“Meu pudor está acima do dinheiro e do meu sonho”

Bastante educativa esta história de uma jovem cantora italiana! Ela tem dezoito anos e fora escalada para o papel principal em um musical de David Zard, «tal vez el mayor productor musical italiano». María Luce Gamboni seria a disputadíssima Julieta no spettacolo  «Romeo & Giulietta – Ama e cambia il mondo». Seria. Porque declinou o convite.

O motivo? Havia no espetáculo uma cena de semi-nudez. Em um dado momento, Julieta teria que se apresentar usando uma roupa transparente. Rapidamente a jovem María Luce chamou o produtor e lhe disse para procurar outra protagonista. Não quis sequer negociar, como se estivesse profundamente ofendida com a proposta indecorosa que lhe fora feita.

[P.S.: na verdade, ao que parece ela tentou negociar sim. O original em italiano diz que [l]a protagonista mancata ha chiesto alla regia di potere almeno mettersi le mutande e il reggiseno. Ma la risposta è stata perentoria: o nuda o chiamiamo qualcun altro. E lei ha detto: chiamate qualcun altro, «perché al denaro e al mio sogno ho preferito il mio pudore». Embora «mancata ha chiesto» possa realmente significar “não pediu” (e esta seja a primeira tradução do Google Translate), o verbo mancare significa também “não conseguir”, “não obter êxito” – e este sentido traduz melhor o período, que ficaria assim: a protagonista não obteve êxito em pedir ao diretor que a deixasse ao menos colocar [por baixo] a calcinha e o sutiã. A resposta [do diretor] foi peremptória: ou nua, ou chamamos outra. E ela [então] disse: [pois] chame outra, «porque ao dinheiro e ao meu sonho eu prefiro o meu pudor». O pessoal da Infovaticana melou a tradução e inverteu o sentido da frase ao meter um «[l]a protagonista principal no pidió al director poder usar por lo menos alguna ropa interior» na matéria. Traduttore, traditore: mais uma vez o adágio popular mostra por que existe. Em todo caso, é verdade que María Luce, diante da intransigência do diretor, abriu mão do papel e o mandou procurar outra cantora.]

«Por encima del dinero y de mi sueño yo prefiero mi pudor», disse a jovem. E disse ainda uma outra verdade bastante esquecida nestes tempos em que a imodéstia dos espetáculos já se transformou em coisa tão banal e corriqueira que ninguém se preocupa em questionar mais: «el canto es una cosa, despojarse de la ropa, es otra».

A história me lembrou um outro desabafo que eu publiquei certa feita aqui no Deus lo Vult!, há mais de cinco anos já. Foi quando o brasileiro Pedro Cardoso disse que os atores eram obrigados a fazer pornografia. As palavras – atualíssimas – dele foram as seguintes:

O personagem é justamente algo que o ator veste. Ao despir-se do figurino, o ator despe-se também do personagem, e resta ele mesmo, apenas ele e sua nudez pessoal e intransferível.

E isto não é exatamente o ponto fulcral da queixa de María Luce? Ora, cantar é uma coisa, e ficar nua é outra coisa completamente diferente! A voz de uma jovem cantora não é melhor apreciada quando ela tira a roupa, muito pelo contrário. O mais provável é que a atenção seja atraída para o corpo desnudo e, diante dele, a beleza do canto passe despercebida. E a jovem italiana quer ser apreciada pelo talento que tem, e não pelos dotes físicos com os quais a natureza a agraciou.

Porque isto não deixa de ser uma forma de apelação desnecessária, de coisificação da mulher – vista como um objeto sexual -, de sacrifício da arte nos altares da pornografia “soft”, de erotismo descabido, de vulgaridade dispensável. Ora, o que importa o corpo da jovem Giulietta – ou, melhor dizendo, o corpo da jovem cantora que a está representando, uma vez que despir-se do figurino é despir-se também do personagem – para a peça? Trata-se de um musical, e não de um ensaio fotográfico erótico!

