As Verdades Eternas estão aí: ouçamo-las!

Trago aqui algumas recentes palavras do Papa Francisco, nas suas homilias na capela da Domus Sanctae Marthae. Ponho no original italiano (com a respectiva tradução logo abaixo) porque gostei sobremaneira das expressões originais; «ma, guardi» e «se ne fanno tanti», entre outras, são de uma sonoridade deliciosa. Quase imagino o Papa falando.

Não lembro quem foi que me disse ter ficado encantado com o Papa Francisco logo ao final da «Urbi et Orbi» do Habemus Papam, quando ele disse «buona notte e buon riposo». Digam o que disserem a respeito desta informalidade que não raro parece uma intimidade excessiva: há muitas pessoas carentes no mundo, as quais espero serem capazes de melhor assimilar o Evangelho de Cristo nestes termos do que no (inobstante tão necessário) latim eclesiástico das fórmulas solenes.

Veja-se, à guisa de exemplo, o discurso sobre supostas aparições marianas abaixo. A gente pode gastar um bocado de latim para justificar o porquê de certas aparições precisarem ser tratadas no mínimo com reservas; mas um meme do Vigário de Cristo dizendo que a SSma. Virgem não é chefe dos Correios tem um impacto incomparavelmente maior. A gente pode escrever tratados e mais tratados sobre a ditadura do relativismo, mas nada se compara a Sua Santidade chamando de adúlteros os que decidem fazer o que todo mundo faz. Podemos falar diuturnamente contra a maldição do aborto, mas muitas pessoas não vão assimilar o nosso discurso até ouvirem o Sumo Pontífice falar em leis modernas que protegem sacrifícios humanos. Obrigado, Santo Padre!

Sem mais delongas, ouçamos o Papa Francisco:

«Ma, guardi, la Madonna è Madre! E ama tutti noi. Ma non è un capo ufficio della posta, per inviare messaggi tutti i giorni. [Q]ueste novità allontanano dal Vangelo, allontanano dallo Spirito Santo, allontanano dalla pace e dalla sapienza, dalla gloria di Dio, dalla bellezza di Dio» (14 de novembro de 2013).

[«Mas, olhem, Nossa Senhora é Mãe! E nos ama a todos. Mas [Ela] não é chefe dos correios para mandar mensagens todos os dias. Esta novidade nos afasta do Evangelho, afasta-nos do Espírito Santo, afasta-nos da paz e da sabedoria, da glória de Deus, da beleza de Deus.»]

– «Questa gente — ha proseguito il Papa tornando al racconto biblico — ha trattato con il re, ha negoziato. Ma non ha negoziato abitudini… ha negoziato la fedeltà al Dio sempre fedele. E questo si chiama apostasia. I profeti, in riferimento alla fedeltà, la chiamano adulterio, un popolo adultero. Gesù lo dice: “generazione adultera e malvagia” che negozia una cosa essenziale al proprio essere, la fedeltà al Signore» […] Farà bene anche a noi, ha suggerito il Pontefice, pensare a quanto raccontato dal libro dei Maccabei, a quanto è accaduto, passo dopo passo, se decidiamo di seguire quel «progressismo adolescenziale» e fare quello che fanno tutti (18 de novembro de 2013).

[«Esta gente – prosseguiu o papa voltando ao relato bíblico [dos Macabeus] – tratou com o rei, negociou [com ele]. Mas não negociou [meros] costumes… negociou a fidelidade ao Deus sempre fiel! E isto se chama apostasia. Os profetas, referindo-se à [falta de] fidelidade, chamaram-na de adultério, um povo adúltero. Jesus o disse: “geração adúltera e malvada” que negocia uma coisa essencial ao próprio ser: a fidelidade ao Senhor» […] Far-nos-á bem, disse o Pontífice, meditarmos naquilo que é contado no livro dos Macabeus: nisto que ocorre, pouco a pouco, se decidimos seguir aquele «progressismo adolescente» e fazer o que todo mundo faz.»]

– «Voi pensate che oggi non si fanno sacrifici umani? Se ne fanno tanti, tanti. E ci sono delle leggi che li proteggono» (id. ibid.).

[«Pensais que hoje não se fazem sacrifícios humanos? Fazem-se tantos, tantos…! E há leis que os protegem!»]

São palavras duras e verdadeiras. Ouçamo-las! Depois, não poderemos dizer em nossa defesa que não sabíamos. Não poderemos nos justificar dizendo que pensávamos ser o novo Papa diferente dos anteriores. As Verdades Eternas estão aí; e, em um certo sentido, de um modo até mais acessível do que estavam nos lábios dos seus predecessores.

