Dom Fabien Raharilamboniaina, OCD, fala-nos do Papa e de Teresinha

[FonteThérèse de Lisieux
Tradução: Pedro Ravazzano]

Quando de nossa visita “ad limina”, dos bispos de Madagascar, no momento em que me apresentei como bispo carmelita, diante de todos os meus confrades, o Santo Padre tomou a palavra para partilhar conosco da sua experiência com Santa Teresa do Menino Jesus.

Ele nos disse que descobriu a espiritualidade de Santa Teresinha em 1991 e que depois desta data Teresa não deixou de realizar surpresas em sua vida, inclusive nos tempos atuais. A santa sempre envia um sinal quando intercede por ele. Teresa está além das nossas expectativas e nos dá o que sequer imaginamos.

O Papa nos convidou a celebrar a Missa no outro dia pela manhã na Casa Santa Marta. Ele celebrou em ação de graças pela intercessão de Santa Teresinha. Depois da Eucaristia, perguntou o meu nome sem eu saber o porquê.

Alguns minutos depois, surpreendi-me quando o próprio Papa me buscava pelo telefone, em meu quarto em Santa Marta. Infelizmente ou providencialmente, eu estava ausente. Contudo, ele enviou uma pessoa em minha procura quando já estava a ponto de partir. Este funcionário me guiou até os seus aposentos.

O Papa estava orgulhoso de me mostrar as relíquias de Santa Teresinha e dos seus pais que se encontravam ao lado do seu escritório. Eu estava maravilhado. O Papa Francisco confirmou a sua proximidade com a espiritualidade de Teresa, tão simples e essencial, mas de modo eficaz. Ele me convidou à oração, pedindo a Teresinha pela minha missão. Nós dois rogamos a Teresa a fim de que seus pais realizassem um milagre para a canonização e sobretudo neste momento do sínodo sobre a família.

Eu estava maravilhado pela simplicidade e pela confiança do Papa, pelo seu amor à Teresinha. Ele novamente me convidou à Casa Santa Marta: “Venite a dialogare”, conforme a sua expressão.

Durante a nossa estadia em Santa Marta, nós tomamos café-da-manhã, almoçamos e jantamos junto ao Santo Padre no mesmo refeitório. Alegrava-me ao vê-lo falando diretamente com os cozinheiros, entrando na cozinha para perguntá-los da comida, de prepara-nos e servir-nos um arroz que é próprio nosso, refeição principal malgaxe.

De volta ao meu país, Madagascar, estamos agora nos preparando ativamente para a visita das relíquias da família Martin, de Santa Teresinha e dos Beatos Luís e Zélia, que virão em nossa casa em 2015, durante o período da JMJ local que reunirá cerca de 40.000 jovens.

Retirado e traduzido de “Thérèse de Lisieux – La revue du Sanctuaire, Juin 2014”

O machismo teológico do pensamento cristão tradicional

Perdoem-me a sinceridade, mas o “perfume” deste “canteiro de obras chamado teologia” apresentado pelo pe. Elias Souza tem cheiro é de esterco. O texto é um ultraje tanto à teologia quanto às próprias mulheres em cuja defesa alegadamente se levanta. A seguir, comento os pontos que são mais escandalosos:

– O assunto “ordenação de mulheres” não tem nada de “polêmico”. Na verdade este assunto está encerrado, porque a Igreja já se manifestou de forma definitiva sobre a questão dizendo que Lhe era impossível conferir o sacramento da Ordem para mulheres. Para quem não lembra, o texto da Ordinatio Sacerdotalis de S.S. João Paulo II é o seguinte:

Portanto, para que seja excluída qualquer dúvida em assunto da máxima importância, que pertence à própria constituição divina da Igreja, em virtude do meu ministério de confirmar os irmãos (cfr Lc 22,32), declaro que a Igreja não tem absolutamente a faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, e que esta sentença deve ser considerada como definitiva por todos os fiéis da Igreja.

Acrescente-se o fato de que a Igreja prevê excomunhão latae sententiae para quem tenta ordenar mulheres (bem como para as mulheres que tentam ser ordenadas). Mais claro do que isto é impossível.

