Se não acreditamos nisso é porque não cremos na justificação

É falsa a oposição — hoje tão disseminada — entre verdade e caridade, ou entre doutrina e pastoral, que no fim das contas não passa de uma reedição da falsa dicotomia entre Fé e obras. O problema já fora resolvido há muito tempo, pelo menos desde o Concílio de Trento; mas o enxame de satanases, demônios e lucíferes do qual o nosso século está particularmente infestado sempre consegue semear a confusão e, por vias tortuosas, lograr que a dúvida espraie suas sombras por sobre o campo outrora plenamente iluminado pelas luzes do sol da verdade. Seria frustrante se não fosse este o lavor cristão quotidiano: repisar a cabeça da velha serpente sempre ávida por se levantar, combater os mesmos combates já vencidos pelos nossos antepassados. É assim que aprouve a Deus que nos santifiquemos, no fim das contas: cada geração precisa exorcizar — de novo e mais uma vez — os mesmos demônios que, no passado, os que nos precederam já precipitaram no Inferno. Satanás quer sempre ganhar o mundo e, nesta intenção, não cessa jamais de fazer as suas investidas: mas são sempre as mesmas, com os mesmos erros e as mesmas tentações, sempre e sem jamais mudar. Somente Nosso Senhor é Aquele que faz novas todas as coisas (Ap 21, 5); o Demônio está condenado a sempre insistir nas mesmas velharias já mil vezes vencidas.

Mas voltemos à verdade e à caridade. Todo o problema está exposto e resolvido na seção VI do Concílio de Trento, de janeiro de 1547: «na justificação é infundido no homem por Jesus Cristo, a quem está unido, ao mesmo tempo, tudo isto: fé, esperança e caridade» E isso é assim porque nem «a fé nem une perfeitamente com Cristo, nem faz membro vivo de seu corpo, se não se lhe ajuntarem a esperança e a caridade».

Não existe portanto «verdade» demais, ou «doutrina» demais, ou «Fé» demais. Não existe nada disso porque uma «verdade» que não conduza à prática da caridade é antes um engodo que uma verdade, e uma «doutrina» que afaste a prática do Cristianismo é no fundo uma falsa doutrina, e uma «Fé» à qual não se lhe sigam as boas obras do homem regenerado não é Fé verdadeira. Não existem essas oposições e elas não podem existir simplesmente porque é um só e o mesmo Deus o autor de ambas, da verdade como da caridade, da Fé como das obras. Não existem essas oposições porque, em suma, como diz o Concílio, a justificação faz infundir no homem «ao mesmo tempo tudo isso: fé, esperança e caridade».

E se não acreditamos nisso é porque não cremos na justificação. E se nela não cremos — se achamos realmente que a verdade pode ser um empecilho à caridade, que a doutrina pode afastar da prática dos ensinamentos de Cristo, que a Fé pode elidir a prática das boas obras –, se não cremos na justificação, eu dizia, então católicos não somos, então não precisamos (e aliás não podemos) nos dizer cristãos. Se nós achamos a sério que a caridade pode ser estimulada em oposição à verdade, ou que a pastoral pode ser vivida sem o supedâneo da doutrina, ou que as boas obras podem ser praticadas prescindindo da Fé Católica e Apostólica, então nós não somos católicos e sim naturalistas que não têm Fé, não guardam a Doutrina e estão distantes da Verdade. Se achamos isso então a nossa caridade não é sobrenatural, a nossa pastoral não é cristã e as nossas obras não são meritórias. E se é assim, então ai de nós.

É evidente que há católicos que não praticam a caridade com todas as suas exigências; mas tal se dá justamente porque eles não estão suficientemente convencidos da verdade de que há um mandamento da caridade a cujo cumprimento os cristãos não se podem furtar. Salta aos olhos que as nossas paróquias apresentam muitas vezes abordagens pastorais inadequadas; isso, contudo, acontece precisamente porque lhes falta a Doutrina de que o Evangelho precisa ser anunciado a toda criatura. Ninguém nega que o mundo esteja carente de boas obras cristãs; isso no entanto só acontece porque a Fé Cristã não é acreditada e vivida em toda a sua radicalidade. Em resumo, há problemas pastorais, há falta de caridade e há escassez de boas obras, claro que os há: mas tudo isso é fruto precisamente da má Doutrina, da falta de Fé e do afastamento da Verdade.

Se cremos na justificação, sabemos que as obras são fruto da Fé Católica, que a caridade constrange mediante a Verdade que é Cristo, que o anúncio do Evangelho é ponto central da Doutrina Cristã. E se é assim não podemos jamais pretender fomentar a caridade escondendo a verdade, multiplicar as obras ocultando a Fé, viver o Cristianismo prescindindo da doutrina — tudo isso é engodo e ilusão. As nossas obras não frutificam como as dos primeiros cristãos porque a nossa Fé já não reluz como a deles; a Igreja não cresce mais como nos tempos áureos da Igreja porque a nossa Doutrina não é mais tão límpida como já foi no passado; e a caridade já não transforma o mundo como antigamente porque, hoje, a Verdade não detém o mesmo lugar de honra que lhe reservavam os que nos precederam. O problema não é excesso senão falta de Fé; não é insistência na Verdade mas sim descaso para com ela; não é Doutrina demais, senão Doutrina de menos!

