Tragédia em Santa Maria, no Domingo da Septuagésima

Hoje de manhã eu estava na igreja, em silêncio, aguardando a entrada do sacerdote e o início do Santo Sacrifício da Missa. De repente, o toque da sineta anuncia a pequena procissão de entrada; acto contínuo, as vozes do pequeno coral enchem o templo. Conheço aquele canto; já não o ouvia, creio, desde a Quaresma do ano passado. Reconheci-o hoje e me enchi de compunção.

Attende Domine, et miserere, quia peccavimus Tibi. Ainda não é Quaresma; mas já a Sagrada Liturgia se reveste de roxo, e já os cânticos penitenciais tomam conta dos nossos Domingos. «Ouvi[-nos], Senhor, e tende misericórdia, porque pecamos contra Ti»; esta súplica, tão desgastada pelos séculos, ainda consegue nos comover. E a nós resta a esperança de que o coração do Altíssimo também se deixe tocar por estes versos que já Lhe foram incontáveis vezes dirigidos. Há um capítulo específico da História da Salvação para cada alma que passou por este mundo; e o que existe de extraordinário nisso é que Deus, justamente por ser Deus, consegue escutar estes nossos pedidos já tão gastos como se eles fossem as primeiras palavras amorosas balbuciadas pelos Seus filhos muito amados. Bastando, para isso, que nós nos acheguemos a Ele com um coração inocente, com aquele coração de criança sem o qual o Evangelho garantiu que não poderíamos entrar no Reino de Deus.

Já é Septuagesima, já começa a morte da Liturgia que chegará a seu cume na Semana Santa. Ainda nem é Carnaval e a Igreja já nos acena com a Quaresma; ainda nem nos despedimos do Tempo Comum e já somos privados do Gloria in Excelsis Deo dominical! Esta é a beleza da orgânica harmonia da vida litúrgica católica: cada tempo é precedido pelos seus sinais, e cada acontecimento importante ensaia seus passos mil vezes antes de subir ao palco da vida.

Voltei para casa e, ao chegar na internet, descobri que o mundo real nem sempre é tão benevolente quanto a Liturgia da Igreja; no mundo real, as tragédias por vezes chegam de supetão, qual relâmpago em céu claro, de surpresa, sem avisar e sem dar tempo para que nos preparemos. No interior do Rio Grande do Sul, na cidade de Santa Maria, centenas de pessoas morreram em um incêndio ocorrido na madrugada deste domingo numa boate. No momento em que escrevo estas linhas, o número de mortos já chega a 233; outras centenas estão hospitalizadas, em estados mais ou menos graves.

O número de mortos me espantou: no Brasil, acidentes aéreos não provocam tantas vítimas assim! E a tragédia assume contornos ainda mais dolorosos quando pensamos que, provavelmente, são jovens que perfazem a maior parte destas vítimas. Jovens com uma vida inteira pela frente, ceifada de modo estúpido pelas chamas que iluminaram lugubremente Santa Maria nesta madrugada. Se cada alma tem a sua história de salvação particular, certas páginas dolorosas, lidas de fora, deixam-nos perplexos. Não as entendemos; e por vezes o máximo que podemos fazer é cair de joelhos e suplicar a Deus misericórdia.

O texto do Fabrício Carpinejar sobre a tragédia foi muito comovente; mas momentos assim já naturalmente provocam comoção. As palavras chegam a ser supérfluas, por vezes até ofensivas. A situação toda já é de uma brutalidade atroz; custa-me acreditar que, no meio do incêndio, havia seguranças da boate «impedindo as pessoas de saírem para que pagassem o cartão de consumação». Isto chega a ser surreal; mas os corpos amontoados, esperando identificação, são angustiantemente reais. No Rio de Janeiro, um bloco de carnaval católico foi transformado em procissão de homenagem às vítimas da tragédia. Por toda a internet multiplicaram-se mensagens de luto pelos mortos e de apoio aos familiares que perderam seus entes queridos. Ao menos é reconfortante saber que o ser humano ainda é capaz de se solidarizar com a dor dos seus próximos, mesmo quando estes próximos estão a centenas ou milhares de quilômetros de distância. Na dor, nós ao menos descobrimos o quanto ainda somos humanos.

Quem quiser ajudar de modo mais concreto pode conferir o guia que o Zero Hora preparou. E todos, independente de onde estejam ou da situação na qual se encontrem, podem ajudar elevando uma prece a Deus pedindo o descanso eterno para os falecidos e o conforto para os que ficam. Miserere, Domine! Que a Virgem Santíssima, cujo nome foi dado à cidade onde aconteceu a tragédia, possa olhar com maternal solicitude para todas as vítimas deste incêndio. Que Ela console os que choram a perda dos seus filhos, irmãos e amigos; e que possa receber nas Moradas Celestes os que pereceram entre as chamas do acidente terrível.

Dias Tumultuados: crucifixos, hackers e aborto

Estes últimos dias estão sendo bastante tumultuados. Ao mesmo tempo em que o pe. Paulo Ricardo é atacado com virulência e este fato mobiliza a internet inteira em sua defesa, outras coisas importantíssimas também acontecem e correm o risco de passar despercebidas.

Na contramão do Direito contemporâneo e da tomada de consciência da importância do respeito à liberdade religiosa, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul determinou a retirada dos crucifixos dos prédios públicos. Uma questão que julgávamos já superada volta à tona; com uma canetada, os magistrados gaúchos nos lançam de volta às Trevas do final do século XVIII das quais já nos havíamos desvencilhado. O retrocesso é enorme.

Heroicamente, o bispo de Frederico Westphalen, Dom Antonio Keller, lançou uma nota pastoral que era também um protesto: «Podem nos tirar os crucifixos e as imagens expostas em locais públicos. Mas jamais poderão tirar de nós a fé e a adesão aos princípios e valores do Evangelho». Parabéns a Sua Excelência! E preparemo-nos para defender a Fé da Igreja. Afinal, Cristo estava aqui antes dos fanáticos laicínicos inventarem sua própria religião idiota.

