[OFF] Eu, com câncer (IV): os baixos e altos de uma semana enfermiça

Passei uma semana inteira sumido. Fui forçado. Domingo último, 19 de janeiro, escrevia aqui que iniciaria a segunda quimio no dia seguinte; na segunda-feira saí de casa pela manhã, e somente ontem (sábado) à noite consegui pôr de novo os pés no lar que parece ser tão mais doce quanto mais tempo passamos afastados dele.

Os culpados foram os meus pulmões, que por alguma estranha razão não pareciam estar muito dispostos a me ajudar na minha nobre peleja contra a insidiosa enfermidade linfoproliferativa que ora me acomete. Haviam enchido de novo, como eu dissera, e na quarta-feira (15 de janeiro) eu passei por uma segunda toracocentese. Respirei melhor, mas foi por pouco tempo. Já no sábado à noite, acordando de madrugada com a sensação de estar afogando, reconheci os sintomas: Deus, estão voltando a encher. Mas continuei forçando a respiração e com a fisioterapia, que era o que dava pra ser feito afinal de contas.

Na segunda cedo, antes da QT, um raio-x matinal me revela o que eu já antevia: os pulmões estavam todos tomados de novo, ainda piores do que antes de eu os drenar há menos de uma semana! Desanimei, confesso. Mas pus a chapa debaixo do braço e me dirigi à clínica. Tinha que fazer a quimioterapia , uma vez que a simples drenagem claramente não estava dando vencimento.

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Na clínica, conseguiram-me a gentileza de um apartamento: minha sessão ia ser longa. Puncionaram-me o CTI que eu implantara na sexta: a quimioterapia em si foi de uma enorme tranquilidade. Sem náuseas, sem vômitos, sem dores, nada: as horas passavam e o meu único incômodo era a tontura provocada pelo Zofran do início.

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Mas a minha respiração piorava a olhos vistos. Eu não conseguia mais sequer me recostar na cama médica, não importa o quão alta a cabeceira estivesse: a posição completamente vertical era a única que me concedia um mínimo de conforto respiratório.

Lá pelas quatro da tarde, termino os químicos. Penso em voltar pra casa, tentar descansar e avaliar a necessidade de ir ao hospital. O caminho entre a clínica e o carro estacionado na frente dela me faz mudar de idéia: “para o hospital, imediatamente”. Era impossível, qualquer mínimo esforço me fazia ofegar de maneira incontrolável – e Deus sabe como é difícil e angustiante ofegar quando o seu pulmão não expande! Cheguei à emergência e sentei-me numa cadeira de rodas, para não querer sair dela nunca mais enquanto não me aliviassem os pulmões.

Os médicos são prestativos – inclusive a garota da emergência é a mesma que me atendeu naquele longínquo dia de dezembro, quando (inocente…) cheguei no hospital com queixas respiratórias achando que ia ganhar um antibiótico e almoçar em casa, antes de tudo começar… Ela me reconhece. Está com melhor aparência do que da primeira vez: se antes a expressão dela era a de quem estava diante de um moribundo, agora me olhava como a um convalescente promissor. Acalmo-me um pouco.

Ligam-me para os meus médicos. Minha pneumologista diz que ninguém mexe nos meus pulmões, e meu cirurgião torácico promete passar na manhã seguinte (então era de noite) para avaliar o meu caso. Eu, que estava a ponto de parar qualquer sujeito com uma furadeira que encontrasse no caminho para que refizesse os furos ainda mal-cicatrizados das minhas costas, protesto com tanta veemência quanto a minha dispnéia me permite: para isso, é preciso que eu sobreviva até amanhã!

Para encurtar a história: põem-me um pequeno cateter de oxigênio, internam-me num apartamento, fazem-me uma nebulização, chamam a médica de intercorrência e, já perto de meia-noite, decidem me levar para uma unidade semi-intensiva. Lá me apresentam, meio receosos, a solução que encontraram para mim: uma máscara de VNI, “Ventilação Não-Invasiva”, a máscara do Jason, como a chamei assim que a vi, ou do Homem da Máscara de Ferro, só que de plástico.

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Dizem que os pacientes reclamam muito dela. Eu a amei. Foi alívio à primeira vista: após um dia inteiro forçando a minha respiração, aquela máquina respirava por mim. Após horas com baixa saturação de oxigênio, aquela máscara satisfazia as minhas necessidades respiratórias. Após dias com os pulmões curtos na caixa torácica, eles enfim pareciam um pouco mais amplos dentro do peito. Recostei na cama e adormeci, como há muito estava desejando e não conseguia. Máscara do Jason, você me salvou.