É preciso, portanto, coroar a Verdade para que a caridade reine no mundo. É preciso aumentar a Fé do povo cristão para que as boas obras espalhem o doce odor de Cristo pelo mundo. E é preciso que a Doutrina seja conhecida e mantida em toda a sua integridade a fim de que a Igreja expanda o Reino de Cristo até os confins da terra. Qualquer estratégia diferente dessa é loucura e desvario; qualquer abordagem que não leve em consideração os liames íntimos entre o que se crê e o que se vive não levará senão ao fracasso do apostolado e ao descrédito do Cristianismo.

Papa Francisco: sem caridade, as boas obras não salvam

Contra os que ainda insistem em acusar o Papa de naturalismo por conta de sua afirmação sobre o valor das boas obras praticadas mesmo pelos que não têm Fé, o Vigário de Cristo dirigiu palavras muito claras na manhã de hoje (segunda-feira, 14 de outubro) em sua homilia proferida na Casa Santa Marta (grifos meus).

O sinal de Jonas, o verdadeiro, é aquele que nos dá a confiança de ser salvos pelo sangue de Cristo. Quantos cristãos, quantos há, pensam que serão salvos somente pelo que fazem, pelas suas obras. As obras são necessárias, mas são uma consequência, uma resposta ao amor misericordioso que nos salva. Mas as obras, sem este amor misericordioso, não servem.

Portanto, as pessoas são salvas «pelo sangue de Cristo». As obras são «conseqüência» deste «amor misericordioso», da caridade, que é virtude sobrenatural infundida por Deus em nossas almas e pela qual amamos a Ele e ao nosso próximo por causa d’Ele.

E as boas obras naturais são boas e valiosas, predispõem o homem a acolher a Graça, mas não têm valor sobrenatural em si mesmas e, portanto, não servem para a salvação eterna.

Eis a Doutrina Católica de vinte séculos nos lábios do Vigário de Cristo.

HOJE, no Círculo Católico de Pernambuco: pelos verdadeiros direitos humanos!

Recife já está preparado para o Fórum sobre o PNDH-3, que acontecerá logo mais no auditório do Círculo Católico. O evento recebeu notas na imprensa local, tanto na Folha de Pernambuco quanto no Blog do Jamildo.

O primeiro lembra que o príncipe «acredita que os problemas sociais são reflexos de outros problemas, de ordem moral». O Jamildo diz a mesma coisa, de modo mais extenso:

D. Bertrand se posiciona claramente no campo da propriedade privada, livre iniciativa e respeito ao princípio de subsidiariedade, o qual limita o Estado ao âmbito que lhe toca por sua natureza. Tendo bem claro que os problemas sociais não são senão reflexo de outros mais profundos, de ordem moral.

Sim, os problemas da sociedade decorrem de problemas doutrinários. Da mesma forma que a Sã Doutrina influencia positivamente a vida social, desabrochando na bela flor da caridade – bálsamo poderoso para aliviar as conseqüências sociais negativas do pecado humano -, a heresia sempre se degenera em cânceres no tecido social. O fenômeno é tão universalmente repetido que chega a ser previsível. Assim, não existem as (falsas e caluniosas) oposições entre o “conservadorismo” e o “cuidado social”, muito pelo contrário: é preciso pensar com clareza para agir de maneira profícua. O conservadorismo, longe de atravancar o desenvolvimento social, é precisamente o que o possibilita e protege contra as influências nefastas – essas sim desagregadoras – dos erros e das heresias, dos experimentos sociais irresponsáveis, da cupidez de coisas novas que historicamente tanto mal provocou às sociedades e aos povos.

Quanto aos que estiverem hoje à noite no Recife, não percam a oportunidade de participar do evento promovido pelo Círculo Católico em parceria com o Instituto Plinio Corrêa de Oliveira. Ouçamos o que conferencistas tão ilustres – o Dr. Eduardo Barreto Campello, o Coronel da PMESP Paes de Lira e S. A. I. R. o Príncipe D. Bertrand de Orleans e Bragança – têm a nos dizer. E debatamos, sim, os Direitos Humanos, mas os verdadeiros, e não os pseudo-direitos revolucionários e injustos que nos querem impôr na base de canetadas advindas do Palácio do Planalto. Furemos a censura da grande mídia, que – salvo honrosas exceções – está mancomunada com os novos bárbaros inimigos da Pátria: com aqueles que atualmente nos governam e que trabalham pela destruição do Brasil tanto por vias oficiais quanto pelas oficiosas. Levantemo-nos em defesa desta Terra de Santa Cruz, desta Pátria-Mãe Gentil que ora se encontra tão terrivelmente ameaçada. Que a Virgem Aparecida salve o Brasil.

