Ainda a Uganda…

[Foto: Fábio Zanini]

Esta foto consta no link que foi publicado aqui ontem; mas ela é tão impressionante que achei por bem trazê-la de novo. Para quem não se recorda: trata-se de uma propaganda do Governo da Uganda e que é parte da política de prevenção da AIDS (que baseia-se em abstinência para os solteiros, fidelidade para os casados, e camisinha só quando tudo o mais falhar). O que está escrito é o seguinte: “Um motorista responsável se preocupa com sua família… [foto] …ele é fiel à sua esposa”.

Aqui, nestas nossas terrinhas tupiniquins, onde os caminhoneiros precisam enfrentar até mesmo problemas de prostituição infantil nas estradas brasileiras, eu só consigo lamentar: que inveja da Uganda!

* * *

Ah! Só para constar, a política ugandense de incentivo à castidade não é novidade, embora somente agora tenha aparecido (mais ou menos) na grande mídia. Já em 2005, Olavo de Carvalho escreveu sobre o assunto. O pior cego é o que não quer ver…

Aids e promiscuidade.

Conforme noticia o BLOG do Reinaldo Azevedo, a OMS reconheceu o óbvio: o número de portadores de HIV é significativamente maior dentro de um grupo de risco que engloba homossexuais masculinos, usuários de droga e os chamados “trabalhadores do sexo” e seus clientes.

Da fonte original da notícia comentada pelo conhecido articulista, destaco o seguinte [tradução livre minha]:

No Primeiro Mundo [industrialised world], a transmissão do HIV entre homens que têm relações sexuais com outros homens não está diminuindo e, em alguns lugares, tem aumentado.
[…]
O comportamento sexual é obviamente importante, mas ele não parece explicar todas as diferenças entre as populações.

A camisinha sempre foi apresentada como a panacéia universal para o perigo do vírus da AIDS, a vacina anti-HIV, a imunização segura e certa contra este grave perigo. Este discurso foi tão ad nauseam repetido que se encontra praticamente impregnado no senso comum das pessoas; expressões como “sexo seguro”, por exemplo, remetem imediatamente à utilização do preservativo. Todos têm por uma verdade inquestionável que a camisinha é o melhor meio de prevenção contra a AIDS.

Todos, não. A Igreja sempre condenou esta política. E foi duramente atacada por causa disso. Mesmo quando a Sua política mostrava os melhores resultados no combate ao HIV. A Igreja não Se calou, não capitulou diante destes que são – por malícia ou ao menos por irresponsabilidade – os verdadeiros inimigos do gênero humano. Acaso irão reconhecer que Ela estava certa? Eu duvido.

A questão é falseada, as mais das vezes. O que a Igreja diz não é que o risco de se contrair AIDS numa relação sexual específica é o mesmo, quer se use camisinha, quer não se use. Isso, dizem os Seus detratores, que precisam de um boneco de palha sobre o qual possam descarregar a sua artilharia com facilidade. O que a Igreja diz – e, agora, a OMS confirma – é o que o risco de se contrair HIV é tanto maior quanto mais promíscua for a vida do indivíduo e que, portanto, o verdadeiro inimigo a ser combatido é a promiscuidade. O fato (segundo a notícia supracitada) de, num determinado grupo de risco – os homossexuais masculinos -, o número de novos soropositivos não estar diminuindo e, pelo contrário, até aumentar em alguns lugares, mesmo com a propagação maciça do preservativo, é a prova inconteste disso. A promiscuidade se combate com o seu contrário, com a castidade, e não com preservativos.

Acontece que o mundo moderno é inimigo da castidade, e venera o hedonismo. Não pode aceitar a castidade. Considera um absurdo que se pregue abstinência para os solteiros e fidelidade conjugal para os casados. Quer o sexo livre, e o quer “seguro”, com preservativos. Mas isso não resolve o problema, como os fatos bem o mostram. A Promiscuidade é madrasta má; só a Igreja é Mãe e Mestra.

