A instrumentalização do sofrimento alheio

Esta notícia é uma verdadeira piada: Vítimas de pedofilia denunciam papa à corte internacional. «Uma associação americana de vítimas de padres pedófilos anunciou nesta terça-feira que apresentou uma queixa ao Tribunal Penal Internaiconal (TPI) contra o papa Bento XVII e outros dirigentes da Igreja católica por crimes contra a humanidade».

Solidarizo-me, de verdade, com as vítimas de abusos sexuais. Em tempos mais civilizados – durante as glórias do Medievo, p.ex. -, um sacerdote que traísse de maneira assim tão grave os seus votos seria trancado em um buraco (possivelmente pelo resto da vida) para meditar nos seus pecados sem ver mais a luz do sol e nem ninguém; ou então seria queimado em praça pública para a maior glória de Deus, e seria justo. As pessoas de hoje, no entanto, dizem que estas práticas são bárbaras e que é um absurdo vergonhoso elas terem um dia existido. E, simultaneamente, promovem um terrível linchamento moral sobre qualquer sacerdote – culpado ou inocente – sobre o qual pese a mais remota suspeita de se ter envolvido em escândalos sexuais (de pedofilia ou não), ao mesmo tempo em que pretendem acusar a Igreja por Ela não [mais!] punir os Seus ministros da forma como fazia anteriormente e que é, hoje, execrada pela totalidade do mundo dito “civilizado”.

Eu entendo que o “braço secular” muda ao longo dos séculos, e entendo que fogueiras ou forcas no Largo da Piedade seriam descabidas nos dias de hoje. Mas o mesmo não vale para os aljubes, que poderiam perfeitamente se ter transformado em prisões eclesiásticas (com o mesmo propósito original). Penso que, assim, as coisas seriam melhores.

No entanto, divago; pois não importa como as coisas poderiam ser (e muito menos se seriam melhores ou piores se fossem de uma maneira diferente do que são), e sim como elas são. E o fato é que, hoje, desconheço qualquer existência de foro eclesiástico para crimes civis. Como alguém colocou em alguma lista de emails da qual participo, a instância responsável por investigar uma denúncia de pedofilia (ou do que quer que seja) são as autoridades do lugar onde o fato supostamente se deu, e não a cúria romana [que fica no Vaticano] e nem muito menos o Papa. Qualquer tentativa de responsabilizar estes é pura calhordice, é instrumentalização do sofrimento alheio para fins ideológicos que deve ser denunciada.

A tal associação americana pretende que o Papa tenha “responsabilidade direta e superior por crimes contra a humanidade, por estupro e outras violências sexuais cometidas em todo o mundo”! Vejam que não estamos sequer falando de alguma coisa que (embora equivocada) tivesse um mínimo de lógica, como p.ex. uma suposta recusa em denunciar às autoridades um suposto caso que porventura tivesse acontecido n’alguma circunscrição geográfica (München, p.ex.) pela qual o então Bispo Ratzinger fosse à época responsável. Na verdade, acusam o Papa de ter “responsabilidade direta” pelos casos de abusos sexuais ocorridos em todo o mundo! Seria alguma coisa como (mutatis mutandis) acusa a sra. Presidente da República do Brasil pelos crimes cometidos por brasileiros em qualquer parte do globo terrestre, e levá-la a um Tribunal Internacional acusando-a de omissão e cumplicidade por eles. A idéia, claro, é estúpida; no entanto, algumas pessoas (movidas por um ódio cego e irracional) perdem completamente a noção do ridículo em sua tentativa de lançar lama na Igreja.