Carta aos bispos

23 de agosto de 2013,
Festa de São Lino, Papa,
e de Santa Rosa de Lima,  primeira santa latino-americana

Excelentíssimos senhores bispos,

O Papa Francisco tem instigado os católicos a promoverem uma «cultura do encontro», que ele entende como contrária a esta cultura «eficientista» e «do descarte» que hoje está aí (cf. Homilia do Papa Francisco na Catedral de São Sebastião, Rio de Janeiro, Sábado, 27 de Julho de 2013). Para uma verdadeira cultura do encontro, diz o Papa, é mister anunciar com coragem a Fé Católica, com «a certeza humilde e feliz de quem foi encontrado, alcançado e transformado pela Verdade que é Cristo, e não pode deixar de anunciá-la» (cf. id. ibid.). Para a mais perfeita promoção dessa cultura, portanto, em obediência à Doutrina do Evangelho e com os olhos fitos em Cristo, Bom Pastor, queremos expôr aos senhores bispos as considerações a seguir.

Consideramos que a máxima “Ecclesia semper reformanda” recentemente lembrada pelo Papa Francisco tem muito a nos dizer, a nós católicos do Terceiro Milênio, e é por estrita fidelidade a este tão importante princípio que precisamos enfrentar corajosamente todas as tentações eclesiais modernas. Em particular, é urgente enfrentar a tentação de retrocedermos a modelos fracassados de Igreja que, no passado, tanto mal provocaram à Esposa de Cristo e a tantas almas pelas quais o Divino Redentor derramou o Seu Preciosíssimo Sangue.

Diante do novo horizonte eclesial que à nossa frente se nos descortina, julgamos da mais alta necessidade que não desperdicemos este tempo favorável que a Divina Providência nos concedeu com retrocessos teológicos e pastorais que, à semelhança do antigo inimigo do gênero humano, rondam as nossas Igrejas Particulares procurando a quem devorar. Temos a consciência de que uma verdadeira «cultura do encontro» deve conduzir os homens e mulheres de hoje a um encontro com Cristo, sem o qual todos os nossos esforços serão vãos e enganosos.

Confiantes nas palavras do Divino Salvador que mandou aos Seus Discípulos anunciarem “de cima dos telhados” a Boa Nova que Ele lhes confiara, nós queremos fazer chegar aos senhores bispos essas nossas reflexões, a fim de que o ar puro do Evangelho da Luz possa vencer os miasmas pestilentos das catacumbas onde velhas raposas que perderam o bonde da história conspiram contra a Igreja Santa de Deus.

1. O Ministério dos bispos à luz do Concílio Vaticano II

Os bispos, enquanto sucessores dos Apóstolos, detêm em união com o Romano Pontífice o «supremo e pleno poder sobre toda a Igreja» (Christus Dominus, 4). Nestes nossos tempos em que o relativismo cresce assustadoramente a ponto de um sem-número de homens e mulheres não serem capazes de encontrar nenhuma referência espiritual segura em meio a um mundo em constantes e céleres transformações, julgamos da mais alta importância que a Unidade da Igreja de Cristo resplandeça com tanto mais vigor e solidez quanto mais fluidos e caóticos forem os valores atualmente em voga.

Esta Unidade da Igreja se manifesta na união afetiva e efetiva de cada Igreja Particular com a Sé Apostólica, e de cada Bispo individual com o Bispo de Roma. A unidade da Igreja depende da unidade do Episcopado, e essa exigência é tão grande que não pode existir verdadeira Igreja Católica onde falte aquela comunhão com a Sé de Roma, princípio e fundamento da unidade. A esse respeito, o Concílio Vaticano II assim nos ensina: «para que o mesmo episcopado fosse uno e indiviso, [Cristo] colocou o bem-aventurado Pedro à frente dos outros Apóstolos e nele instituiu o princípio e fundamento perpétuo e visível da unidade de fé e comunhão» (Lumen Gentium, 18).

