A entrevista do Superior Geral dos jesuítas: «reinterpretar» as palavras de Cristo?

A entrevista do novo superior geral dos jesuítas provocou estupor pela afirmação de que, no tocante ao acesso aos sacramentos dos divorciados recasados, seria necessário «reinterpretar Jesus». As perguntas do entrevistador são muito bem feitas e, as respostas, um verdadeiro show de horrores.

Primeiro o padre Arturo Sosa Abascal põe em dúvida a autoridade das Escrituras Sagradas ao afirmar que na época de Cristo “ninguém tinha um gravador” (!) para registrar o que Ele teria dito ou deixado de dizer. A afirmação é de uma grosseria sem tamanhos e esconde o pressuposto elíptico de que uma gravação poderia ser mais fidedigna que a infalível palavra de Deus, escrita pelos santos, reconhecida pelos doutores e chancelada pela Igreja ao longo dos séculos.

Que não existissem gravadores na Palestina da época de Cristo é de uma irrelevância sem tamanho e, a menção ao fato, de um materialismo que chega a assustar. A autoridade dos Evangelhos não repousa sobre o grau de confiabilidade do meio de registro (de modo que a gravação mediante um aparelho é sob certo aspecto mais exata que o relato feito de memória), mas sobre a chancela da Igreja de Cristo que é «coluna e sustentáculo da Verdade» (1Tm 3, 15). Nós não sabemos, é verdade, todas as palavras que foram proferidas por Nosso Senhor nesta terra; no entanto, as palavras que foram consignadas por escrito pelos Evangelistas, estas nós temos sim a certeza de que foram ditas — e uma certeza mais firme do que poderia ser proporcionada por qualquer extemporâneo meio de registro eletrônico.

Não existe esta divisão — de sabor kantiano — entre a palavra de Jesus e a interpretação da palavra de Jesus. Do jeito que o pe. Arturo fala, fica parecendo um formalismo inútil: é verdade que o que Jesus disse é verdadeiro, mas o que nós sabemos sobre o que Jesus disse pode estar errado… Ora, se não fosse possível a certeza a respeito da interpretação das palavras de Cristo então o Evangelho seria de todo inútil.

A Igreja existe precisamente para dizer qual a interpretação verdadeira das palavras de Cristo. É esta a Sua função precípua e espanta que um sacerdote — o superior de uma importantíssima ordem religiosa! — o pareça ignorar. É sem dúvidas necessário saber quais foram as palavras de Cristo, mas nós as sabemos e, além disso, sabemos qual a sua correta interpretação!

As palavras de Cristo são as que estão registradas na Vulgata: quod ergo Deus coniunxit homo non separet — o que Deus uniu, portanto, não separe o homem (Mt XIX, 6).

E a interpretação dessas palavras é a que está consignada, por exemplo, na XXIV sessão do Concílio de Trento:

977. Cân. 7. Se alguém disser que a Igreja erra quando ensinou e ensina que, segundo a doutrina evangélica e apostólica (Mc 10; l Cor 7), o vínculo do matrimonio não pode ser dissolvido pelo adultério dum dos cônjuges e que nenhum dos dois, nem mesmo o inocente que não deu motivo ao adultério, pode contrair outro matrimonio em vida do outro cônjuge, e que comete adultério tanto aquele que, repudiada a adúltera, casa com outra, como aquela que, abandonado o marido, casa com outro — seja excomungado.

Sim, o pe. Arturo tem total razão ao dizer que é preciso saber exatamente quais são as palavras de Cristo (que ninguém pode mudar), bem como o quê exatamente estas palavras significam. Isto é sem dúvidas muito necessário, e um sem-número de erros absurdos — como os que o próprio pe. Arturo insinua na sua entrevista — seriam evitados se se soubessem, com certeza, as palavras de Cristo e o que elas significam.

E a correta interpretação sobre qualquer ponto da Doutrina Católica — sobre as palavras do Evangelho inclusive — só a dá o Magistério da Igreja. E se é verdade que ninguém pode mudar a palavra de Cristo, é igualmente verdade, e pela mesma razão, que ninguém pode mudar o ensino do Magistérioqui vos audit me audit (Lc X, 16). «Quem vos ouve, a mim ouve; e quem vos rejeita, a mim rejeita; e quem me rejeita, rejeita aquele que me enviou». Absolutamente nada pode ser «reinterpretado» de modo a fugir disso.

A entrevista primeiro tentou lançar dúvidas sobre o registro escriturístico das palavras de Cristo; depois, procurou introduzir uma distinção entre as palavras de Cristo e a interpretação das palavras de Cristo. Tudo vão: nada disso tem lógica dentro do Catolicismo, porque i) a infalibilidade das Escrituras Sagradas nos garante que sabemos, sim, com certeza, o conteúdo do que Cristo disse e ii) a infalibilidade do Sagrado Magistério garante-nos saber, sem possibilidade de erro, o sentido do que Cristo quis dizer.

Resta, por fim, a questão do «discernimento». Acerta o sacerdote ao dizer — e ainda bem que o disse! — que «um verdadeiro discernimento não pode prescindir da doutrina». Repita-se isso quantas vezes forem necessárias: nenhum discernimento pode prescindir da doutrina da Igreja Católica e Apostólica: se o fizer será um falso discernimento! No entanto, ao final, o superior dos jesuítas afirma que o discernimento «pode chegar a conclusões distintas [das] da doutrina». Aqui é preciso ir com calma.

Pode, de ser metafisicamente possível, é claro que pode, porque o discernimento — como uma operação da razão prática — está sujeito ao erro. Agora, pode, de ser moralmente lícito, aí não, não pode, porque o verdadeiro discernimento é aquele que consiste em fazer a vontade de Deus. E a vontade de Deus não pode ser «distinta» do que está expresso na Doutrina que Ele próprio nos transmitiu, é evidente. A doutrina não é um substituto do discernimento como o bem moral não é sucedâneo do livre-arbítrio, mas da mesma forma que o livre-arbítrio só se exerce verdadeiramente na prática do bem, o discernimento só é legítimo estritamente dentro do espaço delimitado pela doutrina. Pecar não é exercitar a liberdade e, do mesmo modo, contrariar os ensinamentos de Deus não é discernir senão confundir.