– As idéias de “um inevitável tom machista” (!) na teologia clássica ou de uma “visão androcêntrica” (!!) do Cristianismo são um ultraje teológico, inconcebíveis na pena de um sacerdote católico. Além, é claro, de serem uma grosseira falsificação histórica. Bastaria ao pe. Elias abrir a Summa – este escrito escolástico machista! – para ver o que Santo Tomás diz sobre a origem da mulher; se ele cita a tese de Aristóteles de que a mulher é “um varão frustrado”, é justamente para precisar-lhe os limites de modo a não diminuir a dignidade feminina decorrente da Criação: com relação à totalidade da natureza, a mulher não é algo ocasional. Porque “a intenção de toda a natureza depende de Deus, Autor da mesma, o Qual ao produzi-la não fez somente o homem, mas também a mulher” (Ia, q.92, a.1, ad.1).

Aquela clássica exegese da passagem do Gênesis – segundo a qual a mulher é igual ao homem por ter sido feita de uma sua costela – encontra-se também nesta questão da Summa: “a mulher não deve dominar o varão (1 Tm 2, 12), motivo pelo qual não foi formada de sua cabeça. Tampouco deve o varão desprezá-la como se ela lhe estive submetida servilmente: por isso ela não lhe foi formada dos pés” (id. ibid., a.3, resp.). E, no último artigo (id. ibid., a.4), o Aquinate defende sem pestanejar que a mulher foi criada diretamente por Deus, contra os que tentavam diminuir-lhe a dignidade por ter sido ela feita a partir de uma costela do homem.

– O que o sacerdote quer dizer com “[é] tempo de (…) questionar a hierarquia da natureza humana sobre a não-humana”?! Por acaso desconhece o padre que a natureza humana é, sim, superior – e muito! – à natureza bruta, à vegetal ou mesmo à animal? Nunca leu o padre nas Escrituras Sagradas que Deus fez o homem quase igual aos anjos e o coroou de glória e de honras (Sl 8, 6), dando-lhe poder e submetendo-lhe “todo o universo,  rebanhos e gados, e até os animais bravios, pássaros do céu e peixes do mar, tudo o que se move nas águas do oceano” (Sl 8, 7b – 9)? Como assim “questionar a hierarquia da natureza humana sobre a não-humana”, acaso o padre quer questionar o próprio Deus Altíssimo que fala através das Escrituras Sagradas? E é com este cabedal de fecundidade teológica que o sujeito abre a pouca para chamar de “machistas” os santos da Igreja de Deus?

– Por fim, é outro absurdo ignorante a idéia de que hoje “é tempo da mulher fazer teologia”. O Pe. Elias está profundamente atrasado. Afinal de contas, nas profundezas da Idade das Trevas – no ano de mil trezentos e tantos – Santa Catarina de Sena (doutora da Igreja!) já fazia teologia. E hoje, dois de janeiro, celebramos o aniversário natalício de outra mulher que também fez teologia: Teresa de Lisieux, nossa Santa Teresinha de Jesus, que inscreveu o seu nome entre os Doutores da Igreja justamente porque soube muito bem beber das fontes da Teologia Cristã (ao contrário do Pe. Elias, que prefere cuspir no passado da Igreja). Ao contrário das teólogas-eco-feministas-holísticas-revolucionárias-ultrajovens que o Pe. Elias apregoa – e que aliás nunca produziram absolutamente nada que fosse útil à Igreja de Cristo, mas enfim… -, são as santas católicas – estas insignes personalidades femininas – que verdadeiramente dignificam a mulher: e estas mulheres foram notáveis justamente por se esforçarem para estar em estreita comunhão com a Igreja Católica, fora da qual só existe confusão e onde todas as “teologias” sempre foram estéreis e vãs.

