O governo brasileiro e o Sínodo Pan-Amazônico

A existência de um Sínodo Especial para a Amazônia a ser realizado em outubro próximo não é — ou pelo menos não deveria ser — novidade para ninguém. Fala-se sobre o assunto há anos. O Papa Francisco anunciou solenemente a assembleia em outubro de 2017, avisando já à época que a convocação se dava em resposta aos pedidos que lhe haviam sido feitos por conferências episcopais latino-americanas. Tem vídeo:

Não é um sínodo que vai acontecer na Amazônia, com bispos do mundo inteiro viajando para o Brasil. Não tem nada a ver com isso. É uma assembleia do Sínodo dos Bispos, aquela “instituição permanente criada pelo Papa Paulo VI (15 de setembro de 1965) em resposta aos desejos dos Padres do Concílio Vaticano II para manter vivo o espírito de colegialidade nascido da experiência conciliar”. É o mesmo Sínodo que já se reuniu em anos recentes para falar, por exemplo, sobre a família em 2015 ou sobre a juventude em 2018.

Em outubro deste ano vai ocorrer a Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Pan-Amazônia. O nome “Sínodo da Amazônia”, assim, não se refere a uma reunião de bispos brasileiros que terá lugar na Amazônia. É uma reunião de bispos do mundo inteiro que acontecerá em Roma (onde sempre ocorrem as assembleias do Sínodo dos Bispos) para falar sobre a Amazônia.

É, portanto, de causar espécie que o primeiro escalão do Governo Federal venha a público dizer que quer “neutralizar isso aí” (!), alegando questões de soberania nacional e alertando para o recrudescimento do “discurso ideológico da esquerda” (!). A notícia é absurdamente surreal. O que cargas d’água o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República do Brasil tem a ver com uma assembleia de bispos católicos marcada para acontecer na Itália? Quem o General Augusto Heleno pensa que é para dizer ao Papa em Roma o que ele pode ou não pode discutir?

O encontro não acontecerá em território brasileiro, não havendo assim qualquer risco às fronteiras do país ou à soberania amazônica. Se o Governo Brasileiro quisesse somente impedir os bispos brasileiros de participarem do encontro, isso já seria de um autoritarismo intolerável, comparável apenas às mais odiosas ditaduras comunistas. Mas é ainda pior, porque não se fala em sanções a cidadãos brasileiros — os quais, em tese ao menos, seriam passíveis de receber punições do Estado Brasileiro. Mas não é isso. Dizendo simplesmente que quer “neutralizar isso aí”, fica parecendo que o Governo quer impedir cidadãos estrangeiros em um país estrangeiro de conversarem sobre o Brasil. Isso deixa de ser odioso para ser francamente ridículo.

Com todas as críticas que possam ser feitas ao Sínodo Pan-Amazônico, é preciso ter senso de prioridades. É totalmente inadmissível que um órgão governamental queira pautar as discussões de uma instituição eclesiástica. Um militar arvorar-se “bispo do exterior” para influenciar uma assembleia sinodal é um acinte e um ultraje, que exige repúdio vigoroso e imediato. Alguém precisa avisar ao General Augusto Heleno que ele não é Constantino.

Isso independe por completo das reais motivações por trás da convocação do Sínodo ou dos resultados que dele se esperam. Este blogueiro acredita sinceramente que a assembleia será na melhor das hipóteses inócua; o mais provável é que seja trágica. O documento preparatório não fala em diaconato feminino nem em ordenação de homens casados, por exemplo, mas ambos os temas já foram abertamente tratados pelo episcopado progressista. Se estas medidas não forem energicamente rejeitadas pelos Padres Sinodais, se o Sínodo deixar qualquer mínima brecha pela qual elas possam se insinuar na vida eclesial, poder-se-ão perder algumas gerações de católicos até que a confusão venha a ser desfeita.

O assunto é sério e é grave, o momento pede orações e pede trabalho diligente na promoção da Doutrina da Igreja e no combate ao anti-catolicismo que tenta se insinuar nas instituições eclesiásticas. Ninguém é ingênuo. Mas nem mesmo assim é possível admitir ingerência estatal nas coisas da Igreja. Ainda que o Imperador esteja correto e os Bispos estejam errados, aquele acerto e este erro serão sempre eventuais e contingentes, absolutamente acidentais, e por isso não se pode aceitar como algo lícito que César mova o braço secular contra a Igreja de Nosso Senhor. Isso não se pode admitir de maneira alguma e, neste tema, católico algum pode sequer titubear.

Não importa que o mesmo seja dito pelos inimigos do Cristianismo. Eles o dizem por malícia e com insinceridade; nós o dizemos por amor à Igreja e com toda a convicção de nossas almas. A verdade é verdade de onde quer que venha. Independente do uso que façam dela.

Publicado por

Jorge Ferraz (admin)

Católico Apostólico Romano, por graça de Deus e clemência da Virgem Santíssima; pecador miserável, a despeito dos muitos favores recebidos do Alto; filho de Deus e da Santa Madre Igreja, com desejo sincero de consumir a vida para a maior glória de Deus.

6 comentários em “O governo brasileiro e o Sínodo Pan-Amazônico”

  1. No que diz respeito a interferência de ONGs ditas católicas insuflando índios e sem Terra para criar o caos na Amazônia com missionários do tipo da TL interessa ao governo brasileiro sim.

  2. Gal Heleno é o vice-presidente que Bolsonaro escolheu, portanto o que ele faz é, basicamente, algo em que o Bolsonaro acredita.

    Militares, de maneira geral, são positivistas-maçons….

