“O Segredo de Fátima” – Dom Rifan

[Publico com alegria o último artigo de S.E.R. Dom Fernando Arêas Rifan sobre o aniversário das aparições de Fátima que nós comemoramos no último domingo – por uma feliz coincidência, junto com o Dia das Mães. É oportuno meditar na mensagem d’Aquela que é a Mãe por excelência; desta Mulher que, do alto da Cruz, Nosso Senhor nos legou por Mãe na ordem da Graça, e isto de tal maneira que não se pode pretender membro da Igreja (Corpo Místico de Cristo) quem não é filho espiritual d’Aquela que é Mãe da Cabeça da Igreja – Cristo Deus.

Há uma música antiga sobre Nossa Senhora que fala que “em cada mulher que a terra criou / um traço de Deus Maria deixou”, ou coisa parecida. E a profundidade destes versos às vezes não é devidamente percebida: é como se as mulheres se realizassem como mulheres apenas enquanto se aproximassem desta Mulher que é o modelo de toda feminilidade. Deus quer povoar o mundo com reflexos de Sua Divina Mãe; e as mulheres são admiráveis porque lembram, um pouco que seja, a Bem-Aventurada Mãe de Deus.]

O SEGREDO DE FÁTIMA

                                                          Dom Fernando Arêas Rifan*

Domingo passado, com o dia das mães, celebramos o 95o aniversário da primeira de uma série de aparições de Nossa Senhora a três pobres crianças, pastores de ovelhas, em Fátima, pequena cidade de Portugal, de onde a devoção se espalhou e chegou ao Brasil. E são sempre atuais e dignas de recordação as suas palavras e seu ensinamento.

O segredo da importância e da difusão de sua mensagem está exatamente na sua abrangência de praticamente todos os problemas atuais. E aquelas três pobres crianças foram os portadores do “recado” da Mãe de Deus para o Papa, os governantes, os cristãos e não cristãos do mundo inteiro.

Ali, Nossa Senhora nos alerta contra o perigo do materialismo comunista e seu esquecimento dos bens espirituais e eternos, erro que, conforme sua predição, vai cada vez mais se espalhando na sociedade moderna, vivendo os homens como se Deus não existisse: o ateísmo prático, o secularismo.

A Rússia vai espalhar os seus erros pelo mundo”, advertiu Nossa Senhora. A Rússia tinha acabado de adotar o comunismo, aplicação prática da doutrina marxista, ateia e materialista. Se o comunismo, como sistema econômico, fracassou, suas ideias continuam vivas e penetrando na sociedade atual. Aliás, os outros sistemas econômicos, se também adotam o materialismo e colocam o lucro acima da moral e da pessoa humana, adotam os erros do comunismo e acabam se encontrando na exclusão de Deus. Sobre isso, no discurso inaugural do CELAM, em 13 de maio de 2007, em Aparecida, o Papa Bento XVI alertou: “Aqui está precisamente o grande erro das tendências dominantes do último século… Quem exclui Deus de seu horizonte, falsifica o conceito da realidade e só pode terminar em caminhos equivocados e com receitas destrutivas”. Fátima é, sobretudo, a lembrança de Deus e das coisas sobrenaturais aos homens de hoje.

Aos pastorinhos e a nós, Nossa Senhora pediu a oração, sobretudo a reza do Terço do Rosário todos os dias, e a penitência, a mortificação nas coisas agradáveis e lícitas, pela conversão dos pecadores e pela nossa santificação e perseverança.

Explicou que o pecado, além de ofender muito a Deus, causa muitos males aos homens, sendo a guerra uma das consequências do pecado. Lembrança muito válida, sobretudo hoje, quando os homens perderam o senso do pecado e o antidecálogo rege a vida moderna.

Falou sobre o Inferno – cuja visão aterrorizou sadiamente os pastorinhos e os encheu de zelo pela conversão dos pecadores –, sobre o Purgatório, sobre o Céu, sobre a crise que sofreria a Igreja, com perseguições e martírios.

Enfim, Fátima é o resumo, a recapitulação e a recordação do Evangelho para os tempos modernos. O Rosário, tão recomendado por Nossa Senhora, é a “Bíblia dos pobres” (João XXIII). Assim, sua mensagem é sempre atual. É a mãe que vem lembrar aos filhos o caminho do Céu.