Observamos com apreensão uma certa tendência à alforria em algumas Igrejas Particulares, que imaginam ser condição necessária à realização da catolicidade da Igreja sacudir dos ombros o jugo do Romano Pontífice. Os que procedem dessa maneira, além de atentarem gravemente contra a Unidade da Igreja de Cristo, esquecem-se de que foi o próprio Cristo quem disse aos Apóstolos: «quem Vos ouve é a Mim que ouve, e quem Vos rejeita é a Mim que rejeita». Enganar-se-iam os purpurados que orgulhosamente pensassem que a gravidade dessas palavras pesa somente sobre os cristãos leigos e não sobre cada um deles igualmente. Afinal, antes de serem pastores pelo Sacramento da Ordem, são também e principalmente cristãos pelo Batismo, aos quais Cristo chama à obediência da Fé. Também os bispos devem encarnar o discipulado de Cristo, e nada mais estranho aos discípulos de Nosso Senhor do que a insurreição contra os fundamentos da Igreja de Deus. De fato, o bispo, «a quem é confiada uma igreja particular, apascenta em nome do Senhor as suas ovelhas, sob a autoridade do Sumo Pontífice» (CD, 11) e jamais à revelia desta autoridade suprema.

Ao invés, portanto, de perderem tempo com semelhantes quimeras, que sejam os bispos verdadeiros discípulos para, obedientes Àquele que Se fez obediente até a morte, aprenderem d’Ele que é manso e humilde de coração. E, em obediência ao Concílio Vaticano II, esforcem-se por serem missionários zelosos pela pureza da Fé do povo a eles confiados, segundo o que ensina o já citado decreto Christus Dominus: que se interessem «particularmente por aquelas regiões em que não foi ainda anunciada a palavra de Deus ou em que, sobretudo por causa da escassez de sacerdotes, os fiéis correm perigo de se afastarem da prática dos mandamentos e até de perderem a fé» (CD 6). A prática dos mandamentos inclui a submissão filial devida às autoridades da Igreja, da qual nem mesmo os próprios bispos estão dispensados. Sejam, portanto, eles próprios os primeiros a darem este testemunho profético tão necessário no mundo de hoje.

2. A colegialidade necessária no século XXI

O Primado do Bispo de Roma é instituição de direito divino; a este respeito, quis o Vaticano II propôr novamente à crença dos fiéis esta santa «doutrina sobre a instituição perpétua, alcance e natureza do sagrado primado do Pontífice romano e do seu magistério infalível» (LG 18).

O Colégio dos Bispos, como aquele Colégio Apostólico original, só existe verdadeiramente em estreita união com o fundamento da unidade da Igreja: São Pedro e seus sucessores. Ainda sobre este assunto, quis o Concílio expressar-se deste modo claro e inequívoco: «o colégio ou corpo episcopal não tem autoridade a não ser em união com o Romano Pontífice, sucessor de Pedro» (LG 22). Queiram, assim, os bispos, em obediência ao Concílio Vaticano II, esforçarem-se por fomentar esta sagrada «união com o Romano Pontífice» da qual depende em absoluto a autoridade episcopal que eles detêm. Mais uma vez, sejam os bispos generosos em darem constantes e efetivas mostras da sua submissão ao Bispo de Roma, afastando mesmo toda aparência de uma “colegialidade” entendida como independente ou mesmo contrária aos interesses da Sé Apostólica.

Conscientes de que somos aquelas «pedras vivas» das quais é constituída a Igreja de Deus, temos a íntima convicção de que a necessária renovação da Igreja passa necessariamente pela renovação das almas individuais. Não existem “estruturas eclesiásticas” passíveis de serem reformadas sem a conversão do coração dos membros da Igreja – não só leigos, mas também bispos – no sentido de obedecerem cada vez mais perfeitamente aos ditames do Divino Mestre, principalmente àqueles que são mais contrários ao espírito dos tempos. E entre os aspectos da vida eclesial que hoje mais necessitam de um retorno às origens do Cristianismo, parece-nos urgente a redescoberta e vivência daquele antigo adágio dos Santos Padres: «ubi Petrus ibi Ecclesia».

Que se esforcem, portanto, os bispos para exercerem responsavelmente a sua colegialidade, exercendo o poder que lhes compete por direito divino «juntamente com o Romano Pontífice, sua cabeça, e nunca sem a cabeça» (CD 4), pois só dessa maneira se dará a tão almejada e necessária renovação da Igreja Católica.