Sobre jovens inglesas e francesas [a respeito da morte de Amy Winehouse]

Foto: AP via G1

A Amy Winehouse foi encontrada morta em Londres hoje. Provavelmente as únicas músicas que ouvi da garota foram as que, indistinguíveis, nos chegam aos ouvidos no meio da poluição sonora das cidades; não seria capaz de me lembrar, agora, de nenhuma delas. Mas o que me espantou foi saber que a Amy, morta aos 27 anos, “seguiu o mesmo roteiro trágico de outros ídolos mundiais da música pop, como Janis Joplin, Kurt Cobain, Jim Morrison e Jimi Hendrix”.

Porque do Nirvana e do The Doors eu sei, sim, algumas músicas. E aí, de repente, a morta precoce da jovem cantora inglesa passa a ter alguma coisa a ver comigo: quando menos, me faz lembrar de algumas bandas que eu escutei na minha adolescência. Faz-me lembrar de algumas mortes pelas quais eu já me interessei. E, em última instância, faz-me pensar na morte, que é coisa muito útil e muito santa de se fazer.

Vinte e sete anos! É a minha idade. E, por mais que a Florbela diga “tenho vinte e três anos! Sou velhinha!”, o fato é que… não é uma vida avançada em anos, da qual se possa dizer que foi longeva. Morrer aos vinte e poucos (ou mesmo aos vinte e muitos) é humanamente uma tragédia, é uma interrupção precoce de uma vida que – como no fundo todos esperamos – poderia ter dado mais a si própria e ao mundo.

Talvez haja quem diga que “foi intensa”. No caso da Amy (ou da Janis ou do Kurt), eu diria antes que foi fútil e vazia. Sim, a garota provavelmente gastou até os vinte e sete anos muito mais dinheiro do que a maior parte de nós vai ser capaz de juntar na vida toda. Mas as coisas do mundo – como fama e dinheiro – naturalmente só fazem sentido enquanto se está no mundo. E a morte trágica e precoce de grandes astros da música parece nos dizer aos ouvidos aquela passagem bíblica segundo a qual é tudo vaidade. É como se ela nos sussurrasse ou, antes, nos gritasse alto para nos despertar de nossa letargia: vê, sic transit gloria mundi. Assim passa a glória do mundo! Morreram Cobain, Morrison, Hendrix, Joplin e Winehouse. Para os seus fãs, ficaram as suas músicas e a saudade; mas para eles próprios, de que valeu?

Talvez digam: “foi intenso!”. Talvez nos citem o Neil Young e nos digam que é melhor queimar de uma vez do que apagar-se aos poucos: it’s better to burn out than to fade away. Enfim, talvez nos digam qualquer coisa; mas, data venia, eu preciso discordar. A nossa vida é potencialmente curta (uma vez que cada um de nós pode morrer hoje mesmo) e, por isso mesmo, ela precisa ser intensa; mas o próprio fato da efemeridade da vida deveria nos fazer pensar no além-vida. “Intensa” é uma vida que se prepara para o futuro; desperdiçar loucamente uma fortuna – os anos de vida – cujo tamanho não se sabe ao certo (mas que sempre nos parece estar ainda “muito longe” de acabar) não é intenso, e sim irresponsável.

Eu conheço uma vida curta que foi verdadeiramente intensa. Não viveu os vinte e sete anos da Amy, mas ainda menos: vinte e quatro anos. Não ganhou o dinheiro de um Kurt Cobain ou de um Jimi Hendrix e nem teve em vida a fama de uma Amy ou de uma Janis, mas soube empregar verdadeiramente bem os seus anos de juventude. Era francesa e se chamava Teresa. E, entre tantas outras coisas, legou-nos versos:

Revesti as armas do Todo-Poderoso,
Sua divina mão dignou-se me adornar;
Doravante, nada me assusta.
Do seu amor, quem pode me separar?
Ao seu lado, lançando-me na arena,
Não temerei nem o ferro, nem o fogo.
Meus inimigos saberão que eu sou Rainha,
Que sou a esposa de um Deus!
Oh, meu Jesus! Guardarei a armadura
Com que me visto ante teus adorados olhos.
Até o entardecer da vida, minha mais bela veste
Serão meus santos votos!