Existe, ainda, um aspecto sórdido que precisa ser posto a descoberto nesta história toda. Durante anos, disseram-nos que esse negócio de “grupo de risco” não existia, fizeram-nos crer que a AIDS era uma epidemia generalizada, e nos incentivaram a usar preservativos para que tomássemos cuidado e nos preveníssemos do HIV. Agora, cai a máscara, e constata-se que “o comportamento sexual é obviamente importante” na transmissão do vírus. Ora, se há uma relação direta entre promiscuidade e contaminação com o vírus da AIDS, a maneira mais fácil de universalizar a epidemia é trabalhar para universalizar a promiscuidade.

Vejamos: que maneira de se incentivar um determinado comportamento pode ser mais eficaz do que apresentá-lo como “seguro” , “protegido” , “responsável” , “consciente” , e tantas outras loas que são feitas à relação sexual na qual se utiliza a camisinha? A Revolução Sexual, que não se resume à exaltação da camisinha mas que certamente a inclui, se triunfasse, iria produzir sem dúvidas um ambiente de tal maneira promíscuo que tornaria verdadeira a (falsa) premissa da “epidemia de AIDS”, que é um dos carros-chefes da argumentação-terrorista de “Saúde Pública” em defesa do uso dos preservativos. Trata-se de um exemplo criminoso de “justificação retroativa”, na qual a “solução” é justificada pela situação que ela própria ajudou a criar.

É importante que nós não caiamos em nenhuma armadilha. Os católicos sabem que o uso da camisinha seria moralmente inaceitável mesmo que a AIDS fosse tão comum quanto uma gripe. Mas não podemos ficar de braços cruzados enquanto as pessoas trabalham simultaneamente na destruição dos valores tradicionais e na (conseqüente) expansão da doença. Não nos deixemos seduzir pelo “canto de sereia” que diz ser preferível o Estado investir em educação sexual, já que a proposta da Igreja deve interessar somente aos católicos. Não nos esqueçamos de que a Moral da Igreja não é “dos católicos”, e sim Universal, e que segui-la é o melhor caminho que qualquer homem – e não só o cristão católico – pode encontrar. Lembremo-nos da Uganda. E defendamos a Igreja, defendamos a Verdade, porque somente assim estaremos verdadeiramente defendendo o ser humano.

Cai o véu…

Em resumo: conseguiu-se enfim autorizar o que dez anos atrás parecia promissor, mas em raras situações, hoje, e com perspectivas cada vez mais estreitas.
– “Decisão do Supremo já chega caduca” – sobre CTEHs. 30 de maio de 2008. Após a liberação das pesquisas pelo STF.

Não há certeza ainda, porém, de que elas renderão novas terapias. “É uma aposta, mas uma aposta fundamentada. E pode ser que todo mundo dê com os burros n’água daqui a alguns anos”[.]
– “Estudos feitos com embrião são só uma ‘aposta’, diz Biólogo” – sobre CTEHs. 02 de junho de 2008. Após a liberação das pesquisas pelo STF.

O que dizer? Eu avisei!? Mas que diferença isso faz, agora, que o engodo e a fraude já se incorporaram ao ordenamento jurídico brasileiro?

Sugestão de leitura: Blefe Retórico.

Tenha Deus misericórdia.

“Se você estivesse numa cadeira de rodas…”

Assisti dia desses a um filme intitulado “Instinto Secreto” (Mr. Brooks, 2007). Não é a melhor obra-prima do mundo, mas é um suspense interessante, com situações criativas e que prende bem a sua atenção. A história, contada de maneira bem superficial, é a seguinte: o sujeito, o tal Brooks, é um empresário bem sucedido, casado, pai de família… uma pessoa bem normal. O único “detalhe” – que o torna capaz de ser protagonista da trama – é o fato de ele ser um Serial Killer.

O filme é recheado de coisas interessantes, como os diálogos que o Brooks tem com o “álter-ego” assassino dele, o chantagista que tem umas fotos do último assassinato, a detetive empenhada no caso, a luta que o assassino trava para parar de matar – sim, porque ele mata por ser viciado e não conseguir parar. Mas tem uma cena que corre o risco de passar despercebida na trama, por ser secundária, e que é todavia bastante expressiva.

