Não basta não ser pecador, é preciso ser santo

Ainda sobre a questão dos abusos sexuais praticados por membros do clero, foram publicados nos últimos dias diversos textos abordando aspectos bastante pertinentes do problema. Comento aqui somente um ou outro ponto deles, escolhidos por afinidade temática e não por serem necessariamente os mais importantes. O assunto é bem grave e demanda mesmo textos longos, cuja leitura na íntegra este post não tem a pretensão de suprir.

Chamo a atenção, em primeiríssimo lugar, para o Carlos Ramalhete apontando o homossexualismo como a verdadeira raiz do problema. «O que agora vem se tornando claro, ainda que disso pouco se falasse no começo do escândalo, mas que eu vinha falando desde que estes horrores inomináveis começaram a vir à luz, é que as vítimas, em sua imensíssima maioria, não eram criancinhas, mas rapazinhos. Em outras palavras, não se trata, nunca se tratou, de um escândalo de pedofilia, sim de efebofilia. Ou, em outras palavras, de homossexualismo.» 

Esta análise, é importante frisar, não é característica exclusiva de católicos conservadores. Gostaria de lembrar que mesmo os ataques virulentos de um Reinaldo Azevedo contra o celibato católico têm esse mesmíssimo pano de fundo. Veja-se, por exemplo, velharias como “Igreja não é armário”, “Ou a Igreja acaba com o celibato ou o celibato acaba com a Igreja” (sic) e “Sacerdócio não é armário”. Naturalmente, este blog por diversas vezes já se levantou contra a tagarelice do sr. Reinaldo quando de suas incursões pouco piedosas no terreno do Catolicismo; neste caso específico, no entanto, o erro dele é de terapêutica e não de diagnóstico. A constatação de que há homossexuais infiltrados no clero católico é uma constatação verdadeira; a idéia de acabar com o celibato por conta disso é que é uma estupidez.

É compreensível que as pessoas — de boa ou de má vontade — queiram apontar soluções para o problema; talvez mais do que nunca, esta é uma marca dos dias atuais. Mas existem alguns pontos que não podem ser obscurecidos. Primeiro, que a reforma da vida sacerdotal virá dos sacerdotes e não dos leigos — e, portanto, as intermináveis laudas publicadas na internet sobre o assunto não podem aspirar senão a um papel bem modesto nesta batalha. Segundo, que a abominação da desolação exige de nós orações redobradas: o Papa Francisco chegou a pedir ao povo de Deus jejum e oração, lembrando que — segundo Nosso Senhor — é somente à força deles que certos demônios podem ser expulsados. E, terceiro, que a vastidão dos pecados do clero não nos pode fazer perder de vista — nem por um segundo — a multidão ainda mais inumerável de padres honestos, que decerto prefeririam morrer a desonrar a vocação sacerdotal a que um dia foram chamados. É preciso, mais do que nunca, rezar por eles.

Este último ponto, no entanto, precisa de maiores desenvolvimentos. É que o lobby gay dentro da Igreja aparenta ser tão vasto que houve até quem falasse em uma corrupção do clero a rivalizar com a da época dos Bórgia (!). A retórica é exagerada e até mesmo injusta; mas que se deixe isso um pouco de lado por enquanto, porque a situação é calamitosa, e às vezes acontece de pessoas bem intencionadas errarem a mão na hora de se levantarem contra injustiças. O fato é que um laxismo generalizado paira sobre a Igreja, e isso é escandaloso e atrai a ira de Deus. «O triunfo da degradação homossexual em tantas dioceses e ministérios na Igreja Católica», diz o artigo do Matthew Hoffman, «deve-se a uma causa fundamental: a aceitação generalizada de um laxismo moral que minimiza a gravidade do pecado sexual e entende a continência como um simples “ideal”, fora do alcance de um católico comum.»

Trata-se de um naturalismo grosseiro que desdenha da graça de Deus e que, em última instância, almeja confinar a sublime vocação humana à santidade em uma vida medíocre e acomodada. Trata-se de uma completa inversão do ideário missionário da Igreja, que sempre consistiu na elevação moral dos católicos para muito além do espírito do seu tempo e, hoje, parece empenhado em reduzir as sublimes exigências do Cristianismo à altura de homens tíbios e pusilânimes, satisfeitos em se arrastar mundo afora curvados sob o peso da própria sensualidade. Trata-se, em suma, de algo indigno da Igreja nascida do costado traspassado de Cristo no alto da Cruz, que foi fundada para arrancar dolorosamente o pecado do mundo e não para acomodar confortavelmente o mundo no pecado.

Essas cores podem parecer demasiado vívidas, mas é sinceramente difícil escolher outras com as quais se possa pintar honestamente o panorama atual. Cada notícia que nos chega é mais escabrosa do a anterior. Agora o Michael Voris denunciou uma rede de tráfico de seminaristas homossexuais (!) da Colômbia para os Estados Unidos, que funcionou durante anos e se estendia por diversas paróquias e dioceses do leste americano. A matéria fala em “por lo menos seis diócesis implicadas”, número que, por conta das informações que continuam chegando, “sigue creciendo”.