As melhores homilias do Papa Francisco

O Papa Francisco tem feito homilias sem sombra de dúvidas excelentes. Mas, na minha opinião, as suas melhores homilias são as que não se encontram disponíveis no site do Vaticano. Explico: o Papa tem o hábito (que eu absolutamente não sei dizer se era compartilhado pelos seus predecessores) de improvisar breves homilias em todas as missas que ele celebra, mesmo durante os dias de semana, mesmo diante de um grupo pequeno de pessoas. Como elas são feitas de improviso, os órgãos de imprensa da Santa Sé não as recebem previamente e, portanto, não podem divulgar-lhes o conteúdo pelos canais de comunicação oficiais da Igreja. Temos acesso a fragmentos delas somente mediante as testemunhas auriculares dessas celebrações, às quais por vezes os órgãos de imprensa conseguem ter acesso.

Trago três exemplos disso que estou falando; nenhuma das datas abaixo consta no calendário (oficial) das atividades do Santo Padre [p.s.: a homilia do dia 23 de abril está disponível aqui; além disso, o site do Vaticano está disponibilizando uma compilação das meditazioni do Papa Francisco, «a cura de L’Osservatore Romano», que é o que de mais próximo temos dos “textos oficiais” dessas homilias do Papa].

06 de abril de 2013, via Sandro Magister, com tradução do Ecclesia Una, que eu já mencionei en passant aqui: «A fé não se negocia. Esta tentação sempre existiu na história do povo de Deus: cortar um pedaço da fé, ainda que não seja muito. Mas a fé é assim, tal como a recitamos no Credo. É necessário superar a tentação de fazer o que todos fazem, não ser tão, tão rígidos, porque precisamente daí começa um caminho que acaba na apostasia. De fato, quando começamos a destroçar a fé, a negociá-la, a vendê-la à melhor oferta, começamos o caminho da apostasia, da não fidelidade ao Senhor».

23 de abril de 2013, via Agência Ecclesia: «[E]ncontrar Jesus fora da Igreja não é possível (…) [O Papa Paulo VI dizia ser] uma dicotomia absurda querer viver com Jesus sem a Igreja, seguir Jesus fora da Igreja, amar Jesus sem a Igreja. (…) Não se pode acreditar em Jesus sem a Igreja, di-lo o próprio Jesus».

22 de abril de 2013, via Avvenire, com tradução livre minha: «Qualquer um de vocês poderia dizer: ‘Padre, o senhor é um fundamentalista!’. Não, simplesmente é isto que Jesus disse: ‘Eu sou a Porta’, ‘Eu sou o Caminho’ para nos dar a vida. Simplesmente. É uma porta bela, uma porta de amor, é uma porta que não nos engana, não é falsa. Sempre disse a Verdade. Há talvez caminhos mais fáceis, mas são enganosos, não são verdadeiros: são falsos. Somente Jesus é o Caminho».

São somente três exemplos que porventura chegaram-me ao conhecimento; quantos outros não existem, sobre os quais eu não fico sabendo nada? E essas sentenças são bastante significativas para compreendermos o pensamento do Papa: ora, uma homilia oficial é aconselhada, redigida (por vezes através de ghost writers…), revisada, criticada, enviada para o Papa, traduzida, etc.; enquanto que nessas homilias espontâneas nós temos o Papa Francisco falando totalmente por conta própria, de improviso, sem influências (boas ou más) de ninguém!

Por isso, faço coro a este pedido do Rorate Caeli: alguém deveria transcrever essas homilias e colocá-las (sob uma seção menos formal da página do Papa, que fosse) no site do Vaticano! Não se compreende que bem pode advir da divulgação apócrifa das palavras de Sua Santidade, nem tampouco que mal causaria a veiculação integral desses ensinamentos tão belos (e tão atuais) do Bispo de Roma.

P.S.: Atendendo aos nossos pedidos, eis as «Meditazioni del Santo Padre Francesco nelle Messe quotidiane celebrate nella cappella della Domus Sanctae Marthae».

Fé adulta e obediência

Trecho da Homilia de Sua Santidade o Papa Bento XVI nas Primeiras Vésperas da Solenidade dos Apóstolos São Pedro e São Paulo, na tradução feita pelo Marcelo Moura Coelho em seu blog:

Nas últimas décadas a expressão “fé adulta” se tornou um slogan difundido. Na maioria [das vezes] é usado em relação à atitude daqueles que não prestam mais atenção ao que a Igreja e Seus Pastores dizem, em outras palavras, àqueles que escolhem por si mesmos em que crer e deixar de crer, numa espécie de “self-service da fé”. Expressar-se contra o Magistério da Igreja é mostrado como uma espécie de “coragem”, quando na verdade não é preciso muita coragem, porque quem faz isso pode estar certo [de] que receberá apoio público.

Ao contrário, é preciso coragem para aderir à fé da Igreja mesmo se ela contradiz a “ordem” do mundo contemporâneo. Paulo chama esse não-conformismo de “fé adulta”. Para ele, seguir os ventos do momento e as correntes do tempo é um comportamento infantil.

Excelente. Que Deus abençoe o Santo Padre!