A filha de Brooks volta para casa, e a polícia está investigando a garota por causa de um assassinato na faculdade. O pai – não sem muitas dúvidas – decide proteger a filha. Qual o plano? Simples: ele procura detalhes do assassinato, vai até a faculdade – fica em uma outra cidade – e mata outra pessoa do mesmo jeito que (supostamente – pois o filme não deixa isso explícito) a filha matou. Dois assassinatos iguais, a polícia vê o padrão, traça o perfil de um serial killer e, como a garota estava em outra cidade na noite do segundo assassinato, a suspeita sobre ela é descartada. Voilà.

Os fins justificam os meios – disse uma vez Maquiavel. E, para justificar a máxima, os homens são capazes de recorrer às mais absurdas situações. Pra salvar a própria filha – que, afinal, pode até estar sendo injustamente acusada -, o pai não deveria fazer tudo o que está ao seu alcance – até matar? A versão atual do dilema, que escutei ad nauseam por ocasião dos infinitos debate sobre as células-tronco, era a seguinte: “se fosse o teu filho numa cadeira de rodas, tu serias a favor das pesquisas”. “Ou então” – às vezes era acrescentado – “tu não amarias o teu filho”.

O problema com esta argumentação é que a resposta à capciosa pergunta vai estar, provavelmente, enviesada, pois a situação é de tal maneira construída que o sujeito vai julgar em favor de si mesmo, defendendo os próprios interesses! E esta “auto-defesa” – até psicologicamente justificável, mas evidentemente falha enquanto apreciação objetiva e juízo isento – é tomada como se fosse a mais nobre expressão da virtude e da solidariedade, porque estaríamos “nos colocando no lugar” das pessoas a quem realmente interessa determinada questão.

“Colocarmo-nos no lugar” de uma parte interessada num resultado específico de uma dada querela é exatamente o que não pode ser feito para quem quiser formar uma opinião justa sobre o assunto em questão, e isso é óbvio. Ninguém pode apreciar um assassinato colocando-se no lugar do assassino; já pensou o advogado dizendo ao juiz “ah, se fosse Vossa Excelência que estivesse no banco dos réus, não ia ser a favor da condenação”? Todavia, contestar esta idéia equivocada nos transforma, incontinenti, em monstros insensíveis aos sofrimentos alheios. A virtude deixa de ser a isenção, e transforma-se no interesse. A atitude correta seria tomar partido. “Se você fosse uma raposa” – é como se dissessem – “ia ser a favor dos saques ao galinheiro”. Oras, mas acontece que, absolutamente, não é isso que está em discussão! Queremos saber se é lícito que as galinhas alheias sejam surrupiadas pelas raposas, e não se as raposas têm motivos para atacar os galinheiros, porque é óbvio que elas os têm!

Em suma, ninguém precisa ter um filho com uma doença incurável para saber a importância que tem para um pai a cura do filho. E, ao mesmo tempo, ninguém pode julgar a licitude de uma questão olhando somente para o próprio filho – real ou imaginado – que esteja doente. Além dos fins, deve-se olhar para os meios; e a moralidade ou imoralidade destes vê-se com mais clareza quando não se está advogando em causa própria. Afinal, de entender os motivos do mr. Brooks a legalizar os assassinatos vai um longo passo. A mesma coisa faz com que seja justificável o desejo das pessoas de buscarem a cura para si próprias ou para as pessoas que amam; mas, mesmo assim, não se justifica a destruição de seres humanos em pesquisas científicas.

Nota da CNBB

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil emitiu uma nota sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal de permitir a destruição de embriões humanos em pesquisas científicas:

Sendo uma vida humana, segundo asseguram a embriologia e a biologia, o embrião humano tem direito à proteção do Estado. A circunstância de estar in vitro ou no útero materno não diminui e nem aumenta esse direito. É lamentável que o STF não tenha confirmado esse direito cristalino, permitindo que vidas humanas em estado embrionário sejam ceifadas.