É triste se deparar com um meio artístico tão erotizado assim. Mas é ao mesmo tempo reconfortante ver que uma jovem ainda é capaz de perceber o descabimento de certas exigências artísticas. E ainda é capaz de dizer “não”. E de nos ensinar que há coisas mais importantes do que o sucesso. De nos ensinar que a realização pessoal não passa necessariamente pela fama, mas sim pela coerência com os próprios valores. Que o «pudor» – esta palavra que está tão fora de moda… – ainda é mais valioso do que o dinheiro.

Fim da Playboy em Portugal

Ontem eu vi que a Playboy portuguesa publicou uma edição com uma capa blasfema, em “homenagem” a José Saramago, mostrando Nosso Senhor ao lado de uma mulher nua. Agressão absurda e gratuita aos católicos, ofensa – indiscutível – ao sentimento religioso de milhões e milhões de pessoas no mundo afora.

[Também ontem, na mesma hora, não pude evitar o comentário: por que esses cretinos não têm cojones para fazer uma capa “bombástica” dessas com uma foto de Maomé? Por que só ofendem os católicos?]

Hoje, acabei de ler uma notícia que, se for realmente verdade, louvado seja Deus. A Playboy encerrou a edição portuguesa por causa da capa cretina. Na notícia:

Em declarações ao site norte-americano Gawker, Theresa Hennessy, vice-presidente da Playboy Entertainment, não poupou críticas à capa que pretende homenagear o livro ‘Evangelho Segundo Jesus Cristo’: “Não vimos nem aprovámos a capa e restantes fotografias do número de Julho da ‘Playboy Portugal’. Trata-se de uma violação chocante das nossas normas e não teria sido permitida a publicação se tivessemos conhecimento antecipado. Devido a esta e a outras questões com os editores portugueses, estamos prestes a rescindir o nosso acordo.”

Queira Deus que seja verdade. Seria menos pornografia e menos blasfêmias em Portugal.

Mais sobre a pornografia infantil estatal

O Carlos me enviou – obrigado mais uma vez, caríssimo! – um vídeo do youtube contendo o livro pornográfico de deseducação sexual infantil que está sendo imposto a crianças a partir de 7 anos, (pelo menos) aqui em Recife, contra a vontade expressa dos seus pais e responsáveis. Vou poupar os leitores da transcrição de algumas passagens. O vídeo segue abaixo, para quem tiver estômago:

E reproduzo o comentário que constava no email por mim recebido, para deixar claro sobre qual problema estamos falando e evitar que o assunto seja novamente desviado:

Pais e mães não são obrigados a aceitar que agentes do Estado venham dizer a seus filhos o que é “a verdade” em matéria de moral. A Convenção Americana de Direitos Humanos — que, no Brasil, tem hierarquia superior à própria lei ordinária — prevê expressamente que “Os pais têm direito a que seus filhos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com suas próprias convicções.”

O Estado brasileiro, em qualquer de suas esferas, não pode impedir ou inviabilizar o exercício desse direito.

Governo impõe pornografia infantil

Agradeço ao Carlos por me ter chamado à atenção para o que acontece aqui mesmo, em Pernambuco, em Recife, divulgado nos jornais locais e que eu ainda não tinha visto: “Livro sobre sexualidade gera polêmica”. O livro é “voltado para crianças de 7 a 10 anos de idade”, e gerou protestos de “pais e responsáveis por alunos de escolas da Zona Norte do Recife”. O motivo? “As páginas, que entre outras coisas mostram um menino e uma menina se masturbando, deixaram até professoras de cabelo em pé”.

Estamos falando de crianças! Por que as pessoas encaram com tamanha naturalidade esta perversão da infância? Chamo a atenção para alguns detalhes que podem passar despercebidos a uma leitura mais superficial.