[…]

Se do guerreiro tenho as armas poderosas,
Se o imito e luto com valentia,
Como a Virgem de encantos graciosos,
Também quero cantar, combatendo.
Fazes vibrar as cordas de tua lira
E esta lira, oh, Jesus, é meu coração!
Posso, então, das tuas misericórdias
Cantar a força e a doçura.
Sorrindo, desafio o combate
E, nos teus braços, oh , meu divino Esposo,
Cantando hei de morrer, sobre o campo de batalha,
Com as armas na mão!…

[“Minhas armas”, in “Obras Completas de Santa Teresa do Menino Jesus e da Sagrada Face”.
pp. 622-624. São Paulo, Editora Paulus, 2002]

A morte no campo de batalha, com as armas na mão: eis o desejo que convém a uma alma jovem! Não a morte em um palco ou – pior ainda – em um apartamento vazio e solitário, desvanecido o glamour após se deixar o palco. Não, isto não é uma vida intensa; a vida de combate preconizada pela santa francesa morta aos vinte e quatro anos é que o é. Que o Altíssimo tenha misericórdia da Winehouse e de tantos outros mortos em condições similares. E que a tragédia ocorrida com a roqueira inglesa faça-nos ver que a vida é curta e, portanto, é fundamental que seja bem vivida.

Beatificação dos pais de Santa Teresinha

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Hoje é o Dia Mundial das Missões. Santa Teresinha do Menino Jesus é a padroeira das Missões. É muitíssimo apropriado, então, que os pais da pequena Doutora da Igreja sejam beatificados no dia de hoje.

Santa Teresinha foi carmelita; vivendo em clausura, como pode ser padroeira das Missões? Bento XVI o explica: “todo cristão, mesmo se é forçado a viver na solidão, pode ser um missionário autêntico através da oração”. E ainda aproveitou para “enfatizar com maior força que o primeiro empenho missionário de cada um de nós é justamente a oração”.

“Santa Teresinha morreu aos 24 anos e é Doutora da Igreja. Numa de de suas cartas, ela testemunhou a santidade de seus pais: O bom Deus me deu um pai e uma mãe mais dignos do céu que da terra” (Canção Nova). Uma grande árvore, de ordinário, não nasce sozinha, e sim no meio da floresta; via de regra, as montanhas estão nas cordilheiras, e não isoladas no meio da planície. Se um santo se elevou até o ponto de ser apresentado pela Igreja como exemplo e modelo para ser seguido, é de se esperar que as pessoas próximas a este santo também tenham exercido a virtude em grau heróico. No caso dos pais de Santa Teresinha – Louis e Zélie Martin -, a Igreja reconheceu hoje, com a beatificação de ambos, o influxo salutar que a santidade da filha teve nos que lhe eram próximos – ou ainda, o mais provável, o efeito miraculoso que a santidade do casal teve na alma da pequena Teresinha de Lisieux.

A beatificação do casal é ainda testemunho eloqüente de uma outra realidade: o matrimônio é caminho de santificação. Trazendo para mais perto da glória dos altares os pais de Santa Teresinha – pais de nove filhos -, a Igreja realça a importância fundamental da vida conjugal, da entrega sem reservas dos esposos que forma a família – “a família, cujo papel é fundamental na educação dos filhos num espírito universal, aberto e responsável em relação ao mundo e seus problemas, como também na formação das vocações para a vida missionária” (Bento XVI em Pompeia).

O Senhor ouviu as nossas orações pela beatificação dos pais de Santa Teresa. Mais dois servos de Deus são, a partir de hoje, bem-aventurados. O milagre da beatificação foi a cura de um recém-nascido, Pietro Schiliro, que nasceu com uma má-formação pulmonar congênita e não tinha esperanças de vida. Hoje, ele tem seis anos, e pode participar das cerimônias que a Igreja celebra em honra dos beatos Louis e Zélie Martin, a cuja intercessão ele deve a sua vida. Que os novos beatos intercedam por nós. Que as famílias dos nossos dias possam se espelhar na família Martin, a fim de que cada lar cristão possa ser, sempre e verdadeiramente, fonte de virtude e de santidade.