O trono de ouro do Papa e a caridade da Igreja

Voltou a circular no Facebook uma imagem retratando a suposta contradição entre a “opulência” do Papa sentado em um trono (alegadamente) de ouro e a miséria de uma criança passando fome na África. A imagem recente provoca mais comoção, imagino, por conta do olhar da criança: a foto mostra o menino faminto ostentando dois olhos enormes e brilhantes, no melhor estilo Gato-de-Botas, acrescentando assim à (já comovente, é lógico) tragédia uma apelo visual que faz com que seja impossível não se compadecer imediatamente. É uma obra-prima de propaganda, forçoso reconhecer. Contudo, nem tudo o que reluz é ouro e nem toda boa peça publicitária divulga a verdade. Aliás, o que acontece neste caso é exatamente o contrário.

Sobre este assunto já se falou extensamente no ano passado, quando ele surgiu pela primeira vez: no entanto, fez-se uma confusão com as imagens que convém esclarecer. O que se disse anteriormente (e que é verdade) é que nem mesmo a Cathedra Petri, encrustrada n’A Glória de Bernini, é de ouro. A obra do famoso escultor italiano é de madeira revestida por bronze dourado. Contudo, este não é o trono que aparece nas fotos divulgadas no Facebook, como qualquer um que compare as duas imagens pode ver. Aliás, creio que nenhum Papa se senta na Cathedra Petri por óbvias razões ergonômicas: a obra é alta e imponente, e é perceptível que foi confeccionada visando mais a razões estéticas do que ao uso prático quotidiano.

O trono no qual o Papa aparece sentado – e que NÃO é o de Bernini – é o Trono de Leão XIII. Sobre esta confusão falou extensamente o Caos & Regresso no início deste mês, e recomendo a leitura: tanto deste texto quanto do anterior lá linkado, mormente na parte específica sobre as riquezas da Igreja. O que realmente interessa nessa discussão – como eu respondi pela primeira vez a um amigo que me questionou – é que não importa o valor do trono no qual o Papa se senta, uma vez que ele (como aliás todas as riquezas da Igreja) pertence(m) não ao Papa enquanto indivíduo, mas sim à Igreja como um todo. As riquezas da Igreja estão lá não para conforto dos homens, mas para reverenciar a Deus. E o valor delas, conquanto fosse alto, seria ainda assim insuficiente para “comprar” um mundo perfeito porque, infelizmente, o egoísmo humano é maior do que toda a riqueza acumulada pela humanidade e uma terra sem males não está à venda. Portanto,

  1. ainda que o Trono do Papa fosse de ouro maciço, o Papa não poderia vendê-lo porque ele não lhe pertence; e ainda
  2. ainda que o Trono do Papa fosse de ouro maciço e o Papa o derretesse e vendesse, a fome do mundo não ia acabar com isso. Porque dinheiro se gasta e acaba, ao passo em que as pessoas têm fome todos os dias. Isto é tão evidente que dói ter que desenhar.

O que interessa é dizer que a Igreja – ao contrário desta galera que acredita estar colaborando com o futuro da humanidade ao divulgar no Facebook uma peça de propaganda caluniosa – é a maior instituição de caridade do mundo. A gente não costuma divulgar porque caridade é para ser feita sem alarde mesmo, mas existe um Dicastério Romano (o Conselho Pontifício Cor Unum) voltado para a caridade institucionalizada. Os que acham ser uma boa idéia jogar pedras na Igreja Católica, melhor fariam se primeiro dessem uma olhada nos relatórios anuais do Cor Unum. Se não têm coragem de ler textos grandes e em outros idiomas, então tenham ao menos a decência de passar os olhos pelos números organizados em tabelas (mostrando o total de doações e o número de países beneficiados por ano) antes de perguntar cinicamente quantas crianças poderiam ser alimentadas pela venda de uma peça histórica.

O mais trágico é que as pessoas que divulgam estas cretinices, as mais das vezes, não têm coragem de comprar um pão na padaria para dar a um mendigo faminto da rua, e certamente não lhes passa pela cabeça vender o próprio carro (ou o iPhone ou a roupa de marca) para alimentar a criança que passa fome na calçada do seu próprio prédio. No entanto, vêm fazer exigências sem sentido à Igreja Católica. Donde se vê que, na verdade, hipocrisia não é o que está representado na imagem. Hipocrisia existe em quem compartilha uma coisa dessas.

O combate ao erro e também àquele que erra

[O texto apareceu recentemente na lista “Tradição Católica”; buscando-o na internet, descobri que ele já havia sido publicado aqui. Reproduzo-o na íntegra, por julgar as considerações do autor extremamente pertinentes. São palavras que fazem eco àquelas de São Francisco de Sales (aliás, o mesmo a dizer que é mais fácil capturar moscas com mel do que com vinagre): “os inimigos de Deus e da Igreja devem ser difamados tanto quanto se possa, contanto que não se falte com a verdade; porque é dever de caridade gritar “Eis o lobo!” quando ele está entre o rebanho, ou em qualquer lugar onde se encontre”.