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Isso foi na segunda à noite. A partir de então, foram três sessões por dia – manhã, tarde e noite – com a benedetta, pelo menos uma hora a cada vez. Os fisioterapeutas não acreditavam em como eu ficava feliz quando eles vinham com a máscara. Eles provavelmente não são capazes de entender a natureza de minha relação com ela. Ama mais quem mais foi perdoado, como diz o Evangelho, e mutatis mutandis dá mais valor às invenções humanas quem mais lhes obteve os benefícios. Aquela máscara me fizera respirar, e isso era uma dívida insanável. Que Deus abençoe copiosamente o idealizador de tão incompreendida geringonça.

Assim se passou uma semana inteira. E, para minha alegria, o derrame dos meus pulmões baixaram somente à força de VNI, diuréticos e repouso: não precisei fazer nenhuma drenagem. É uma grande e promissora vitória, provavelmente a mais promissora desde que eu comecei o meu tratamento: pela primeira vez eu voltava a respirar sem ter que drenar cirurgicamente o líquido da pleura e, quando o meu derrame pleural esteve pior, ele foi revertido “naturalmente”, com o passar do tempo e o reequilíbrio do organismo, como se esperava para este segundo ciclo de QT. Se toquei o fundo de alguns abismos deprimentes esta semana, também me elevei deles aos píncaros esperançosos do (em vislumbre ao menos) tratamento bem-sucedido. Bendito seja Deus, que me acompanhou às profundezas; louvado seja Ele, que delas me permitiu voltar.

É incrível como as doenças – um amigo mo dizia hoje – têm o condão de abrir os nossos olhos ao valor das coisas banais, que ficam escondidas sob a trivialidade do quotidiano. Acho que nunca antes na vida eu percebera o quanto respirar é maravilhoso. E hoje isso se repete a cada dia, quando percebo o prazer de uma noite dormida na própria cama, de um braço que não está mais dolorido, de um corte já cicatrizado, de um apetite livre dos tentáculos de uma náusea repentina… não dá pra dizer que esta estrada na qual me colocou a Divina Providência seja desejável. Mas também é impossível negar que ela me tenha ensinado coisas valiosas. E, por estas últimas, é também impossível não ser grato.

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Hoje estou em casa, sem queixas maiores que as decorrentes da semana de imobilidade passada numa Unidade de Cuidados Especiais. Não sinto nada da quimio de segunda-feira. Já respiro de maneira excelente, se não ainda com o vigor da plena saúde, ao menos de modo incomparavelmente melhor do que há uma semana, quando escrevi aqui da última vez. Nos próximos dias farei alguns exames de controle, para comparar com os que foram feitos antes do tratamento e aferir-lhe a eficácia. Ainda há muito caminho pela frente, mas por mais este solavanco eu atravessei: obrigado, Senhor. E eis-me aqui! Vamos em frente. Aonde fores. Aonde quiseres me levar.

[OFF] Eu, com câncer (III): The road so far…

– Essa tua barba vai cair. Mas depois nasce de novo.

Assim me disse a dra. Rosa, com um sorriso, naquela – parece já tão distante! – noite em que prescreveu minha quimioterapia. A primeira parte da “profecia” já se cumpriu à risca: minha barba e meu cabelo caem aos tufos, enquanto durmo, ao banho, quando lhes passo a mão. Fico feliz de voltar a ser imberbe: o simbolismo do rejuvenescimento é óbvio demais para não ser percebido…

O cabelo que nasce depois, dizem, é um cabelo todo novo; pode inclusive nascer diferente do que era antes, se estava já branco volta a nascer preto, se era liso pode nascer encaracolado, etc. Eu, no entanto, de calvície já avançada antes dos trinta, fico já animado com a mera possibilidade de que ao final do tratamento ele nasça simpliciter. Quem sabe um cabelo novo não vem, anos depois, estabelecer-se no lugar que lhe cabe, sobre a careca antiga? E não consigo deixar de conter um sorriso: quem sabe, ainda, eu não ganho de volta os cachos de anjo que eu tinha quando criança, quando o futuro não cabia num lance de vista e se tinha a vida toda pela frente…?

Amanhã (segunda-feira, 20 de janeiro) é minha segunda sessão de QT. Este primeiro ciclo guardou as suas intercorrências para o final; só na última semana a minha imunidade baixou, os meus cabelos começaram a cair, meus pulmões voltaram a encher.