                                                                       *Bispo da Administração Apostólica Pessoal
São João Maria Vianney

Já foram identificados os que podem ser mortos: CFM estabelece critérios para o diagnóstico de anencefalia

Foram publicadas hoje no Diário Oficial da União as diretrizes do Conselho Federal de Medicina (CFM) para regulamentar o aborto (dito “legal”) de fetos anencéfalos. A publicação ocorre praticamente um mês após a ilegítima usurpação de poderes do STF que, extrapolando confessadamente as suas competências, “autorizou” o assassinato de fetos deficientes em meados do mês passado.

Procurando um pouco eu encontrei a Resolução CFM nº 1989/2012, “[p]ublicada no D.O.U. de 14 de maio de 2012, Seção I, p. 308 e 309”. São seis artigos, que reproduzo na íntegra abaixo com meus comentários em vermelho e entre colchetes. O arquivo reserva ainda seis páginas para a “Exposição de Motivos da resolução CFM No 1.989/2012”, que podem ser encontradas no link acima mencionado.

Na verdade, a resolução na prática não resolve nada. Os critérios não estão colocados em lugar nenhum, limitando-se a resolulação a se referir a uma vaga “ausência” da calota craniana e do tecido cerebral, sem quantificá-las (que é, exatamente, onde reside a diferença específica entre a anencefalia propriamente dita e os diversos graus de meroanencefalia).

A pior parte do texto, contudo, é justamente quando ele estabelece o absurdo de que crianças deficientes não têm direito aos mesmos cuidados pré-natais que as crianças sadias. Isto, além de ser um preconceito cretino e estúpido, dá margem a toda sorte de abusos.

* * *

O CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, no uso das atribuições conferidas pela Lei no 3.268, de 30 de setembro de 1957, alterada pela Lei no 11.000, de 15 de dezembro de 2004, regulamentada pelo Decreto no 44.045, de 19 de julho de 1958, e

[…]

RESOLVE:

Art. 1° Na ocorrência do diagnóstico inequívoco de anencefalia o médico pode, a pedido da gestante, independente de autorização do Estado, interromper a gravidez.

[E desde quando existe “diagnóstico inequívoco de anencefalia”, se a criança “deixa” de ser classificada como anencéfala simplesmente depois que sobrevive (vide Marcela de Jesus, Vitória, etc.) e, portanto, o tal “equívoco” no diagnóstico só pode ser excluído se a gente deixar a criança nascer, sendo completamente impossível um diagnośtico “inequívoco” durante o período pré-natal?

Os que tiverem oportunidade devem rejeitar todos os diagnóticos de anencefalia que encontrarem, uma vez que eles por definição não podem ser “inequívocos”.]

Art. 2º O diagnóstico de anencefalia é feito por exame ultrassonográfico realizado a partir da 12ª (décima segunda) semana de gestação e deve conter:

I – duas fotografias, identificadas e datadas: uma com a face do feto em posição sagital; a outra, com a visualização do polo cefálico no corte transversal, demonstrando a ausência da calota craniana e de parênquima cerebral identificável;

II – laudo assinado por dois médicos, capacitados para tal diagnóstico.

[Continua valendo o mesmo que foi dito acima. Este artigo não define o que é um “diagnóstico inequívoco de anencefalia”, apenas dizendo o que ele deve conter (e não o que ele é – afinal, desde quando “ausência da calota craniana” (e de tecido cerebral – quanto tecido cerebral?) é igual a “anencefalia”?!). Os abortistas, claro, usarão da ambigüidade para extrapolar ao máximo o conceito e fazer com que qualquer criança com qualquer má-formação craniana se “encaixe” como anencéfala. Por outro lado, os que compreendem o valor da vida humana devem rejeitar quaisquer destes diagnósticos como não-conclusivos ou susceptíveis a erros (e, portanto, “não-inequívocos”), não aceitando a realização do assassinato eugênico (pretensamente legal) com base neles.]

Art. 3º Concluído o diagnóstico de anencefalia, o médico deve prestar à gestante todos os esclarecimentos que lhe forem solicitados, garantindo a ela o direito de decidir livremente sobre a conduta a ser adotada, sem impor sua autoridade para induzi-la a tomar qualquer decisão ou para limitá-la naquilo que decidir:

§1º É direito da gestante solicitar a realização de junta médica ou buscar outra opinião sobre o diagnóstico.