  3. Do site: http://www.rogeriomendelski.com.br/?fbclid=IwAR0BsWTXrYmjPBZHU29I6ng3KUYw3OOCeDOJIdoxlRXEze2w8WXI_v1o8Bw

    “O Brasil quer participar do Sínodo da Amazônia previsto para o mês de outubro, em Roma, e há uma reação incompreensível por parte da CNBB que não pretende levar ao Vaticano um pedido do governo brasileiro para estar presente no encontro.
    O cardeal Dom Cláudio Hummes foi encarregado de encaminhar a solicitação de Brasília, mas o arcebispo emérito de São Paulo sugeriu que o governo tomasse a iniciativa através da Embaixada do Brasil na Santa Sé. Já o bispo emérito do Xingu (Pará), Dom Erwin Kräutler, deu a entender que não quer o Planalto discutindo temas como meio ambiente e situação dos índios na Amazônia, pois “nós conhecemos a região muito melhor do que qualquer integrante do governo federal”.
    Com o devido respeito, Dom Erwin pensa que está falando com alguém subalterno seu ao subestimar o controle que o governo brasileiro precisa manter sobre a Amazônia. Por que o Brasil não pode estar oficialmente representado no Sínodo da Amazônia?
    A questão ambiental e a vida dos índios são de responsabilidade constitucional de Brasília e é para isso que o governo tem um Ministério do Meio Ambiente, Incra e a Funai. Para o bispo do Xingu, o encontro será religioso e irá tratar dos novos caminhos da evangelização e é aí que mora o perigo.
    Convém lembrar que há um plano conhecido como “Igreja Pan-amazônica” onde se agrega outro projeto, o “Corredor Tríplice A” – uma faixa territorial que inicia no Atlântico e termina nos Andes, atingindo áreas de oito países amazônicos.
    Se apenas o Brasil tem interesse em participar do encontro no Vaticano é porque há razões estratégicas do governo brasileiro em saber quais são as pretensões evangélicas na região. Ninguém desconhece o controle que os adeptos da Teologia da Libertação (boa parte da CNBB) e diversas ONGs internacionais têm na Amazônia sobre os povos indígenas, populações ribeirinhas, sem-terra, extrativistas e quilombolas que se enfrentam com posseiros, proprietários rurais e traficantes.
    Há um clima permanente de conflito na região e o novo governo brasileiro precisa estar atento ao que se vai discutir no Sínodo da Amazônia, em outubro, no Vaticano.
    Goste ou não a CNBB.”

  4. Acredito que tudo o que se refere à Amazônia interessa sim ao governo brasileiro e a nós brasileiros, mesmo que seja assunto religioso. Vivo no Amazonas desde que nasci (37 anos) e aqui todas as dioceses e prelazias recebem dinheiro do governo para realizarem seus serviços pastorais e assistenciais a população mais carente, então porque não interessa ao governo o que a Igreja pretenda discutir sobre à Amazônia? Além do mais há inúmeras ONG’s espalhadas na Amazônia, muitas de origem duvidosas, porém o nosso Exército não pode entrar nessas regiões “demarcadas” pelo o governo Lula. Daí a importância de se saber o que querem realmente na Amazônia? Se de fato é a evangelização ou outra coisa. Não se iludam, o protestantismo já tomou várias comunidades que eram católicas, a falta de padres deve-se primeiro pela própria Igreja não valorizar as vocações locais, nossos bispos aqui na maioria são estrangeiros e dizem saber mais sobre a Amazônia do que nós e o governo. Sim, a Igreja teve e tem uma grande importância para a Região, porém essa mesma igreja por anos foi e perpetrou a velha politica de velhos cangaceiros políticos aqui da região. A TL aqui é muito forte, não se reza mais nas igrejas, mas há mais discurso político e de cunho esquerdista marxista. Procissão é uma verdadeira passeata politica. Os verdadeiros católicos querem rezar ter acesso aos sacramentos, porém, nossos próprios padres não querem mais saber disso, criticam quem faz e desanimam quem deseja engajar-se. Além do mais que muitos desses padres não querem ir para as zonas ribeirinhas, pois é melhor viver na Capital Manaus que tem mais conforto e lugares para se fazer o que não deve. Precisa-se falar sobres os índios de olhos azuis fruto da relação de missionários com as indígenas, porém isso não se ver – aldeias com indiozinhos brancos. A homossexualidade no clero, os padres mortos pelo HIV e que transmitiram aos regionais, sim isso é uma realidade, por isso muitos jovens estão abandonando à Igreja, falar de padres é falar de gay, essa é nossa realidade acobertado pelos bispos e clérigos, aí vem com esse discurso de que estão preocupados com a Evangelização na Amazônia. Como disse no início nasci e moro aqui, tenho um irmão padre e sou católico, porém vivemos uma realidade muito diferente do que esse Sínodo aponta, apenas querer fazer frente ao novo governo e as novas políticas que desfavorecem à própria Igreja. O povo aqui quer estradas para interligar os municípios uns aos outros e ao restante do Brasil, quer internet boa e tudo o que de bom se pode ter. Há municípios que só se chega por rio, o povo vive praticamente isolado. Então senhores bispos, tá na hora de ouvi a população e não ficarem querendo discutir temas que são parecidos com o discurso marxista. Por isso o protestantismo avança e nós estamos perdendo espaço, por conta da ingerência do próprio clero da Amazônia. É muito triste ir à missa e ter que ouvir o padre defender políticos ladrões justificando seus atos apenas por não gostar do novo governo. Isso é lamentável.

  5. Pois é, meu caro blogueiro católico: NESSA você está redondamente errado, mas claro que nunca vais admitir isso…

  6. É, e reconhecer o erro é uma grande virtude caro blogueiro.

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