A minha contagem de leucócitos caiu para 3.310 somente na última segunda-feira. Antes se manteve em queda, mas dentro dos valores de referência. Sinal amarelo: usar máscaras com mais freqüência, reduzir o número de visitas, essas coisas. Mas não tive nada. Trata-se de um número num exame de sangue, que se eu não o tivesse visto nenhum outro sintoma perceptível me avisaria da minha imunodeficiência.

Já quanto aos meus pulmões, estes, sim, eu percebi. A minha respiração cada vez mais curta não deixava margens para dúvidas: eles estavam enchendo de novo. Terror. A quimioterapia, disseram-me, deveria secar os linfonodos do mediastino cuja compressão era responsável pelo acúmulo de líquido linfático na pleura que tanto me incomodava. Não estava funcionando. Eu estava disposto a simplesmente esperar que funcionasse; no entanto, uma angustiante falta de ar no domingo passado (após o “esforço” de caminhar em terreno plano os pouco mais de cinqüenta metros que separam a minha casa da paróquia, que fica no mesmo quarteirão) me convenceram a ir ao hospital.

Lá o raio-x foi implacável: «seios costofrênicos com derrame pleural». Seja lá o que isso for. Mas olho a chapa, e entendo perfeitamente: a ameaçadora mancha branca sobe, dos dois lados, deixando-me menos da metade de cada um dos pulmões. O que significa que eles só se expandem até metade da caixa torácica, quando muito. Discutem entre si pneumologista, hematologista, cirurgião torácico: é melhor drenar antes da quimio, concluem.

Faço a punção, de novo. Dessa vez, dos dois lados. 1,9 l do lado direito, 1,3 l do esquerdo: mais de três litros ao todo, sem contar o (muito!) que ainda foi deixado nas bases. Respiro aliviado, literalmente. Os resultados dos exames confirmam que se trata do mesmíssimo caso da vez anterior. É normal, ainda é cedo: no segundo ciclo da QT é que os efeitos devem começar a ser perceptíveis. Deus, tomara que sim. A barba já começou a cair. A contagem de leucócitos já diminuiu. Já está na hora dos linfonodos começarem a atrofiar.

Implantei um port-a-cath na última sexta-feira. Fica do lado direito do meu peito, logo abaixo da clavícula, sob a pele, e é menos horrendo do que imaginara. Fica um “calombo”, como se fosse um pequeno osso fora do lugar, nada muito grotesco. A micro-cirurgia foi simples e não tive com ela maiores problemas; só as dores normais do pós-operatório, de quando passa a anestesia. Duraram pouco. Ontem já não doía quase nada, hoje já praticamente não dói. Mantenho ainda os curativos até amanhã, e os pontos ficam pelo menos até a próxima sexta-feira. Depois, só o “calombo” e a cicatriz. Ao menos preservo as veias periféricas do braço; ao menos, como todo mundo me disse, as sessões de quimioterapia serão agora mais fáceis e mais seguras.

Do último post para cá eu recebi um sem-número de recomendações sobre como cuidar da minha saúde. Agradeço de coração por todas elas. Li-as todas. Pesquisei sobre todas e, se todas não adotei, foi porque não considero sensato fazer mudanças radicais no meu estilo de vida agora, justamente no meio de um câncer e de um tratamento quimioterápico, sem nem ao menos consultar uma nutricionista. Tenho procurado melhorar a minha alimentação, sem contudo fazer extravagâncias que não são do meu feitio. Hoje como com mais freqüência (lancho entre as refeições), como mais frutas, bebo mais água. Prefiro mel natural ao açúcar (do qual nunca fui muito fã, a propósito), e introduzi gengibre e um probiótico (Kefir) na minha alimentação diária. Estou me dando bem com isso: meu apetite funciona, meu intestino, idem, minhas funções excretoras parecem estar em ordem.

Não tenho ainda autorização e nem condições para fazer exercícios, o que tem me incomodado um pouco. Por enquanto, apenas a fisioterapia respiratória com o Respiron e o esforço de andar da sala ao quarto algumas vezes ao dia, só para fugir do temível “repouso absoluto” que provoca tromboses em quem faz viagens longas de avião. Tenho sobrevivido bem. Como diz a clássica passagem das Escrituras, até aqui tem me ajudado o Senhor. E sei que Ele não há de me faltar.

