Pode um papa ir contra um santo?

Determinado site de jornalismo político denunciou recentemente, da forma lacônica que lhe é peculiar, que o Papa Francisco anulou uma decisão de João Paulo II. E em seguida perguntou, de maneira capciosa, sofística, se o papa poderia ir contra um santo.

Trata-se de pergunta verdadeiramente disparatada. O padre Ernesto Cardenal está com 94 anos, no leito de morte, e recentemente pediu, por intermédio do núncio da Nicarágua, a sua reabilitação canônica. Estava suspenso a divinis desde 1983. Não existe motivo absolutamente nenhum para se negar a reconciliação com a Igreja a um moribundo que a vem humildemente pedir. As penas eclesiásticas têm objetivo medicinal e servem para salvar almas, não para aprovar ou desaprovar movimentos políticos.

Repita-se: Ernesto Cardenal está à beira da morte e pediu à Igreja que suas sanções canônicas, justamente impostas por João Paulo II, fossem retiradas. Ora, o perdão concedido ao pecador arrependido não significa, em nenhum lugar do mundo e sob nenhuma lógica, uma chancela do pecado. Se fosse assim, pecador nenhum poderia pleitear jamais a reconciliação com a Igreja. Se fosse diferente, e se fosse lícito à Igreja de Cristo fechar as Suas portas a uma alma que Lhe vem suplicar misericórdia no fim da vida, então esta não seria a Igreja fundada por Deus para conduzir os homens à salvação.

Se até de Voltaire já se cogitou dizer que tivesse morrido no grêmio da Santa Igreja, mesmo que a documentação a este respeito seja parca e duvidosa, por que nos deveria espantar que volte ao seio da Igreja de Roma um sacerdote que sabidamente requereu a sua regularização? Oras, o que o Papa — qualquer papa! — deveria fazer em uma situação assim? Dar as costas a Ernesto Cardenal por conta de seu passado? Se, à conta do nosso passado, Cristo nos desse as costas para sempre, quem haveria de resistir? Quem poderia permanecer católico?

Frise-se que a retirada da censura canônica, nas presentes circunstâncias, não tem nenhuma conotação de apoio ao marxismo pretensamente católico da teologia da libertação. É, aliás, exatamente o contrário: é exatamente por ser censurável a atividade política desempenhada por Ernesto Cardenal que ele precisou, hoje, à beira da morte, pleitear a sua reabilitação. O próprio pe. Cardenal sabe-o e o reconhece: se não o reconhecesse, se continuasse acreditando que estava correto em 83 e a Igreja estava errada, então não teria pedido para se regularizar. O próprio ato de pedir o perdão da Igreja carrega, em si mesmo, o repúdio e o rechaço aos erros do passado. É assim que funcionam as coisas no Catolicismo; e é preciso muito mundanismo para não ser capaz de o perceber.

A imagem do padre Cardenal paramentado no seu leito de morte não apaga aquela outra, famosa, de São João Paulo II, ríspido, censurando-lhe com o dedo na face. Ao contrário, complementa-a maravilhosamente: aquela censura, enfim, mais de três décadas depois, deu os seus frutos. O sacerdote orgulhoso, que preferiu romper com a Igreja a abandonar os seus projetos políticos mundanos, hoje roga a essa mesma Igreja que lhe permita morrer em paz com Ela. O sacerdote que um dia deu as costas a um Papa hoje estende as mãos a um outro Papa para suplicar misericórdia. O mundo dá voltas; a Cruz permanece.

O Antagonista pergunta se um papa pode ir contra um santo. Ora, mas que papa está indo contra que santo? São João Paulo II, naquele longínquo ano de 1983, quis que o pe. Ernesto Cardenal largasse a militância política para se reconciliar com a Igreja — exatamente o que ele faz, agora, passados 35 anos. Nenhum papa está indo contra santo algum; aceitando de volta a ovelha desgarrada, o pecador arrependido, o Papa Francisco está levando à perfeição aquilo que São João Paulo II iniciou na Nicarágua. O remédio amargo da suspensão canônica finalmente produziu efeitos. Louvado seja Deus.

A Igreja existe para salvar as almas. O Papa João Paulo II seria o primeiro a receber, com alegria, de braços abertos, qual pai amoroso, um maltrapilho padre Ernesto que retornasse, arrependido, após tenebrosos anos longe de casa. É o que acontece hoje. Retirando as censuras do sacerdote nicaraguense, longe de contrariá-la, o Papa Francisco na verdade honra a memória do santo Papa polonês.