No mesmo sentido, é extremamente recomendada a leitura deste “Capítulo II” do “Em defesa da Ação Católica”, de Plínio Corrêa de Oliveira.]

Capítulo XXIII

SE É CONVENIENTE AO COMBATER O ERRO COMBATER E DESAUTORIZAR A PERSONALIDADE DO QUE O SUSTENTA E PROPALA

Dir-se-á porém: “Conceda-se isso com respeito às doutrinas em abstrato. Mas será conveniente ao combater o erro, por maior que o seja, cevar-se e encarniçar-se contra a personalidade do que o sustenta?”

Responderemos que muitas vezes sim, é conveniente e não só conveniente, mas até indispensável, e meritório diante de Deus e da sociedade. E ainda que bem pudesse deduzir-se esta afirmação do que anteriormente havemos exposto, queremos, todavia, tratá-la aqui ex professo, pois é grande a sua importância.

Com efeito, não é pouco freqüente a acusação que se faz ao apologista católico de ocupar-se sempre das pessoas, e quando se lança em rosto a um dos nossos o atacar uma pessoa, parece aos liberais e aos contaminados de Liberalismo que já não há mais que dizer para condená-lo.

E, não obstante, não têm razão; não, não a têm. As idéias más hão de ser combatidas e desautorizadas; é preciso torná-las aborrecidas, desprezíveis e detestáveis à multidão, a essa que intentam embair e seduzir. Mas quer o acaso que as idéias não se sustentem por si mesmas no ar, nem por si mesmas fazem todo o dano à sociedade. São como as flechas ou balas, que a ninguém iriam ferir, se não houvesse quem as disparasse com o arco ou com a espingarda.

Ao atirador se devem, pois, dirigir primariamente os tiros do que deseje destruir a sua mortal pontaria; e qualquer outro modo de fazer a guerra será tão liberal como queiram, porém, não terá sentido comum. Soldados com armas de envenenados projéteis são os autores e propagandistas de doutrinas heréticas; suas armas são o livro, o jornal, o discurso público, a influência pessoal.

Não basta, pois, desviar-se para evitar o tiro, não; o principal e mais eficaz é deixar inabilitado o atirador. Assim, convém desautorizar e desacreditar o seu livro, periódico, ou discurso; e não só isso, senão desautorizar e desacreditar em alguns casos a pessoa. Sim, a pessoa, porque é este o elemento principal do combate, como o artilheiro é o elemento principal da artilharia, e não a bomba, a pólvora ou o canhão.

Pode-se, pois, em certos casos, trazer a publico suas infâmias, ridicularizar seus costumes, cobrir de ignomínia o seu nome e apelido. Sim, senhor; e pode-se fazer em prosa ou em verso, a sério ou brincando, em gravuras e por todas as artes e processos que no futuro possam inventar-se.

Somente se deve ter em conta que não se ponha a mentira ao serviço da justiça. Isso não; ninguém neste ponto se afaste um só ápice da verdade, porém, dentro dos limites desta, recorde-se aquele dito de Cretineau-Joly: – A verdade é a única caridade permitida à história; e poderia acrescentar: À defesa religiosa e social.

Os mesmos Santos Padres, que temos citado, provam esta tese. Até os títulos de suas obras dizem claramente que, ao combater as heresias, o primeiro tiro procuravam dirigi-lo contra os heresiarcas. Quase todos os títulos das obras de Santo Agostinho se dirigem ao nome do autor da heresia: Contra Fortunatum manichaeum; Adversus Adamancium; Contra Felicem; Contra Secundinum; Quis fuerit Petilianus; De gestis Pelagii; Quis furiet Julianus, etc. De sorte que quase toda polêmica do grande Agostinho foi pessoal, agressiva, biográfica, por assim dizer, tanto como doutrinal; corpo a corpo com o herege, como contra a heresia. E assim poderíamos dizer de todos os Santos Padres.

Onde foi, pois, o Liberalismo buscar a novidade de que ao combater os erros se deve prescindir das pessoas e até animá-las e acariciá-las? Firmem-se no que ensina neste ponto a tradição cristã, e deixem-nos a nós, os ultramontanos, defender a fé como se defendeu sempre a Igreja de Deus. Penetre, pois, a espada do polemista católico, fira e vá direto ao coração, que esta é a única maneira real e eficaz de combater!”.

O Liberalismo é Pecado, de D. Felix Sardá y Salvani, 1949.
Ed. Companhia Editora Nacional, pp. 89-91.

Beata Dulce dos pobres, rogai por nós!