Tudo isso é um acinte, é um escárnio, é uma vergonha. E uma situação assim drástica exige uma reação também vigorosa, enérgica, radical. Diante de tamanha podridão não é suficiente se manter fleumaticamente afastado: é preciso o combate explosivo, colérico, visceral. Os pecados são muitos e muito graves; é preciso contrapôr a eles um clero santo. Não é o suficiente guardar a própria castidade, é preciso fazer violência contra o laxismo hegemônico. Não basta não ser homossexual, não basta não estar envolvido em escândalos, é preciso denunciar e combater os que desonram a Igreja de Nosso Senhor. Não basta levar uma vida meia-boca, dessas que, como se diz, “não fede nem cheira”: é preciso ser trigo sadio e vistoso, que se ergue, dourado, em direção ao sol, abafando e sufocando com a própria virtude o joio circundante. Não basta não ser pecador; é preciso ser santo.

E que nós, leigos, possamos rezar mais e nos mortificar mais, que passemos a nos voltar para Deus com mais frequência e com mais confiança, e que levemos mais a sério a Fé em Cristo que a Igreja nos legou. Ela sofre e agoniza. Nós queremos vê-La saudável e resplandecente, iluminando todos os homens e sendo, na História, instrumento eficaz da glória de Deus e da salvação das almas. Mas nossas mãos estão atadas. Sacerdotes de Cristo, tomai sob vosso encargo, corajosamente, virilmente, a defesa da Esposa de Nosso Senhor! É a vós que primeiro compete restaurá-La. Sem vós nada podemos fazer.

Canonização sem martírio nem heroísmo: os altares ficam mais próximos?

Com o motu proprio Maiorem hac dilectionem, publicado no último dia 11 de julho, o Papa Francisco estabeleceu um novo critério para a canonização dos santos: a oferta da vida (vitae oblatio), que agora passa a ser uma nova causa para o processo de beatificação e canonização. Até então o caminho para os altares era aberto pelas hipóteses do martírio (super martyrio) e do heroísmo das virtudes (super heroicitatem virtutum).

Na prática, o que acontece é que a Congregação para a Causa dos Santos vai passar a admitir processos de canonização baseados na oferta da própria vida, ainda que a morte não se dê in odium Fidei (hipótese tradicional de martírio) e ainda que a pessoa não tenha levado uma vida extraordinária na prática das virtudes cristãs (hipótese tradicional de heroísmo das virtudes). Ou seja, será possível postular a canonização de uma pessoa que, ainda não tendo exercido durante a vida as virtudes em grau heróico, ofereça propter caritatem a própria vida e aceite uma morte prematura mesmo em situações distintas do martírio propriamente dito.

As condições, segundo o documento (Art. 2), são as seguintes:

a) oferta livre e voluntária da vida e aceitação heroica propter caritatem de uma morte certa e a curto prazo;
b) nexo entre a oferta da vida e a morte prematura;
c) exercício, pelo menos em grau ordinário, das virtudes cristãs antes da oferta da vida e, depois, até à morte;
d) existência da fama de santidade e de sinais, pelo menos depois da morte;
e) necessidade do milagre para a beatificação, ocorrido depois da morte do Servo de Deus e por sua intercessão.

A ideia (ventilada, por exemplo, aqui) de que o Papa Francisco esteja querendo canonizar cristãos não-católicos não se sustenta. Se ele quisesse fazê-lo, seria muito mais fácil utilizar-se da hipótese (desde sempre vigente!) do martírio, uma vez que não-católicos são, ainda hoje, perseguidos e mortos mundo afora por conta de sua fé. A perseguição movida contra cristãos, por exemplo, pelos muçulmanos, naturalmente não conhece barreiras denominacionais — para os sarracenos, um herege é tão infiel quanto um católico, e um e outro são igualmente assassinados por não aceitarem se prostrar diante do Allah de Maomé.

Ora, todos sabemos «que aqueles que sofrem de ignorância da verdadeira religião, se aquela é invencível, não são eles ante os olhos do Senhor réus por isso de culpa alguma» (Pio IX, Singulari Quadam, 1854, Denzinger, 1647, apud Montfort) e, a princípio, uma pessoa que prefere morrer a negar suas convicções transmite um atestado bastante credível da própria boa-fé (conquanto matar por aquilo em que se acredita, e eventualmente morrer no processo — caso, por exemplo, dos fautores de todas as revoluções do mundo –, seja coisa banal e bastante condizente com os instintos desordenados humanos, naturalmente não é disso que se trata quando, por exemplo, cristãos coptas morrem em uma Igreja explodida por terroristas islâmicos). Aqui a virtude (mesmo que meramente humana) é inegável e, em muitos aspectos, verdadeiramente admirável.