Não faltou quem quisesse utilizar a entrevista do pe. Arturo Abascal como um subsídio para a interpretação da Amoris Laetitia — como se a Exortação Apostólica não dissesse, logo na primeira linha do célebre capítulo VIII, exatamente o contrário do que defende o pe. Abascal: «toda a ruptura do vínculo matrimonial «é contra a vontade de Deus (…)»» (AL 291)! Não há aqui nada que se «reinterpretar». Permanece válido — e não poderia ser diferente — o ensino católico em todo o seu fulgor: a homem algum é lícito tomar outra esposa, e a mulher nenhuma tomar outro marido, durante a vida do cônjuge verdadeiro. Qualquer «discernimento» possível de ser feito precisa levar isso em consideração, e ignorar esta verdade — sob o argumento de não se saber exatamente as palavras de Cristo, ou de haver dúvidas sobre o seu significado, ou ainda de que não se pode fazer a doutrina substituir a consciência moral, ou de qualquer outro — é servir ao Demônio e não a Deus.

Receber a Liturgia, não reformá-la

Não li ainda o livro do Card. Sarah (grande cardeal!) que, segundo consta, chegou há poucos meses às livrarias do Brasil; mas hoje, no Facebook, tive acesso a uma peça publicitária do livro-entrevista que me chamou a atenção. Traduzo livremente:

Se nós fabricamos a liturgia por nossa própria conta ela se afasta do divino; ela se transforma em um ridículo, vulgar e maçante jogo teatral. Acabamos, assim, com liturgias que se parecem com programas de auditório, com uma festa dominical engraçada para relaxar após uma semana de trabalho cheia das mais variadas preocupações. Uma vez que isso acontece, os fiéis voltam para a casa após a celebração da Eucaristia sem haverem encontrado Deus pessoalmente — ou sem O terem ouvido no mais profundo dos seus corações.

Tenho para mim que esta questão é importante e, a ela, não se costuma dar a devida atenção fora dos ambientes (ditos) tradicionalistas. O cerne do argumento aqui desenhado é o seguinte: os homens vão à Igreja para se relacionar com Deus. Para tanto, é necessário que eles encontrem, na Igreja, algo maior do que eles próprios, algo que eles próprios não seriam capazes de confeccionar com suas próprias mãos. Mas, ora, tornar a Liturgia uma coisa que cada “comunidade” produz — ainda que seja uma “construção coletiva” — é fazer com que ela seja percebida não mais como algo que se recebe (de Deus, do passado ou de um determinado conjunto de pessoas santas), mas como algo que se constrói. E se eu construo a Liturgia, então eu não preciso ir à Igreja: é o corolário mas óbvio aqui, de cuja precisão o esvaziamento de nossas igrejas (mormente no pós-Concílio) dá a prova mais triste e incontestável.

Os homens já se relacionam consigo próprios o tempo inteiro — afinal de contas, a vida secular é exatamente isso. Não se vai à Igreja para fazer, lá, o que mesmo que já se faz no mundo; vai-se para a Igreja, ao contrário, para lá se abrir ao diferente. É aliás esta uma característica muito própria da Religião Cristã: nela se tem não a obra de um grande homem, não o resultado acumulado do progresso da humanidade, nem nada disso, mas o próprio Deus que vem ao encontro da humanidade que, sem esta Vinda, estaria para sempre condenada a nunca O encontrar. É por isso que se vai à Igreja: porque n’Ela Deus vem até nós. E imaginar que Deus poderia vir até nós mediante a virtude de qualquer coisa propriamente nossa não passa de uma superstição ímpia; achar que somos capazes de O invocar mediante determinado conjunto de palavras e gestos inventados por nós é ainda mais insano do que acreditar, por exemplo, que determinada dança é capaz de fazer chover. É bárbaro e primitivo.

A Liturgia só funciona (lembrando, Sacramento é um sinal sensível e eficaz da graça divina) porque Ela nos foi dada: não é obra nossa mas do próprio Cristo, através do Seu Corpo que é a Igreja. Essa verdade, fundamental para um relacionamento sadio com Deus, fica completamente obscurecida quando «nós fabricamos a Liturgia por nossa própria conta»: é o que o Card. Sarah está dizendo. Nós perdemos a capacidade de nos abrir a Deus (lembrando, os Sacramentos agem ex opere operato mas os seus efeitos só se percebem ex opere operantis) se não somos capazes de enxergar, nos gestos e palavras da Santa Missa, mais do que uma simples convenção arbitrariamente definida pelos católicos que nela tomam parte. No limite, como se disse, a Liturgia artificialmente produzida torna desnecessária a própria ida à Igreja.

Penso que o maior problema da questão litúrgica não se encontra na parte objetiva, mas sim na subjetiva; i.e., não na capacidade do rito de conferir a graça, mas sim na de tornar os fiéis propícios a recebê-la. Isto, penso, respeita a Doutrina Católica no que diz respeito à indefectibilidade da Igreja em matéria litúrgica; isso, igualmente, explica a situação de miséria espiritual em que se encontra o catolicismo com o Novus Ordo.

Com uma interessante vantagem. Se a questão é subjetiva e não objetiva, então ela depende das disposições interiores dos que se acercam dos Sagrados Mistérios — e, portanto, a possibilidade de correção orgânica é muito maior. Ora, uma Missa repleta de invencionices locais é sem dúvidas uma coisa muito artificial. Um rito produzido por uma comissão burocrática é artificial também; mas ele só o é dentro de um horizonte temporal muito restrito. Quanto mais se caminha no tempo, mas o Rito de Paulo VI deixa de ser uma novidade para se tornar algo que simplesmente é assim na Igreja — para as novas gerações a Missa simplesmente “sempre foi assim”, é a missa que os seus pais sempre assistiram, dentro de algumas poucas décadas se tornará a missa de que os seus pais e avós sempre participaram e assim sucessivamente. Em algumas gerações a aura da ancestralidade irá reluzir também sobre o Novus Ordo; é simplesmente questão de tempo para que os católicos encontrem, nele, algo que vem de um passado (cada vez mais) remoto da Igreja — e, portanto, algo que é recebido e não confeccionado. O problema apontado pelo Card. Sarah, assim, naturalmente deixa de existir.