Primeiro, é importante notar que os pais das crianças não gostaram. Eles reclamaram. O problema está na “elite” que se julga bem pensante e, nos seus laboratórios de reinvenção da natureza, adora fazer de cobaia os filhos dos outros. Não foi um pai que comprou este livro para os seus filhos, foram os responsáveis pela escola que o fizeram. Agora, vejam como é interessante (ou, melhor dizendo, trágico): o Estado obriga os pais a matricularem os seus filhos nas escolas e, nestas, expõe as crianças a esta pornografia desnecessária, inadequada e deletéria. Um menino chegou a dizer que eles teriam “aula de safadeza”. Trata-se de uma deseducação, de uma deformação moral imposta pelo Estado às crianças e à revelia dos pais. Como é possível que tão poucas pessoas se indignem contra isso?

Outra coisa. Ah, mas – disseram – “o livro é aprovado pelos ministérios da Educação e da Saúde e (…) o conteúdo didático foi elogiado pelo educador Paulo Freire, que escreve na contracapa da atual edição”. Sinceramente, dá vontade de soltar um palavrão. E daí que a porcaria do livro foi aprovada pela porcaria do Ministério da Saúde? E daí que Paulo Freire elogiou o excremento? Aliás, dado o histórico dos ministérios petistas, estranho seria se alguma coisa de boa viesse da lavra dos ministérios da Educação e da Saúde. Acaso isso é argumento? E os mesmos palhaços que – mutatis mutandis – zombam dos católicos por acatarmos os ensinamentos da Igreja – alegadamente – sem senso crítico, querem justificar o uso de material pornográfico para crianças por causa meramente da palavra de Temporão e de Paulo Freire!

E os que promovem este estupro moral infantil são os mesmos hipócritas que, depois, vêm rasgar as vestes cinicamente acusando os padres pedófilos de corromperem a infância. Quem é que corrompe a infância? É a Igreja, por causa de meia dúzia de padres pedófilos que fazem exatamente o contrário do que Ela prega? Ou são os responsáveis por esta depravação moral institucionalizada e obrigatória desde a mais tenra infância, sob as bênçãos do Ministério da Saúde e de Paulo Freire?

E ainda vem um psicólogo infantil dizer que esta obra “é muito séria e adequada a pré-adolescentes”… Contra a vontade expressa dos pais, contra o bom senso, contra a moral e os bons costumes, o que vale é a força da imposição estatal e os argumentos de “psicólogos infantis” e educadores do naipe de Paulo Freire. Lamentável. Que a Virgem Aparecida proteja as nossas crianças – porque, se dependermos da boa-vontade do Governo, só iremos de mal a pior.

A imprensa e a internet

Há um “ditado” em informática que diz o seguinte: para fazer uma besteira (o termo não é bem esse, mas preciso torná-lo adequado ao blog), é suficiente uma pessoa. Agora, para fazer uma grande besteira, é preciso uma pessoa e um computador.

A brincadeira me veio à mente quando eu pensava na Reforma Protestante e nos desastrosos efeitos que ela provocou na Europa do século XVI. Eu pensava no papel determinante que a invenção da imprensa desempenhou na propagação das heresias de Martinho Lutero e, por conseguinte, nas proporções que teve a Reforma. E disse para mim mesmo, parafraseando o ditado acima: para se fazer um herege, basta um monge bêbado sem vocação. Para lançar a Alemanha inteira na heresia, no entanto, só com um monge bêbado sem vocação e uma máquina tipográfica.

Não que a invenção da imprensa tenha sido uma coisa ruim. Facilitou o acesso a inestimáveis tesouros culturais antigos, propiciou o aumento da produção intelectual, popularizou escritos aos quais, de outra maneira, dificilmente as pessoas teriam acesso. No entanto, isso não é “um bem em si mesmo”. Depende do que foi feito com os tesouros antigos, do tipo de produção intelectual que foi feita, de qual literatura foi popularizada.