Se o objetivo fosse canonizar não-católicos, então, não seria necessário alterar os critérios vigentes de canonização. Seria perfeitamente possível lançar mão dos mártires não-católicos que os muçulmanos, inadvertidamente, costumam mandar para o Paraíso.

No entanto, elevar aos altares essas pessoas não é possível. Primeiro porque fora da Igreja nenhuma salvação é certa, nem mesmo a do martírio: o Concílio de Florença atesta que fora da comunhão da Igreja não se pode salvar nem mesmo vertendo o sangue em nome de Cristo, e diante de uma sentença assim peremptória não é possível abrir brecha para nenhuma espécie de irenismo. No mesmo sentido, embora de maneira mais comedida, o Papa Pio IX ensina a mesma coisa: é um erro esperar bem da salvação dos que vivem fora da verdadeira Igreja de Nosso Senhor (Syllabus, erro 17).

Em segundo (e mais importante) lugar porque declarar alguém santo — “santo de altar” — não é meramente ter fundada esperança de que o sujeito se encontra na Bem-Aventurança Eterna, não é apenas encontrar na vida da pessoa aspectos admiráveis: é mais que isso. Canonizar é insculpir uma vida humana no frontispício da Igreja de Cristo, para louvor público de Deus e edificação dos fiéis. É abrir uns rasgos na Eternidade e trazer para as feridas da Igreja Militante uns lampejos da glória da Igreja Triunfante. Qualquer um pode salvar-se mediante um ato de contrição sincero in articulo mortis (e nós esperamos que sejam muitos os que ingressam nas Moradas Eternas por esta via!), mas não é disso que se trata quando estamos falando em eternizar histórias humanas nos altares imorredouros da indefectível Igreja de Nosso Senhor.

A virtude é virtude onde quer que se encontre — e isso não foi jamais negado –, mas a canonização não é um mero atestado de que alguém foi “uma pessoa boa”. Sem dúvidas é justo, em princípio, reconhecer que há um grande valor (talvez até mesmo — permita-o Deus! — sobrenatural) nestas mortes provocadas não por um ódio específico às heresias, mas sim pela imagem de Cristo que, nelas, conquanto deformada, ainda bruxuleia. Isso, no entanto, não autoriza jamais cogitar de apresentar um herege como modelo de santidade à imitação dos fiéis católicos. Evidentemente não é possível ornamentar a face visível da Igreja (Seu culto público) com almas que em vida A rejeitaram externamente — ainda que possam, na glória, fazer enfim parte d’Ela. São duas coisas completamente diferentes.

E se não é possível canonizar indistintamente os que são mortos por ódio a Deus, tampouco se pode conceder altares sem mais critérios aos que entregam a vida por amor ao próximo. Inclusive parece até mais fácil encontrar não-católicos martirizados do que não-católicos dispostos a realizar a oferta da própria vida propter caritatem. A situação atual não é, portanto, mais laxa do que a anterior. E se não era anteriormente possível canonizar entre os não-católicos nem mesmo as almas simples que derramaram o próprio sangue por causa de Nosso Senhor, pela exata mesma razão não é possível, agora, canonizar aquelas que, fora da Igreja, abrem mão de sua vida por amor ao próximo. A mera idéia não faz nem sentido.

O que muda então com o documento? O Padre Z. arriscou alguns comentários, e lembrou alguns santos que facilmente se encaixariam nesta hipótese de vitae oblatio — como S. Maximiliano Kolbe, que se ofereceu em lugar de um prisioneiro em um campo nazista, ou Santa Gianna Beretta Molla, que mesmo diagnosticada com um câncer de útero manteve a gravidez até que sua filha nascesse. São exemplos que revelam uma coisa que convém não esquecer: abrir mão da própria vida em favor de outrem já é uma atitude que apresenta rasgos de heroísmo! Não ficou mais fácil ser canonizado. Os altares não são para os medianos.

O Papa Francisco não está tornando mais fácil chegar ao Céu (afinal de contas, quem em sã consciência diria que é fácil morrer por alguém?): os altares continuam tão altos quanto sempre estiveram. Não é possível ao homem elevar-se aos altares: o que ele pode — e deve! — fazer é se deixar ser elevado até eles por Deus. Porque pode até haver canonização sem milagre, sem martírio, mesmo sem virtudes extraordinárias: o que não pode haver, jamais, é canonização sem santidade. Esta é a que não pode nunca faltar. Esta é a que somente Deus pode conceder.

Papa Francisco: vejam bem que o Diabo existe!

Todos somos tentados, porque a lei da vida espiritual, a nossa vida cristã, é uma luta. O príncipe deste mundo – o diabo – não quer a nossa santidade, não quer que sigamos Cristo. Alguém de vocês, talvez, não sei, possa dizer: ‘Mas, padre, que antigo o senhor é, falar de diabo no século XXI!’. Mas vejam bem que o diabo existe! Mesmo no século XXI! E não devemos ser ingênuos. Temos de aprender com o Evangelho como se faz a luta contra o diabo.

Papa Francisco,
Homilia na Domus Sanctae Marthae,
11 de abril de 2014

Subir ainda um pouco mais…!