3. O cinquentenário do Concílio Vaticano II

O Papa Francisco nos ensinou recentemente que o Vaticano II «foi um Concílio sobre a fé, por nos ter convidado a repor, no centro da nossa vida eclesial e pessoal, o primado de Deus em Cristo» (Lumen Fidei, 6). A fim de aproveitar a celebração do cinquentenário do Vaticano II para fomentar a frutuosa redescoberta dos tesouros que este Concílio legou à Igreja, gostaríamos de propôr aos senhores bispos três pontos conciliares que, em nossa opinião, precisam ser mais generosamente aplicados em nossas Igrejas Particulares.

Primeiro, sobre a Fé, que o Concílio «fez brilhar (…) no âmbito da experiência humana» (LF 6), gostaríamos de recordar, segundo as linhas mestras do Concílio, que «ao inculcar expressamente a necessidade da fé e do Baptismo (cfr. Mc. 16,16; Jo. 3,15), [Cristo] confirmou simultaneamente a necessidade da Igreja, para a qual os homens entram pela porta do Baptismo» (LG 14). De acordo com esta importante Constituição Dogmática, assim, Fé e comunhão eclesial não são duas realidades antagônicas ou mesmo independentes entre si, mas muito pelo contrário: é da absoluta necessidade da Fé «sem a qual é impossível agradar a Deus» que decorre a necessidade de se pertencer à Igreja de Cristo, «necessária para a salvação» (LG 14).

Que se esforcem, portanto, os bispos para anunciar o Evangelho da Verdade, conscientes de que alargar as fronteiras da Fé equivale a alargar os limites da Igreja Católica e Apostólica e, simultaneamente, colocar-se fora da comunhão com esta Igreja é o mesmo que atraiçoar a Fé que Cristo nos legou, pois «a unidade da fé é a unidade da Igreja» (LF 48). A este respeito, são muito incisivas as recentes palavras do Papa Francisco em sua já citada primeira carta encíclica: segundo ele nos ensina, a Fé «tem uma forma necessariamente eclesial, é professada partindo do corpo de Cristo, como comunhão concreta dos crentes» (LF 22); e ainda, «danificar a fé significa danificar a comunhão com o Senhor» (LF 48). Que tenham portanto os bispos sempre a firme consciência de que só é possível confessar a Fé em Cristo em comunhão com a Igreja Católica, e que anunciar a Fé é simultaneamente convidar o ouvinte a tornar-se «participante do caminho da Igreja, peregrina na história rumo à perfeição» (LF 22).

Segundo, sobre a Liturgia, «que edifica os que estão na Igreja em templo santo no Senhor, (…) [que] robustece de modo admirável as suas energias para pregar Cristo e mostra a Igreja aos que estão fora, como sinal erguido entre as nações, para reunir à sua sombra os filhos de Deus dispersos, até que haja um só rebanho e um só pastor» (Sacrosantum Concilium, 2), queremos meditar nessas palavras proféticas do Concílio: a Liturgia deve ser um «sinal erguido entre as nações» pela Santa Igreja, a fim de «reunir à sua sombra os filhos de Deus dispersos».

A Sagrada Liturgia, assim, transcende as comunidades individuais onde ela se realiza, pois contém em si o papel de ser um sinal entre as nações, convidando os que não crêem a se reunirem à sombra da Igreja de Cristo. Por esta razão, a catolicidade da Liturgia rejeita todos os particularismos aos quais por vezes as Igrejas Particulares são tentadas a reduzi-la. O nexo entre Liturgia e Fé – expresso no conhecido adágio «lex orandi, lex credendi» – deve resplandecer em cada celebração da Eucaristia, a fim de que ela seja «também abundante fonte de instrução para o povo fiel» (SC 33).

É com profunda consternação que encontramos não raras vezes celebrações eucarísticas totalmente desfiguradas por elementos estranhos à tradição litúrgica da Igreja, a ponto de sua identidade católica tornar-se irreconhecível sob uma profusão de símbolos que nada dizem a respeito da Fé. A este respeito, recordamos aquele (tão atual) lamento do Bem-Aventurado João Paulo II: «Como não manifestar profunda mágoa por tudo isto? A Eucaristia é um dom demasiado grande para suportar ambiguidades e reduções» (Ecclesia de Eucharistia, 10).

