Sobre zelo e prudência

A [má] repercussão sobre o triste fato ocorrido em Brasília no domingo último ultrapassou os limites da razoabilidade. Diante de um tal acontecimento deveriam ter lugar na alma católica a penitência, a reflexão sobre as próprias atitudes, a oração; ao contrário, polarizou-se a discussão e se utilizou do fato para se fazer propaganda velada do próprio sectarismo anti-Vaticano II que estava na raiz mesma da supressão da missa tridentina na capital do país.

A missa tradicional já esteve por muito tempo nas mãos de pessoas que [sem fazer nenhum juízo de valor sobre as suas intenções, que acredito sinceramente serem as melhores possíveis] causaram muito mal à Igreja e forçaram as medidas necessárias para a solução da crise que atravessa a Esposa de Nosso Senhor a serem postergadas. Com a graça de Deus, o papa Bento XVI gloriosamente reinante tem dirigido com maestria a Barca de Pedro e conduzido-A (não sem percalços) pelos caminhos que Ela precisa singrar, a despeito dos escolhos existentes e dos riscos que Ela corre. É fundamental que os marinheiros não sejam um empecilho aos projetos do Capitão.

Com o motu proprio Summorum Pontificum, a Missa Gregoriana foi – graças a Deus! – arrancada das mãos dos filhos rebeldes da Igreja e solenemente entronizada no lugar que lhe pertence de direito: no coração da Igreja Católica. Aquela que antes era usada por extremistas como cavalo de batalha contra a própria Igreja, hoje está sendo – não sem dificuldades! – colocada novamente ao serviço da Esposa de Nosso Senhor. É da mais capital importância que este processo não seja sabotado.

A Missa Tridentina não é exclusividade daqueles que, em maior ou menor grau, têm problemas com o Concílio Vaticano II e as reformas que se lhe seguiram. Ao contrário, o Summorum Pontificum veio exatamente para dizer que ela pertence a todo o povo de Deus, a todos os filhos da Igreja, e é nesta catolicidade que ela deve ser sempre considerada. É inoportuno querer fazer “um pacote” onde estejam juntos o rito tridentino e o espírito anti-Vaticano II, e empurrá-lo aos fiéis em todas as dioceses e paróquias onde o motu proprio encontre um mínimo de boa vontade. Não precisamos desta “promoção”.

Há dolorosos exemplos (inclusive recentes) de situações onde más atitudes por parte de alguns católicos [repito, cuja boa vontade não está em discussão] provocaram graves danos à Igreja. Há o [ontem lembrado] caso do IBP em São Paulo, há as [já tristemente célebres] diatribes virtuais lançadas pelo Instituto do pe. Divino Lopes contra Sua Excelência Dom Manoel Pestana Filho – para ficarmos apenas nos mais notórios. Precisamos aprender com os nossos erros, a fim de que a nossa contribuição para o fim do incêndio não seja lançar mais gasolina ao fogo.

O Danilo entendeu isso muito bem e republicou as suas dicas para não perder a missa tridentina – vale a pena uma [re]leitura. Que os católicos que amam a Igreja possam unir as suas forças em torno de seus objetivos comuns: a maior glória de Deus, a salvação das almas, a exaltação da Santa Madre Igreja. Oremus pro invicem. E que a Virgem Puríssima, Auxilium Christianorum, seja em nosso favor; que São Miguel Arcanjo nos proteja a todos no combate, livrando-nos de todos os embustes e ciladas do demônio.

Introibo ad altare Dei

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Não sei exatamente onde e quando foi tirada esta foto; talvez seja até muito famosa e eu não a conheça. O amigo que me enviou, disse-me que foi uma missa celebrada em uma igreja destruída na Segunda Guerra Mundial, logo após o fim da guerra. Gosto sobremaneira dela: dá pra ver os escombros e, mesmo assim, quase dá para sentir o quanto as pessoas estão compenetradas no serviço litúrgico. O templo está em ruínas; mas a Santa Missa é celebrada com toda a dignidade, como se estivesse sendo celebrada na mais imponente igreja da Europa. O templo está destruído, mas a Fé está viva: a Fé sobreviveu à Guerra, sobreviveu aos bombardeios, sobreviveu à destruição. Após o fim da Guerra, volta-se a celebrar a Santa Missa; o sacerdote mais uma vez se paramenta, os assistentes mais uma vez se preparam, os degraus do altar são mais uma vez subidos, o Sacrifício de Cristo mais uma vez se faz presente.

E gosto de olhar para esta foto e pensar que… Deus não nos abandona jamais. O templo físico pode estar destruído, mas basta um sacerdote para que, lá, aconteça o maior milagre da Graça, para que Deus Se faça real e substancialmente presente. Mesmo em meio aos escombros. Mesmo quando tudo está destruído, é possível subir ao altar de Deus, que é a nossa alegria – introibo ad altare Dei / ad Deum qui laetificat iuventutem meam. Mesmo em meio ao pó e às ruínas, é possível cantar os louvores do Altíssimo – confitebor tibi in cithara, Deus, Deus meus. Mesmo quando não temos mais nada, é-nos possível esperar em Deus – spera in Deo, quoniam adhuc confitebor illi.

E, ao mesmo tempo, é triste olhar para esta foto e imaginar que, se fosse nos dias de hoje… quem iria oferecer a Santa Missa nestas condições? Em uma igreja em ruínas, após a guerra, sem luz elétrica, [aparentemente] sem povo… em quantas almas católicas encontraríamos hoje o zelo pelas coisas de Deus demonstrado por estes cinco homens numa fotografia em branco e preto? E, no entanto, isto é tão importante, pois é para isso que os sacerdotes são ordenados…!

Nos escombros de uma igreja, sozinho, o sacerdote se mantém firme porque sabe que está diante de Deus. Sabe que é à Trindade Santa que ele está ofertando o Sacrifício do Corpo e Sangue do Senhor. Sabe que o ritual por ele desempenhado tem valor infinito, e Deus é digno de ser infinitamente adorado. Sabe que toda a Igreja está com ele; que a Santa Missa transcende o tempo e o espaço e o coloca diante do Trono Eterno do Altíssimo. Sabe tudo isso e, por isso, porta-se como convém. Mesmo numa igreja em ruínas.

Será pedir muito encontrar este zelo nos sacerdotes dos nossos dias? Será sonhar muito alto querer que os ministros do Deus Altíssimo sejam ciosos das coisas sagradas, inflamados de um santo desejo da glória de Deus e da salvação das almas? Rezemos ao Senhor da Messe, para que nos mande bons trabalhadores. E elevemos os olhos para os Céus, de onde nos virá o nosso socorro. Esperemos em Deus. Nunca nos esqueçamos dessa verdade tantas vezes repetidas na Liturgia da Santa Igreja: adjutorium nostrum in nomine Domini / qui fecit coelum et terram.