Foi com espanto que eu vi, hoje pela manhã, estas fotos de adolescentes russos nas alturas. Não sei se é algum tipo de competição, se alguma maneira de experimentar sensações intensas (uma espécie de substituto psicológico para o efeito que, em outros tempos e lugares, seria buscado por meio de drogas ou álcool), se simplesmente um desgosto por uma vida que se percebe vazia… não sei. Também não sei quem inventou esta moda ou se alguém já se machucou fazendo isso; mas o que salta aos olhos é a imponência das imagens, que em alguns casos chega a dar vertigens.

As fotos me parecem, na verdade, extremamente adequadas à juventude, a esta fase da vida em que a possibilidade de se mudar o mundo parece tão concreta que, certas vezes, a gente acaba mudando-o mesmo. Expressão desordenada da juventude, por certo, uma vez que ninguém pode colocar a própria vida em risco sem razão proporcionada; mas deixemos estes pormenores técnicos de lado por ora. Ninguém imagine que eu esteja defendendo a irresponsabilidade; o meu ponto é precisamente que é possível explorar as características próprias da juventude sem necessariamente se tornar irresponsável.

A grandeza! A altura, o vento no rosto, o mundo pequeno sob os pés, o céu próximo a ponto de dar a impressão de que seria possível tocá-lo com as mãos caso se subisse só um pouquinho a mais! A imagem se presta a uma bonita metáfora sobre o itinerário espiritual, com os arroubos próprios da juventude que se reproduzem tão bem, no plano religioso, nos dos neo-conversos. Costuma-se dizer que a maturidade (natural) vem quando a gente troca o desejo de mudar o mundo pelo de pagar as contas no final do mês; no plano espiritual, no entanto, tal não pode acontecer. É preciso sempre voltar ao altar do Todo-Poderoso que é a verdadeira Fonte da Juventude – ad Deum qui laetificat juventutem meam, como rezamos nas orações ao pé do altar – para ali encontrar este entusiasmo com a a vida e com a vocação cristã, esta indizível sensação de que o mundo está na iminência de ser mudado e que, portanto, vale a pena esforçar-se ainda um pouco mais. Em suma, esta capacidade (tão tipicamente jovem) de não se deixar desanimar, de não esmorecer diante das dificuldades que, talvez, insistam em se levantar.

O céu! O corpo solto, o mundo lá embaixo, distante. Desimportante. O tênue equilíbrio – na vida da graça? – que precisa ser mantido com diligência, senão cairemos – no pecado? – e morreremos. Mais sentido que o Skywalking russo tem a vida espiritual cristã. Mais importante que aproximar-se do céu físico é se esforçar por chegar (ainda!) mais perto de Deus. Mais perigoso que o espaço vazio sob os jovens é o Inferno aberto a nossos pés. E mais bela – infinitamente mais bela! – do que a vista das alturas é a visão de Deus.

E que venha 2012!

Passou-se mais um ano. Esta noite nós damos adeus ao ano de 2011 e, ao mesmo tempo, esperamos um próspero ano novo. Os  votos que todas as pessoas fazem são sempre os mesmos: muita paz, muita saúde, felicidade, realizações, dinheiro. Sobre estes (indiscutíveis) bons votos eu não quero me demorar. Quero falar sobre outras coisas.

Primeiro, sobre uma tirinha excelente que eu vi no Facebook por estes dias, da Mafalda dizendo que o ano novo espera pessoas melhores mais do que estas esperam um ano novo melhor. E a garota está coberta de razão. Muitas vezes nós esperamos que os nossos problemas se resolvam num passe de mágica, ou achamos que existe alguma confluência de “bons fluidos cósmicos” ou seja-lá-o-quê no dia primeiro de janeiro capaz de transformar as nossas vidas. Quando na verdade é uma noite como todas as outras, e a função simbólica que ela possui – e indubitavelmente possui – não decorre de nenhuma característica que lhe é intrínseca, mas sim do que nós decidimos fazer com ela. As promessas de ano novo (já falei sobre isto algures) têm valor não por serem feitas no ano novo, mas sim por serem feitas, simplesmente. Se alguém tem mais esperança em um ano novo melhor do que tem o propósito de melhorar no próximo ano… esta pessoa está fadada a se decepcionar. Que o próximo ano nos encontre melhores, como já desejei aqui há dois anos.

Um corolário disto que foi exposto é que há geralmente algo de muito errado nos nossos votos de “feliz 2012”. Como eu disse, é perfeitamente justo e razoável que as pessoas desejem saúde, dinheiro, paz, amor, felicidade; o que não é razoável é que as pessoas não desejem as coisas que dependem do empenho humano e sem as quais todo o resto perde o sentido. Por isto, àqueles votos padrões de ano novo, eu gostaria de acrescentar mais alguns que considero de absoluta importância.