Que os bispos velem para que as celebrações eucarísticas em suas Igrejas Particulares façam sempre refulgir a Fé Católica e a comunhão com a Igreja Universal, sem as quais a Liturgia perde a sua razão de ser. Sejam solícitos em atender aquele «veemente apelo» do Papa João Paulo II «para que as normas litúrgicas sejam observadas, com grande fidelidade, na celebração eucarística» (EE, 52), pois este mistério «é demasiado grande para que alguém possa permitir-se de tratá-lo a seu livre arbítrio, não respeitando o seu carácter sagrado nem a sua dimensão universal» (id. ibid.).

Por fim, em terceiro lugar, sobre o papel dos leigos, queremos recordar que é sua «vocação própria (…) procurar o Reino de Deus tratando das realidades temporais e ordenando-as segundo Deus» (LG 31). Queremos, destarte, suplicar aos senhores bispos que não os queiram transformar em sucedâneos de sacerdotes, consumindo assim os seus esforços em um papel que não lhes compete realizar. Pois a maneira própria do leigo santificar o mundo não é assumindo papéis na Sagrada Liturgia ou tratando de assuntos da burocracia eclesiástica, mas sim realizando em Deus «os seus trabalhos, orações e empreendimentos apostólicos, a vida conjugal e familiar, o trabalho de cada dia, o descanso do espírito e do corpo» (LG 34).

Sejam, assim, os bispos diligentes em fomentar o apostolado dos leigos não «ad intra», mas «ad extra»: que eles não sejam somente cristãos de paróquia, mas que possam espalhar o bom odor de Cristo em meio à sociedade, pois o Vaticano II nos ensina que «devem os leigos sanear as estruturas e condições do mundo, se elas porventura propendem a levar ao pecado, de tal modo que todas se conformem às normas da justiça e antes ajudem ao exercício das virtudes do que o estorvem» (LG 36). Desta maneira, «o campo, isto é, o mundo ficará mais preparado para a semente da palavra divina e abrir-se-ão à Igreja mais amplamente as portas para introduzir no mundo a mensagem da paz» (id. ibid.). A importância deste trabalho é demasiado grande para ser obscurecida por concepções equivocadas do que significa ser católico no mundo atual. Que os bispos, constituídos por Deus para cuidar do povo fiel a eles confiado, sejam sempre solícitos em ajudar os leigos a encontrarem o seu lugar na Igreja, que absolutamente não se confunde com aquele dos ministros ordenados.

Queiram estas considerações provocar nos senhores bispos uma reflexão sobre os desafios que a Igreja Católica enfrenta no Brasil no século XXI. Fazemos votos de que elas possam contribuir para aquela sadia renovação da Igreja recentemente pedida pelo Papa Francisco, e da qual a nossa pátria tem particular necessidade nos dias de hoje. E suplicamos à Bem-Aventurada Virgem Maria Aparecida, Mãe de Deus e da Igreja, que possa iluminar sempre o episcopado brasileiro, para a glória do Seu Filho e para o bem das almas das quais Ela é Rainha e Senhora.

– Jorge Ferraz, leigo católico

A maléfica “Igreja-poder”

Leio um artigo do Boff – recentemente publicado – no qual ele tece severas  críticas àquilo que chama de “Igreja-poder”, que ele pinta como se fosse o diabo e que – não obstante e nada surpreendentemente – identifica-se com a Igreja fundada por Nosso Senhor.

Como eu conversava ontem com um amigo, o que espanta não é que Boff seja um herege. O que causa verdadeiro estupor é que ele se recuse a enxergar aquilo mesmo que se encontra debaixo do seu nariz, que ele tem debaixo dos olhos, o que ele próprio escreve. Isso, sim, é impressionante. Passemos a vista pelo texto do Boff: para ele, esta Igreja-poder “se impôs através dos tempos”.