É justamente para impedir essa correção orgânica que os assassinos da Liturgia precisam, o tempo inteiro, inventar coisas e mais coisas para atormentar os fiéis que assistem à Missa. Celebrar estritamente o N.O.M. não atende mais à sanha iconoclasta dos inimigos da Igreja, exatamente porque para as novas gerações o N.O.M. é a liturgia tradicional. É por isso que é preciso lhe acrescentar cada vez mais coisas, cada vez mais novidades: para mantê-lo indefinidamente como uma coisa fabricada, sempre construída pela comunidade, nunca recebida da Igreja. As posições do Card. Sarah, assim, não são uma nova intervenção Ottaviani: o alvo dele é a mentalidade de que a Liturgia deva (ou mesmo possa) ser continuamente fabricada, e não um rito específico. E este combate é prévio a qualquer discussão sobre forma ordinária ou extraordinária do Rito Romano. Sem esta concepção, qualquer apostolado litúrgico é vão. Para que qualquer “Reforma da Reforma” possa ser possível, é preciso antes entender — por paradoxal que pareça — que a Liturgia se recebe e não se reforma. Sem isso estaremos apenas recauchutando velhos erros.

Os contraceptivos e a Zika

O grande Paulo VI, na sua conhecida encíclica Humanae Vitae, estabeleceu o seguinte ensinamento lapidar: “[é] de excluir toda a ação que, ou em previsão do ato conjugal, ou durante a sua realização, ou também durante o desenvolvimento das suas conseqüências naturais, se proponha, como fim ou como meio, tornar impossível a procriação” (HV 14). Não satisfeito, antevendo talvez as objeções que porventura lhe pudessem fazer, o Servo de Deus continua assim o seu arrazoado:

Não se podem invocar, como razões válidas, para a justificação dos atos conjugais tornados intencionalmente infecundos, o mal menor (…). Na verdade, se é lícito, algumas vezes, tolerar o mal menor para evitar um mal maior, ou para promover um bem superior, nunca é lícito, nem sequer por razões gravíssimas, fazer o mal, para que daí provenha o bem; isto é, ter como objeto de um ato positivo da vontade aquilo que é intrinsecamente desordenado e, portanto, indigno da pessoa humana, mesmo se for praticado com intenção de salvaguardar ou promover bens individuais, familiares, ou sociais [id. ibid.].

Esta encíclica não diz diretamente que a contracepção é intrinsecamente má. Quem o faz é S. João Paulo II na Veritatis Splendor (n. 80). O que são atos intrinsecamente maus? São aqueles — ainda S. João Paulo II — que são maus “sempre e por si mesmos, ou seja, pelo próprio objecto, independentemente das posteriores intenções de quem age e das circunstâncias” (id. ibid.). Aliás, vale a pena a leitura dos parágrafos desta encíclica que falam sobre o tema: os nn. 79-83 e 95-97 ajudarão a conhecer com mais clareza a posição da Igreja sobre o assunto. Em suma, não é legítimo, “nem sequer por razões gravíssimas”, tornar um ato conjugal intencionalmente infecundo — independente das circunstâncias em que se encontre o agente (e.g. às voltas com um surto de uma moléstia incurável) e das intenções que ele porventura tenha (evitar que um filho nasça gravemente doente, v.g.).

[Existe, talvez, uma discussão teologicamente legítima que se pode fazer a respeito da posição católica contrária à contracepção: é a que indaga se o Magistério versa sobre todo e qualquer ato sexual, em qualquer contexto, ou se fala especificamente a respeito do ato conjugal entre esposos legitimamente casados. Pode-se encontrar aqui uma discussão a este respeito. A argumentação é pertinente porque, em se tratando da fornicação — da prática do ato sexual fora do casamento, entre solteiros — tão desgraçadamente comum nos dias de hoje, não é claro se o uso do preservativo agrava ou não o pecado (que, lembremo-nos, já é mortal). De qualquer maneira, não se discute (obviamente) se existe alguma situação em que o uso dos contraceptivos seja legítimo, mas sim se há alguma que o Magistério não abrangeu. São duas coisas completamente distintas, mas a questão tem a sua relevância prática, quando menos, para responder à acusação estapafúrdia de que a Igreja, condenando a camisinha, é responsável (v.g.) pelos altos índices de gravidez na adolescência. Tal é um completo nonsense (afinal, a Igreja condena os atos sexuais fora do Matrimônio, e não apenas “a camisinha”), contra o qual, por frustrante que seja, o baixo nível do anti-catolicismo contemporâneo obriga-nos por vezes a nos batermos.]

Coletiva do Papa aos jornalistas durante o voo de retorno do México deixou perplexos católicos e não-católicos por conta de uma resposta estranha que Sua Santidade deu a uma pergunta a respeito da Zika, do aborto e da contracepção. Ei-las, pergunta e resposta, na íntegra (grifos da RV):

(Paloma Garcia Ovejero, “Cope”)

Santo Padre, há algumas semanas há muita preocupação em muitos países latino-americanos, mas também na Europa, sobre o vírus “Zika”. O risco maior seria para as mulheres grávidas: há angustia. Algumas autoridades propuseram o aborto, ou de se evitar a gravidez. Neste caso, a Igreja pode levar em consideração o conceito de “entre os males, o menor”?

Papa Francisco: O aborto não é um “mal menor”. É um crime. É descartar um para salvar o outro. É aquilo que a máfia faz, eh? É um crime. É um mal absoluto. Sobre “mal menor”: mas, evitar a gravidez é – falemos em termos de conflito entre o quinto e o sexto Mandamento. Paulo VI, o Grande!, em uma situação difícil, na África, permitiu às religiosas de usar anticoncepcionais par aos casos de violência. Não confundir o mal de evitar a gravidez, sozinho, com o aborto. O aborto não é um problema teológico: é um problema humano, é um problema médico. Mata-se uma pessoa para salvar uma outra – nos melhores dos casos. Ou por conforto, não? Vai contra o Juramento de Hipócrates que os médicos devem fazer. É um mal em si mesmo, mas não é um mal religioso, ao início: não, é um mal humano. Além disso, evidentemente, já que é um mal humano – como todos assassinatos – é condenado. Ao invés, evitar a gravidez não é um mal absoluto: e, em certos casos, como neste, como naquele que mencionei do Beato Paulo VI, era claro. Ainda, eu exortaria os médicos para que façam tudo para encontrar as vacinas contra estes dois mosquitos que trazem este mal: sobre isto se deve trabalhar. Obrigado.

Não há reparos a serem feitos no que diz respeito ao aborto, penso, uma vez que a sua condenação está bastante clara e enfática; prestemos atenção no que concerne à contracepção.