E a Bahia estava em festa para ver a Irmã Dulce ser inscrita no rol dos beatos da Santa Igreja Católica. A universalidade da celebração foi uma das coisas que mais me impressionou. Havia outdoors pelas ruas, cartazes nas janelas das casas e, segundo me disse um amigo, até mesmo os protestantes eram simpáticos àquela que mereceu ser chamada de “Anjo Bom da Bahia”: estes últimos apenas insistiam, de maneira tíbia, que “ela não podia interceder”. Mas as virtudes dela pareciam provocar admiração em todos.

Antecipei o meu vôo e acabei esquecendo de comprar os jornais do dia de ontem. Um amigo me disse que, em um deles, era narrado um episódio da vida da nova beata: acontecera um acidente grave com um pequeno ônibus, dentro do qual haviam ficado presas algumas pessoas. O ônibus pegara fogo e as pessoas não estavam conseguindo sair. Irmã Dulce, que estava nos arredores, ouviu o acidente, chamou as irmãs e foi correndo socorrer as vítimas; com pedras, quebrou os vidros e conseguiu salvar, se não me falha a memória, uma dúzia de pessoas.

E uma dessas pessoas era um garoto que a própria Irmã Dulce já salvara quando ele era um bebê. A mãe dele o havia abandonado para morrer, ferido, em uma encruzilhada como oferenda a algum Orixá. Irmã Dulce o recolheu, tratou dele e o entregou a uma família para que ele fosse criado. Anos depois, o mesmo garoto estava prestes a morrer em um acidente; e, mais uma vez, a Irmã Dulce estava lá para o salvar.

Nunca o serviço social dela foi confundido com mera filantropia. A sua visão horizontal era totalmente dependente de uma firme e clara visão vertical: a freira de hábito era uma mulher de profunda oração, interessada em lutar não por “melhores condições sociais” nem por nenhuma outra bobagem do tipo, mas preocupada em amar pessoalmente cada um dos filhos de Deus que Ele colocava em seu caminho. A dedicação de toda uma vida ao serviço dos pobres era radicada em um profundo amor a Deus, sem o qual o que ela fez simplesmente não teria sido possível. Externamente, alguma filantropia pode até ser confundida com caridade, mas o amor meramente humano – ao contrário do divino – tem limites. Ninguém consegue esquecer-se de si a serviço dos outros – como fez a Irmã Dulce – se não for por um profundo amor a Deus.

“-Chegou uma freira nova tão bonitinha!”. Um outro amigo me disse ter ouvido esta frase da mãe dele, referindo-se ao primeiro contato que ela tivera com Irmã Dulce em Salvador. Uma menina jovem e bonita, de uma família importante da cidade, dedicando-se exclusivamente – desde criança – a cuidar dos indigentes! Como não se admirar com esta mulher? A festa, repito, era na capital baiana inteira. Nem a chuva conseguiu esmorecer o ânimo dos baianos, que se dirigiram às centenas e aos milhares para o Parque de Exposições. Participar do histórico momento em que uma filha da Bahia foi declarada Bem-Aventurada.

Em bom latim, na leitura da bula do Papa Bento XVI, logo após traduzida: a Serva de Deus Dulce Lopes Pontes estava inscrita entre os beatos da Igreja Católica. Aplausos. O grande retrato da nova beata foi descoberto, ao lado do altar – de onde o Senhor do Bonfim olhava para a amplidão tomada de gente, e abençoava o povo da Bahia. Eu estava radiante: mais uma brasileira próxima dos altares! Uma conterrânea reconhecidamente na amizade de Deus. A olhar por Salvador, a olhar pela Bahia, a olhar pelo Brasil.

Que a Irmã Dulce interceda por nós! Que ela se lembre do seu Brasil, de sua Pátria tão necessitada dos favores celestes. Que muitas graças caiam em abundância sobre esta Terra de Santa Cruz: graças do Senhor do Bonfim, pelas mãos da Virgem da Conceição da Praia, pela intercessão da Bem-Aventurada Dulce dos Pobres.

Igreja Católica enaltecida em abertura do Ano Judicial, em Portugal

Senhor Presidente da República, senhor Presidente da Assembléia da República, senhor Ministro da Justiça, no meio deste  panorama – cujas conseqüências não estão ainda totalmente diagnosticadas – quero deixar uma nota final para enaltecer o papel da Igreja Católica, e ilumiadamente realçar a ação altamente meritória que as várias organizações d’Ela pendentes têm realizado um pouco por todo o país, atenuando as conseqüências mais dramáticas da pobreza que têm vindo alastrar. A Ordem dos Advogados é uma entidade laica; e eu próprio, que não sou católico e nem sequer religioso, queremos aqui louvar publicamente a ação humanitária levada a cabo por centenas ou milhares de católicos anônimos que, movidos apenas pelos impulsos mais generosos da sua Fé, ajudam os seus semelhantes a suportar as agruras da miséria que se tem abatido sobre um número crescente de portugueses. Por essa ação é que deixo na pessoa de Vossa Excelência, senhor Cardeal Patriarca de Lisboa, o meu muito obrigado. Tenho dito.

– Dr. Marinho e Pinto
Sessão Solene de Abertura do Ano Judicial.