De que tempos? Boff responde: 1) desde que Ela Se considera a única Igreja verdadeira, com exclusão da demais; 2) desde que Ela impede os hereges de escreverem e pregarem; 3) desde que se respeitam e veneram as autoridades eclesiásticas; 4) desde que se canonizam [i.e., são propostas como modelos] as pessoas que têm “sentire cum Ecclesia” (a expressão – obviamente não em latim – é do texto do Boff), que obedecem, que são submissas; 5) desde que há cristãos (sim, porque tirando a petição de princípio do ponto quinto, o que sobra é isso mesmo); e 6) desde que a Igreja tem ritos e símbolos. Ou seja: desde sempre! A dar crédito aos “motivos” elencados pelo Boff para a perpetuação desta “Igreja-poder”, chega-se à inevitável conclusão que esta estrutura maligna perdura realmente há muito tempo: desde pelo menos Nosso Senhor. É facílimo ver.

Quanto ao primeiro ponto: “Todo aquele que caminha sem rumo e não permanece na doutrina de Cristo, não tem Deus. Quem permanece na doutrina, este possui o Pai e o Filho. Se alguém vier a vós sem trazer esta doutrina, não o recebais em vossa casa, nem o saudeis. Porque quem o saúda toma parte em suas obras más” (IIJo 9-11).

Quanto ao segundo: “Com efeito, há muitos insubmissos, charlatães e sedutores, principalmente entre os da circuncisão. É necessário tapar-lhes a boca, porque transtornam famílias inteiras, ensinando o que não convém” (Tt 1, 9-10a) ; e ainda: “Se alguém não obedecer ao que ordenamos por esta carta, notai-o e, para que ele se envergonhe, deixai de ter familiaridade com ele” (IITs 3, 14).

Quanto ao terceiro: “Cuidai de vós mesmos e de todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos constituiu bispos, para pastorear a Igreja de Deus” (At 20, 28a); ver também o parágrafo seguinte.

Quanto ao quarto: “Sede submissos e obedecei aos que vos guiam (pois eles velam por vossas almas e delas devem dar conta)” (Hb 13, 17). E ainda:  “Quem vos ouve, a mim ouve; e quem vos rejeita, a mim rejeita; e quem me rejeita, rejeita aquele que me enviou” (Lc 10, 16).

Quanto ao quinto, dado que – ao contrário do que o próprio Boff prega – a constituição hierárquica da Igreja (que ele chama de “Igreja-poder”) é querida assim por Deus e estabelecida assim desde Cristo (como se depreende da leitura não-seletiva do Novo Testamento), segue-se que todos os “que acima de tudo apreciam a ordem, a lei e o princípio de autoridade em detrimento da lógica complexa da vida que tem surpresas e exige tolerância e adaptações” (nas palavras do Boff) são, descontada a retórica, precisamente os que amam a Igreja nos moldes em que Cristo A instituiu – i.e., os cristãos.

Quanto ao sexto: “Assim, todas as vezes que comeis desse pão e bebeis desse cálice lembrais a morte do Senhor, até que venha” (ICor 11, 26).

E tudo isto sem ser necessário nem mesmo recorrer à patrística. Todos os pontos levantados pelo Boff para explicar a “auto-reprodução” da “Igreja-poder” são elementos essenciais da Igreja Católica, já encontrados desde o século I, dentro mesmo das Escrituras Sagradas. Como, então, o ex-franciscano tem a capacidade de dizer que isto “[e]ra o que Jesus exatamente não queria”? Onde está, então, o que Jesus Cristo queria, se até mesmo dentro do Novo Testamento nós encontramos tudo aquilo que o Boff vive a condenar?

Não é impressionante que o Boff seja um herege. Impressionante é que ele consiga demonstrar – sem o perceber! – que aquilo que ele chama de “instituição-Igreja (…) com características autoritárias, absolutistas e excludentes” seja exatamente a instituição que encontramos no Novo Testamento. E, mesmo assim, não perceba o próprio erro, e continue insistindo que é mais fácil a Igreja Católica ter passado dois mil anos errando do que ele próprio ser capaz de errar.

Duas sobre Dom Demétrio Valentini

1. Dom Demétrio Valentini faz balanço da Assembleia da CNBB. “Dom Demétrio tem se tornado referência constante do blog, uma referência às avessas, por representar o ideário da ‘libertação’ e por defendê-lo em seus artigos publicados com frequência no site da CNBB. Gosto de ler o que o bispo escreve. Em geral, ele é direto, claro e dá mostras de bom humor. Na medida em que sua posição perde força entre os bispos, prova-se também corajoso”.