No caso da imprensa (cujo primeiro trabalho foi, ironicamente, a Bíblia de Gutemberg), ela foi terrivelmente usada por Martinho Lutero para espalhar os seus escritos e, assim, angariar adeptos para as suas heresias. Posso cometer alguma injustiça por ignorância histórica, mas tenho a impressão de que, olhando para trás, a partir da Reforma Protestante, os maus frutos da invenção da imprensa são mais visíveis do que os seus bons frutos.

A internet hoje provoca uma revolução análoga àquela que a imprensa provocou outrora. E é possível fazer também paráfrases do ditado ao qual eu me referia no início do post. Uma das que vejo mais claramente é no que se refere à castidade. Para levar material pornográfico para um jovem, um canalha é suficiente; para massificar a pornografia entre a juventude, é preciso um canalha e a internet.

Precisamos dar um melhor uso à internet do que este. E é com muita alegria que eu vejo o potencial positivo que a internet tem, nos sites de defesa da Fé Católica, nas listas de discussão por email, na possibilidade de contato entre pessoas que, de outra maneira, provavelmente jamais se conheceriam. É importante trabalhar e explorar essa potencialidade da rede mundial de computadores. Para, quem sabe, fazermos uma paráfrase enfim positiva do ditado da informática: uma que revele a importância da internet na manutenção e na promoção da Fé Católica durante a terrível crise do final do segundo milênio.

Filmes em hotel

Semana passada, no hotel, passando os canais da televisão, vi alguns filmes – melhor dizendo, trechos de filmes – que tive vontade de comentar. São, todos, uns mais, outros menos, imorais; mas revelavam algumas coisas verdadeiras de maneira tão nua e crua que merecem ser citados.

Na Globo, passava “Os Sonhadores”. Achei que seria um filme histórico sobre a Revolta Estudantil, mas me enganei: o filme era repleto de cenas explícitas de sexo explícito (a redundância é proposital e necessária), de uma maneira que não me recordo de ter visto no cinema ou na televisão. Escandaloso, mas tem uma cena muito interessante: é quando um dos personagens principais diz a outro (em cuja casa – abastada… – ele está hospedado) que, se ele realmente acreditasse nos livros que lê e nos discursos políticos que faz, estaria nas ruas de Paris e não trancado no apartamento, bebendo os vinhos caros do pai…

Há um outro filme que eu não sei o nome, mas lembro-me da cena. Dois adolescentes, um garoto e uma garota, conversando sobre o seu relacionamento. O rapaz reclama que gostaria de sair com a menina para o cinema, para uma sorveteria, para um baile. A menina, rapidamente, rebate: “isso deveria ter sido antes do sexo, não?”. O rapaz cala-se, pois não tem como contra-argumentar. E eu penso em quantos casos assim não existem nos dias de hoje…

Mas o melhor é um filme que eu assisti quase todo, embora não lembre o nome. A sacada é genial, talvez alguém conheça: trata-se de um “documentário” produzido por um extraterrestre sobre a reprodução humana. O filme mostra a voz do ET explicando todos os passos da vida afetiva de um casal do século XX: o encontro na boate, o telefone perdido, o reencontro, o sexo com contraceptivos, a gravidez acidental, a tentativa de aborto, o casamento. E o hilário é que o extraterrestre explica tudo isso sob uma ótica de reprodução da espécie e, portanto, não consegue entender nada: é impagável ver a narração explicar que, quando se encontram na boate, a mulher está tentando convencer o homem que é fértil e vai lhe dar muitos filhos, enquanto o homem tenta fazer a mulher acreditar que ele é forte e vai proteger e sustentar ela e a prole. Quando os dois viajam para um final de semana nas montanhas e esquecem os contraceptivos, ouvir o ET empolgado dizendo: “ahhh, conception! Finally” é indescritível. Muito provavelmente o roteirista não quis fazer uma crítica aos relacionamentos humanos modernos, mas terminou conseguindo. Ainda bem.