Alegramo-nos por nossos pastores, que levantam a voz de maneira clara em defesa dos mais fracos e desprotegidos.

A CNBB continuará seu trabalho em favor da vida, desde a concepção até o seu declínio natural.

Fazemos nossas as palavras da CNBB, e assumimos particularmente o mesmo compromisso. Que Nossa Senhora Aparecida Se compadeça do Brasil.

Considerações sobre o STF e o julgamento das CTEHs

“Supremo libera pesquisas com células-tronco embrionárias”, diz o G1. “STF aprova pesquisas com células-tronco embrionárias”, é a manchete da Folha online. “Supremo autoriza pesquisas com células-tronco embrionárias”, noticia o Estadão. “STF autoriza pesquisas com células-tronco embrionárias”, anuncia o Jornal do Commercio daqui da terrinha. É impressionante o tom monocórdico da cantilena!

As manchetes poderiam ser diferentes. “Aberto importante precedente para a legalização do aborto”. “Embriões humanos não são sujeitos de direitos”. “Vida não merece proteção desde a concepção”. “Embrião pode morrer”. Qualquer coisa que expusesse, de maneira clara e sem floreios, a verdade nua e crua da decisão do Supremo Tribunal Federal, que deveria cobrir de vergonha toda esta nação.

Foram dois dias de votação, dois dias de orações e de esperanças, dois dias de expectativas e de angústias. Está consumado. Aquela que se intitula Suprema Justiça condenou os inocentes à morte. A votação teve o placar de 6 x 5, que é o que consta no site do Supremo Tribunal Federal.

O resultado é desastroso sob todos os aspectos. Em primeiro lugar, porque o simples fato de tal pergunta – se o Estado deve proteger os inocentes – ter sido formulada revela a mais completa confusão na qual se encontra o povo brasileiro em geral e os Ministros do Supremo em particular. É preocupantemente sintomático que as pessoas não saibam diferenciar as discussões que são válidas daquelas que são intrinsecamente nonsense. É óbvio que o Estado deve proteger os inocentes, e o óbvio não pode sequer ser discutido. Eis o primeiro passo em direção ao abismo.

Em segundo lugar: o próprio fato de tal pergunta ter sido levada a julgamento revela mais um grau da escala de sandice que acomete os brasileiros, porque, se já é preocupante a concessão de se debater a pergunta nonsense, a noção que se encontra adjacente ao julgamento é ainda mais diabólica: não só é permitido discutir o óbvio, como o Estado tem o poder de dizer e fazer o contrário do óbvio. Ora, uma coisa – que já é bastante séria – é fazer uma, digamos, discussão acadêmica sobre se é permitido ao Estado matar nordestinos; outra coisa muitíssimo mais séria é o Supremo Tribunal reunir-se para deliberar e aprovar a carnificina no Nordeste Brasileiro. Não satisfeito em conceder que a proteção à vida humana é passível de discussão, o país concedeu também que competia ao Supremo Tribunal Federal deliberar sobre a manutenção ou retirada desta proteção. O segundo passo é dado. O abismo já se abre monstruoso diante dos pés.

E, no final, a queda: o poder da deliberação absurda sobre a discussão nonsense foi concedido não a uma nobre casta de probos e ilibados baluartes das virtudes, não a uma elite intelectual e moral que fosse digna deste nome, mas a um bando de malucos, com surtos de megalomania, notoriamente preconceituosos, volúveis, irresponsáveis e levianos. É isso o que se infere dos votos dos ministros – à exceção (honrosa) dos ministros Direito e Lewandowski. Não encontrei na internet a íntegra dos discursos, mas os excertos a seguir foram tirados do “ao vivo” do G1.