2. Dom Demétrio Valentini sabe posar como poucos. “Dito isto, o que dizer de um bispo que resolve distribuir o rotulamento de ‘fundamentalista’ a quem não concorda com sua visão torta de mundo? Pois não é exatamente isto que fez D. Demétrio Valentini, bispo da Diocese de Jales/SP? Em declaração ao site de notícias Folha Online, o prelado não economizou no rotulamento de ‘fundamentalista’  a seus irmãos de episcopado. Disse ele que teme que de Brasília, onde os bispos do Brasil estão reunidos para a 48a. Assembléia Geral da CNBB, saia um ‘documento marcado pelo fundamentalismo'”.

E rezemos pelo nosso episcopado. Bons rumores à vista

Aniversário do Papa!

Hoje o Santo Padre, o Papa Bento XVI, completa 83 anos de vida. Feliz aniversário, Santidade! Oremus pro Pontifice nostro Benedicto; Dominus conservet eum, et vivificet eum, et beatum faciat eum in terra, et non tradat eum in animam inimicorum eius. Longos anos de vida, ad majorem Dei gloriam, é o meu sincero desejo no dia hoje.

Presente de aniversário: novena pelo Papa, a começar hoje, proposta pelo pe. Mateus Maria, FMDJ. A novena termina no dia 24 de abril, quando celebramos o quinto aniversário da eleição do Papa Bento XVI à Cátedra de Pedro.

Outro presente de aniversário, mas este indireto, é o ódio dos maus: Carta abierta a los obispos católicos de todo el mundo, por Hans Küng. Tem uma tradução para o português aqui. Et iterum dico: oremus pro Pontifice nostro Benedicto. Preferir a fidelidade radical à “política de boa vizinhança”, em detrimento inclusive da própria imagem, é o distintivo dos verdadeiros discípulos de Nosso Senhor.

E hoje é dia de São Benedito José Labre. Que o “mendigo de Cristo” interceda por nós.

Gregório Magno, por Bento XVI

Talvez o texto mais orgânico de Gregório Magno seja a Regra pastoral, escrita nos primeiros anos de Pontificado. Nela, Gregório propõe-se traçar a figura do Bispo ideal, mestre e guia da sua grei. Com esta finalidade, ele explica a gravidade do ofício de Pastor da Igreja e os deveres que ele comporta: portanto, aqueles que não foram chamados para esta tarefa, não a busquem com superficialidade; por outro lado, aqueles que porventura a assumiram sem a devida reflexão, sintam nascer na sua alma uma necessária trepidação. Retomando um tema preferido, ele afirma que o Bispo é em primeiro lugar o “pregador” por excelência; como tal, antes de tudo ele deve servir de exemplo para os outros, de tal forma que o seu comportamento possa constituir um ponto de referência para todos. Além disso, uma acção pastoral eficaz requer que ele conheça os destinatários e adapte as suas intervenções à situação de cada um: Gregório passa a explicar as várias categorias de fiéis, com anotações intensas e pontuais, que podem justificar a avaliação de quem viu nesta obra também um tratado de psicologia. Daqui, compreende-se que ele conhecia realmente o seu rebanho e falava de tudo com as pessoas da sua época e da sua cidade.

Todavia, o grande Pontífice insiste sobre o dever que o Pastor tem de reconhecer todos os dias a sua própria miséria de maneira que o orgulho não torne vão, diante dos olhos do Juiz supremo, o bem levado a cabo. Por isso, o capítulo final da Regra é dedicado à humildade: “Quando nos regozijamos por termos alcançado muitas virtudes, é bom reflectirmos sobre as nossas insuficiências e humilhar-nos: em vez de considerarmos o bem realizado, temos que pensar naquilo que deixamos de fazer”. Todas estas preciosas indicações demonstram o altíssimo conceito que São Gregório tem acerca do cuidado das almas, por ele definido como “ars artium”, a arte das artes. A Regra teve tanto êxito que, algo bastante raro, foi depressa traduzida em grego e anglo-saxão.

Bento XVI, Audiência Geral da 4ª-feira, 04 de junho de 2008 (grifos meus).