§2º Ante o diagnóstico de anencefalia, a gestante tem o direito de:

I – manter a gravidez;

II – interromper imediatamente a gravidez, independente do tempo de gestação, ou adiar essa decisão para outro momento.

§3º Qualquer que seja a decisão da gestante, o médico deve informá-la das consequências, incluindo os riscos decorrentes ou associados de cada uma.

§4º Se a gestante optar pela manutenção da gravidez, ser-lhe-á assegurada assistência médica pré-natal compatível com o diagnóstico.

[Como assim “compatível com o diagnóstico”?! Este parágrafo é de uma cretinice ímpar. Por que a criança deficiente não tem direito à mesma assistência médica pré-natal que as outras crianças?

Como é uma assistência “compatível com o diagnóstico”? O médico (ou, pior ainda, o plano de saúde) pode porventura negar assistência à criança deficiente sob a alegação de que tal ou qual procedimento é “incompatível” com a anencefalia diagnosticada? De que serve este parágrafo (que, suponho, foi colocado aqui para salvaguardar a criança cuja mãe optasse por não a assassinar), se ele na prática permite que qualquer tratamento seja negado sob a alegação de ser “incompatível” com o diagnóstico da criança?

Mais: e se o plano de saúde não quiser oferecer pré-natal nenhum (alegando que o anencéfalo “não é um ser humano” ou qualquer outra besteira do tipo que costuma brotar da cabeça oca de alguns ministros do STF) por entender que um pré-natal não é “compatível” com o diagnóstico de anencefalia, quem vai dizer que ele não pode fazer isso?]

§5º Tanto a gestante que optar pela manutenção da gravidez quanto a que optar por sua interrupção receberão, se assim o desejarem, assistência de equipe multiprofissional nos locais onde houver disponibilidade.

§6º A antecipação terapêutica do parto pode ser realizada apenas em hospital que disponha de estrutura adequada ao tratamento de complicações eventuais, inerentes aos respectivos procedimentos.

[Mais uma vez as coisas vagas: nenhuma palavra sobre qual seria esta “estrutura adequada”. Do mesmo modo que foi dito acima, portanto, todos os cidadãos de bem devem se aproveitar desta ambigüidade para, diante de um caso concreto, dizer que falta “estrutura adequada” para realizar o procedimento.]

Art. 4º Será lavrada ata da antecipação terapêutica do parto, na qual deve constar o consentimento da gestante e/ou, se for o caso, de seu representante legal.

Parágrafo único. A ata, as fotografias e o laudo do exame referido no artigo 2o desta resolução integrarão o prontuário da paciente.

[E devemos nos preocupar em cobrar auditorias diligentes sobre estas atas.]

Art. 5º Realizada a antecipação terapêutica do parto, o médico deve informar à paciente os riscos de recorrência da anencefalia e referenciá-la para programas de planejamento familiar com assistência à contracepção, enquanto essa for necessária, e à preconcepção, quando for livremente desejada, garantindo-se, sempre, o direito de opção da mulher.

Parágrafo único. A paciente deve ser informada expressamente que a assistência preconcepcional tem por objetivo reduzir a recorrência da anencefalia.

Art. 6º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.

[Ou seja, nada está definido e, mesmo assim, já está valendo. É impressionante!]

Brasília-DF, 10 de maio de 2012

CARLOS VITAL TAVARES CORRÊA LIMA
Presidente em exercício

HENRIQUE BATISTA E SILVA
Secretário-geral

Isto é amar, isto é ser mãe!

Eu vi esta notícia há um mês atrás e tinha deixado para comentar depois. O tempo foi passando e, hoje, sábado véspera do Dia das Mães, parece-me uma ocasião propícia. É a história de uma garota inglesa que resolveu adiar o próprio tratamento contra câncer porque estava grávida e queria salvar a vida da filha; e, depois que a menina nasceu, ela descobriu que não tinha mais cura.

O bebê nasceu saudável com 27 semanas (um pouco mais de 6 meses) de gestação, por cesárea, pesando 900 gramas. Mas Sarah foi informada de que não tinha muito tempo de vida. O câncer já havia se espalhado para o pâncreas, pulmões, pescoço e tomado conta dos intestinos.