Que, em 2012, você seja mais santo. Se você não é católico (ou se é “católico não-praticante”), que encontre a Igreja de Cristo que lhe espera; se ja é católico, que possa aumentar a sua comunhão com o Corpo Místico de Cristo. Que, em 2012, você reze mais e reserve uma maior (e melhor) parte do seu tempo para Deus. Que você seja mais generoso e menos egoísta; que se empenhe em cumprir os seus deveres de estado com mais diligência do que tem empregado neles até então. Que você estude mais, trabalhe mais e ame mais. Não um estudo supérfluo e fútil, mas o estudo que conduz à contemplação das coisas divinas. Não um trabalho do qual se é escravo ou que se realiza como um vício, mas o trabalho que serve à maior glória de Deus. Não um amor naturalista confundido com “passar a mão na cabeça”, mas o amor jungido à Verdade que leva à salvação das almas. Que, em 2012, você seja um filho de Deus melhor do que tem sido até então.

Que venha 2012! Que, no ano novo, nós sejamos pessoas melhores. Os desejos de um santo ano novo têm implícitos os votos de que sejamos mais santos no ano novo que ora se inicia; que assim seja. Que a Virgem Mãe de Deus (de cuja festa solene já se celebram hoje as Vésperas) seja em nosso favor e, na presença do Seu Divino Filho, lembre-se de falar coisas boas a nosso respeito, apesar de nossas muitas faltas. Que Ela nos ajude. Feliz ano novo a todos os leitores do Deus lo Vult!

“Ó, que grandioso é o sacerdócio!”

O Santo Cura d’Ars sempre manifestou a mais alta consideração pelo dom recebido. Afirmava: “Ó, que grandioso é o sacerdócio! Só se compreende bem no Céu… mas se o compreendesse sobre a terra, morrer-se-ia, não de temor, mas de amor”

– Bento XVI, 05 de agosto de 2009

Hoje a Igreja celebra a festa de São João Maria Vianney, o santo cura d’Ars, patrono dos párocos, honra do clero francês. Um homem simples, mas que soube entregar-se desmedidamente ao serviço de Deus e, por isso, o Altíssimo fez maravilhas em sua vida.

Era filho de camponeses. Queria ser padre, mas quase não o consegue por conta dos sucessivos insucessos nos estudos necessários para tal. No entanto, não desistiu: contra todos os prognósticos, foi adiante, insistente, até conseguir levar a cabo os seus estudos e ordenar-se sacerdote do Deus Altíssimo.

A sua limitação intelectual chega a ser anedótica! Não sei a veracidade da história, mas conta-se que o santo, certa feita, confrontado com um seu superior que o tentava dissuadir do sacerdócio argumentando exatamente que a inteligência refinada (que tanto faltava ao santo!) era necessária ao ofício de pastoreio das almas, respondeu singelamente: “Davi, com uma atiradeira feita da mandíbula de um burro, derrubou o gigante Golias; imagine o que Deus não poderá fazer tendo nas mãos o burro inteiro?”. De onde se vê que, ao santo, embora talvez faltasse alguma habilidade mais específica exigida para os estudos acadêmicos, não lhe faltava sabedoria ou bom humor.

“Que grandioso dom é o sacerdócio”! Talvez o santo cura d’Ars percebesse-o melhor que os outros padres, porque para ele – devido à sua história – o aspecto do dom estava muito mais evidente do que o de mérito. Mas todo sacerdócio é um dom, ainda para o aluno laureado nos estudos do seminário, porque o sacerdócio é tão grandioso que ultrapassa infinitamente quaisquer méritos que os homens pudessem ter. Não, o sacerdócio não é a recompensa dos anos de estudos no seminário como um – digamos – diploma de medicina é a recompensa pelos anos de dedicação integral na faculdade. O sacerdócio é mais, muito mais: os efeitos são desproporcionais às (supostas) causas. De um médico pode-se dizer que é o que estudou na faculdade, e o mesmo de um engenheiro, um arquiteto, um jornalista; mas a santidade de um padre santo não encontra a sua causa nos estudos do seminário, por melhor aluno que ele tenha sido, por melhor o lugar onde ele tenha estudado. Olhe-se para o santo cura d’Ars! É de Deus que vem a santidade do sacerdócio. É um dom, um dom grandioso, com o qual Deus, pela Providência, agracia alguns dos Seus filhos.

Rezemos pelos sacerdotes! Para que sejam padres conforme São João Maria Vianney. Para que reconheçam quão grandioso é o dom do sacerdócio que do Altíssimo receberam e pelo qual terão um dia que prestar contas. Para que deixem a santidade vir de Deus, do alto, e não brotar dos próprios esforços humanos. Para que sejam santos, honrando a dignidade da vocação à qual foram elevados. Para que Deus nos conceda sempre sacerdotes bons e fiéis para cuidar do Seu povo.

Bento XVI, sobre o Munus Sanctificandi

Leiam a Audiência Geral do Papa Bento XVI de ontem, sobre o munus sanctificandi dos sacerdotes (vejam uma versão em português no site da Canção Nova). Está primorosa. A expressão teológica tradicional não se encontra na catequese do Papa, mas é também sobre isto que ele está falando: os Sacramentos agem ex opere operato, i.e., têm a sua eficácia independente da santidade de quem os ministra.