Grupo Anonymous reivindica ter derrubado ontem o site do Vaticano! Como comentou magistralmente o frei Rojão, não há nada de novo: são apenas «[c]oisas velhas e atrasadas que aporrinham a humanidade há muito tempo [e] aprenderam a usar computador»…

– Hoje é o Dia Internacional da Mulher e, desgraçadamente, os inimigos do gênero humano estão reunidos em Brasília para, em audiência pública, discutirem a reforma do Código Penal que, na verdade, é mais uma tentativa sub-reptícia de legalizar o aborto no Brasil. Faço eco ao pedido do Wagner Moura: «Mulher, você pode fazer alguma coisa: ligue gratuitamente para o Alô Senado, 0800-612211, registre a sua vontade de que ninguém use uma reforma no Código Penal para legalizar o aborto no Brasil e peça, enfaticamente, que os senhores Luiz Flávio Gomes e Luiza Nagib Eluf sejam excluídos imediatamente da comissão que trata do novo Código Penal». Esta é uma batalha de todos nós; não podemos permitir que a infâmia do aborto possa macular esta Terra de Santa Cruz.

Hoje é o dia da mulher e, nele, devemos nos lembrar d’Aquela Mulher que é em Si o modelo perfeito de toda feminilidade. Neste dia em que nos querem vender uma caricatura de mulher que, pretendendo uma suposta autonomia, reivindica o direito de matar os seus próprios filhos, apresentemos ousadamente Aquela que, dentre todas as filhas de Eva, é a Única digna de representar todo o gênero feminino. É Maria Santíssima a Mulher na qual todas as outras devem ter os olhos fixos, ansiando por imitar-Lhe as virtudes. Neste Oito de Março, rezemos à Virgem Santíssima para que interceda pelo Brasil. É Ela a Mulher que deve orientar a verdadeira compreensão do papel feminino em nossa mundo – aliás, Ela é a única que pode fazê-lo de modo digno.

Nota à imprensa – Operação Rei Herodes

[Publico a nota cum iubilo. Fico muitíssimo feliz com a seriedade com a qual o Departamento de Polícia de Itaqui conduziu o caso; o nefasto crime do aborto, que clama aos Céus vingança, não pode continuar sendo tratado com a indiferença que encontramos muitas vezes nesta Terra de Santa Cruz. Permita a Virgem Santíssima que o exemplo do delegado Brodbeck possa inspirar mais policiais Brasil afora, a fim de que o covarde assassinato de crianças indefesas não continue impune.]

NOTA À IMPRENSA SOBRE A OPERAÇÃO REI HERODES

Degravando áudios de interceptação telefônica de conhecidos traficantes da cidade, todos devidamente presos e com inquérito policial remetido, os agentes da Delegacia de Polícia de Itaqui descobriram que uma das interlocutoras D. R. B. teria consentido que com ela se praticasse aborto. Registrada, desta feita, a devida ocorrência e instaurado o respectivo inquérito policial, diligenciou-se no sentido de buscar informações quanto à prática criminosa.

Ouvindo diferentes testemunhas, chegou-se à informação de que D. consentiu na prática do aborto, feito este por VIVIANA MESSA DA SILVA, de alcunha “TERESONA”. Houve, ademais, reconhecimento fotográfico de TERESONA por ALBINHA, na Seção de Investigação deste órgão policial. D., prestando depoimento em cartório, confirmou a história, apontando TERESONA como autora do aborto.

Na tarde de ontem, o Del. Pol. Rafael Vitola Brodbeck desencadeou a OPERAÇÃO REI HERODES. Imediatamente, sob suas ordens, o Insp. Pol. Gilmar Cavalheiro, em atividade disfarçada, deslocou-se com uma escrivã ad hoc, estagiária desta DP, para a casa de TERESONA, fingindo-se passar por um casal à procura de métodos abortivos. A ação logrou o êxito esperado, de vez que a filha de TERESONA, JOSIANE DA SILVA MACIEL confirmou que, na residência, praticava-se o delito.

JOSIANE também disse que TERESONA estava em Santa Maria, buscando drogas abortivas, e que retornaria à noite. Igualmente, avisou que duas moças de Ijuí estariam vindo para Itaqui a fim de abortar seus filhos.

De posse das informações, aguardamos o cair da noite, e designamos a mesma escrivã ad hoc para que fizesse contato telefônico com TERESONA, no que, atendendo sua filha, esta confirmou que sua mãe já estava em casa, e com as substâncias abortivas à mão. Esta autoridade ordenou que a escrivã ad hoc deslocasse, novamente com o Insp. Cavalheiro, até a residência de TERESONA e tentasse comprar as substâncias, para que, na confirmação, obtivéssemos o flagrante esperado de guarda dos medicamentos conforme o crime descrito no art. 273, § 1º-B, V e VI, do Código Penal, com pena prevista de dez a quinze anos. Na entrada da residência, TERESONA franqueou a entrada livremente, nos termos constitucionais, e, uma vez lá dentro, vasculhamos sob a supervisão da mesma, as dependências, vindo a encontrar inúmeros medicamentos.

Os remédios são, de fato, em grande quantidade, inclusive havendo seringas prontas para serem usadas, já com substâncias dentro, embora guardadas em caixas. Remédios de uso controlado, com retenção de receita, havia em quantidade verdadeiramente surpreendente. Também medicamentos exclusivos para uso hospitalar. Tudo isso reforçou a hipótese de que TERESONA pratica também o delito do art. 282, do Código Penal.