Virgem Maria, desejos de Céu

[Está tão bonita que reproduzo do mesmo jeito que recebi por email. Não tenho muito mais o que acrescentar – que a Virgem Santíssima inspire em todos o desejo do Céu! Sim, que esta Boa Senhora possa nos curar da tibieza, e inflamar as nossas almas de um verdadeiro desejo pela Vida Eterna junto ao Seu Filho.

A frase do título não está na reportagem. Está no discurso de Bento XVI em visita al Centro Don Orione di Monte Mario, anteontem. Que, como disse o Sumo Pontífice “[l]a Madonnina (…) protegga le famiglie, susciti propositi di bene, suggerisca a tutti desideri di cielo”; é também o que eu desejo. “Guardare al cielo, pregare, e poi avanti con coraggio e lavorare. Ave Maria e avanti!” – como dizia San Luigi Orione. Que nos guarde a Virgem Santíssima, Salus Populi Romani, que também nós somos romanos. Da Igreja de Roma. Da Igreja de Cristo.]

Bento XVI: “Que Maria inspire em todos desejos de céu”.

25/06/2010 (1:29)

Papa: “Que Maria, Mãe de Deus e nossa, esteja sempre no alto de seus pensamentos e afetos, amável conforto de suas almas, guia certa de suas vontades e amparo de seus passos, inspiradora persuasiva da imitação de Jesus Cristo”.

Bento XVI visitou na manhã de quinta-feira o Centro Don Orione de Monte Mario e abençoou a imagem de Nossa Senhora, abatida alguns meses atrás pela fúria do vento. Restituída aos olhos e à devoção dos romanos, graças à restauração atenciosa, a efígie – recordou o Pontífice – é “memória de eventos dramáticos e providenciais, escritos na história e na consciência da Cidade”. A imagem, de fato, “foi colocada na colina de Monte Mario em 1953, como realização de um voto popular pronunciado durante a II Guerra Mundial, quando as hostilidades e as armas faziam temer pelo futuro de Roma”. Uma iniciativa que partiu dos orionitas, que justamente no alto da colina realizaram um centro de “acolhimento de mutilados e de órfãos”. “Don Orione – precisou o Papa – viveu de maneira lúcida e apaixonada a tarefa da Igreja de viver o amor para fazer entrar no mundo a luz de Deus”, “convencido de que a caridade abre os olhos à fé”. “As obras de caridade – concluiu Bento XVI – jamais podem reduzir-se a gesto filantrópico, mas devem permanecer sempre tangíveis expressão do amor providencial de Deus”.

Fonte: H20News

O respeito devido a Deus

Um grande amigo meu, o Gustavo Souza, que já é provavelmente conhecido de alguns por ter alguns textos aqui publicados e por ter o seu blog relacionado na coluna lateral do Deus lo Vult, escreveu há algum tempo um interessante texto sobre o respeito ao ser humano, a cuja leitura eu remeto. Gostaria de seguir os passos do meu conterrâneo e tecer mais algumas considerações sobre o assunto, já que o mesmo aparenta ser bastante mal compreendido nos nossos dias. Mas começo sob uma outra perspectiva: pretendo falar primeiramente um pouco sobre o respeito a Deus.

Inicio com um parágrafo do Catecismo da Igreja Católica:

Feito membro da Igreja, o baptizado já não se pertence a si próprio mas Aquele que morreu e ressuscitou por nós. A partir daí, é chamado a submeter-se aos outros, a servi-los na comunhão da Igreja, a ser «obediente e dócil» aos chefes da Igreja e a considerá-los com respeito e afeição. Assim como o Baptismo é fonte de responsabilidade e deveres, assim também o baptizado goza de direitos no seio da Igreja: direito a receber os sacramentos, a ser alimentado com a Palavra de Deus e a ser apoiado com outras ajudas espirituais da Igreja.
[CIC 1269]

Saliento a seguinte frase: o Batismo é fonte de responsabilidade e deveres. Já manifestei aqui por diversas vezes o meu mais veemente descontentamento para com os “católicos de IBGE”, “católicos self-service”, “Católicos com Doutrina Diferente da Igreja” (CDDI’s – excelente contributo de um leitor no espaço de comments!) e outras espécies estranhas que, infelizmente, pululam como micróbios em água suja nos nossos dias. Por que essas pessoas são fontes de escândalo e provocam justa indignação naqueles que se esforçam para serem católicos fiéis? Oras, porque elas esvaziam o catolicismo daquilo que lhe é fundamental e apresentam ao mundo, com a sua vida, uma caricatura do Evangelho, uma deformação da Igreja Católica.