Uma excelente catequese, ensejada pela crise de escândalos que hoje se lança sobre a Igreja. Se, por um lado, os pecados dos sacerdotes (ao contrário do que apregoava Lutero) em nada diminuem a eficácia dos Sacramentos por eles ministrados, por outro lado isso não é justificativa para se negar a “indispensável tensão para a perfeição moral, que deve habitar cada coração autenticamente sacerdotal”. Não é porque os padres não são santos que os Sacramentos por ele ministrados não têm valor; nem é pelo fato de que os Sacramentos continuam tendo valor a despeito dos pecados dos padres que estes não devem ser santos. Por um lado, a salvaguarda dos fiéis e, por outro, a radical exigência da conformidade a Cristo.

E vejam também outros pontos da referida audiência, entre os quais destaco:

É, então, o próprio Cristo que nos torna santos, isto é, que nos atrai na esfera de Deus. Mas como ato de Sua infinita misericórdia, chama alguns a “estar” com ele (cf. Mc 3, 14) e tornarem-se, mediante o Sacramento da Ordem, apesar da pobreza humana, participantes do seu próprio Sacerdócio, ministros desta santificação, dispensadores de seus mistérios, “pontes” de encontro com Ele, da sua mediação entre Deus e os homens e entre os homens e Deus (cf. Presbyterorum Ordinis, 5).

Sobretudo neste nosso tempo, em que, de um lado, parece que a fé vai enfraquecendo-se e, por outro, emerge uma profunda necessidade e uma ampla busca de espiritualidade, é necessário que todo o sacerdote recorde que, na sua missão, o anúncio missionário e o culto e adoração e os sacramentos não estão mais separados e promova uma saudável pastoral sacramental, para formar o Povo de Deus e ajudá-lo a viver plenamente a Liturgia, o culto da Igreja, os Sacramentos como dons gratuitos de Deus, atos livres e eficazes de sua ação salvadora.

Exemplar, acerca do primado do munus sanctificandi e da correta interpretação da pastoral sacramental, é ainda São João Maria Vianney, que, um dia, frente a um homem que dizia não ter fé e desejava discutir com ele, respondeu: “Oh! meu amigo, vos dirigistes muito mal, eu não consigo pensar … mas se tendes necessidade de alguma consolação, dirija-se para lá … (seu dedo apontava para o inexorável banco [do confessionário]) e, acredita-me, em que muitos outros colocaram-se antes de vós, e não tiveram do que se arrepender” (cf. Monnin A., Il Curato d’Ars. Vita di Gian-Battista-Maria Vianney, vol. I, Torino 1870, pp. 163-164).

Longa vida ao Papa!

Escândalos na Igreja – Pe. Roger Landry

Judas foi sempre livre e usou sua liberdade para permitir que satanás entrasse nele e, por sua traição, terminou fazendo com que Jesus fosse crucificado e morto. Portanto, entre os primeiros doze que o próprio Jesus escolheu, um deles foi um terrível traidor. ÀS VEZES, OS ESCOLHIDOS DE DEUS TRAEM. Este é um fato que devemos assumir. É um fato que a Igreja primitiva assumiu. Se o escândalo de Judas tivesse sido a única coisa com que os membros da Igreja primitiva tivessem se preocupado, a Igreja teria acabado antes de começar. Em vez disso, a Igreja reconheceu que não se deve julgar algo (religioso) a partir daqueles que não o praticam, mas olhando para os que praticam.

[…]

Por isso, pergunto-vos novamente: Qual deve ser a resposta da Igreja a esses atos? Falaram muito a respeito na mídia. A Igreja precisa trabalhar melhor, assegurando que ninguém com inclinação para a pedofilia seja ordenado? Com certeza. Mas isto não seria suficiente. A Igreja deve atuar melhor ao tratar desses casos quando sejam notificados? A Igreja mudou a sua maneira de abordar esses casos e hoje a situação é muito melhor do que era nos anos oitenta, mas sempre pode ser aperfeiçoada. Mas ainda isso não seria suficiente. Temos que fazer mais para apoiar as vítimas desses abusos? Sim, temos que fazê-lo, por justiça e por amor! Mas tampouco isso é o adequado… A única resposta adequada a este terrível escândalo, a única resposta autenticamente católica a este escândalo – como São Francisco de Assis reconheceu em 1200, como São Francisco de Sales reconheceu em 1600 e incontáveis outros santos reconheceram em cada século – é a SANTIDADE! Toda crise que enfrenta a Igreja, toda crise que o mundo enfrenta, é uma crise de santidade. A santidade é crucial, porque é o rosto autêntico da Igreja.