Amanhã é a minha segunda sessão de quimioterapia. A partir de amanhã, as coisas vão melhorar mais: é mais um passo, another brick in the wall, uma hora a menos da noite escura que não pode durar para sempre. Uma hora a menos…! O arrebol já vem. Há aquela história dos três pedreiros trabalhando juntos, o primeiro dos quais disse estar cimentando um tijolo, o segundo, levantando uma parede e, o terceiro, construindo uma catedral. Eu poderia dizer que amanhã estarei tomando Rituximab ou me tratando de um linfoma. Mas, agora, vou preferir dizer que amanhã estarei fazendo crescer de novo um pouco dos caracóis dos meus cabelos infantis.

Chávez está morto. A Venezuela está livre.

Hugo Chávez acaba de morrer. Ou melhor: a sua morte acaba de ser oficialmente reconhecida pela Venezuela. Como quase tudo o que acontece no país vizinho, a morte do ditador venezuelano é obscura e inspira desconfiança. Em meados do mês passado, por exemplo, uma postagem no Twitter (!) no meio da madrugada (!!) anunciava o inesperado retorno de Chávez a Caracas. Sinceramente, na ocasião eu não acreditei e ainda hoje não sei se acredito; mas agora é irrelevante, porque a sua morte foi oficialmente declarada. Se foi hoje ou na(s) semana(s) passada(s), se foi em Caracas ou em Cuba, agora já não faz mais tanta diferença. Chávez está morto. A Venezuela está livre.

Será que está? O presidente eleito deveria ser empossado em janeiro. Não foi. A Justiça da Venezuela topou adiar a cerimônia por tempo indeterminado e, mesmo assim, a morte colheu Chávez antes que ele pudesse tomar posse como presidente da Venezuela. O vice não foi eleito. Teoricamente, deveriam ser convocadas novas eleições. Serão? Ainda é cedo para saber. O que dá para fazer com certeza é rezar pela Venezuela, cujo futuro desponta um pouco menos sombrio agora que El Comandante depôs a foice e o martelo em definitivo mas que, provavelmente, ainda deve reservar algumas agruras ao povo venezuelano.

Quanto a Chávez… o que dizer? Está morto. O provérbio manda não dizer dos mortos senão o bem, mas peço aqui licença ao adágio popular porque, no dia de hoje, um silêncio assim tão prolongado seria inconveniente e constrangedor. É preciso dizer pelo menos que o mini-ditador candanga não fez bem à sua pátria, que a sua tentativa medonha de ressuscitar um sistema político já morto e apodrecido lançou a política latino-americana cinqüenta anos para trás, que as suas demonstrações de Fé no final da vida são, se não falsas, pelo menos incoerentes com tudo o que ele fez antes do câncer e, aliás, até o último instante de vida não se preocupou em consertar. Isto são verdades que é dever de justiça não deixar caírem no esquecimento, no meio da comoção midiática que costuma transformar em herói impoluto todo aquele que sai do palco da História para não mais voltar.

Está morto o Chávez, e que o Deus Altíssimo tenha misericórdia dele! R.I.P., como rezamos para os católicos, pois nem mesmo alguém como o ex-presidente da Venezuela foi criado por Deus para se perder. Que ele tenha conseguido uma boa contrição antes da morte, é o que eu desejo sinceramente. E que Deus mostre compaixão para com ele e sua terra.

Visões sobre o aborto: a mesquinhez e a nobreza

Está muito pertinente a nota do “Brasil Sem Aborto” a respeito das propostas anti-vida do novo Código Penal. A denúncia que este texto faz é verdadeira e merece a nossa atenção: o projeto contém inúmeros pontos polêmicos – que, aliás, são taxativamente reprovados pela esmagadora maior parte da população brasileira – e está sendo conduzido a toque de caixa pelos nossos parlamentares, em uma tentativa de passar um verniz de legitimidade sobre a imposição de uma ideologia minoritária e estranha ao nosso povo e que, pelo conteúdo e pela forma, configura-se um verdadeiro atentado à democracia do Brasil.

Pelo conteúdo, uma vez que (como explicou de forma magistral o delegado de polícia Rafael Brodbeck na semana passada) muitas das propostas que ele contém estão longe de corresponder aos anseios da população brasileira: trata-se de «um Código ideológico, escrito por intelectuais em desconexão com a realidade brasileira e que não representam as mais profundas aspirações do nosso povo». Pela forma, porque (como disse a supracitada nota do Brasil Sem Aborto) está sendo realizado às escondidas e no apagar das luzes, conduzindo mudanças radicais em uma legislação importante de nosso ordenamento jurídico sem um debate público proporcionado: «Surpreende o fato do Presidente do Senado Federal, ainda que dentro de suas prerrogativas constitucionais e regimentais, apressar-se em transformar o polêmico ante-projeto em projeto de lei às vésperas do início do recesso parlamentar. Surpreende também que essa apresentação contrarie informação anteriormente divulgada, de que o ante-projeto seria analisado por uma sub-comissão da CCJ, presidida pelo senador Eunício Oliveira, antes de se transformar em projeto de lei».