Repercussões sobre a suspensão de Luiz Couto

Suspensão de padre gera protestos, como diz o Diário de Pernambuco. Segundo a notícia, “[e]ntidades civis organizadas da Paraíba estão se mobilizando para realizar protestos contra a atitude do arcebispo da Paraíba, dom Aldo Pagotto, que proibiu o padre e deputado federal paraibano Luiz Couto (PT) de exercer suas funções de sacerdote”. Pergunta: o que raios estas “entidades civis” têm a ver com a Igreja? Absolutamente nada. Usurpando funções que obviamente não lhes pertencem, “representantes sindicais, de associações e de organizações não governamentais (ONG) planejam atos públicos para a próxima semana”. As opiniões de toda esta caterva, para a Igreja valem absolutamente nada. Acho engraçado a inversão da realidade que esta gente faz: quando a Igreja, no Seu direito, emite as suas posições morais para a sociedade, é ingerência eclesiástica e começam a bradar aos quatro ventos em defesa do “Estado Laico”; no entanto, quaisquer “entidades civis” podem, sem direito algum, fazer protesto e dizer à Igreja como Ela deve governar! É uma piada. Esta gente não merece coisa alguma, a não ser um solene desprezo.

Bispo se solidariza com Luiz Couto. Dom Tomas Balduíno veio em defesa do deputado petista, e disse que o Arcebispo da Paraíba “usou uma pena de vingança” (mas o motivo da vingança, ninguém sabe…). A Comissão Pastoral da Terra também publicou uma moção de apoio a Luiz Couto, dizendo vir “ao público em geral, manifestar seu apoio e solidariedade ao companheiro, padre e Deputado Federal Luiz Couto e repudiar a atitude do Arcebispo Metropolitano Dom Aldo di Cillo Pagoto, em suspender suas atividades religiosas”. Como disse um amigo numa lista de emails da qual participo, e subscrevendo-o integralmente, o meu sonho era ver a CPT julgada pela Inquisição. Já basta desta corja de inimigos da Igreja zombando d’Ela e tomando o lugar dos bons católicos.

Católicos pedem à CNBB que remova Dom Aldo da Arquidiocese paraibana – a cretinice chega às raias do surreal. Como se os leigos pudessem se rebelar assim publicamente contra a hierarquia, e como se fosse da competência da CNBB – e não do Santo Padre pessoalmente – a remoção de bispos! A notícia diz que será organizado “um abaixo-assinado que será encaminhado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), pedindo a saída de Dom Aldo da Arquidiocese”. Só falta mesmo a CNBB dá atenção a esta palhaçada. Aliás, seria até bom que ela desse: punindo a todos os “católicos” que ousassem assinar esta porcaria. Mas aí já é sonhar alto demais…

Este blog apóia a atitude de Dom Aldo!

Sacerdote-Deputado suspenso de ordens

Uma notícia muito boa: o deputado petista Luiz Couto que – espantosamente – é também sacerdote católico foi (segundo G1) “afastado da função de padre por defender uso da camisinha”. Deixemos de lado as expressões escolhidas para a manchete, como se ser padre fosse uma “função” da qual alguém é “afastado” como se o é de um cargo público. Também não nos importemos tanto com o fato de que o referido sacerdote deveria ter já sido suspenso quando ingressou na vida política, e não somente agora. Por enquanto, rendamos graças a Deus e alegremo-nos pelo fato.

Reproduzo a Nota Oficial da Arquidiocese da Paraíba, conforme está disponível no Correio da Paraíba, jornal (salvo engano) de João Pessoa:

João Pessoa (PB), 25 de fevereiro de 2009

Nota Oficial

O Arcebispo da Paraíba, Dom Aldo di Cillo Pagotto, suspendeu do uso de Ordem o padre Luiz Couto. Ele está impedido de realizar atividades próprias de um sacerdote, como celebrar missas. Abaixo seguem as explicações de Dom Aldo:

“Na edição do dia 25 de fevereiro de 2009, A/4, Política, o Jornal O Norte divulga: “Padre, deputado e adversário do celibato. Favorável ao uso do preservativo, Luiz Couto combate a intolerância e a discriminação a homossexuais, contrariando o Vaticano”.

Preposto à Arquidiocese da Paraíba, vejo-me na grave obrigação de suspender o referido sacerdote do uso de Ordem em nossa circunscrição eclesiástica, porquanto, por suas afirmações sumárias, e enquanto perdurem sem retratação explícita, provoca confusão entre os fiéis cristãos, e contraria “in noce” as orientações doutrinais, éticas e morais sustentadas pela Igreja Católica (Cf. Cânon 1317 CDC)”.

Ita, in fide muneribus,

Aldo di Cillo Pagotto,

Arcebispo Metropolitano da Paraíba

Então, corrigindo as expressões utilizadas pelo GLOBO: o padre Luiz Couto foi suspenso de ordens pelo Arcebispo da Paraíba. E, aparentemente, não está nem aí para isso, porque, como declarou a G1:

“Eu vou continuar celebrando, posso celebrar na minha casa, com meus amigos, ou seja, o direito de celebrar, a ordem que eu recebi tem um caráter indelével, que ninguém pode tirar. Isso não significa nenhum combate aquilo que a Igreja tem na sua doutrina”, afirma o padre e deputado.

O Correio da Paraíba, na reportagem acima linkada, reproduziu também a matéria original, publicadas pelo Portal Congresso em Foco, na qual o deputado fala as besteiras que provocaram a justa indignação dos católicos. Que Deus nos conceda sempre santos bispos; e nos livre sempre dos maus sacerdotes.