O nome da mãe é Sarah Brook; o da filha, Polly Jean. A história adquire contornos de particular heroísmo quando é situada no século em que vivemos: num mundo onde o egoísmo se disseminou de tal maneira que é visto como a norma do comportamento socialmente aceitável.

Lembro-me de que a primeira vez em que contei a história de Santa Gianna para uma amiga, a primeira reação dela foi a de espanto. “Mas como assim, ela só fez dar a vida pelo seu filho? Qualquer mãe faria isso!”. E eu até concordo que qualquer mãe deveria fazer isto, mas tal não é infelizmente a regra nos tempos que hoje correm. E é exatamente por isso que provoca admiração a história de Sarah.

Vejam, a rigor ninguém está mesmo obrigado a se deixar morrer em favor de ninguém. O “primeiro próximo” que estamos obrigados a amar somos nós mesmos, pois ensina Santo Tomás que ninguém é mais próximo do homem do que ele próprio. Antes de qualquer coisa nós estamos obrigados a cuidar da nossa própria vida, uma vez que ela é o nosso bem maior e a manutenção dela é condição necessária para a realização de quaisquer outras obras meritórias. Assim, a rigor ninguém está obrigado a morrer nem mesmo por um filho: um tratamento de câncer durante a gravidez é um caso clássico de causa com duplo efeito e, portanto, é perfeitamente legítimo, ainda que isto acarrete a morte do bebê que se carrega no ventre. Mas eu não consigo nem imaginar como seria estar na pele de uma mulher nesta situação.

No meu Facebook eu encontro uma frase atribuída a Chesterton; eu detesto essas imagens do FB que têm somente uma foto ou uma pintura, uma frase entre aspas e um genérico “fulano de tal”, sem referência, sem nada. Mas neste caso serve para exemplificar o que estou falando, porque o dito é bem verdadeiro independente do autor. A frase é “você não pode amar uma coisa sem querer lutar por ela”. E penso como não deve ser terrível para uma mãe pensar que, talvez, não tenha lutado o suficiente por sua prole… É uma situação difícil! Em um caso mais ou menos análogo, um pai que chegasse em casa e encontrasse sua família vítima de um marginal armado também não teria, a rigor, a obrigação moral de se atracar com o meliante para salvar os seus. Mas me provoca arrepios imaginar como seriam os restos dos dias deste pai, caso ele sobrevivesse sem haver tentado reagir ao assassino.

Se não é possível amar uma coisa sem querer lutar por ela, portanto, nossas mais sinceras homenagens à britânica que não apenas quis lutar como de fato lutou – e lutou até a morte! – pela vida de sua pequena filha. Isto é amar, isto é ser mãe. E se é verdade que toda mãe verdadeira tem ao menos esta disposição in voto de consumir-se pelos seus filhos, é belíssimo quando nós a encontramos realizada concretamente em um caso extremo que, justamente por ser extremo, é de uma admirável eloqüência. No dia de hoje, nós queremos saudar a todas as mães que participam, pelo fato mesmo de serem mães, desta grandiosa missão e desta sublime vocação expressas de maneira tão magnífica nesta história de sacrifício. Quando à Sarah Brook, eu não sei o que aconteceu com ela (já faz um mês da notícia); se ela já tiver partido para as Moradas Celestes, que seja lá recebida com glória. E, onde quer que ela se encontre, que receba as justas homenagens pelo dia de amanhã. Que o exemplo dela possa despertar – ou fazer florescer – este instinto materno nas mães de que o mundo de hoje precisa.

Que voltem depressa os da FSSPX!

Soube hoje à tarde (via La cigüeña de la torre) de duas importantes cartas recentemente tornadas públicas e que têm a ver com os diálogos entre a Santa Sé e a Fraternidade Sacerdotal São Pio X. A primeira foi uma carta enviada por três bispos da FSSPX – Mgr. Alfonso de Galarreta, Mgr. Bernard Tissier de Mallerais e Mgr. Richard Williamson – ao Conselho Geral da Fraternidade (e, nomeadamente, ao Superior-Geral, Dom Bernard Fellay). A segunda é a resposta de D. Fellay a esta carta. Não sei se elas possuem tradução para o português; apenas vi o original francês e as duas traduções para o espanhol feitas pela Radio Cristiandad:

1. Carta de los tres obispos a Mons. Fellay – Traducción completa de Radio Cristiandad
2. Respuesta de Mons. Fellay a la carta de los tres obispos – Traducción completa de Radio Cristiandad

Muito resumidamente, os três bispos se mostram reticentes a isto que chamam de “um acordo prático” com Roma. Aliás, dizer que eles se mostram “reticentes” é um eufemismo: os bispos atacam abertamente a reconciliação que está às portas, inclusive empregando expressões bem duras como dizer que a FSSPX corre o risco de “apodrecer” caso se coloque em meio à “contradição” da doutrina do Concílio Vaticano II. E conclamando os fiéis da Fraternidade, em nome de D. Lefebvre, a recusarem todo acordo “puramente prático” com Roma.

