e pais compreendam alguma malformação de seus bebês, no Reino Unido os modelos são usados para incentivar o apego da mãe em relação ao filho”, segundo a matéria de G1.

– Vi hoje no boletim do VIS (aqui reproduzido): o Santo Padre aprovou a publicação do decreto concernente a um milagre do Venerable Siervo de Dios John Henry Newman, inglés, (1801-1890), cardenal y fundador de los Oratorios de San Felipe Neri en Inglaterra. Fico feliz, porque o ex-protestante convertido sempre me pareceu bem digno da honra dos altares.

– “Pretender que alguém possa controlar a natureza e regular os ritmos do clima, sobre tudo quando nem sequer nós somos capazes de predizê-lo corretamente, é algo patentemente absurdo”; foi a frase proferida na International Conference on Climate Change. A conferência já está na sua terceira edição, os cientistas (perto de 400) que dela participaram publicaram um livro de 880 páginas contendo “uma refutação dos mitos climáticos ” e, no entanto, “[e]ssas grandes assembléias não tiveram quase cobertura na mídia brasileira”. Muito perspicaz a frase com que se encerra o artigo: “O catastrofismo ecologista reedita a historinha da criança impotente que pretende frear o mar construindo muralhas de areia. E, ainda depois choraminga porque não está conseguindo”.

Ecologia e ecolatria

Ecologia é um assunto importante. Sem dúvidas que o é. Vou mais fundo: ecologia é tão importante que não pode ficar nas mãos dos ecologistas irresponsáveis, que apresentam caricaturas do tema a ponto de torná-lo odioso às pessoas de relativo bom senso ou objeto de culto às pessoas de relativa falta de senso. Falo isso porque promover uma grande queimada de todos os livros e publicações “ecólatras” foi o meu primeiro impulso ao ler a besteira que a Ivone Gebara escreveu no site das Abortistas pelo Direito de Matar.

A freira abortista conseguiu juntar, num artigo só, “ecolatria”, exploração capitalista, luta de gêneros e digressões absurdas sobre a “Deusa Feminina” que ela julga ter sido injustamente suprimida da história religiosa da humanidade pelo Deus judaico-cristão. Parece até piada, mas ela realmente acusa os homens de terem distorcido a realidade porque, p.ex., é uma impropriedade falar no “seio de Deus Pai”, já que são as mulheres que têm seios (!). O que essa bobagem toda tem a ver com ecologia, só ela sabe; o termo cunhado “ecofeminismo” em oposição a “ecomasculinismo” é completamente destituído de significado objetivo sério, e só serve para – como falei acima – irritar quem ainda mantém senso de realidade e encantar quem já o perdeu. Mas, afinal, qual o problema com a ecologia?

Com a ecologia séria, nenhum problema. Afinal, “[o] Senhor Deus tomou o homem e colocou-o no jardim do Éden para cultivá-lo e guardá-lo” (Gn 2, 15). O homem, portanto – e isso é óbvio – deve guardar o planeta, e não destruir o planeta. E o lucro não pode, evidentemente, ser colocado acima desta ordenança de Deus: antes de obter bens para si, o homem está obrigado a cuidar da Criação de Deus. Ninguém discute isso. O que as pessoas discutem – e isso separa os católicos dos “ecólatras” – são outras coisas.

Primeiro, discute-se a hierarquia que há na Criação. É óbvio para os católicos que o ser humano tem primazia no Universo Criado, exatamente porque aquele que foi colocado por Deus para cuidar do Jardim do Éden precisa necessariamente ter primazia sobre o jardim do qual ele cuida. Mas há quem não entenda isso, e ache que “a natureza” tem o exato mesmo valor do homem ou – pior ainda! – que ela tem primazia sobre o homem. O primeiro caso pode levar a aberrações como o vegetarianismo por convicção de que um animal não pode ser morto para alimentar “outro animal” (no caso, o homem); o segundo caso, pode levar à aceitação tácita do absurdo de que ovos de tartaruga sejam protegidos incondicionalmente ao mesmo tempo em que embriões humanos podem ser destruídos em laboratório ou por meio do aborto. Igualitarismo é coisa de esquerdista, e eles não medem esforços para aplicar o seu pressuposto absurdo a tudo – até mesmo à ordem que há na natureza.

Outra coisa que se discute é a confusão feita entre, digamos, “efeito desejado” e “efeito colateral”. Uma pessoa que derrube um espaço de floresta para plantar gado não é puramente um “criminoso ecológico”, é uma pessoa que está interessada – antes de na mera destruição da fauna – na criação de animais para a produção de bens de consumo básicos. E eu, sinceramente, tenho sérias dificuldades para precisar a responsabilidade moral de pessoas em situações como essa. E no caso de um carro que é utilizado como meio de transporte necessário, mas que polui o ar junto com isso? E no caso de terrenos de mangue que precisam ser aterrados (em Recife, a coisa mais comum do mundo) para a construção de casas para as pessoas morarem? Claro que deve haver algum limite sério para a “destruição” da natureza, mas o que é necessário ter em vista é que as pessoas quase nunca estão simplesmente “destruindo a natureza” por destruir, mas se utilizando de bens naturais para a produção de alguma coisa que é útil e necessária ao ser humano. Já deve ter até gente dizendo que as reservas de petróleo não devem ser exploradas, porque são dissipadores naturais do calor do núcleo da terra… qual a proposta? Voltar ao “bom selvagem”? Isso – de novo – não é um debate sério.

Uma outra coisa, enfim, bastante discutível é o catastrofismo ambientalista alardeado por alguns irresponsáveis. Por exemplo, já houve até quem dissesse que os flatos das vacas têm uma grande parcela de responsabilidade no aquecimento global, e houve quem inventasse “pílulas anti-arroto” para diminuir a emissão de gases bovinos na atmosfera terrestre! Vejam, não há problemas morais em pesquisas sobre maneiras de diminuir a emissão de metano bovino, mas será que isso é realmente urgente e não há coisas mais sérias a serem priorizadas? No mesmo saco catastrofista podem ser ainda colocadas as projeções malthusianas que colocam o controle de natalidade como um imperativo para evitar uma tragédia demográfica num futuro próximo devido à superpopulação mundial – com a diferença de que, aqui, o controle de natalidade simplesmente não pode ser aplicado. Nem que fosse verdade – o que não é – a existência de uma bomba demográfica na iminência de explodir (neste caso, seria necessário largar as pastilhas das vacas e procurar maneiras de aumentar a produção de alimentos).

Em suma, pode ser um péssimo indicativo o fato de assuntos ecológicos sempre estarem na ordem do dia de toda sorte de movimentos anti-católicos, de teólogos da libertação a movimentos New Age, mas o problema não é com a ecologia em si – e sim com a palhaçada que essas pessoas fazem com um assunto sério. Às vezes, fico com a impressão de que a impressão passada pelos “católicos sérios” é a de um total descaso irresponsável com o planeta – o que não é verdade. É necessário “cultivar e guardar” o Jardim do Éden; o que não aceitamos é que o jardim seja transformado em máquina de guerra contra o homem, acrescentando mais uma tensão dialética onde ela não deveria existir e, aliás, nem existe: os pobres versus os ricos, os homens versus as mulheres, o ser humano versus a natureza. É por isso que o assunto é tão palatável aos esquerdistas de todos os naipes. E é por isso que os católicos fazem-lhe oposição.