Na contramão desta desastrosa tentativa política de implantar a vergonha abortista no país, é um refrigério ler esta notícia que o Estadão publicou no início do mês sobre uma mãe – brasileira! – que decidiu manter a gravidez apesar do câncer de mama. A história é emocionante:

Simone morava no Canadá quando recebeu o diagnóstico da gravidez praticamente ao mesmo tempo que o de câncer de mama. Para poder levar a gestação adiante, teve de comprar uma briga com médicos e recusar o protocolo de tratamento indicado, que preconizava o aborto terapêutico. O parto ocorreu junto com a mastectomia.

Não estamos falando de uma mãe superanimada com uma gravidez planejada e tranqüila, muito pelo contrário: foi uma gravidez inesperada (ela estava tomando anticoncepcionais) e de altíssimo risco para ela própria e para o bebê, uma vez que havia um câncer em estado avançado que, segundo os seus médicos, se agravava ainda mais por conta da gravidez. Ela não teve apoio médico algum para a sua tentativa de salvar a filha: ao contrário, os médicos se recusaram a lhe tratar se ela não abortasse (!). E ela estava em um dos melhores hospitais do Canadá, o que acabou com as suas esperanças de encontrar no país alguém que quisesse cuidar dela.

Ou seja, nós estamos falando de uma mulher gravemente doente, longe de casa, carregando no ventre um filho que não havia planejado e que lhe diziam estar piorando a sua doença, a qual se recusavam a tratar enquanto ela não consentisse no sacrifício da criança! É difícil até mesmo imaginar uma situação mais dramática do que essa. No entanto, ela procurou um médico na internet e pegou um vôo de volta para o Brasil, onde encontrou quem estivesse disposto a respeitar sua vontade e a tratar tanto a ela própria quanto ao seu filho por nascer.

Melissa nasceu saudável às 36 semanas de gestação. A mãe perdeu uma mama e vai precisar passar ainda por diversas sessões de quimioterapia, mas passa bem.

“O mais difícil já passou. A Melissa é um milagre, uma promessa que se cumpriu”, diz Simone, que atribui o milagre da vida da filha ao “anjo Waldemir Rezende”. Agora ela só tem três desejos: poder pegar a bebê no colo todos os dias, fazer sua mamadeira e trocar sua fralda. Como qualquer mãe.

Diante de uma história dessas, como defender – como pretendem os abortistas de todos os naipes – que uma mãe possa matar o seu filho ao próprio alvitre? Como consentir nesta covarde fuga ao sofrimento e à responsabilidade materna? O ser humano foi feito para as coisas elevadas e nobres, e não para a mesquinharia. Nobre é não fugir das próprias responsabilidades, ainda que isto signifique colocar a própria vida em risco: a enorme repercussão positiva que teve a notícia acima dá testemunho de que – como era de se esperar – as pessoas admiram a nobreza, dão valor ao heroísmo. Ora, são dignos de proteção exatamente os valores, e não os anti-valores; merecem ser promovidas as coisas que são admiráveis, e não o seu contrário. E é exatamente por isso que a vilania e a mesquinhez não podem receber proteção legal positiva, não podem ser consideradas um “direito” e não se pode desviar recursos públicos para que elas sejam exercidas. A vida é sagrada e é dever de todos e de cada um protegê-la. Naturalmente, não significa que isto seja fácil; mas significa, sim, que é a coisa certa a ser feita.

Isto é amar, isto é ser mãe!

Eu vi esta notícia há um mês atrás e tinha deixado para comentar depois. O tempo foi passando e, hoje, sábado véspera do Dia das Mães, parece-me uma ocasião propícia. É a história de uma garota inglesa que resolveu adiar o próprio tratamento contra câncer porque estava grávida e queria salvar a vida da filha; e, depois que a menina nasceu, ela descobriu que não tinha mais cura.

O bebê nasceu saudável com 27 semanas (um pouco mais de 6 meses) de gestação, por cesárea, pesando 900 gramas. Mas Sarah foi informada de que não tinha muito tempo de vida. O câncer já havia se espalhado para o pâncreas, pulmões, pescoço e tomado conta dos intestinos.