Por outro lado, a resposta de D. Fellay é magnífica. Não apenas repetindo o óbvio – se o Papa é Papa legítimo e se o desejo que ele apresenta à Fraternidade é legítimo, não atentando contra os mandamentos da lei de Deus e nem nada, como é possível rejeitá-lo? -, mas também indo ao ponto nevrálgico e dizendo, ousadamente, que falta aos bispos tanto visão sobrenatural da Igreja quanto até mesmo senso de realidade. Visão sobrenatural, porque eles parecem esquecer que Deus é Senhor da História e, nesta aproximação com Roma, só conseguem ver complôs e armadilhas dos quais é preciso (humanamente) se resguardar. E senso de realidade porque dão aos erros disseminados na Igreja após o Vaticano II uma intensidade e uma amplitude totalmente desproporcionadas.

Sim, as coisas mudaram muito de 1988 para cá. Se naquela época poderia parecer que os inimigos da Igreja haviam triunfado, hoje o movimento de restauração é evidente e é preciso ser cego para o negar. Temos um Papa teólogo francamente dedicado ao resgate da sacralidade da Liturgia. Temos vozes conservadoras proclamando a Fé Católica por todos os lados: entre os leigos e entre os seminaristas, entre o clero, nos bispos e na Cúria Romana. Temos, em suma, uma luta encarniçada ocorrendo abertamente dentro da Igreja, na qual católicos que não aceitam as novidades heterodoxas das últimas décadas estão diligentemente empenhados em resgatar tudo o que foi perdido de Woodstock pra cá. Não é crível fingir que nada disso está acontecendo. Não é possível afirmar que este combate não seja justo. Não é portanto lícito negar-se a ele.

E a cereja do bolo vai ao final da carta-resposta: embora saibam – diz D. Fellay – que o princípio da unidade da FSSPX é o Superior-Geral, os três bispos que assinam a primeira carta parecem querer impôr o seu próprio ponto de vista a toda a Fraternidade, “mesmo sob a forma de ameaças, mesmo publicamente”. E “esta dialética entre verdade/fé e autoridade é contrária ao espírito sacerdotal”. A questão, assim colocada nas devidas perspectivas, deixa de ser sobre a alegada resistência heróica do Resto de Israel aos assaltos do Anticristo e passa a adquirir contornos de uma rebeldia sem causa, de uma polêmica que se esqueceu de sua razão de ser. E esta decadência é precisamente o maior risco que a Fraternidade corre neste momento.

Que, pela intercessão de todos os coros angélicos e de todas as almas dos bem-aventurados que do alto da Igreja Triunfante olham por nós, Deus não permita que isto aconteça! E que voltem, sim, depressa, os valorosos soldados da Fraternidade: que voltem cheios de ânimo e de zelo para se baterem pela glória do Senhor dos Exércitos! Nós precisamos deles. Que São Miguel Arcanjo possa nos trazer estes tão importantes reforços, e que a Virgem Santíssima, Auxilium Christianorum, possa conduzir os membros da FSSPX de volta ao campo de batalha o quanto antes.

Revista In Guardia: 5ª Edição

Aviso, com um pouco de atraso, que já foi publicada (desde o início do mês passado) a quinta edição da Revista In Guardia. Segundo divulgação do próprio site da revista, «[n]essa edição temos a entrevista com o José Nivaldo Cordeiro que nos falou muito sobre temas variados da política nacional e ainda de alguns temas legislativos em voga. A outra entrevista ficou por conta de um belo bate-papo com Dom Antônio Keller». Para acessá-la basta clicar no link acima (ou aqui, para lê-la online diretamente).