Livremente, TERESONA deixou-nos trazer os remédios para averiguação junto a um profissional farmacêutico, sendo que deslocamos, então, para uma drogaria, onde uma farmacêutica, cujo nome segue em sigilo, nos deu inúmeros apontamentos, confirmando a tese da polícia. Há suspeita, inclusive, de que um dos medicamentos provoca hemorragia, e o aborto, objeto da presente investigação, é justamente feito a partir de hemorragias forçadas. Outros remédios presentes na residência de TERESONA e levados à farmacêutica são anestésicos, de uso exclusivamente hospital, e ainda há inúmeros indicados para conter justamente os efeitos colaterais do abortamento. Ademais, butterflies e objetos para soro intravenoso foram encontrados.

Com esses dados, representamos, à noite, junto ao Plantão do Poder Judiciário, pela prisão preventiva de VIVIANA MESSA DA SILVA, a TERESONA, e de JOSIANE DA SILVA MACIEL. Obtido o mandado judicial, deslocamos para a residência do alvo e efetuamos as prisões, trazendo TERESONA e JOSIANE para a delegacia.

A Operação Rei Herodes desbarata, assim, uma clínica de aborto, crime dos mais hediondos, pois mata um ser humano inocente, que deveria ser alvo de todas as proteções.

O desdobramento das ações policiais serve de alerta à sociedade, especialmente às mães que procuram os “serviços” de aborteiros. Deveriam elas zelar por seus filhos, ainda que dentro do ventre. Em nada se diferencia, ontologicamente, um ser humano nascido de um não-nascido. Sua dignidade é idêntica. As “clientes” das clínicas de aborto matam seus filhos, mas, uma vez nascidos, talvez não o fizessem, por uma dificuldade, fruto, do egoísmo, de ver quem está em seu útero como um ser humano, uma pessoa, com seus direitos, mormente à vida.

Assim como Herodes, o rei da Judéia que mandou assassinar milhares de bebês nos tempos de Jesus, quem pratica ou se submete ao aborto comete um crime horrendo e nefasto, que terá dura reprimenda da Polícia Civil gaúcha.

Itaqui, RS, 20 de agosto de 2009

Dr. Rafael Vitola Brodbeck

Delegado de Polícia
Titular DP/Itaqui

Apanhado ligeiro

Pais não revelam sexo de sua criança de dois anos e meio. Na opinião da mãe, “[q]ueremos que Pop cresça com maior liberdade e que não seja forçado a um gênero que o/a moldará”. A criança “usa vestidos e também calças masculinas e seu cabelo muda do estilo feminino para o masculino a cada manhã”. Sinceramente, isso já está ultrapassando todos os limites do ridículo. Sempre me pareceu a coisa mais estúpida do mundo recusar-se a dar educação religiosa para a criança, sob a justificativa de que ela poderia “escolher por si própria” quando crescesse. Parece que eu estava enganado, porque conseguiram fazer uma coisa ainda mais idiota na Suécia. Pobre criança! Será que a mãe dela também vai se recusar a mandá-la à escola para que ela decida sozinha, quando crescer, se quer estudar ou não?

Jovens que matam cão em vídeo confessam crime no RS. Fiquei curioso por saber qual era o crime em que incorria quem matasse um cachorro. Acredito que seja a Lei de Crimes Ambientais (9.605/98). Segundo esta, é crime “[p]raticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados”, e “[a] pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal” (art. 32). A pena? “[D]etenção,  de três meses a um ano, e multa”. Temos, portanto, que os garotos que mataram um cachorro no RS podem ficar presos por até 16 meses, além de pagarem multa (a conjunção é aditiva, e não alternativa). Obviamente, o ato praticado pelos fulanos foi bárbaro e sádico (eles mataram o pobre animal a pauladas, enquanto filmavam), mas gastar tempo e dinheiro com abertura de inquéritos e procedimentos judiciais, que podem culminar em quase um ano e meio de prisão, não é um pouco exagerado para um cachorro morto?

– Mais sobre Honduras: Bispos católicos das Honduras apoiam golpistas (!), na suprema imparcialidade deste jornal eletrônico de Portugal; o avião do presidente deposto, que iria pousar ontem em Tegucigalpa, foi impedido de aterrissar. Uma pessoa morreu nas manifestações. O presidente Lula se diz preocupado com o aumento da violência no país, mas não esconde a sua simpatia – ou, melhor dizendo, o seu apoio entusiasta – ao presidente exilado: “[o]s golpistas têm que entender isso: não é possível aceitarmos mais golpes na América Latina”, “[o governo interino de Honduras] não pode ser reconhecido em hipótese alguma”, e “precisamos procurar uma interlocução, não com os golpistas mas com personalidades [da sociedade]”…

Enfim, um ateísmo com profundidade, artigo da Carta Capital. Onde está esta “profundidade”, é um mistério que me escapa à compreensão; talvez no livro citado pelo articulista, “O Espírito do Ateísmo”, de André Comte-Sponville. Não conheço a obra, mas é importante não confundir o autor com Augusto Comte. Parece ser interessante, porque fala em “espiritualidade atéia” e em “Pentecostes dos ateus, ou o verdadeiro espírito do ateísmo”. Achei engraçado como este “verdadeiro espírito” ateu parece uma caricatura do cristão. Se tiver tempo, ponho uma resenha do livro aqui depois.

Pedofilia (quase) legalizada no Brasil – II

Pena de 12 anos para travesti que mantinha relações com seus irmãos menores; é a manchete exibida no site do Ministério Público do Rio Grande do Sul. Mas o escandaloso não é tanto esta notícia, e sim o desenrolar do processo que é sucintamente narrado no corpo da reportagem.

O réu tem vinte e cinco anos de idade, e é o irmão mais velho de outros três meninos que contavam, à época dos crimes, nove, doze e treze anos. “A mãe” – diz a reportagem –  “morava em outra cidade e estava separada do marido. Por diversas vezes, o denunciado prevalecia-se de sua autoridade de irmão mais velho e ameaçava os meninos de surras para obrigá-los a praticarem com ele os atos libidinosos”.