Para ser católico não é suficiente dizer-se católico. O Batismo não é uma mera cerimônia social. É – nos dizeres do Catecismo – fonte de responsabilidades e deveres. “Católicos” que não levam a sua vida de acordo com as exigências do seu Batismo são péssimos católicos, são traidores das promessas que fizeram um dia (ou que fizeram por eles, mas eles aceitaram livremente depois), são anti-evangelizadores na medida em que impedem a Igreja Católica de ser conhecida na plenitude de Seu esplendor de Esposa de Cristo sem ruga e sem mácula. Disse o Apóstolo que de Deus não se zomba (cf. Gl 6, 7); os católicos que não querem assumir as “responsabilidades e deveres” decorrentes do seu Batismo e se insistem em se dizer católicos mesmo assim estão faltando ao respeito devido ao Deus Todo-Poderoso.

Devemos respeito a Deus – eis uma verdade tão óbvia quanto negligenciada nos nossos dias! O “temor de Deus”, este dom do Espírito Santo tão esquecido, é o princípio da sabedoria (cf. Pr 1, 7) e é o dom “que nos faz reverenciar a Deus, e ter receio de ofender a sua Divina Majestade, e que nos afasta do mal, incitando-nos ao bem” (Terceiro Catecismo da Doutrina Cristã, q. 921). Enquanto estas coisas não forem devidamente relembradas, dificilmente haverá respeito a Deus.

Hoje em dia “temor” é uma palavra à qual está associada um rótulo odioso, capaz de evocar imagens obscurantistas das quais queremos nos emancipar. Ninguém quer ter medo; dizem-nos que isto é coisa de crianças, e que foi usado como instrumento de dominação pela Igreja Católica, e outras besteiras mais. Dizem-nos ainda que Deus é um amigo ao qual devemos amar e não temer; dizem até que “temor” é para ser traduzido por “ter amor”… é verdade que Deus é nosso amigo a quem devemos amar, e é sem dúvidas verdade que devemos ter amor a Deus. Mas dizer somente isso não é dizer toda a verdade, porque Deus também é a Majestade Suprema infinitamente digna de respeito e veneração. Deus é Pai, mas também é Deus; as duas coisas não são de modo algum excludentes. Precisamos respeitar a Deus (como, aliás, precisamos respeitar os nossos pais – o respeito aos pais está radicado justamente no temor de Deus, como diz o Catecismo (cf. CIC 2217)), precisamos reverenciá-Lo, precisamos ter receio de O ofender. Isso não é um medo irracional nem uma fonte de traumas e frustrações; é, ao contrário, o princípio da Sabedoria.

Respeitar a Deus é também respeitar a Igreja, respeitar os compromissos assumidos no Batismo; respeitar a Deus é esforçar-se para ser, tanto quanto possível, um católico bom e fiel. E, aqui, nós chegamos no respeito ao próximo, que pode ser visto como um caso particular do respeito devido a Deus. A caridade – que nos manda amar ao próximo como a nós mesmos – leva-nos naturalmente a respeitar ao próximo, por amor a Deus (claro, dentro dos limites do que é verdadeiramente respeito, que o Gustavo sinalizou muito bem no texto acima linkado). É por isso que todos os problemas do mundo se resolvem com a Doutrina Católica, e é por isso que são descabidas as críticas daqueles que julgam ser “farisaísmo” (ou coisa parecida) a importância dada àquilo que a Igreja ensina. O conhecimento e a prática do Evangelho de Jesus Cristo são o único caminho seguro para a verdadeira paz nesta terra, são a única resposta às inquietudes dos seres humanos, são a única força capaz de transformar o mundo.

Spiritus sancti timoris,
miserere nobis!

“A Freira e seu mundo” – prof. Luiz Delgado

O Estado, por exemplo, passa a assumir serviços que, anteriormente, eram realizados somente pela inspiração da caridade cristã [José Luiz Delgado].

Encontrei um texto do professor Luiz Delgado, único colunista digno deste nome que ainda escreve no Jornal do Commercio. Vai em anexo. Fala sobre a verdadeira obra caritativa da Igreja, a verdadeira opção evangélica pelos pobres, a verdadeira obra social que tem verdadeiro valor. Fala sobre “um tempo em que a Igreja, com seu eterno senso do social e do fraterno, antecipava-se ao Estado para a criação de escolas populares”. Hoje, fala-se muito em “educação” como uma condição fundamental para o desenvolvimento do país; sem dúvidas, não é nenhuma novidade, pois a Igreja sempre deu valor à educação. Fundou escolas paroquiais, fundou as Universidades na Idade Média, fundou inúmeras escolas dirigidas pelos membros de Suas ordens religiosas ao longo dos séculos.

O problema, hoje, é que a educação é deixada nas mãos do Estado. Transforma-se em instrumento de doutrinação ideológica. Não é mais obra de caridade que a Igreja toma para Si, e sim interesse estatal em formar os seus cidadãos desta ou daquela maneira. Não é mais serviço desinteressado, realizado sem retribuições, por pessoas que se entregaram completamente a Deus, e sim trabalho remunerado, sujeito às leis econômicas do mercado. Ora, se o Estado tem obrigação de fornecer educação para os seus súditos, então para quê as ordens religiosas vão perder tempo erigindo escolas?