“Nossa religião, aqui dentro, é o direito” – é a afirmação esdrúxula da sra. Carmen Lúcia. A “combinação do caráter laico do Estado e o princípio da liberdade individual ditam que ninguém pode interferir caso os pais desejem dar esse destino aos embriões congelados que carregam seu material genético”, é a besteira monumental defendida pelo sr. Joaquim Barbosa. O sr. Marco Mello “passou por Santo Agostinho e até pelo livro bíblico do Êxodo, no qual a morte de um feto é citada como uma ofensa menor do que um assassinato”. Já o sr. Celso de Mello “começa frisando o caráter “secular e laico” do Estado brasileiro e louvando os votos dos ministros do STF que o precederam”, e diz ainda que “a religião é uma questão de ordem estritamente privada”.

É preciso ser cego para não ver o preconceito contra a Igreja Católica, o ranço anti-clerical dessa gente; principalmente pelo fato de que não há argumentos religiosos no discurso pró-vida! Os votos dos ministros estão, portanto, enviesados por puro preconceito: já que a Igreja Católica tem uma determinada posição, eles simplesmente votam na posição contrária. E, talvez por ato falho, revelam-no claramente, quando destilam o seu ranço contra a Igreja em situações onde Ela não está presente. A obsessão pelo “Estado Laico” está de tal maneira arraigada nas cabeças dos senhores ministros que a preocupação principal é não seguir a opinião da Igreja – opinião não-religiosa, é sempre bom frisar – porque, caso ela seja seguida, será uma ingerência religiosa obscurantista nos assuntos que competem ao Estado e um retorno à Idade das Trevas medieval! Isso não está dito de modo explícito, mas está tão claramente expresso nas entrelinhas do discurso ofensivo à Igreja que é impossível passar despercebido. Não haveria necessidade de se ser anti-clerical e nem mesmo de se afirmar com tanta ênfase a “iurelatria” e a proscrição de Deus das salas do STJ, se não estivessem os votos já enviesados pelo preconceito prévio contra a Igreja e as cartas já marcadas de antemão. Nenhum ministro quer a “pecha” de ser “ligado à Igreja”, de ser “conservador”, “obscurantista”, de pertencer a esta “Instituição Retrógrada”. É vergonhoso, é ridículo, mas é verdade, infelizmente.

Esta é a primeira farsa da vitória de Satanás. Mas tem uma outra trapaça que, de tão gritante, merece ser citada: todo o arrazoado dos senhores ministros foi baseado sobre uma versão falseada do problema, segundo a qual os embriões, se não fossem utilizados em pesquisas científicas, seriam “jogados no lixo”. Como, “jogados no lixo”? E a possibilidade dos genitores os procurarem? E a possibilidade de adoção? E a possibilidade de se manterem os embriões congelados, simplesmente, enquanto não se lhes arranja um útero onde eles possam se desenvolver? É uma grosseira mentira que a única alternativa possível à experimentação científica seja o descarte. E, num ambiente de indiscutível alta erudição como o é o Supremo, como se justifica que uma burla grosseira dessas possa ter passado incólume? Quanta leviandade! O Supremo Tribunal Federal parece ser a Casa da Mãe Joana, onde cada um faz o que quer, e onde nenhuma seriedade é exigida.

E os deuses da Suprema Justiça – a brasileira, que não faz jus ao nome que leva -, onipotentes do alto do seu poder de voto, viraram as costas a Cristo e prostraram-se diante de Satanás em adoração. O sangue dos inocentes irá manchar a terra desta Terra de Santa Cruz. A maior nação católica acaba de cerrar fileiras com os inimigos da Igreja. Tenha Deus misericóridia de nós todos.

E existe, por fim, mais um aspecto diabólico, malignamente perverso, desta palhaçada toda, que precisa ser exposto, ao menos, para se tentar fazer um desagravo. Noticiou o G1:

O aposentado Pedro Freire, de 60 anos, assistiu ao julgamento ao lado do neto, João Victor Freire Xavier, de 9 anos, que tem distrofia muscular. Segundo ele, o menino sempre acompanhou pela TV os debates sobre o tema. “Ele nos cobra muito, pergunta quando o remédio vai sair”, comentou.