É com alegria que eu vejo a revista crescendo e adquirindo maior qualidade a cada edição. Trata-se de um trabalho coordenado entre diversos escritores católicos dos mais variados lugares do Brasil, reunidos nesta iniciativa de oferecer uma revista de formação católica com assuntos de interesse aos internautas brasileiros. Vocês que passam por aqui não deixem de prestigiar a revista acessando-a e recomendando-a aos seus conhecidos. E quaisquer comentários que desejem fazer sobre ela, sintam-se à vontade: o nosso desejo é trabalhar para melhor servi-los.

Vandalismo e ofensas gratuitas são “piadas” para alguns

Parece que um apresentador de TV teve a fantástica idéia de conclamar os seus telespectadores a picharem igrejas (!) e enviarem as fotos para o programa. O sujeito faz referência a este fato ocorrido no interior do Paraná, quando alguém resolveu fazer uma “homenagem” de gosto estupidamente discutível ao Kurt Cobain e pichar “Deus é Gay” – entre outras delicadezas – nas paredes da Igreja [Católica] Matriz de Santa Helena (PR). Após a repercussão negativa do fato, o fulano responsável pelo programa meio que pediu desculpas por sua “piada” (aqui e aqui), a despeito de poluir em seguida o Twitter com provavelmente a maior sequência encadeada de orações adversativas que o microblog já armazenou.

O pior não é a “letra” de música do Nirvana e nem mesmo (por incrível que pareça) o próprio ato do vandalismo. O mais deprimente é encontrar alguém que pareça achar graça nisso e, fazendo piada em um programa de televisão, sinta-se depois ofendido quando acusado da apologia ao crime que estava fazendo. É como se nessa pichação não existisse um imenso desrespeito e uma agressão gratuita ao sentimento religioso dos católicos (aliás, dos cristãos como um todo). É como se não tivesse redundado em dano material à paróquia este vandalismo que danificou os muros de uma propriedade sua. É como se nada disso importasse, porque “é engraçado” debochar de religiosos e ninguém pode violar o sacrossanto direito de se divertir às custas das desgraças alheias.

Os seres humanos possuem uma característica que lhes é própria e sem a qual se bestializam facilmente; trata-se da empatia, i.e., da capacidade de perceber (ou ao menos de entrever) a realidade sob o ponto de vista de outras pessoas: é o velho “colocar-se no lugar dos outros”. Basicamente, é esta habilidade humana que nos permite, p.ex., oferecer os nossos sentimentos a alguém que perdeu um ente querido que nos seja desconhecido: nós conseguimos entender que, embora fulano seja desconhecido para nós, a sua importância para a viúva ou para o órfão é grande ao ponto de provocar-lhes um profundo sofrimento, e somos capazes de compreender em certa medida o estado de espírito de alguém que esteja passando por um situação dessas a ponto de podermos dizer “meus pêsames” [= “pesa em mim”] ou “minhas condolências” [“co” = junto, “dolência” = dor, “dividir a dor”] sem que isto seja mentira ou hipocrisia.

Esta habilidade humana parece estar profundamente danificada – ou, pior ainda, ter sido irremediavelmente destruída… – em pessoas como este apresentador que acha divertido picharem as casas dos outros. Mais ainda: a apreciação prolongada deste tipo de comportamento pode destruir paulatinamente as habilidades empáticas do sujeito que se submete a isso, a ponto de torná-lo insensível ao sofrimento alheio: se hoje riem quando vandalizam um templo católico, quem garante que ainda serão capazes de se solidarizar quando explodirem uma igreja com gente dentro? É preocupante. Muito pior do que o agressor é o sujeito que acha “não haver problema” na agressão. E ainda pior do que este último é o fulano que está convencido de que a agressão é na verdade uma piada.

A união entre Cristo e a Igreja

E Deus criou a mulher para ser companheira do homem, pois não era bom que este estivesse só. Embora esta complementaridade entre os sexos aponte indubitavelmente para a transcendência humana (aqui entendida como a sua capacidade de relacionar-se com um outro diferente de si mesmo) em seu sentido latu, é também indiscutível que este plano divino realiza-se com maior perfeição e particular eloqüência dentro do Sagrado Matrimônio, por meio do qual o homem e a mulher se unem diante de Deus; tornando-se assim uma só carne e iniciando uma nova família no mundo.