Primeiro, que evitar a gravidez não é um mal absoluto. Verdade. A própria HV citada ensina que, havendo “motivos sérios para distanciar os nascimentos, que derivem ou das condições físicas ou psicológicas dos cônjuges, ou de circunstâncias exteriores” (HV 16), é lícito “regular a natalidade”. Mas, atenção!, que isto não se pode fazer de qualquer modo: o que é lícito é “ter em conta os ritmos naturais imanentes às funções geradoras, para usar do matrimônio só nos períodos infecundos” (id. ibid.). Uma epidemia de Zika é motivo suficientemente grave para espaçar o nascimento dos filhos? Sim, é. Isso significa que, em tais circunstâncias, um casal pode legitimamente recorrer aos “períodos infecundos” para não engravidar.

Segundo, a história de Paulo VI e as freiras. Aqui o negócio fica mais nebuloso; parece que ninguém conseguiu encontrar uma referência primária a este fato. O pe. Z., aliás, afirma, altissonante, que isso é uma mentira e Paulo VI jamais deu permissão alguma para que freiras usassem contraceptivos; houve um artigo, publicado no início da década de 60, onde esta hipótese era aventada, e nada mais. Há referências esparsas a coisas parecidas com isso (por exemplo, o pe. Cullinane afirma, num panfleto, que há um decreto do Santo Ofício com este teor na época de Pio XII), mas nada capaz de dirimir a questão.

Se a materialidade da história é — pra dizer o mínimo — controversa, o seu conteúdo não é mais cediço. Del Greco ensina que é lícito à mulher violentada expulsar do seu corpo o sêmen do estuprador, e que isto se deve considerar como legítima defesa; no entanto, parece que este uso “defensivo” dos anticoncepcionais não tem sido tão pacificamente aceito pelas autoridades vaticanas como dá a entender a entrevista pontifícia. Na década de 90, já sob S. João Paulo II, a Santa Sé proibiu a pílula mesmo para freiras que, missionárias em zona de guerra, corriam risco de estupro. Roma, portanto, non locuta, e esta causa não se pode pretender finita.

Terceiro, por fim, a ilação anticatólica — que, malgrado o Papa não diga com estas exatas palavras, os meios de comunicação do mundo inteiro foram praticamente unânimes em alardear — de que é lícito usar contraceptivos durante o surto de Zika para evitar o nascimento de crianças com microcefalia. Sobre isso, é preciso dizer

i) que a situação das freiras na África aparentemente não guarda semelhança alguma com a de pessoas tendo relações sexuais livres e consentidas em um país da América Latina afligido pela Zika: no primeiro caso há a violência que permite aventar a hipótese da legítima defesa e, no segundo, não;

ii) que, portanto, para que se possa discutir a possibilidade de se usar contraceptivos como no (suposto) caso de Paulo VI, é preciso que se esteja diante de uma situação que lhe seja minimamente análoga — é o que faz o National Catholic Register, ao aventar o exemplo de uma mulher que é constrangida, pelo marido doente de Zika, a ter relações sexuais com ele;

iii) que o Pe. Lombardi, comentando a entrevista, disse que o uso dos contraceptivos só poderia ser objeto de deliberação da consciência em casi di particolare emergenza e gravità — casos de particular emergência e gravidade –, o que parece ir ao encontro do que NCR publicou; por fim,

iv) que independente de tudo isso permanece integralmente válido o ensino tradicional da Igreja, contido no Magistério de — entre outros — Paulo VI e S. João Paulo II, segundo o qual o uso de contraceptivos não é legítimo nem “mesmo se for praticado com intenção de salvaguardar ou promover bens individuais, familiares, ou sociais” (HV).

Evidentemente o aborto é um pecado mais grave que a contracepção; claro que peca mais quem tira a vida de um ser humano inocente do que quem torna um ato sexual intencionalmente infecundo. Esta diferença de gravidade entre os pecados, no entanto, não tem o condão de “justificar” o pecado menos grave, que continua sendo pecado, e pecado grave, é bom lembrar. Nunca é lícito fazer o mal para que dele provenha o bem; tendo lembrado Paulo VI no avião, o Papa Francisco bem que poderia ter-lhe citado esta frase — esta, sim, de cuja autoria não há dúvidas, e cuja doutrina é certa e segura.

Papa Francisco põe a imprensa a serviço de Cristo

A carta que o Papa Francisco enviou recentemente ao Eugenio Scalfari já começa a dar frutos. Foi publicada na edição de hoje do La Repubblica (original aqui, em inglês aqui; em português só encontrei esta tradução do Fratres in Unum) uma entrevista «exclusiva» que o fundador do jornal realizou com o Vigário de Cristo.

Foi o próprio Papa quem o convidou: «mercoledì non posso, lunedì neppure, le andrebbe bene martedì?» “Sim”, respondeu o ateu, «va benissimo». E lá se foram os dois veneráveis anciãos conversar sobre a Fé e sobre os problemas do mundo atual.

Problemas cuja expressão máxima o Papa identifica, logo de saída, com a falta de transcendência do mundo moderno: «si può vivere schiacciati sul presente?» “É possível viver esmagado pelo presente”, sem passado e sem futuro? Aqui o «desemprego» da juventude é mais acídia do que questão trabalhista e, a «solidão» da velhice, mais desespero do que carência emocional. Uma vez que se elimina Deus do mundo, uma vez que o materialismo é erigido como norte da vida humana, os velhos estão encurralados diante de um abismo que conduz ao nada e os jovens não se sentem motivados a trilhar o caminho que conduz a este crepúsculo inglório que eles já hoje enxergam nos seus pais e avós. Os dois extremos são, assim, parte de um só e mesmo problema: se a vida caminha inexoravelmente para a velhice e esta não tem sentido, então o próprio «caminho» não tem sentido. A vida se transforma numa estrada estúpida que conduz a lugar nenhum: é natural que muitos não tenham portanto sequer vontade de a trilhar. Não têm as coisas que dão sentido à vida, «e il guaio è che non li cercano più». “E o problema é que sequer as procuram mais”, como disse o Papa Francisco.