Nós estamos falando de uma criança doente, que está sendo covardemente usada, alimentada com falsas expectativas e vãs esperanças, manipulada pelo lobby dos que querem movimentar a opinião pública por vias sentimentalistas para a aprovação da destruição de embriões humanos. Ele tem nove anos, e já pergunta quando vão sair os remédios. Quem é que vai se preocupar em dizer ao menino, dia após dia, mês após mês, ano após ano, que ele espere a panacéia universal que vai ser descoberta “logo amanhã”?

Que a Virgem Maria, Refúgio dos Pecadores e Espelho da Justiça, possa olhar com misericórdia para este menino e para todo o povo brasileiro. E que Ela possa, com toda a corte celeste, ser em favor dos mais novos excluídos e desprotegidos do beneplácito da Nação Brasileira, aqueles que são tão pobres que têm bem menos do que a roupa do corpo, pois nem mesmo têm o corpo já formado; aqueles que nem ainda nasceram, e já são órfãos; aqueles a quem não foi dado um lar, num útero materno, onde eles pudessem crescer; aqueles que não podem alimentar-se sozinhos e que não são alimentados, e que passam fome e frio, muito frio, na solidão das câmaras criogênicas.

Fé que vence a Caridade

A Esperança é uma das Virtudes Teologais, junto à Fé e à Caridade, mas parece que [entre os católicos] a Fé venceu a Caridade.

(Alexandre Garcia, no “Jornal da Manhã” da Globo de ontem, quarta-feira 28 de maio. O assunto, claro, é a utilização de embriões humanos para buscar a cura de doenças)

Todavia, para a Igreja, a caridade é a virtude teologal pela qual amamos a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos por amor de Deus, como reza o Compêndio do Catecismo da Igreja Católica.

Da primeira parte da definição, vemos que o primeiro aspecto da caridade é vertical, i.e., refere-se a Deus. Portanto, não tem caridade quem não ama a Deus. E Deus é a Verdade, em Quem radica-se a Ética e, por conseguinte, não ama a Deus quem desrespeita a Ética, como os que desejam sacrificar embriões humanos indefesos em pesquisas de laboratório, por melhores que sejam as suas intenções.

E, da segunda parte da definição, vemos que a caridade verdadeira, quando se dirige ao próximo, fá-lo por amor de Deus, i.e., está assentada sobre e orientada para o amor a Deus. “Amor ao próximo” que não esteja alicerçado no amor de Deus não é caridade verdadeira; no máximo, filantropia, que, ainda que possa ter o seu valor no plano natural, todavia não raro degenera em erros gravíssimos, como no caso em que se deseja sacrificar embriões humanos indefesos para [e somente talvez] ajudar pessoas doentes.

Em termos teológicos, a Fé, obviamente, não “vence” a Caridade, mas a Caridade pressupõe a Fé, não existindo aquela sem esta. A “frase de efeito” que o jornalista procurou elaborar simplesmente não faz sentido.

Donde se vê que Alexandre Teles não entende nada de Catecismo. E, se é tão grande a ignorância do jornalista em um assunto tão “bê-a-bá” quanto os rudimentos da Doutrina Católica, por que mereceriam adesão incontestável as suas opiniões sobre assuntos tão complexos quanto a utilização de embriões humanos em pesquisas científicas?

Castelos de Cartas

Amanhã, o Supremo Tribunal Federal retoma o julgamento sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade 3510, impetrada contra a lei que permite a manipulação [e conseqüente destruição] de embriões humanos em pesquisas científicas, sob a justificativa de que esta viola o Direito Constitucional à vida. O campo de batalha já foi devidamente preparado pela horda dos “paladinos das luzes” contra o “obscurantismo medieval” da retrógrada Igreja Católica. A julgar pelo que diz o Quarto Poder, a “Infame” será esmagada. Voltaire exultaria.

Os argumentos de ambos os lados já estão postos; os do pró-vida, ao alcance de qualquer pessoa que tenha interesse no assunto. Os do “pró-[pseudo-]ciência”, já devidamente impregnados no inconsciente coletivo por meio do bombardeio diuturno dos formadores de opinião midiáticos. O problema é mais sério do que parece à primeira vista, e uma análise mais atenta da questão revela-nos o quão perto do fundo do poço nós estamos.