Sem dúvidas é uma história horrível e degradante, criminosa, digna de suscitar justas repulsa e indignação. Não é? Para meu espanto, parece que não, não é, porque a 5ª Câmara Criminal do TJ absolveu o acusado anteriormente!

A justificativa? Pasmem:

[N]o contexto em que estavam inseridas as partes, o menor tinha a exata noção do que estava fazendo, pois seu irmão acusado era travesti, tinha parceiro sexual e a promiscuidade sexual era a tônica da convivência doméstica, bastando para atestar esta realidade, a naturalidade com o que o tema foi enfrentado pelas supostas vítimas.

Qualquer semelhança com o outro caso aqui citado, da menina de 12 anos e seu namorado, não pode ser mera coincidência. Muda apenas a Câmara Criminal; lá foi a sexta e, aqui, é a quinta. É a mesma argumentação: o menor sabia o que estava fazendo e o fez livremente. E o que me deixa profundamente angustiado é pensar na possibilidade de que, sim, a pederastia pode perfeitamente ter sido consentida neste caso. E basta alguém atentar para este detalhe que, aí, já estará legalizada a pedofilia no Brasil, mais rápido do que eu achei que fosse possível.

Cor Iesu Sacratissimum,
Miserere Nobis!

Pedofilia legalizada no Brasil

Agradeço ao Matheus pelo toque. Apesar da notícia ser de fevereiro, ela não recebeu nenhuma repercussão na mídia. Tenho-a em quatro fontes diferentes, com ligeiras variações na redação do texto:

  1. Sexo “consentido” com menina de 12 anos não é estupro
  2. Se há consentimento, sexo aos 12 anos não é estupro
  3. Relação sexual aos 12 anos não é estupro, se consentida
  4. Justiça gaúcha absolve jovem por sexo consentido com menina de 12 anos

A notícia é a mesma: um rapaz de 20 anos namorava uma menina de 12 anos e mantinha relações sexuais com ela. Como o relacionamento entre ambos – assim definido expressamente inclusive pela garota – era de namoro, os pais da menina conheciam e aceitavam o fato, os atos sexuais ocorreram diversas vezes e a menor não apresentou nenhum sinal de coação física ou psicológica, então não cabe falar em violência nem em presunção de violência; assim entendeu a 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

Segundo o desembargador relator, Mario Rocha Lopes Filho, o artigo 224 do Código Penal não está mais adequado aos dias de hoje. E, para chegar a esta conclusão, baseia-se em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, por ele citada:

“Manifestação do Min. Marco Aurélio, proferido no julgamento do HC 73.662 (…), onde prevaleceu que a interpretação flexível à rigidez anacrônica do artigo 224 “a” do CP, norma forjada na década de 40 do século 20; porém não mais adequada à hodierna realidade social”, justificou o Desembargador Lopes Filho.

Bom… o que dizer diante disso tudo? Só posso constatar, tristemente, que estas são as conseqüências lógicas da completa ausência de referências morais do nosso século. Eliminada a diferença entre vício e virtude, com base em quê poderia ser condenado o namorado da menor? Sufocado o direito de preservar as crianças e adolescentes da exposição a comportamentos morais inadequados à idade deles, qual misteriosa força os iria impedir de seguirem os seus instintos precocemente aflorados? De posse de informações teóricas sobre “educação sexual” ministradas em sala de aula, qual seria o freio a impedir a curiosidade infanto-juvenil de partir para os experimentos práticos? E se não há absolutamente nenhum problema na relação sexual entre menores, qual a lógica de passar a haver quando o menor “mais velho” fizer aniversário?

Não adianta combater a legalização da pedofilia, é preciso combater os princípios deturpados que a ela conduzem inexoravelmente. Não tem nenhuma lógica pretender, ao mesmo tempo, expôr a infância à vida sexual e impedir a infância de ter vida sexual. E os corruptores de gerações sabem disso. A cada dia, fica mais nítido o mundo que estão construindo para os nossos filhos, e a cada dia fica mais manifesta a sua feiúra. Que Deus tenha misericórdia de nós.

P.S.: Ler também as minhas outras considerações sobre o assunto nos comentários publicadas.

Liberdade de uma opção só

A mídia é capaz de fazer coisas fantásticas e inacreditáveis. Hoje, por exemplo, encontrei uma mesma notícia, contada de formas tão escandalosamente diferentes que parecem até duas: Menina de 11 anos dá à luz no RS (Gazeta do Povo) e Burocracia pode ter condenado menina de 11 anos estuprada em Iraí, no RS, a levar gravidez adiante (O Globo).

[Quanto a este último, aliás, comentei en passant aqui há uns dias uma outra matéria do mesmo jornal que, de tão igual à de hoje, pareceu-me até a mesma… fui olhar. A que comentei então é do dia 06 de março, assinada por Cleide Carvalho e Fabiana Parajara; a que comento hoje é do dia 05 de março, assinada pela Cleide Carvalho sozinha, e claramente serviu de base para a redação do texto do dia seguinte.]

Diz a matéria da Gazeta que “[a] menina parece feliz com a maternidade, já pegou o bebê no colo”; perfeito. Existe correspondência entre o corpo da matéria e o seu título. Na matéria d’O Globo, contudo, nada que esteja no corpo da matéria justifica o título, pois naquele é dito claramente que “não houve sequer discussão sobre a possibilidade de a criança ser submetida a um aborto porque não houve pedido por parte dos responsáveis legais”.

Oras, se a menina não queria abortar, se a família da menina não queria abortar, se ninguém em momento algum falou sobre aborto, então onde raios entra a “burocracia” do título da reportagem?! Por que motivo a menina foi “condenada”?! Um semelhante título – que dá a entender ter havido uma batalha judicial (burocraticamente estendida até além do período de gestação da menor) entre os que queriam o aborto da menina e os que não o queriam – para um semelhante caso é totalmente incompreensível.