Ele não quer fazer proselitismo: «[o] mundo é cruzado por vias que se aproximam e se separam, mas o importante é que elas levem ao Bem». Grifo: levem, verbo conjugado no subjuntivo, que expressa desejo, dever, e não levam, no presente do indicativo, como se se tratasse já de um fato consumado. No original italiano, «portino», para não deixar dúvidas. É óbvio que as vias não necessariamente conduzem, assim em ato, ao Bem; mas é importante que elas conduzam para Ele. A história de nossas vidas não necessariamente nos há de levar para Deus. Mas, se existe algum Fim Último na História, o que importa é que as nossas histórias concretas conduzam a Ele. É esta a missão da Igreja. É esta a contribuição concreta que Ela pode dar à triste situação poucas linhas atrás delineada.

Para explicá-lo melhor, o Papa parafraseia Sto. Tomás: “Cada um de nós tem uma visão do bem e do mal. Temos que encorajar as pessoas a caminhar em direção ao que elas consideram ser o Bem”. No original italiano: «Noi dobbiamo incitarlo a procedere verso quello che lui pensa sia il Bene». É o mesmíssimo ensinamento que o Aquinate expõe de maneira lapidar na Summa: «hay que decir sin reservas que toda voluntad que está en desacuerdo con la razón, sea ésta recta o errónea, siempre es mala» (I-IIae, q. 19, a. 5, resp.). E se é evidente que Santo Tomás não é um relativista, tampouco o é o Papa Francisco. Ele sabe muito bem que, embora nem sempre desculpe (cf. id. ibid., a.6), a consciência – mesmo errônea – sempre obriga; e portanto é mister incentivar a segui-la. Simplesmente não há outro caminho.

Porque o papel da Igreja obviamente não é obrigar as pessoas a agirem contra a própria consciência, e sim levá-las a uma verdadeira conversão, uma metanóia, uma “mudança de mente”, de consciência, a fim de que façam o que é certo não como uma imposição exterior, mas em harmoniosa obediência ao mais íntimo do seu ser. Para isso precisam encarar a Fé Católica não como um conjunto desconexo de normas e proibições, mas como um encontro com uma Pessoa: Jesus Cristo. E para isso é preciso à Igreja “ir ao encontro” delas, usando uma expressão cara ao Papa Francisco, a fim de que possa mostrar-lhes o Bem a que elas almejam. Para isso é preciso «conhecer um ao outro, ouvir um ao outro e melhorar o nosso conhecimento do mundo ao nosso redor», como ele falou ao Scalfari nesta entrevista, e como já o repetiu tantas outras vezes de outras formas ao longo do seu pontificado.

E a conversa prossegue: Igreja, santos, mística, graça. Alfineta o Sumo Pontífice: «Mesmo o senhor, sem o saber, poderia ser tocado pela graça». O ateu diz que não acredita em alma. «[M]as você tem uma», riposta com maestria o Vigário de Cristo. O ateu sente o chão faltar-lhe aos pés e corta a conversa: «Santidade, o senhor disse que não tem a intenção de tentar me converter e não acho que o senhor conseguiria». E o Papa: «Questo non si sa», “isto não se sabe”, não dá para saber.

O Papa Francisco então pergunta no que crê o velho ateu. Ele responde: «Acredito no Ser, que está no tecido do qual surgem as formas e o corpos». Insiste o Vigário de Cristo: «Mas você pode definir o que você chama de Ser?». E a resposta do Scalfari é digna de ser reproduzida na íntegra, em português e no original italiano, para que se tenha uma noção do quão confusa é a única cosmogonia a que foi capaz de chegar um intelectual ateu após longos 89 anos de vida:

Ser é uma fábrica de energia. Energia caótica, mas indestrutível e caos eterno. As formas emergem da energia quando ela atinge o ponto de explosão. As formas têm as suas próprias leis, os seus campos de magnetismo, os seus elementos químicos, que combinam aleatoriamente, evoluem e eventualmente são extintos, mas a sua energia não é destruída. O homem é provavelmente o único animal dotado de pensamento, ao menos, no nosso planeta e no sistema solar. Disse que ele é guiado por instintos e desejos, mas eu acrescentaria que ele também contém dentro de si uma ressonância, um eco, uma vocação de caos.

[L’Essere è un tessuto di energia. Energia caotica ma indistruttibile e in eterna caoticità. Da quell’energia emergono le forme quando l’energia arriva al punto di esplodere. Le forme hanno le loro leggi, i loro campi magnetici, i loro elementi chimici, che si combinano casualmente, evolvono, infine si spengono ma la loro energia non si distrugge. L’uomo è probabilmente il solo animale dotato di pensiero, almeno in questo nostro pianeta e sistema so-lare. Ho detto è animato da istinti e desideri ma aggiungo che contiene anche dentro di sé una risonanza, un’eco, una vocazione di caos.]

Aqui a entrevista praticamente termina. Diz o Papa, em tom condescendente: «Está certo. Não quero que você me faça um resumo de sua filosofia e o que você me disse é o suficiente». Um pouco antes das afabilidades finais, uma última coisa disse o Papa Francisco:

Demos um passo à frente em nosso diálogo. Observamos que na sociedade e no mundo em que vivemos o egoísmo tem aumentado mais do que o amor pelos outros, e que os homens de boa vontade precisarão trabalhar, cada qual com os seus pontos fortes e experiência, para garantir que o amor aos outros aumente até que seja igual e possivelmente exceda o amor por si mesmo.

Na redação que lhe conferiu o fundador do La Repubblica, este é o clímax da entrevista, o ponto de chegada ao qual ela conduz. E um jornal secular estampando na primeira capa uma reportagem onde se fala de deveres morais, de santos, de mística, de graça, e que termina conclamando as pessoas a se esforçarem por amar mais ao próximo do que a si próprias é uma vitória e tanto do Sumo Pontífice. Pela primeira vez em muito tempo, talvez a primeira vez desde que eu me entendo por gente, um Papa pautou o tom das reportagens sobre ele ao invés de ser pautado por elas. Bravo, bravissimo! Que Deus abençoe o Papa neste terreno pantanoso em que ele se move com tão assombrosa desenvoltura. Que os inimigos dele sejam confundidos e dispersados diante desta Rocha imponente contra a qual não prevalecerão as portas do Inferno. Que, olhando para ele, o mundo creia e se coloque aos pés do Crucificado. A fim de que (re)encontre o caminho. A fim de que seja salvo.

