Debate(ndo-se)

Ontem, ocorreu em Recife o primeiro debate entre os “prefeituráveis”, na Universidade Católica de Pernambuco. Um amigo – de férias e desocupado – esteve presente e, hoje, brindou-nos com o texto que reproduzo abaixo, para divertimento nosso e desespero quanto ao próximo pleito. As citações feitas não são literais mas, segundo o autor do texto, “traduzem o que eles realmente disseram”. Aproveitem.

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Debate(ndo-se)

– por Gustavo Souza

Candidatos debatendo-se: foi o que se viu ontem no primeiro debate oficial entre os candidatos à Prefeitura da Cidade do Recife. O evento marcou (realmente, marcou) a abertura da 6ª Semana de Integração Universidade Católica & Sociedade (SIUCS).

Vou tentar relatar os melhores momentos do debate. Mas, que o leitor não se iluda: os “melhores” momentos não são necessariamente “bons”. Avante!

O auditório do Bloco G da Unicap estava lotado. Eram 17h. Quando já não cabia mais ninguém (nem em pé!) a coordenação da SIUCS aconselhou que as pessoas que estivessem chegando se deslocassem para um outro auditório – no mesmo andar – de onde o debate poderia ser assistido através de um telão. Acontece que o outro auditório, na verdade não era auditório: O telão transmitia apenas as imagens, sem som!

No meio das considerações iniciais – em que cada candidato dispunha de 5 minutos – surge uma mulher que se aproxima da bancada em que se encontram os prefeituráveis e começa a fazer gestos obscenos. Tenta partir para cima dos candidatos, fala alto, e… onde estão os seguranças? Guardando a perigosíssima porta de entrada. Fico me perguntando por onde será que aquela mulher passou para entrar?…Esta senhora interrompeu o debate por mais ou menos 1 hora! A cada nova incursão dela os presentes riam, vaiavam, xingavam, e – os mais sensatos – tentavam silenciar a multidão gritando: SILÊNCIO!!! Ou, então: psssiiiiiiiiiiiuuuuuuu!!! Ou ainda: CALA A BOCA!!!

Nisso, um homem, ou ébrio ou louco, começou a pular por cima das cadeiras onde as pessoas estavam sentadas. Mais uma vez, risos, vaias, e interrupção do debate.

Afora isso, havia, nas paredes, faixas de um movimento que luta pela “liberdade” dos animais não-humanos. Algo como: não matem as baratas, deixem os ratos correrem livremente no seu quintal, não ponham coleira nos cachorros (mesmo que seja um pitty bull); Coma apenas vegetal, pois não é justo que animais inocentes e indefesos morram para matar sua fome! Convenhamos, salada de alface é muito mais gostoso que bife! Só me inquieta uma coisa: como se sabe que o grau de crueldade na morte de uma vaca é maior que o do assassinato de uma alface?

Afogados num mar de perguntas capciosas, e pressionados pelos olhares desconfiados dos estudantes, restava aos candidatos apenas debater-se. Para não sucumbir, agarravam-se – como náufragos desesperados – às mesmas bóias de sempre: passado sofrido, marcado normalmente por uma infância pobre e uma adolescência permeada de perseguições e torturas na época da ditadura. Pobrezinhos: merecem um voto de confiança!

Alguns corajosos jornalistas tentaram [se] debater com os honoráveis prefeituráveis da nossa Veneza Brasileira. Foi algo mais ou menos assim:

Você, Cadoca, nas últimas eleições presidenciais você apoiou o então governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Hoje, você faz parte da base do governo e conta com o apoio do presidente Lula. Como você acha que o eleitor vai entender essa sua mudança?

– Veja bem, tudo foi feito com muita transparência. Eu tirei uma camisa, vesti outra, mas continuo fiel aos meus ideais.

Você, João da Costa, acha que o Orçamento Participativo é realmente participativo?

Sim, 2% do orçamento da prefeitura é discutido com o povo.

E as obras da Avenida Conde da Boa Vista foram discutidas com o povo?

– Veja, bem, essa parte estava dentro dos outros 98%…

Você, Kátia Teles, está preparada para governar Recife?

– Sim. Tenho grande experiência na luta sindical.

E o que a senhora acha que é preciso fazer para mudar o cenário da nossa cidade?

Precisamos primeiro mudar o mundo, para, DEPOIS, mudar Recife.

Candidata, a senhora afirmou que nenhum candidato aqui presente era capaz de governar democraticamente e, ao mesmo tempo obedecer à Lei de Responsabilidade Fiscal. Como a senhora pretende enfrentar esse desafio?

– É simples: vou desobedecer a Lei. Viva a Anarquia!

Você, Raul Henry, criticou a obra da Avenida Boa Viagem. Mas, onde é que o senhor mora mesmo?

– Sim, é um absurdo gastar 50 Milhões na orla de Boa Viagem. Mas que eu adorei, adorei!

Você, Numeriano, quais são suas propostas para a cidade do Recife?

– Ah, eu tenho um sonho para esta cidade. E, nesse sonho, o 1% de intenções de voto que as pesquisas me dão, podem se transformar em 2%, e depois em 10%, em 20%, em 30%… Enfim, o meu sonho pode se transformar no sonho de muitas pessoas.

Você Mendonça, o que pretende fazer, quanto à questão da saúde na cidade de Recife?

As condições do sistema de saúde da cidade do Recife são realmente precárias, lamentáveis. Faltam médicos especialistas, como: ginecologistas, neurologistas, cardiologistas, ortopedistas, pediatras, etc. E faltam também remédios. Aliás, remédio é qualidade de vida! Nós precisamos ampliar a verba destinada a aquisição de medicação hospitalar. Outro problema grande do sistema de saúde dessa nossa querida cidade, problema que atual gestão não enfrentou e, conseqüentemente, não resolveu, é a falta de ambulâncias… Candidato, falta um minuto para o senhor concluir sua fala. Como dizia, pretendo construir 3 policlínicas, credenciar 200 médicos, comprar 25 ambulâncias… Candidato, tempo esgotado. Pretendo ainda, ampliar as atribuições dos agentes comunitários de saúde, para que elas auxiliem na erradicação de doenças como a rubéola, a dengue. Candidato, por favor, seu tempo esgotou! Concluo, quando eu for prefeito dessa cidade… Argh! Time is over, candidato!

E você, Edílson, quais são suas propostas?

Bem, ao lado da ex-senadora Heloísa Helena, e de todos nós que fazemos o PSOL, pretendemos implantar em Recife uma nova maneira de governar. Uma maneira que não atende aos interesses dos imperialistas burgueses, que não atende à pressões do FMI, e que não se vende às grandes potências opressoras da classe trabalhadora como os Estados Unidos, blá, blá, blá , blá , blá…

Enfim, “nada de novo sob o sol”. Quem foi ao debate assistiu a um show de populismo. Quem foi ao debate pode se deliciar com um banquete de argumentos non sense, com uma coletânea de episódios toscos. Na corrida eleitoreira vale tudo! Ainda bem que eu tinha um bote e não precisei me debater…