O nome da mãe é Sarah Brook; o da filha, Polly Jean. A história adquire contornos de particular heroísmo quando é situada no século em que vivemos: num mundo onde o egoísmo se disseminou de tal maneira que é visto como a norma do comportamento socialmente aceitável.

Lembro-me de que a primeira vez em que contei a história de Santa Gianna para uma amiga, a primeira reação dela foi a de espanto. “Mas como assim, ela só fez dar a vida pelo seu filho? Qualquer mãe faria isso!”. E eu até concordo que qualquer mãe deveria fazer isto, mas tal não é infelizmente a regra nos tempos que hoje correm. E é exatamente por isso que provoca admiração a história de Sarah.

Vejam, a rigor ninguém está mesmo obrigado a se deixar morrer em favor de ninguém. O “primeiro próximo” que estamos obrigados a amar somos nós mesmos, pois ensina Santo Tomás que ninguém é mais próximo do homem do que ele próprio. Antes de qualquer coisa nós estamos obrigados a cuidar da nossa própria vida, uma vez que ela é o nosso bem maior e a manutenção dela é condição necessária para a realização de quaisquer outras obras meritórias. Assim, a rigor ninguém está obrigado a morrer nem mesmo por um filho: um tratamento de câncer durante a gravidez é um caso clássico de causa com duplo efeito e, portanto, é perfeitamente legítimo, ainda que isto acarrete a morte do bebê que se carrega no ventre. Mas eu não consigo nem imaginar como seria estar na pele de uma mulher nesta situação.

No meu Facebook eu encontro uma frase atribuída a Chesterton; eu detesto essas imagens do FB que têm somente uma foto ou uma pintura, uma frase entre aspas e um genérico “fulano de tal”, sem referência, sem nada. Mas neste caso serve para exemplificar o que estou falando, porque o dito é bem verdadeiro independente do autor. A frase é “você não pode amar uma coisa sem querer lutar por ela”. E penso como não deve ser terrível para uma mãe pensar que, talvez, não tenha lutado o suficiente por sua prole… É uma situação difícil! Em um caso mais ou menos análogo, um pai que chegasse em casa e encontrasse sua família vítima de um marginal armado também não teria, a rigor, a obrigação moral de se atracar com o meliante para salvar os seus. Mas me provoca arrepios imaginar como seriam os restos dos dias deste pai, caso ele sobrevivesse sem haver tentado reagir ao assassino.

Se não é possível amar uma coisa sem querer lutar por ela, portanto, nossas mais sinceras homenagens à britânica que não apenas quis lutar como de fato lutou – e lutou até a morte! – pela vida de sua pequena filha. Isto é amar, isto é ser mãe. E se é verdade que toda mãe verdadeira tem ao menos esta disposição in voto de consumir-se pelos seus filhos, é belíssimo quando nós a encontramos realizada concretamente em um caso extremo que, justamente por ser extremo, é de uma admirável eloqüência. No dia de hoje, nós queremos saudar a todas as mães que participam, pelo fato mesmo de serem mães, desta grandiosa missão e desta sublime vocação expressas de maneira tão magnífica nesta história de sacrifício. Quando à Sarah Brook, eu não sei o que aconteceu com ela (já faz um mês da notícia); se ela já tiver partido para as Moradas Celestes, que seja lá recebida com glória. E, onde quer que ela se encontre, que receba as justas homenagens pelo dia de amanhã. Que o exemplo dela possa despertar – ou fazer florescer – este instinto materno nas mães de que o mundo de hoje precisa.

Pílula anticoncepcional e câncer

Apenas registrando: Médicos são contra pílula anticoncepcional antes dos 18. Boa notícia: finalmente alguém ousou romper a aura de santidade que envolvia a pílula – virtual materialização da revolução sexual – e levantar a hipótese de que este veneno pode fazer mal à saúde das mulheres. Queira Deus que estes estudos não estejam fadados ao descaso ou ao esquecimento!

“Até alguns anos atrás não víamos problemas no uso de anticoncepcional. Mas trabalhos internacionais e serviços especializados começaram a relatar evidências de que a pílula poderia potencializar o câncer de mama”, afirma Basségio. “Preconizamos que as menores de 18 anos evitem usar o produto”, completa. Em sua tese de doutorado, Basségio atestou que triplicaram os casos de neoplasia de mama em mulheres antes dos 40 anos. Em 2003, elas representavam 5,3% dos casos, taxa que saltou para 16,8% em 2007.