O Papa Francisco e o aborto: a esquizofrenia da grande mídia

Ontem correram o mundo notícias “bombásticas” sobre as críticas que o Papa teria feito à forma como a Igreja transmite a sua Doutrina Moral. Citando uma entrevista do Romano Pontífice a uma revista jesuíta, as matérias que pulularam na internet foram as mais disparatadas possíveis. Exemplo:

Para Papa, Igreja não pode interferir espiritualmente na vida dos gays
– Papa abre Igreja aos gays, aos divorciados e às mulheres que abortam
– Igreja insiste demais em homossexualidade e aborto, diz papa
Papa critica obsessão da igreja por aborto, casamento gay e contracepção
Et cetera, et cetera, et cetera.

As causas mais gerais dessa loucura generalizada se encontram no diálogo de surdos entre a Igreja e a Imprensa que o prof. Carlos Ramalhete apontou com extrema perspicácia ontem mesmo. A leitura do texto dele é recomendadíssima, para que se possam evitar perturbações provocadas pela situação atual e por outras idênticas a ela que já apareceram e sem dúvidas ainda haverão de aparecer enquanto houver jornalismo medíocre no mundo.

Quanto ao caso concreto, é importante dizer quanto segue:

1. A íntegra da entrevista de Sua Santidade pode ser encontrada aqui.

2. A frase que provocou celeuma – sobre não se poder «insistir somente sobre questões ligadas ao aborto, ao casamento homossexual e uso dos métodos contraceptivos» – não se encontra solta no tempo e no espaço, como se o Papa estivesse estabelecendo diretrizes de ação para a Igreja em geral e para todas as situações possíveis. Como se trata de uma entrevista, o Papa Francisco está dando uma resposta para uma pergunta específica, e portanto é óbvio que o alcance de suas palavras deve estar circunscrito ao contexto dela. É evidente que elas não servem para guiar toda e qualquer ação dos católicos, pela simples razão de não ter sido isso o que foi perguntado a Sua Santidade.

3. A pergunta à qual o Papa Francisco responde é a seguinte:

[E]xistem cristãos que vivem em situações não regulares para a Igreja ou, de qualquer modo, em situações complexas, cristãos que, de um modo ou de outro, vivem feridas abertas. Penso nos divorciados recasados, casais homossexuais, outras situações difíceis. Como fazer uma pastoral missionária nestes casos? Em que insistir?

4. O Papa, portanto, não está falando da ação evangelizadora da Igreja simpliciter – e nem muito menos da apologética! -, e sim da «pastoral missionária» a ser feita junto a cristãos específicos – grifo, a cristãos específicos – que sofrem com problemas de ordem moral. O Papa, assim, não está falando do combate contra o Movimento Gay internacional ou contra a Indústria do Aborto, e sim do diálogo com cristãos arrependidos de seus atos. Veja-se:

Penso também na situação de uma mulher que carregou consigo um matrimónio fracassado, no qual chegou a abortar. Depois esta mulher voltou a casar e agora está serena, com cinco filhos. O aborto pesa-lhe muito e está sinceramente arrependida. Gostaria de avançar na vida cristã. O que faz o confessor?

Ora, o que isso tem minimamente a ver com o movimento feminista que pleiteia um “direito” ao assassinato de seres humanos inocentes ou com a Planned Parenthood? Absolutamente nada. Carece totalmente de sentido, portanto, fantasiar que o Papa pretenda banir o movimento pró-vida católico, sacramentar o “casamento” homossexual, abolir a Moral da Igreja ou qualquer outro disparate do tipo.

5. Ainda: não se trata de pretender converter os pecadores sem lhes apontar os seus pecados, e sim de acolher os penitentes que, já arrependidos de suas faltas, buscam sinceramente a graça de Deus; e fazê-lo sem que seja necessário ficar remexendo em feridas passadas dolorosas. A situação concreta que o Papa apresenta, como vimos, é a de uma mulher que no passado abortou e agora está sinceramente arrependida. É óbvio que numa situação dessas (e em outras análogas) o confessor não pode «insistir somente sobre questões ligadas ao aborto, ao casamento homossexual e uso dos métodos contraceptivos». É óbvio que esta mulher precisa sentir-se perdoada por Deus, e não ainda mais atormentada pelo seu pecado passado e do qual já se arrependeu, sem no entanto conseguir se perdoar.

6. Mais: não se trata de deixar de falar de temas morais, mas sim de harmonizá-los com a totalidade do ensino da Igreja. Porque, caso contrário, eles podem parecer regras arbitrárias e sem sentido. O que o Papa diz está corretíssimo: «o anúncio do amor salvífico de Deus precede a obrigação moral e religiosa». E ainda: «A mensagem evangélica não pode limitar-se, portanto, apenas a alguns dos seus aspectos, que, mesmo importantes, sozinhos não manifestam o coração do ensinamento de Jesus». É claro que é assim. Não fosse a Moral radicada na obediência a um Deus que é amor, ela se transformaria em um conjunto de imposições tirânicas e desprovidas de sentido. Não existe Moral sem Deus, e desvincular aquela Deste é um erro que obviamente não pode dar frutos de conversão.

7. Estas palavras do Papa, por fim, que falam por um lado da melhor maneira de acolher cristãos já arrependidos de seus pecados e, por outro, de não apresentar a Moral Católica desvinculada da totalidade da Mensagem Evangélica para não a desacreditar, não mudam em um átimo o dever da Igreja de continuar fazendo incansável guerra contra os promotores de pecados. Pretender que se deva agir com estes últimos da mesma forma que o Papa manda acolher os pecadores arrependidos é um completo nonsense e uma falsificação grosseiríssima das palavras de Sua Santidade.

E a maior prova de que o Papa não tem (e nem poderia ter) a menor intenção de alterar a forma de pregação da Igreja está nas palavras que ele próprio dirigiu hoje (sexta-feira, 20 de setembro, um dia depois da veiculação da entrevista supracitada) aos participantes de um encontro promovido pela Federação Internacional das Associações de Médicos Católicos. O original italiano desse discurso do Papa Francisco está aqui. Uma repercussão em português pode ser encontrada aqui. Desta última, destaco:

O Papa referiu-se esta sexta-feira em termos muito claros ao drama do aborto e ao direito à vida, deixando muito claro que a protecção da vida é “uma verdadeira prioridade do magistério, particularmente no caso da vida indefesa, isto é, os deficientes, os doentes, os nascituros, as crianças, os idosos”.