Pe. Roger Landry, “Escândalos na Igreja”

Sermão de Reis – São João de Ávila

Os que não acabaram

Vinham os magos, decididos. Quem não se decide a servir a Deus por toda a vida ou a morrer à sua procura não está capacitado para a guerra. Deus ordenava aos israelitas que, à hora de entrarem em combate numa guerra, se anunciasse por meio de um arauto que todos os que estivessem construindo uma casa e ainda não a tivessem acabado, e todos os que tivessem plantado uma vinha e ainda não tivessem colhido os frutos, e todos os casados e todos os medrosos – voltassem para suas casas (Deut 20, 5 e segs; 1 Mac 3, 56 e Jz 7, 3).

– “Padre, que quereis dizer com isso?” Que nem todos estão capacitados para a guerra. Porque dirás: – “Não acabei o que estava fazendo”. Tereis o corpo na guerra e o coração em casa (cf. Mt 6, 21). Esses são os homens sobrecarregados com os ocupações da vida: – “Que farei, que comerei, como sustentarei os meus filhos?” (cf. Mt 6, 25 e 31). Julgais que, preocupando-vos em demasia, conseguireis manter-vos. Infeliz o homem que não se apóia em Deus, mas que vive pensando se choverá muito ou se não choverá!

Dou-te este sinal para que vejas se estás apoiado em Deus: se nas dificuldades te afliges, se nos sofrimentos te encolhes, não estás apoiado em Deus. Na hora da angústia me reconfortastes (Sl 4, 2), diz Davi. – “Não posso Eu sustentar-te sem a chuva?”, diz-te o Senhor. Aquele que se apóia em Deus não se deixa abater nem pelos sofrimentos, nem pelas angústias, nem pela morte, nem pelo inferno. Quem não se apóia n’Ele, quanto medo sente, como anda preocupado!

Disse Jesus Cristo: Não vos preocupeis pela vossa vida, nem pelo vosso corpo, nem pelo que vestireis (Mt 6, 25-31). Estais tão cheios de preocupações com o muito comer e beber que, se a palavra de Deus entrar nos vossos corações, um minuto depois será sufocada! (cf. Mt 13, 22) Trabalhai e ganhai o suficiente para comer, que Deus assim o quer, mas essas preocupações e angústias desmedidas são sinal de que não estais apoiados em Deus. Quem se encontra nesse estado não irá para a guerra.

Os sensuais e os medrosos

Em segundo lugar, os casados, que aqui quer dizer os sensuais. Diz o Sábio: Qualquer palavra sábia, ouvida por um homem sensato, será louvada por ele e dela se aproveitará. Que a ouça um luxurioso, e lhe parecerá desagradável e a arremessará para trás das costas (Ecli 21, 18). Não há pecado que mais entorpeça a alma do que este. Jovem lascivo, olha que dentro em pouco essa tua carne será alimento para os vermes e se transformará em cinzas. Podes retirar-te: não irás para a guerra.

Em terceiro lugar, estão os medrosos, os que se preocupam com o que se pode dizer deles. Observamos a esposa: – “Tens dez saias e a tua irmã apenas uma; tens seis mantilhas e a tua irmã apenas uma, com a qual vai à missa. Isso não é fraternidade; não pareces acreditar que Jesus Cristo está no pobre. Vende essa saia, contenta-te com uma ou duas, e com as outras compra para a tua irmã”. – “Mas que dirão os outros de mim? Compreendo que o que me mandas é bom, mas queres que eu pareça a empregada das outras? Se as minhas amigas fizessem o mesmo, eu também o faria”.

Ó louca! Como vives, com o mundo ou com Deus? Depois, ireis a Deus, dizendo: – “Paga-me”. E o Senhor te dirá: – “Os serviços que me prestastes, Eu vo-los pagarei, mas os que andastes prestando ao meu inimigo, como quereis que vo-los pague?”

É difícil encontrar quem ande só. E se é para ir só, então é melhor ir por onde foi Jesus Cristo. Não pelas pompas, jóias ou brocados, embora por aí sigam muitos reis. Não ousarás ir de mãos dadas com Jesus Cristo por onde Ele foi? É impossível que quem abriu uma conta com o mundo tenha outra aberta com Deus. Ninguém pode servir a dois senhores (Mt 6, 24 e Lc 16, 13). Quem é amigo deste mundo por isso mesmo tornou-se inimigo de Deus. O medroso diz: – “Dirão que sou um hipócrita!” Deves procurar a Deus com decisão, aconteça o que acontecer. Cortem-me a cabeça, que nem assim o abandonarei.

Disse Jesus Cristo: O que vos é dito ao ouvido, pregai-o sobre os telhados (Mt 10, 27). É com essa condição que Deus te dá a conhecer a verdade: que digas em público o que te disseram em segredo. Gostaríeis de ser como aqueles de quem fala São Paulo que retêm a verdade na injustiça? (Rom 1, 18). Quem tem a verdade e não a professa nem se comporta de acordo com ela está prendendo a verdade na injustiça. Onde está o rei dos judeus? Nós já o conhecemos. Devemos professar esta verdade custe o que custar. Vede como é o mundo: os reis magos vêm de longe à procura do Salvador, e os que estão na terra d’Ele nem se dão conta da sua presença.