O julgamento de amanhã é somente a ponta do iceberg, é a gota d’água, o último exemplar de uma série de erros amontoados e contra os quais não nos levantamos no momento oportuno – ou nos levantamos e perdemos as batalhas de então. É muito difícil mudar o mundo. Com um pouco de boa vontade, as pessoas podem até se convencer de que um aspecto da realidade que elas tinham como incontestável está errado; mas e quando esta convicção exige, após si, a destruição de mais um castelo, e esta a de outro, e de outro, e de outro, até que toda a cidade de cartas jaza esparramada pelo chão?

Este é o maior problema para argumentar contra quem é a favor das pesquisas com CTEHs. Afinal, o problema não é somente o início da vida humana: o próprio ministro Britto, no seu voto lido na última sessão sobre o tema, disse-o claramente:

[N]ão se nega que o início da vida humana só pode coincidir com o preciso instante da fecundação de um óvulo feminino por um espermatozóide masculino. Um gameta masculino (com seus 23 cromossomos) a se fundir com um gameta feminino (também portador de igual número de cromossomos) para a formação da unitária célula em que o zigoto consiste.

[…]

Não pode ser diferente. Não há outra matéria-prima da vida humana ou diverso modo pelo qual esse tipo de vida animal possa começar, já em virtude de um intercurso sexual, já em virtude de um ensaio ou cultura em laboratório. Afinal, o zigoto enquanto primeira fase do embrião humano é isso mesmo: o germe de todas as demais células do hominídeo (por isso que na sua fase de partida é chamado de “célula-ovo” ou “célula-mãe”, em português, e de “célula-madre”, em castelhano). Realidade seminal que encerra o nosso mais rudimentar ou originário ponto de partida. Sem embargo, esse insubstituível início de vida é uma realidade distinta daquela constitutiva da pessoa física ou natural […].

Ecco! O foco do problema não é o momento em que se inicia a vida de um indivíduo humano: este é incontestável. Acontece que, aceitando esta verdade [já evidente] até as últimas conseqüências, levanta-se uma miríade de perguntas que não podem ser satisfatoriamente respondidas a não ser com a radicalidade do Evangelho.

Se o embrião é uma pessoa humana, por que eles podem ser congelados? Dever-se-ia proibir o congelamento de embriões. Mas, assim, tornar-se-iam inviáveis* as técnicas de reprodução assistida: também estas deviam ser proibidas. Mas, então, um casal que não conseguisse ter filhos naturalmente estaria condenado à infelicidade. E, ainda: se o embrião é uma pessoa humana, por que se pode abortá-lo n’alguns países do mundo ou mesmo no Brasil, em casos como o estupro? Se ele é uma vida, então não deveria haver exceções. Se ele é uma vida, também a “pílula do dia seguinte” – que pode provocar a morte do embrião impedindo a sua nidação no útero materno – deveria ser proibida. E, se este assunto é de tamanha gravidade, os jovens deveriam ser aconselhados a se absterem de práticas sexuais, até que tenham responsabilidade suficiente para assumirem as conseqüências dos seus atos.

E assim, num verdadeiro “efeito-dominó”, cairiam todas essas “verdades” que são lugares-comuns para a imensa maioria da população. Ora, é até relativamente fácil convencer uma pessoa de que a vida do indivíduo humano tem o seu marco inicial na concepção; mas convencê-la, além disso, de que o aborto é crime em qualquer lugar do mundo, e que uma adolescente é “obrigada a carregar na barriga” um filho que tenha anencefalia ainda que ela tenha sido covardemente estuprada, e que o “bem” de pessoas doentes não pode ser obtido por meio de embriões mesmo que eles só sejam visíveis a microscópio e estejam congelados sem perspectiva alguma de “se transformar” num ser humano adulto, e também que, além disso, não deveria haver embriões congelados e, por conseguinte, os casais que não pudessem ter filhos próprios deveriam se resignar a não tê-los e que, ainda, os métodos contraceptivos, quer por serem falhos, quer por serem abortivos, não deveriam ser utilizados por jovens que não têm condições de se responsabilizar por um possível filho que venha ao mundo… aí, é demais. Não se pode esperar que as pessoas comuns “aceitem” isso simplesmente: é uma mudança demasiado radical na vida que elas estão acostumadas a levar. É muito mais fácil para elas, mais cômodo, conviver com a contradição e com a incoerência de, reconhecendo que os embriões são seres humanos vivos, permitir ainda assim que sejam utilizados como melhor aprouver à “Ciência”. É mais fácil fechar os olhos e se negar a enxergar isso.