Numa audiência uma delegação de médicos católicos, Francisco foi mais longe e disse que as crianças que são “condenadas ao aborto” têm “o rosto do Senhor”, tal como os idosos cujo direito à vida não é respeitado.

E é exatamente isto o que está no original: «Per questo l’attenzione alla vita umana nella sua totalità è diventata negli ultimi tempi una vera e propria priorità del Magistero della Chiesa, particolarmente a quella maggiormente indifesa, cioè al disabile, all’ammalato, al nascituro, al bambino, all’anziano, che è la vita più indifesa». “Por isto, a atenção à vida humana na sua totalidade se tornou nos últimos tempos uma verdadeira e própria prioridade do Magistério da Igreja, particularmente àquela mais indefesa, isto é, ao inválido, ao doente, ao nascituro, à criança, ao ancião – que são as vidas mais indefesas”. E ele ainda vai mais longe:

O terceiro aspecto é um mandato: sede testemunhos e difusores desta “cultura da vida”. O vosso ser católico comporta uma responsabilidade maior: antes de tudo com relação a vós mesmos, pelo empenho de coerência com a vocação cristã; e depois diante da cultura contemporânea, para contribuir a reconhecer na vida humana sua dimensão transcendente, marca [impronta] da obra criadora de Deus, desde o primeiro instante de sua concepção. Este é um empenho da nova evangelização que muitas vezes exige andar contra a corrente, pessoalmente [pagando di persona].

E termina:

Nunca deixem de rezar ao Senhor e à Virgem Maria para terem sempre a força de cumprir bem o trabalho de vocês, testemunhando com coragem – com coragem! Hoje se exige coragem! -, testemunhando com coragem o “Evangelho da Vida”. Muito obrigado!

Não se trata de “deixar de lado” a pregação moral da Igreja, e sim de saber que esta é uma «prioridade do Magistério». Não se trata de “falar menos” nestes assuntos, e sim do «mandato» de agirmos «contra a corrente», «testemunhando com coragem o Evangelho da Vida». Ora, isso é rigorosamente o oposto do que se alardeou ontem na mídia irresponsável!

E o castigo para a leviandade da imprensa é a contradição, que chega às raias da esquizofrenia; ontem diziam que o Papa criticara a «obsessão da Igreja com o aborto», hoje anunciaram que o Papa disse ser «a defesa da vida uma verdadeira prioridade do Magistério». E continuarão dizendo ora uma coisa e ora o seu contrário, mesmo de um dia para o outro, porque a preocupação de certa mídia sensacionalista não é (e nem nunca foi) com a verdade dos fatos ou com a coerência do seu discurso, mas tão-somente com o “novo”, com o “sensacional”, com o “bombástico”. Esta é a função desta mídia. Engana-se quem pensa que o objetivo dela é informar alguém de alguma coisa.

Do nosso lado, enganar-nos-emos ainda mais terrivelmente se lhe prestarmos ouvidos. Confudir-nos-emos e nos perderemos, porque a missão dela é confundir e dispersar. Não caiamos nesta armadilha tão tosca e pueril! Os nossos olhos devem estar fitos no Eterno, e não nas inconstâncias esquizofrênicas dos meios de comunicação.

CBN entrevista Carlos Ramalhete

A polêmica envolvendo os bárbaros que querem a cabeça do Carlos Ramalhete continua. Hoje foi a vez da CBN Curitiba divulgar o evento anti-Ramalhete organizado no Facebook e fazer ao vivo uma entrevista com o autor da coluna mais odiada das redes sociais revolucionárias.

O “Fora Carlos Ramalhete: Preconceito na Gazeta do Povo” é um evento de ódio dogmático e intransigente que foi criado na própria quinta-feira em que a coluna do professor Carlos foi publicada. Tem por objetivo declarado “pedir a retirada deste elemento” (sic) dos quadros da Gazeta do Povo; para isso, está marcando um encontro (ou sei-lá-o-quê) de dia inteiro em Curitiba, no próximo dia 30 de setembro. Das mais de 30.000 pessoas que foram convidadas, três mil e poucas (até o momento) disseram que iriam. Foi este o evento original onde se publicou o primeiro abaixo-assinado pela demissão do Ramalhete, no qual os delirantes intolerantes soltaram a patacoada de que os jornais são “concessão pública” (sic) e, por conta disso, exigem que a Gazeta do Povo “apresente uma retratação pública, e que a coluna do Sr. Carlos Ramalhete seja encerrada”. Puro delírio totalitário: televisão é concessão pública, mas a mídia impressa não. Em sua sanha persecutória cega, os que querem calar a voz do prof. Carlos meteram feio os pés pelas mãos.

A entrevista com o professor Carlos pode ser ouvida no site da CBN (ou aqui, em .mp3 para download). Dentre as coisas muito bem ditas por ele a despeito da patente má vontade do entrevistador, eu destaco:

  • A questão não é se o matrimônio gay é feliz ou não é feliz, ou existe ou não existe: a questão é botar uma criança na ponta de lança de uma luta que não é a luta dela.
  • O Estado está avançando muito além dos seus limites – inclusive de maneira impopular, por isso que isso tá sendo feito só por tribunais, cartórios, nunca por representanes eleitos da população: porque a maior parte da população não concorda com esse tipo de coisa – ao ficar tentando desmontar a família tradicional, tentando impôr como se fosse exatamente equivalente qualquer tipo de união.
  • Olha, eu não acho que o Estado deva organizar a sociedade, eu acho que o Estado deva reconhecer como a sociedade se organiza. A sociedade se organiza naturalmente. (…) As uniões, tanto uniões de vida em comum, quanto uniões (pra voltar ao tema) religiosas, quer dizer, as pessoas que se agrupam em denominações religiosas, tudo isso existe: e é isso que gera a ordem da sociedade. Ao Estado compete manter esta ordem, ao Estado compete impedir que haja violência contra quem quer que seja: violência contra a maioria silenciosa que aceita preceitos religiosos, no Brasil em geral cristãos, ou a violência contra os homossexuais, ou a violência de qualquer tipo. O Estado está aí justamente para impedir que esta ordem se desfaça, não pra tentar construir uma ordem nova.