O problema atual não é que o Estado não oferece educação, é precisamente o contrário: o Estado oferece educação e não deixa os demais (p.ex., a família; p.ex., a Igreja) fazerem aquilo que sempre fizeram ao longo dos séculos. O problema para a crise educacional não será jamais resolvido pelo Estado, e até mesmo supôr isto é já uma demonstração de que não se entende a natureza do problema. É necessário voltar à caridade cristã, aos exemplos das freiras de Recife e da “Casa do Pobre”; exemplos dos quais a desgraçada Teologia da Libertação, com o seu discurso comunista, só é capaz de produzir caricaturas.

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Anexo: Jornal do Commercio de 28/10/2008

A freira e seu mundo
Publicado em 28.10.2008

José Luiz Delgado
jlmdelgado@terra.com.br

A rua fazia parte do caminho das maxambombas para Olinda. Quando fizeram a estrada nova, na frente, reta, vindo de Santo Amaro, e não mais da Encruzilhada, a rua ficou um tanto à margem. E mais à margem ainda ficaria quando construíram, do outro lado, atrás, a continuação do complexo Salgadinho, no rumo de Paulista. Entre uma e outra, entre as vias modernas, aquele arruado ficou como perdido fora do tempo e do espaço.

Nele, naquele pequeno mundo, o Padre Sidrônio Wanderley (sobre quem o padre José Aragão publicou expressivo depoimento) plantou importante obra social – uma escola para meninos de famílias de baixa renda, a “Casa do Pobre”, cujo sentido já estava no próprio nome. Depois, ao lado, edificou uma capela simpática e de singelo bom gosto. Era outro tempo – um tempo em que a Igreja, com seu eterno senso do social e do fraterno, antecipava-se ao Estado para a criação de escolas populares. Assim como o padre Airton Guedes fazia em Peixinhos, com a Escola Dom Bosco, e tantos outros, em variados arrabaldes.

Na obra da Casa do Pobre, o cônego Sidrônio contou com a ajuda da irmã freira, que conseguiu encaminhar algumas religiosas para se instalarem permanentemente na instituição. Várias delas vinham e se iam. Duas vieram e ficaram definitivamente. Nas minhas mais remotas lembranças da infância lá estão sempre aquelas duas – madre Redentor e irmã Filomena. Além de dirigir a “Casa”, a primeira se dedicava também aos filhos das famílias de classe média, ensinando-lhes (era outro tempo…) datilografia. A segunda gostava de artesanato, sobretudo de frutas de cera, que ensinava aos meninos e vendia em quermesses de fim de ano.

O arruado de famílias antigas, tradicionais, com um grande descampado no meio das casas e uma pequena lagoa atrás, ficou marcado pela presença daquelas religiosas. A madre Redentor faleceu há 6 anos. A irmã Filomena se foi agora, no último dia 6 – com seu sorriso permanente, sua doçura, sua suavidade, seu jeito sempre discreto e modesto. Poucos saberiam das dificuldades financeiras em que a instituição e as freiras sempre se debateram. Viviam um real voto de pobreza e de obediência. Não a pobreza literária, fácil, de pura retórica. A lição silenciosa e profunda do cônego Sidrônio, tão bem salientada no opúsculo do padre Aragão, perpetuava-se na dedicação das duas freiras. Na vida humilde que levaram, são exemplos de milhares de outras moças que renunciaram ao mundo e se consagraram à vida religiosa, vida ao mesmo tempo de oração e de intenso serviço aos pobres. Foram integralmente fiéis, não se seduzindo pelas atrações da moda, nem se perturbando com as defecções e as levianas infidelidades em torno. Mesmo quando o padre Sidrônio morreu, elas continuaram na instituição, mantendo a sua obra, sob a orientação dos novos diretores que os Arcebispos dom Helder e dom Cardoso nomearam.

Era um outro mundo e um outro tempo. As obras humanas têm muitas vezes existência igual à dos homens, raramente sobrevivem aos seus criadores. Dói, tantas vezes, vê-las decair, assim como dói a partida definitiva de um amigo. Mas não é importante que as obras fiquem como tais, para sempre. As coisas mudam, o tempo e o mundo se modificam, instituem-se novas práticas e novos valores. O Estado, por exemplo, passa a assumir serviços que, anteriormente, eram realizados somente pela inspiração da caridade cristã. Importante é que cada pessoa responda aos problemas do seu tempo e do seu meio da melhor forma que puder. Fecunde o mundo em que lhe foi dado viver. Corresponda às angústias e aos clamores dos anos que passar na terra. E foi isso mesmo que aquelas duas freiras fizeram – integralmente dedicadas a Deus, à Igreja, aos pobres, segundo a lição admirável do cônego Sidrônio.

A mínima justiça que se poderia fazer a elas, sinal da gratidão de toda a comunidade daquele modesto arruado, seria simplesmente dar à praça, que a prefeitura há pouco construiu no meio, acabando com o lamaçal que ali havia, o nome de irmã Filomena.

» José Luiz Delgado é professor universitário