A inquietação de Herodes

O rei Herodes turbou-se, e toda Jerusalém com ele (Mt 2, 3). Que o rei se inquietasse não era muito, mas toda a cidade?

Por aqui vedes como é necessário que haja um bom rei na cidade e uma boa cabeça que reine. Se o bispo é mau, mau o magistrado, mau o pároco e mau o pregador, dificilmente haverá um bom povo. Esta é a intenção pela qual deveríeis rezar a Deus e é dela que mais vos esqueceis. “Senhor, dai-nos bons governantes; Senhor, dai-nos bons dirigentes. Que os reis Vos temam; dai-nos bons sacerdotes e pregadores”.

Toda a cidade turbou-se com o rei. Diz o rei: – “Então quereis outro rei além de mim?” E diz o criado: – “Que quereis que eu faça? O meu patrão ordena que eu o acompanhe nas suas noitadas”. E pensa o sacerdote: “Se eu disser a Fulano que tem uma amante, se lhe disser que não comunga, encher-me-á de pancadas”. Ora, para quem quereis a honra, se não é para Jesus Cristo? Não vale a pena morrer pela honra de Deus? É uma grande honra morrer pela honra de tão grande príncipe!

Herodes perturbou-se, começou a tremer e, convocando todos os príncipes dos sacerdotes e os escribas do povo, perguntou-lhes onde havia de nascer esse rei. Disseram-lhe: Em Belém de Judá, porque assim foi escrito pelo profeta. Disse Herodes aos magos: Ide e informai-vos bem acerca do menino, e, quando o encontrardes, comunicai-me, a fim de que também eu vá adorá-lo (cf. Mt 2, 4-8); na verdade, para matá-lo.

Os reis partem e ele fica. Não vedes como está bem representado aqui o mau pregador? Prega onde se pode encontrar a Deus e depois fica onde está. O bom pregador e o bom confessor devem ir à frente. Ninguém deve dizer uma palavra boa sem que primeiro a tenha posto em prática. Lê-se na vida dos Santos Padres que, estando moribundo um daqueles santos anciãos, se aproximaram dele alguns religiosos e lhe pediram: – “Padre, deixai-nos algo que fique aqui conosco”. Respondeu-lhes ele: – “Sempre acreditei mais no parecer alheio do que no meu, e nunca tive a presunção de ensinar coisa alguma que antes não tivesse posto em prática. Este é o testamento que vos deixo”.

São João de Ávila,
“O Mistério do Natal”
pp. 60-64
Ed. Quadrante, 2ª Edição
São Paulo – 1998

Homilia do Dia de Todos os Santos – pe. Antoine, LC

Existe, de facto, uma coragem própria da santidade que é muito mais profunda e radical que as “coragens” do mundo que povoam os nossos ecrãs de televisão ou livros de história. Não todos temos os nervos, a energia interior, a estrutura física e psicológica para realizar grandes façanhas, ao modo como as pintam os livros de aventuras. Tenho um amigo que se dedica a atravessar em solitário o oceano Atlântico. Contou-me todos os sacrifícios que tinha que realizar durante a travessia, contou-me as vezes em que se encontrou entre ondas colossais e conseguiu manter a calma necessária para uma luta de horas contra os elementos… Pensei: “isso não é para mim!”

Mas todos temos tudo o que é necessário para realizar a maior das façanhas: a santidade. E o que é o necessário para isso? Deus, só Deus é necessário. O sangue do Cordeiro, na qual devemos branquear as nossas túnicas. Mas da nossa parte, não é necessário algo? Sim, algo básico e elementar. Aceitar um caminho espiritual com Cristo, andando detrás de Ele e perseverando com Ele. Um caminho muito pessoal, intransferível, uma história única entre Deus e a alma. E onde nos leva tudo isso? A imergir-se no sangue do cordeiro, a compartilhar a experiência de Cristo. A verdadeira coragem é abandonar-se a si mesmo para se reencontrar a si mesmo infinitamente mais enriquecido em Deus.

[…]

Deus permite o crepúsculo das criaturas e dos apoios humanos e materiais, para que entendamos o que verdadeiramente conta: Ele. Cristo mostra-nos de novo como actuar quando exclama, sempre no Calvário e como resposta à sua pergunta anterior: “Pai abandono-te o meu espírito”. Ser santo é isso, é abandonar-se completamente nas mãos de Deus, é pôr nele todas as seguranças, todas as aspirações. Quando tudo parece absurdo na vida ao ponto que até o suicídio parece fazer sentido, a única resposta é o abandono. Ao mesmo tempo, é a resposta fecunda por excelência, porque quando o homem se abandona a Deus, faz entrar precisamente Deus em cena. O homem criado a imagem de Deus torna-se então uma janela transparente por onde irradia com força irresistível o Deus que o seu denso egoísmo escondia.

P. Antoine, LC

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