Ou, se pensarmos com mais cuidado, é bastante compreensível: os abortistas queriam que a menina abortasse. Os que fazem lobby em defesa do assassinato de crianças querem impôr o aborto a todo custo, não importa o que a menor ou os responsáveis por ela desejem. Eles, que defendem o aborto por qualquer motivo ou até mesmo sem motivo algum, simplesmente não conseguem suportar a idéia de que existam pessoas que, tendo “motivos” para abortar, optem por não o fazer. Uma belíssima contradição dos defensores do “direito” de escolha! Na verdade, para esta gente, a única escolha que se tem direito de fazer é aquela que esteja de acordo com a agenda abortista. O resto, é “negligência” dos pais, é “burocracia”, é “desinformação” e tantas coisas mais… Que coisa bonita, não?

OFF: Eu não conhecia Umbert, the Unborn. Excelente!

Ainda a repercussão sobre o aborto em Recife

– A polêmica sobre o aborto realizado na menina de nove anos ganhou primeira capa no Jornal do Commercio duas vezes: ontem, “Ciência X Fé: Excomunhão em debate” e, hoje, “Aborto é pior que estupro, diz Dom José”.

– Quanto à manchete de ontem, nem cabe fazer comentários, porque é evidente que, sobre a excomunhão, não pode haver entre a “Ciência” e a “Fé” debate algum, dado que “excomunhão” é um conceito ininteligível para a ciência, sobre o qual ela não tem absolutamente nada a dizer.

– Quanto à matéria de hoje, vale salientar: sim, por mais que seja chocante para a mentalidade moderna, o aborto é mais grave do que o estupro, porque neste há uma violência física e, naquele, uma violência física que implica na morte de um ser humano inocente e indefeso. A vida é o maior de todos os bens e, portanto, aquilo que atente contra ela é mais grave. Por exemplo, assassinar uma pessoa é mais grave do que torturá-la ou estuprá-la, e com isso se está simplesmente reconhecendo que a vida em si é um bem mais valioso do que a integridade física, dado que esta pressupõe aquela. Colocados os preconceitos e as paixões de lado, qualquer pessoa é capaz de entender isso.

– Nunca é demais repetir: dizer que o aborto é mais grave do que o estupro não tem absolutamente nada a ver com negar ou relativizar a gravidade do estupro. Claro que o estupro é grave. A única coisa que se está dizendo é que o assassinato de um inocente indefeso é mais grave. Analogamente, se alguém dissesse que um latrocínio é mais grave do que um assalto a um banco, ninguém poderia honestamente deduzir daí que se esteja afirmando não haver problemas com assaltos a bancos.

– Dom José disse que o senhor presidente deveria procurar a assessoria de um teólogo antes de proferir sentenças disparatadas sobre temas que ele manifestamente ignora. É um excelente conselho, que o presidente deveria seguir, para não passar (ainda mais) vergonha em público.

– A CNBB publicou duas notas sobre o assunto (uma dos bispos da Regional Nordeste 2 e outra da CNBB como um todo). Têm o mérito de afirmarem claramente (ao menos!) que a Conferência é contrária ao aborto; faltou, contudo, na minha opinião, pelo menos duas coisas fundamentais: (a) um apoio explícito a Dom José Cardoso (que está sendo crucificado pela mídia); e (b) corroborar a sua declaração, dizendo que, sim, todos os envolvidos no crime incorreram em excomunhão latae sententiae.

– As Abortistas pelo Direito de Matar, como não poderia deixar de ser, manifestaram-se contra a Igreja e favoráveis aos médicos assassinos. A declaração delas foi muito bem comentada pelo blog “A Saúde da Alma”. Quanto a estas desgraçadas, nunca é demais repetir que, de católicas, só têm o nome, ostentado com o único intuito de enganar os incautos e semear a confusão dentro da Igreja de Deus.

– O Carlos Cardoso possui um anti-clericalismo que chega a ser nauseabundo, mas neste post é preciso louvar a sua honestidade. A despeito de não concordar com a posição do Arcebispo, ele diz claramente que Dom José só fez agir em coerência com o que a Igreja ensina. E diz ainda ser necessário “admitir publicamente que o problema não é o homem, o problema são os PRINCÍPIOS defendidos pela Igreja Católica: Esses sim desumanos, medievais, bárbaros, sem-sentido e indignos de qualquer um que se diga civilizado”. Obviamente não concordamos com esta sandice; mas louvamos, sim, a coerência e o bom caráter de quem apresenta as coisas das quais discorda como elas são na realidade.

– No Rio Grande do Sul está em curso um caso parecido com o da menina do interior de Pernambuco; ela tem 11 anos e também foi estuprada pelo padrasto. No entanto, não abortou, dado que os familiares da criança, ao que parecem, nem sequer cogitaram a possibilidade do assassinato. Sem disfarçar o próprio incômodo com o fato da família da garota ter decidido levar a gravidez adiante, o responsável por esta matéria do jornal O Globo chega ao cúmulo de sugerir que, mesmo à revelia dos pais, “o Ministério Público tem legitimidade para assegurar o direito da menina ao aborto” (!!). Ou seja, o famigerado “direito de escolha” foi para o beleléu: o que eles querem é matar o filho da menina a todo custo, mesmo que, para isso, precisem passar por cima da vontade da família (que é chamada de “inércia dos representantes legais” aqui)! A cretinice dos abortistas dá nojo.

Mais Ditadura Gay

Publico, em anexo, uma decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que recebi por email, condenando um clube gaúcho a indenizar uma lésbica por causa de uma “discriminação” ocorrida numa festa cinco anos atrás. A menina, que trocava carícias com a “namorada”, sentiu-se constrangida quando a diretoria disse-lhe que o seu comportamento era inadequado ao ambiente.

São dignos de menção dois trechos do documento.

