Domingo, façamos história!

Preciso confessar que, aparentemente, minhas previsões políticas são uma verdadeira negação. Quatro anos passados, às vésperas das eleições, eu escrevi aqui que a diferença entre os então candidatos era «tão assustadoramente pequena que cada voto individual faz[ia], sim, diferença». Poucos dias depois, Dilma ganhava com uma vantagem de doze pontos percentuaisdoze milhões de votos. Há algumas poucas semanas, eu escrevi aqui que «Aécio não é o mal menor porque Aécio não está concorrendo». Hoje, a quatro dias do pleito, o candidato PSDBista aparece (no pior cenário!) em empate técnico com a sra. Rousseff…

Tenho vontade de dizer que o PT levou mais uma, mas não quero dar a essas linhas o tom desesperançoso que tal avaliação carrega. Apenas faço um comentário, uma avaliação moral e uma declaração.

O comentário: o Partido dos Trabalhadores está no poder há 12 anos. Doze anos é muito tempo; reis medievais houve – eu dizia mais cedo no Facebook – aos quais não foi concedido um reinado tão longo. Os efeitos psicológicos disso são bem fáceis de serem inferidos e verificados na prática. Em primeiro lugar, muitas pessoas simplesmente têm o PT como um arcabouço ontológico, um ponto de constância metafísico: FHC é um nome feio, Lula é uma lembrança bucólica da infância (ou, pior, um personagem dos livros de história) e o mundo político está começando agora, nas eleições de 2014. São pessoas que não possuem consciência de terem jamais vivido fora do modo petista de governar e, portanto, para elas é como se a mera concepção de um outro mundo (leia-se um outro partido na presidência) soasse estranha e se lhes afigurasse uma traição àquilo que elas “sempre foram”. Isto nos leva ao segundo ponto: a sensação de familiaridade com o Partido transforma-se, muito facilmente, numa espécie de xenofobia política. É esta a tônica das presentes eleições: os eleitores da Dilma votam na Dilma não por gostarem dela, mas por um verdadeiro medo de uma mudança de governo. Medo que – terceiro ponto – degenera em agressividade pura e simples, irresponsavelmente fomentada pelos altos escalões petistas: não me recordo de outra época em que os ânimos estivessem tão acirrados e em que os eleitores do candidato da oposição fossem tão fortemente percebidos (e, por conseguinte, tratados) como verdadeiros inimigos da Pátria.

[Alguém pode me dizer que também os “petralhas” recebem atualmente esse tratamento, ao que eu respondo que a diferença é que o PT é de fato inimigo da Pátria, haja vista o lamaçal de corrupção e o fundo do poço moral aos quais doze anos de desmandos petistas efetivamente nos conduziram – ao passo que, em relação a um PSDB (ou qualquer outro partido!) que há mais de década não tem sequer o exercício do poder com o qual poderia trair o Brasil, o ódio é dirigido não contra um governo de fato e verdadeiramente existente, mas sim contra uma mera figura mítica produzida pela retórica das esquerdas. Adelante.]

A longa permanência de um governo provoca um acomodamento pragmático; esta acomodação traz em seu bojo o receio das mudanças; este medo, por sua vez, degenera em simples discurso (e exercício) de ódio contra o diferente, consolidando assim o governo no poder por ainda mais tempo: eis o presente estado de coisas em que nos encontramos. E a oportunidade de ouro que temos agora é a de quebrar este círculo vicioso.

A avaliação moral: é evidente que Aécio Neves não é nenhum D. Sebastião e é igualmente óbvio que, do ponto de vista católico, um sem-número de críticas pode ser feito ao presidenciável. Está-se, contudo, diante de uma escolha entre a manutenção de um Governo que é no presente totalmente hostil à Igreja Católica e outro com o qual Ela provavelmente terá no futuro sérias divergências: a diferença de grau é ululante e não penso que pode ser seriamente negada por ninguém. Não há absolutamente nada moralmente reprovável que o Aécio prometa ou sinalize fazer que o PT não tenha já feito ou tentado mil vezes pior.

O Aécio pode não ser o mais entusiasta militante contra o aborto e ter idéias francamente insustentáveis com relação aos grupos LGBT, mas (e isso é fundamental) não concede a esses temas o status de coluna vertebral que o PT lhes devota. Não há o menor indício de que um possível governo tucano vá gravitar em torno desses temas, ou pelo menos não com a militância escancarada com a qual o PT os trata, e portanto não existe o menor óbice moral ao voto no neto de Tancredo Neves como se fosse “a mesma coisa” que votar na sra. Rousseff. Não é, e isso precisa ficar bem claro. Se para o expurgo do PT até mesmo o voto na Marina era aceitável, quanto mais o no Aécio! Não se trata, insista-se, de um “cheque em branco”, de um sinal de concordância para com todos os pontos do seu programa de governo ou de uma aceitação prévia de tudo quanto o presidenciável deseje pôr em prática no país. Ao votar no Aécio para impedir a vitória da Dilma, ninguém se torna moralmente co-responsável pelas atitudes anti-católicas que o ex-senador eventualmente venha a tomar. O voto é para tirar o PT da presidência: apenas isso, e ninguém precisa ficar com escrúpulos de consciência concedendo a este instrumento da cidadania um peso maior do que o que ele de fato possui.

A declaração: evidentemente, por tudo o que foi exposto, no próximo domingo eu vou votar em Aécio Neves. Entendo que não existe outra opção, dada a confluência destes fatores: i) o mal duradouro e certo que tem se mostrado o PT, ii) a evidente diferença de grau (no que concerne à Moral Católica) entre as duas candidaturas e iii) a razoável possibilidade de vitória. Se o PT não fosse um mal objetivo, se inexistisse diferença entre os dois candidatos ou se não houvesse possibilidade real de mudança, então seria talvez possível agir de outra maneira: nas atuais conjunturas, contudo, não.

Vale a pena! Os esquerdistas estão quais baratas tontas, ocultando sob os gritos da militância pública o verdadeiro pânico que interiormente estão sentindo de perder estas eleições. Do efeito simbólico de interromper a dinastia petista assim, praticamente a meio mandato, não nos é lícito desdenhar. Não podemos desperdiçar a chance – absolutamente real – de que a “primeira mulher presidenta” seja também o primeiro presidente a perder uma reeleição na história deste país – para usar a retórica tão ao gosto dos poderosos de hoje. E é preciso deixar claro que a quadrilha que tomou Brasília de assalto não nos representa; é preciso dizer com clareza que não estamos satisfeitos com o atual estado de coisas; é preciso afirmar, em público e com a voz tonitruante das urnas, que não aceitamos o confinamento neste curral ideológico onde, ameaçando-nos com o discurso do medo e do ódio, os atuais governantes do Brasil pretendem nos manter indefinidamente.

Faltam quatro dias: um Brasil diferente é possível. Coragem, perseverança e foco. Preparemo-nos nestes últimos momentos! Domingo, digamos um rotundo “não” a isso que aí está. Domingo, tenhamos a coragem de rejeitar aquilo que até então nos tem feito mal. Domingo, deixemos (de novo e mais propriamente) a esperança vencer o medo. Domingo, façamos história.