Esta “acomodação” natural das pessoas é usada de maneira muito eficaz pela Revolução Anti-Cristã da seguinte maneira: sabe-se muito bem que as pessoas comuns não vão aceitar facilmente mudanças que sejam muito profundas em seu modo de enxergar a realidade. Mas aceitam pequenas mudanças. Então, a mentalidade dessas pessoas é “comida pelas beiradas”, deturpada pouco a pouco, até que, após décadas de pequenas mudanças, o resultado final seja de tal maneira que pareceria chocante e inadmissível para o cidadão médio vivente no início do processo de descristianização. Mas, com o acúmulo das mudanças, é hoje a proposta de vida cristã que parece chocante e inadmissível para o cidadão médio… E, quando um determinado aspecto é de tal maneira que ameaça ruir todo o castelo de cartas se contrariado – como é o caso em pauta no Supremo amanhã -, pode-se supôr com razoável confiança de que ele, simplesmente, não será contrariado.

Não, ao menos, pelo cidadão [de]formado pela Revolução. E aqui entra o segundo passo da “mágica”: através de uma deturpação do conceito de democracia, postula-se que vox populi, vox Dei e o único critério para a legitimidade ou não de alguma coisa é a arbitrariedade positivista do Direito, ou baseada naquilo que as pessoas pensam atualmente, ou então naquilo que os seus (supostos) representantes gostariam que elas pensassem [e que elas certamente pensarão, no futuro, se a Revolução não for detida]. Agem, então, os inimigos de Deus em duas frentes: por um lado, corroendo os costumes para permitir a institucionalização de aberrações no futuro e, por outro, institucionalizando aberrações para corroer os costumes e, depois, conseguir retroativamente a sua aprovação.

Pintado com tais cores, o quadro parece demasiado sombrio e, a dimensão do trabalho, digna de um exército de Hércules. Arriscar-me-ia a dizer que, de facto, não há esperanças. Mas teria que acrescentar imediatamente após: não há esperanças humanas. Porque existe um Deus que é o Deus do Impossível e que é, em última instância, Senhor da História. A recente derrota humilhante do Projeto de Lei que propunha a descriminalização do aborto não é um exemplo mais do que evidente desta ação de Deus na História? Não é uma resposta às súplicas que fazemos ao Senhor, na Litaniae Sanctorum, para que Se digne humilhar os inimigos da Santa Igreja?

Vinde, Senhor, depressa em nosso auxílio; socorrei-nos sem demora, porque perecemos. E Vós, Virgem entre todas singular, Vós, de quem jamais se ouviu dizer que tivesse recusado o Vosso auxílio àqueles que à Vossa proteção recorressem, olhai com compaixão para esta Terra de Santa Cruz e, esmagando a cabeça da Serpente, dai-nos a vitória contra as hostes de Satanás, para o bem das almas e a exaltação da Santa Madre Igreja, e para a maior glória de Deus.

Amen.

* Comment, bastante esclarecedor, de um amigo sobre o assunto, ao qual agradeço:

Só uma ressalva: não é correto dizer que a técnica de fertilização in vitro seja inviável caso não se permitam os chamados embriões excedentes. É possível gerar apenas os embriões que serão efetivamente implantados. Claro que com isso aumentam os casos de insucesso que requerem nova coleta de óvulos. Em outras palavras, não há “backup” e se não der certo na primeira tentativa, o processo teria que ser retomado do início.

Mesmo nesses casos, permanece o veto moral à FIV em relação à separação do ato sexual da geração do novo ser.