[N]ão podem eventuais peculiaridades regionais servir de excludente da responsabilidade dos demandados, em face da ocorrência de discriminação, que, no caso em tela, se dera com fundamento na opção sexual da demandante.

Ou seja, para os órgãos de Justiça comprometidos com a Ditadura Gay, pouco importam a cultura ou os costumes das pessoas; elas precisam aceitar, de todo jeito, a imposição do “gay-way-of-life”.

[A]o que tudo indica, a conduta exigida da autora e de sua companheira não era necessariamente aquela demandada dos demais casais heterossexuais que freqüentavam o clube.

Ou seja, os órgãos gayzistas de Justiça não aceitam a evidente diferença entre um casal e uma dupla. O que vale para o primeiro, tem que valer para a segunda, por mais que repugne a razão e o bom senso, e por mais que isso seja naturalmente ofensivo ao senso moral das pessoas que não foram ainda contaminadas com o gayzismo.

Tal decisão é vergonhosa. Rezemos, pois as coisas estão piorando a olhos vistos.

* * *

Estado do Rio Grande do Sul
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça

OS

Nº 70017041955

2006/Cível

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DISCRIMINAÇÃO À CASAL HOMOSSEXUAL EM BAILE PROMOVIDO POR CLUBE SOCIAL. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. MAJORAÇÃO.

1. RESPONSABILIDADE CIVIL. A Constituição Federal, em seu artigo 3º, inciso IV, institui o combate à discriminação, seja de qual espécie for, como um dos objetivos precípuos da República Federativa do Brasil. Em vista disso, não podem eventuais peculiaridades regionais servir de excludente da responsabilidade dos demandados, em face da ocorrência de discriminação, que, no caso em tela, se dera com fundamento na opção sexual da demandante.

2. Hipótese em que a autora, conjuntamente com sua companheira, fora advertida por membro da diretoria de clube social, em plena festa promovida pelo mesmo, a que cessassem as carícias que vinham trocando. Conduta que não era costumeiramente exigida de casais heterossexuais, o que indica a efetiva prática de discriminação.

2. QUANTUM INDENIZATÓRIO. A indenização por dano moral deve representar para a vítima uma satisfação capaz de amenizar de alguma forma o sofrimento impingido. A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que não signifique um enriquecimento sem causa para a vítima e produza impacto bastante no causador do mal a fim de dissuadi-lo de novo atentado. Ponderação que recomenda a majoração do montante indenizatório fixado no Juízo a quo.

NEGARAM PROVIMENTO AO APELO DOS RÉUS E DERAM PROVIMENTO AO APELO DA AUTORA. UNÂNIME.

Apelação Cível

Sexta Câmara Cível – Regime de Exceção

Nº 70017041955

Comarca de Santiago

CLUBE SETE DE SETEMBRO

APELANTE/APELADO

PAULO CESAR AMARAL MONTEIRO

APELANTE/APELADO

JULIANA JURACI MARQUES MAIER

APELANTE/APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Sexta Câmara Cível – Regime de Exceção do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo dos réus e dar provimento ao apelo da autora.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Otávio Augusto de Freitas Barcellos (Presidente e Revisor) e Des. Angelo Maraninchi Giannakos.

Porto Alegre, 17 de setembro de 2008.

DES. ODONE SANGUINÉ,

Relator.

RELATÓRIO

Des. Odone Sanguiné (RELATOR)

1. Cuida-se de apelações cíveis interpostas por CLUBE SETE DE SETEMBRO E PAULO CÉSAR AMARAL MONTEIRO, réus, e JULIANA JURACI MARQUES MAIER, autora, contra sentença das fls. 90/96, que julgou procedente a demanda, condenando os demandados ao pagamento solidário de indenização por dano moral no valor de R$ 1.500,00, corrigidos monetariamente pelo IGP-M a contar da publicação da decisão e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, desde a citação. Outrossim, restaram os réus condenados ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios à FADEP, no valor de 10% sobre o montante condenatório.

2. Em razões recursais (fls. 98/102), os demandados afirmam que a autora e sua companheira sempre chamava a atenção dos associados devido a atitudes não compatíveis com o estatuto do clube, tais como carinhos libidinosos e beijos na boca. Destacam que o apelante PAULO fora por várias vezes questionado a respeito da necessidade de tomar providências em relação à autora e a sua namorada, tendo esse tão-somente convidado a demandante à uma sala reservada, onde lhe teria pedido que se comportasse. Ponderam que as relações de afetividade não podem ser exageradas, seja o caso homossexual ou não, ainda mais em uma sociedade conservadora, como a do Município de Santiago. Salientam que não houvera nenhum constrangimento à autora, tanto que um amigo do casal só ficara sabendo do ocorrido após comentários dessa. Refere que não se verificam nos autos os requisitos informadores da Responsabilidade Civil. Assim, pede seja dado provimento ao apelo, de forma a julgar improcedente a demanda.

3. Já em suas razões de apelo (fls. 105/110), a parte recorrente aduz que o quantum fora arbitrado em valor reduzido. Refere que nada há nos autos a demonstrar a suposta incapacidade financeira da agremiação demandada para arcar com a quantia de R$ 5.000,00 pleiteada na inicial. Discorre acerca do caráter punitivo-pedagógico da indenização, ainda mais num caso como o versado nos autos, que trata de preconceito para com um casal homossexual. Destaca que fora vítima de constrangimento público. Assim, pede seja dado provimento ao recurso, de forma a julgar procedente a demanda.

4. Em contra-razões (fls. 111/116), a demandante pugna pelo desprovimento do recurso dos réus.

5. Já em sua resposta ao apelo da parte autora (fls. 119/122), os réus repisam a tese exposta em sua apelação, pedindo pela improcedência da demanda.

6. Subiram os autos, que, redistribuídos em Regime de Exceção, vieram conclusos.

É o relatório.