Oferecemos, mais uma vez, o nosso apoio e solidariedade ao professor Carlos. E se você ainda não o fez, assine (e divulgue) agora o abaixo-assinado “em favor da liberdade de expressão do prof. Carlos Ramalhete”. Vamos desmascarar o hipócrita discurso de ódio dos que só sabem se fazer de vítimas clamando por tolerância mas, ao primeiro sinal de discordância, põem as garras de fora e buscam calar na marra o seu interlocutor. Já basta deste inverno estéril no qual querem transformar o Brasil à força de truculência ideológica. Que floresçam as flores, pois já é tempo. Força, prof. Carlos! Nós estamos com você.

Elba Ramalho: “Foi pelo amor de Nossa Senhora que eu fui resgatada do peso de ter feito um aborto”

Vale a pena conhecer esta entrevista da Elba Ramalho à ACI Digital, onde ela fala da sua Fé Católica e do seu trabalho na defesa da vida – por conta do qual a cantora tem inclusive recebido ameaças de grupos feministas radicais.

É possível obter mais informações na matéria da ACI Digital. «Eu conheci a palavra Deus, esperar, confiar, acreditar, desde a infância naquele lugar árido, seco, de natureza cruel, mas de uma beleza também muito grande. Minha cidade se chama Conceição, a minha padroeira se chamava Nossa Senhora da Conceição, e Ela era nosso farol e nosso guia. Eu cresci seguindo a procissão de Nossa Senhora da Conceição, eu cresci coroando a santa, virava anjinho e coroava a santa naquelas festas de dezembro, de 8 de dezembro».

A agência católica de notícias promete a divulgação da íntegra da entrevista ainda hoje, dia 30 de julho, à tarde. Vamos aguardar.

Revista In Guardia: 5ª Edição

Aviso, com um pouco de atraso, que já foi publicada (desde o início do mês passado) a quinta edição da Revista In Guardia. Segundo divulgação do próprio site da revista, «[n]essa edição temos a entrevista com o José Nivaldo Cordeiro que nos falou muito sobre temas variados da política nacional e ainda de alguns temas legislativos em voga. A outra entrevista ficou por conta de um belo bate-papo com Dom Antônio Keller». Para acessá-la basta clicar no link acima (ou aqui, para lê-la online diretamente).

É com alegria que eu vejo a revista crescendo e adquirindo maior qualidade a cada edição. Trata-se de um trabalho coordenado entre diversos escritores católicos dos mais variados lugares do Brasil, reunidos nesta iniciativa de oferecer uma revista de formação católica com assuntos de interesse aos internautas brasileiros. Vocês que passam por aqui não deixem de prestigiar a revista acessando-a e recomendando-a aos seus conhecidos. E quaisquer comentários que desejem fazer sobre ela, sintam-se à vontade: o nosso desejo é trabalhar para melhor servi-los.

Entrevista com o Cel. Paes de Lira

O site “Rainha dos Apóstolos” informa que irá entrevistar hoje (29/03) à noite o cel. Paes de Lira. A entrevista será transmitida ao vivo pela Web Radio “Rainha dos Apóstolos” a partir da 21h00. O tema: as ameaças contra a vida e a família no Brasil contemporâneo.

Provavelmente a maior parte de nós já conhecemos estes assuntos; nem por isso, contudo, eles se tornam menos importantes. Assistam e divulguem este programa! É importante que os brasileiros tomem consciência do que está acontecendo com a nossa pátria. Esta é uma luta da qual nenhum de nós tem o direito de se furtar.

Sinais da decadência

Recebi uma notícia “bombástica” este final de semana, cuja manchete dizia: “Sandy defende casamento homossexual, aborto e se diz contrária ao celibato”. O estopim de tudo isso foi uma entrevista que a garota deu recentemente ao jornal “O GLOBO”, onde ela revela as suas posições “polêmicas”.

Numa lista de internet da qual participo, alguém – comentando o fato – citou um livro do Mario Ferreira dos Santos. De acordo com o filósofo, estamos diante de um sinal da decadência de um povo quando este passa a dar ouvidos a artistas e atletas. E talvez o mais constrangedor aqui seja o fato de que nem precisaríamos ser filósofos de reconhecida envergadura intelectual para constatarmos esta verdade elementar.

Afinal de contas, quem é a Sandy? Lembro-me dela cantando “Maria Chiquinha” quando eu era criança; depois lembro-me da repercussão que houve quando ela declarou ser ainda virgem. Depois (um dia desses, aliás) foi a vez dela fazer um comentário embaraçoso sobre sodomia e prazer (!) e, agora, a sua língua rotatória se volta contra valores caros à Igreja Católica.

Tudo aqui é vergonhoso: desde a imprensa que se prostitui para produzir uma pauta com semelhante [ausência de] conteúdo, até a garota que se acha gabaritada para papagaiar em público suas opiniões levianas sobre estes temas morais e chegando até às pessoas que lerão esta notícia e levarão a sério as declarações clichês da Sandy, tomando-a talvez – de alguma maneira – por formadora de opinião.

Eu não vou nem comentar o absurdo que é a Sandy abrir a boca para se dizer “contra o celibato”, como se o celibato tivesse ainda que remotamente alguma coisa a ver com ela ou como se as pessoas tivessem o direito de ser “contra” as escolhas de vida dos outros e que não lhes dizem respeito. Mas vou deixar registrada a estupidez proferida com relação ao aborto, que se encontra na entrevista já citada:

ABORTO: “Aborto, sob o ponto de vista jurídico, é crime. Eu defendo a descriminalização, principalmente quando a gravidez representar risco para a mulher ou para o bebê.”

Entenderam? Matar um bebê é crime, mas ela defende que isso possa ser feito quando a gravidez representar risco para o bebê! Ou seja, se o bebê estiver em risco, a brilhante “solução” proposta pela ex-intérprete de Maria Chiquinha é matá-lo, certamente porque o risco cessa quando se realiza e uma vez que o bebê já esteja morto não estará mais em risco (!) e todos estarão felizes e satisfeitos! Este raciocínio faz sentido para alguém? No entanto, é exatamente este relincho que ganha destaque na grande mídia. É para repetir esta espécie de chavões que a Sandy aparvoa-se toda, sem perceber o papelão que está fazendo.

Dar ouvidos a este tipo de “opiniões” é um sinal de decadência; mas claro que é! E talvez seja um sinal de decadência ainda maior que um filósofo precise sentenciar o óbvio ululante e, mesmo assim, seja para todos os efeitos tratado como uma voz esgoelando-se no deserto. Mesmo assim, todos continuam agindo como se ninguém tivesse dito nada.