Ainda mais erotismo

Uma leitora deixou um – em parte – pertinente comentário aqui no Deus lo Vult! ontem à noite. Entre outras coisas, ela disse:

[E]xiste tanto incentivo ao sexo heterossexual em tanto canto no mundo. Já olhou a letra dessas músicas de funk, hip hop, brega, forró? Internet, televisão, tudo hoje incentiva o sexo heterossexual.

É uma triste verdade, infelizmente incontestável. Para ficar em um só exemplo de tantos que poderiam ser citados, recebi dia desses de um amigo o link para este blog, comentando um vídeo que é um perfeito exemplo desta cultura erótica que permeia os nossos dias. Acredito que o vídeo foi feito em uma escola, já que as pessoas estão aparentemente fardadas. Eu não saberia precisar a idade dos meninos e meninas que aparecem, mas salta aos olhos que são crianças.

Esta dança pornográfica e apelativa é tão gritantemente imoral e tão obviamente prejudicial à educação das crianças que ninguém nem precisa ser católico para entender isso. Os próprios comentários [aliás, mal-educados] do autor do blog citado mostram isso. O outro blog lá linkado – este, que aparentemente foi a fonte original do vídeo – também revela isso: ele não tem a mínima conotação religiosa, e a autora começa o seu texto dizendo que não quer ter filhas.

No mês passado eu comentei também aqui sobre a erotização da moda infantil: mais um exemplo – entre tantos! – da degradação moral da nossa sociedade e do mundo que nós estamos deixando para os nossos filhos. Quando nós, católicos, combatemos a pornografia e tanta sujeira da qual está repleta a cultura moderna, somos chamados de ultra-conservadores, de sermos traumatizados com tabus sexuais, de estarmos fora de moda e tantas outras coisas mais. E quanto aos não-católicos que mantêm o seu senso moral relativamente intacto e têm a coragem de serem contra a erotização da sociedade na qual vivemos, eles são o quê? Influenciados pela Igreja, é isso?

Isto está errado. Salta aos olhos que está errado. No entanto, as atitudes tomadas frente ao patente erro pelos que não são católicos são sofríveis: o Eden revela um terrível pessimismo ao dizer que a culpa é “nossa que consumimos esse tipo de porcaria”, a Kellen diz que só quer ter filhos porque prefere “tem um filho garanhão e pegador de quem uma filha biscate” (sic) e a Isabela insinua que, se existe tanta apelação erótica heterossexual, não deveríamos nos preocupar tanto com a homossexual! É incrível, mas é verdade: sem Deus, o homem até percebe que está no abismo, mas não consegue nada a não ser cair cada vez mais fundo.

Qual o problema com a pornografia?

Não sei quem é o Jason Evert, mas esta resposta dele sobre qual é o problema com a pornografia – considerando que, com ela, “não estamos fazendo mal a ninguém” – está muito boa. Recomendo.

Deus lhe deu inicialmente uma mente livre de imaginações para que você imprima nela a beleza de sua esposa, e só ela. E, ao invés, estampamos nela tantas imagens de outras mulheres, e você olha para essas outras mulheres na pornografia 15 segundos e já está enjoado dela. Olha para a próxima garota 30 segundos, e já está enjoado; e a próxima, e a próxima… Esses são os corpos mais bonitos do mundo e estamos sendo treinados para ficar enjoados deles em menos de um minuto. E você faz isso por alguns anos, e casa com uma mulher, e você realmente espera que seu corpo vai cativá-lo até que a morte os separe?

Pedro Cardoso e a pornografia na televisão brasileira

Tive uma grata surpresa ao ler um texto do ator Pedro Cardoso, referente a um discurso pronunciado pelo mesmo na primeira exibição do filme “Todo mundo tem problemas sexuais”. A sinopse do filme deixa entrever que é somente mais uma depravação brasileira; o discurso de Pedro Cardoso, contudo, fez-me ter vontade de assisti-lo.