VOTOS

Des. Odone Sanguiné (RELATOR)

Eminentes colegas:

7. Segundo relatado na inicial (fls. 02/11), a autora, JULIANA JURACI MARQUES MAIER, participava de uma festa na noite de 07/07/2003, no clube demandado, com sua companheira, MICHELE AMARAL MACHADO, quando, por volta da uma da manhã fora chamada por um segurança para se dirigir à uma sala reservada da diretoria da agremiação.

Lá chegando, foi recebida pelo co-demandado PAULO CÉSAR AMARAL MONTEIRO, um dos diretores do clube, que, apresentado-se como policial, disse que se ela e sua companheira “continuassem a dançar agarradas, não permaneceriam mais no clube”, sendo aquilo que estava ocorrendo uma “pouca vergonha” (fl. 03).

Retornando ao baile, a demandante e sua companheira, abaladas, então saíram da festa. Posteriormente, vieram a dar queixa na polícia, ao passo que o demandado PAULO CÉSAR, em resposta, teria “escalado” uma pessoa para que seguisse os passos da autora e sua companheira dentro do Clube.

Assim, em vista do tratamento discriminatório dispensado, que lhe causara constrangimento em face dos demais associados, ingressou com a presente demanda, pleiteando o pagamento de indenização por dano moral no valor máximo de R$ 5.000,00 (fl. 10).

8. Dada a devida tramitação à demanda, adveio então sentença (fls. 90/96), que, acolhendo a tese exposta na inicial, condenou os demandados ao pagamento solidário de R$ 1.500,00, dada a reduzida capacidade das partes figurantes no pólo passivo da demanda.

9. Inconformadas, ambas as partes apelaram: a ré, pedindo a improcedência da demanda, ante a inexistência do constrangimento alegado ou de qualquer prática discriminatória; a autora, a majoração do quantum indenizatório ao patamar declinado na exordial.

Examine-se.

I. Mérito

a) Responsabilidade Civil

10. Pois bem, primeiramente, destaco que é fato incontroverso que a autora e sua companheira, durante uma festa realizada na data de 07/07/2003 nas dependências do clube réu, foram requisitadas a se dirigirem a uma sala da direção, onde lhe fora pedido que cessassem as carícias que supostamente estavam trocando.

O que se discute, entretanto, são os motivos que levaram à intervenção dos seguranças do clube referido demandado: (a) se por conta de eventual excesso na demonstração de afeto, o que seria conduta inaceitável em relação às normas internas, segundo interpretação do artigo 13, itens 01 e 02, do Estatuto do Clube (fl. 30), independentemente da opção sexual adotada; (b) ou se por conta de discriminação por parte do referido réu e da instituição o qual estava representando.

11. No caso, entretanto, ao que tudo indica a prova dos autos, a intervenção efetivamente se dera em razão de preconceito, o que não pode ser tolerado, visto que a própria Constituição Federal de 1988 instituiu, em seu artigo 3º, inciso IV, o combate à discriminação, seja de que espécie for, como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil.

Com efeito, ao que se infere da prova testemunhal coligida, e que foi bem analisada pelo magistrado a quo, não há indício mínimo a demonstrar o eventual abuso por parte da demandante e de sua companheira.

12. Primeiramente, deve ser observado que há inclusive dúvida sobre o que seria exatamente tal “excesso”: se estavam somente dançando juntas, como indica a testemunha ALZIRO GARCIA RAMALHO (fl. 82), ou se abrançando, como apontou JOÃO ROSEMAR DE OLIVEIRA (fl. 72), ou, ainda, trocando um “beijo de cinema”, conforme JOSÉ DOMINGOS PINTO (fl. 73v).

Ou seja, na pior das hipóteses, a conduta supostamente indevida da demandante, ao que indicou a referida testemunha JOSÉ DOMINGOS PINTO, um dos que teria solicitado a presença da autora à sala da diretoria (fl. 73v), teria sido a de “trocar um beijo de cinema” com sua companheira, sendo este, especificamente, um “beijo demorado“, “envolvendo língua”, que em tese não seria comumente visto entre casais heterossexuais freqüentadores do clube.

Ora, um “beijo demorado”, e “de língua”, ainda que trocado por um casal homossexual, não pode ser tido por uma conduta inaceitável, ainda mais no local em que se deu, qual seja, no salão de bailes, em uma festa, com diversos outros casais. Aliás, veja-se inclusive que, contrariando observação feita por JOSÉ DOMINGOS PINTO, a testemunha ANTÔNIO VALTER COSSETIN ROLIM asseverou que deixara de freqüentar o clube não só pelos beijos da autora com sua companheira, mas também por causa de casais heterossexuais que se excediam no ato (fl. 71v), que também se dariam em pleno salão de bailes.

13. Ou seja, ao que tudo indica, a conduta exigida da autora e de sua companheira não era necessariamente aquela demandada dos demais casais heterossexuais que freqüentavam o clube, que, por óbvio, às vezes também se excediam nas carícias. Entretanto, esses não eram alertados para que cessassem as suas carícias, ao contrário do que fora exigido da demandante.

Desta forma, como bem observado pelo magistrado a quo, é evidente que a demandante e sua companheira foram abordadas e conduzidas até a apontada sala reservada – onde mantiveram conversa cujo teor não foi devidamente esclarecido, considerando as versões contraditórias existentes e, em especial, o fato de que no local estavam presentes apenas as partes ora litigantes – apenas porque formavam dupla homossexual, o que, aliás, vem corroborado pelos depoimentos prestados em Juízo pelos associados do clube, os quais reivindicavam “providência”. Esta atitude, pois, de abordar e advertir o casal revela inequivocamente preconceito decorrente de opção sexual, o que é expressamente vedado pela Constituição Federal (fl. 93).