Não esperava encontrar tanto bom senso num manifesto pronunciado por um comediante brasileiro. O problema abordado por Pedro Cardoso – evidente para quem mantém intacto o seu senso de moralidade, mas (infelizmente) irrelevante para a grande maioria dos telespectadores nacionais – é a questão da pornografia na televisão e no cinema, entendendo por isto não apenas a exibição de cenas explícitas, mas toda a “erotização” que parece ter se tornado conditio sine quae non para qualquer produção televisiva / cinematográfica nos dias de hoje. Por exemplo, seria atigida pela crítica do autor aquela menina de calcinha e soutien na tela da Globo às três horas da tarde. Muita gente acha que é normal. Eu acho um tremendo absurdo. Parece que há atores brasileiros que também concordam comigo, o que é muito reconfortante.

O discurso inflamado do comediante brasileiro não passou despercebido da mídia. TERRA publicou uma reportagem sobre o assunto, com o polêmico título de “Pedro Cardoso diz que atores são obrigados a fazer pornografia”. Há, certamente, toda uma questão moral sobre o assunto – que não está alheia ao discurso de Pedro Cardoso -, mas achei particularmente interessante uma objeção (à primeira vista) “meramente técnica” do ator, sobre interpretação de personagens e nudez:

A minha tese é de que a nudez impede a comédia, e mesmo o próprio ato de representar. Quando estou nu sou sempre eu a estar nu, e nunca o personagem. Quando vemos alguém nu vemos sempre a pessoa que está nua. O personagem é justamente algo que o ator veste. Ao despir-se do figurino, o ator despe-se também do personagem, e resta ele mesmo, apenas ele e sua nudez pessoal e intransferível. Diante da irredutível realidade da nudez de seu corpo, o ator não consegue produzir a ilusão do personagem. O ator ou atriz que for representar um personagem que estiver nu, terá que vestir um figurino de nu (seja lá o que isto quer dizer!).

Não sou ator, nunca estudei artes cênicas, nunca fiz curso de teatro, de modo que não posso fornecer uma discussão aprofundada sobre a tese de Pedro Cardoso; no entanto, ela me parece bastante óbvia e, justamente por isso, genial. E vou mais além: a reconhecida incapacidade do ator em representar um personagem nu, pelo simples fato de que, quando o autor se despe do figurino, resta “apenas ele e sua nudez pessoal e intransferível”, é uma eloqüente expressão – certamente involuntária – de um aspecto básico da antropologia cristã: a tremenda verdade de que o ser humano é uma união indissociável entre corpo e alma, de modo que, ao olhar para o próprio corpo, ele não consegue simplesmente dizer “este é um corpo” (como consegue fazer, p.ex., com uma roupa), mas sim, sempre, “este sou eu”. Por isso é impossível fazer personagens só com o próprio corpo e mais nada, porque o corpo do ator é sempre o próprio ator, e de nenhuma maneira um personagem. Por isso a – a meu ver, extremamente pertinente – crítica de Pedro Cardoso.

Como falei, a questão moral não fica de fora do inflamado discurso do ator brasileiro; é ele próprio a reconhecer que “[a] pornografia está tão dissimulada em nossa cultura que não a reconhecemos como tal”, e ainda a usar expressões extremamente duras ao se referir ao nudismo como “a oferenda que vai ser imolada no altar do tesão alheio dos impotentes”! Em suma, uma excelente notícia; quando até mesmo os profissionais da área descobrem que há algo de podre no seu ganha pão, e têm a coragem de vir a público denunciar isto, é sinal de que – talvez – podemos ter alguma esperança. Parabéns ao Pedro Cardoso pela coragem de gritar que o rei está nu. Que mais e mais pessoas possam segui-lo, a fim de que consigamos deter – um pouco que seja – esta queda vertiginosa no abismo da imoralidade que sofre a nossa civilização.