Com efeito, mesmo em uma cidade pequena e, nas palavras da demandada, “conservadora”, como Santiago (fl. 101), deve se buscar diuturnamente a cessação de preconceitos de qualquer espécie. Ora, eventuais peculiaridades do local em que habita a demandante não poderiam servir de excludente da responsabilidade dos demandados, ainda mais disciplinando a Constituição Federal, de forma específica, em seu artigo 3º, inciso IV, que o combate à discriminação constitui um dos objetivos precípuos da República Federativa do Brasil.

14. Portanto, ante todo o exposto, tenho por inegável a responsabilidade dos demandados pelo ocorrido, dada a conduta preconceituosa assumida pelo réu PAULO CÉSAR AMARAL MONTEIRO, então um dos diretores da agremiação, e, por via de conseqüência, do próprio CLUBE SETE DE SETEMBRO.

Aliás, nesse sentido, assim já se manifestou esta corte: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS E MATERIAIS. DISCRIMINAÇÃO HOMOSSEXUAL. INDENIZAÇÃO. Presente o dever do requerido em indenizar os autores, vítimas de preconceito e ofensas verbais entre vizinhos, tendo por escopo a opção sexual dos ofendidos. Danos materiais e morais comprovados. Quantum indenitário minorado, em atenção às peculiaridades do caso e aos parâmetros praticados pelo Colegiado. Ônus sucumbenciais redistribuídos. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. (Apelação Cível Nº 70014074132, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Maria Nedel Scalzilli, Julgado em 25/05/2007).

Assim sendo, tenho que deva ser reconhecida a responsabilidade dos demandados pelos fatos articulados na inicial.

Dito isso, passo à análise do quantum indenizatório.

b) Quantum indenizatório

15. A parte autora, em seu apelo, pede seja majorado o quantum indenizatório para R$ 5.000,00, nos termos como pedido na inicial, em razão do caráter punitivo-pedagógico da medida.

16. A indenização por dano moral deve representar para a vítima uma satisfação capaz de amenizar de alguma forma o sofrimento impingido. A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que não signifique um enriquecimento sem causa para a vítima e produza impacto bastante no causador do mal a fim de dissuadi-lo de novo atentado.

Nesta linha, entendo que a condição econômica das partes, a repercussão do fato, a conduta do agente – análise de culpa ou dolo – devem ser perquiridos para a justa dosimetria do valor indenizatório.

No caso, a autora é agente de saúde, litiga sob o amparo da assistência judiciária gratuita (fl. 17), e foi submetida à situação discriminatória constrangedora. Os réus, por sua vez, praticaram ato ilícito extremamente reprovável, e, ainda que não demonstrem grande capacidade financeira, não aparentam, por outro lado, não possuírem condições de arcar com uma indenização como aquela pleiteada na inicial.

17. Assim sendo, sopesadas as condições sócio-econômicas dos litigantes e a gravidade do fato, tenho que o quantum de R$ 1.500,00 fixado em sentença deve ser majorado para o patamar de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), quantia essa mais próxima do originalmente pleiteado na inicial, montante que considero suficiente para atenuar as conseqüências do dano causado à reputação da parte ofendida, não significando um enriquecimento sem causa para a parte demandante, punindo a responsável e dissuadindo-a da prática de novo atentado, montante esse acompanhado dos consectários legais, nos termos a seguir,

18. Quanto à correção monetária constitui mera atualização da moeda, devendo incidir a partir da fixação do quantum devido, é dizer, a partir do julgamento. Nesse sentido: REsp 316332 / RJ; Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior; Quarta Turma; DJ 18.11.2002 p. 220.

19. No que se refere aos juros moratórios, entendo cabível o início da contagem a partir do julgamento no qual foi arbitrado o valor da condenação. Considerando que o Magistrado se vale de critérios de eqüidade no arbitramento da reparação, a data do evento danoso e o tempo decorrido até o julgamento são utilizados como parâmetros objetivos na fixação da condenação, de modo que o valor correspondente aos juros integra o montante da indenização.

Destaco que tal posicionamento não afronta o verbete da Súmula nº 54 do STJ. Ao revés, harmoniza-se com o entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça. A ultima ratio do enunciado sumular é destacar que a reparação civil por dano moral deve possuir tratamento diferenciado na sua quantificação em relação ao dano material, dado o objetivo pedagógico, punitivo e reparatório da condenação.

No tocante ao arbitramento do dano moral, o termo inicial da contagem deve ser a data do julgamento. Dessa forma, além de se ter o quantum indenizatório justo e atualizado, evita-se que a morosidade processual ou a demora do ofendido em ingressar com a correspondente ação indenizatória gere prejuízos à parte demandada, sobretudo, em razão do caráter pecuniário da condenação (STJ: REsp 618940 / MA; Rel. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro; Terceira Turma; julgado em 24/05/2005; DJ 08.08.2005 p. 302.).

20. Portanto, vai provido o apelo da autora, para majorar a verba indenizatória para R$ 4.000,00, a ser corrigida monetariamente pelo IGP-M e acrescida de juros de mora de 12% ao ano, a contar deste acórdão.

II. Dispositivo

21. Ante o exposto, voto por: (a) negar provimento ao apelo dos réus; (b) dar provimento ao apelo da autora, para, majorando o quantum indenizatório, condenar os réus a arcar, solidariamente, com a quantia de R$ 4.000,00, a ser atualizada monetariamente pelo IGP-M e acrescida de juros de mora de 12% ao ano, a contar da data deste acórdão.

Des. Otávio Augusto de Freitas Barcellos (PRESIDENTE E REVISOR) – De acordo.

Des. Angelo Maraninchi Giannakos – De acordo.

DES. OTÁVIO AUGUSTO DE FREITAS BARCELLOS – Presidente – Apelação Cível nº 70017041955, Comarca de Santiago: “NEGARAM PROVIMENTO AO APELO DOS RÉUS E DERAM PROVIMENTO AO APELO DA AUTORA. UNÂNIME.”