Um casamento, como dizia o Carlos Ramalhete outro dia, deve sempre ser comemorado. Porque se trata de uma etapa da vida que é deixada para trás, ao mesmo tempo em que se tem diante de si a grande aventura da vida, a aventura verdadeiramente importante da vida. Eu já escrevi sobre isto aqui há mais de três anos, quando voltava da festa de casamento de pessoas que me são particularmente caras. Todo casamento é um drama que cumpre ser bem representado, um drama único e irrepetível como únicas e irrepetíveis são as pessoas – cada uma das pessoas – criadas por Deus. Todo casamento é chamado a ser santo como santos devem ser os seus protagonistas, e eu diria ainda mais: os que se unem nos laços do Sagrado Matrimônio têm uma responsabilidade ainda maior do que os solteiros, pois devem acrescentar ao testemunho de si próprios o testemunho público da sua família. Em um certo sentido, o marido deve ser melhor do que era até o dia em que tomou a sua mulher por esposa, e a esposa deve ser melhor do que foi até o momento em que subiu ao altar de Deus; de certo modo, os esposos estão obrigados a serem bons esposos mais ainda do que os filhos ou irmãos devem ser bons filhos ou bons irmãos.

Porque o Matrimônio tem esta gravíssima prerrogativa de ser, como disse o Apóstolo, sinal da união entre Cristo e a Igreja. Se já é naturalmente nobre a união dos esposos, nobilíssima é a missão dos que se unem sob o signo da Cruz e, banhados no Sangue do Cordeiro, ousam aproximar-se deste Sacramento que torna palpável e visível a relação entre Deus e o Seu povo, entre Cristo e Sua Igreja. É o único Sacramento que tem esta finalidade. À união entre os esposos foi concedida esta incomensurável honra de servir como metáfora para o deleite da visão beatífica, para o encontro definitivo com Deus: são as próprias Escrituras Sagradas que nos falam nas “núpcias do Cordeiro” (cf. Ap 19, 7). Eis a que estão obrigados os que se unem em Matrimônio! A amizade é nobre. O amor natural entre o homem e a mulher é sublime. O Matrimônio elevado sobrenaturalmente a Sacramento chega aos limites do Céu, aos umbrais da Jerusalém Celeste: é divino.

Dentro em breve vou pegar um avião. Amanhã, se o bom Deus assim permitir, estarei presente à cerimônia religiosa onde um amigo e uma amiga irão selar a sua união diante do Todo-Poderoso, e isto é belíssimo porque semelhante entrega ultrapassa os limites humanos e só é possível porque o amor de Deus é maior do que as misérias humanas. Sim, o amor de Deus é maior do que as nossas fraquezas, e isto se torna visível cada vez que um Matrimônio é celebrado; cada vez que, a despeito de nossas muitas faltas, Deus insiste em fazer do barro que somos um vaso de precioso conteúdo. Amanhã este milagre acontecerá mais uma vez. Amanhã Marcio e Cristina darão continuidade a esta tradição que remonta às Bodas de Caná e, ainda mais além, remonta aos próprios Primeiros Pais, ao Primeiro Homem e à Primeira Mulher que Deus criou para que fossem um do outro e, precisamente sendo um do outro, refletissem no mundo um pouco do amor que Deus tem por Seus filhos. Amanhã – isto é certo! – eu terei um vislumbre de Cristo Se unindo à Sua Igreja. E o que desejo sinceramente aos amigos que embarcam em tão grandiosa empreitada é que sejam fiéis e felizes: que esta família possa ser no mundo um reflexo tão límpido e fulgurante d’Aquela Família Sagrada de Nazaré, d’Aquela União Mística entre Cristo e Sua Igreja, que arraste mais e mais almas a Deus; e que assim eles possam um dia consumar plenamente a união que amanhã irão simbolizar.

Parabéns aos noivos! Que sejam santos. Que por meio deles o amor de Deus se difunda sobre o mundo – e se encontre nesta terra. Que o Sacramento do Matrimônio os leve a Deus.

Estadão inventa “sentença” do Santo Ofício contra o pe. António Vieira

Há algum tempo eu encontrei numa livraria uma bonita edição dos “Autos do processo de Vieira na Inquisição”. Passei um tempo considerável folheando o livro, que me pareceu interessantíssimo; não o trouxe para casa, contudo, porque a curiosidade histórica não me cabia então no orçamento mensal.

O livro não veio comigo, mas o conteúdo dele sim. O processo contra o pe. António Vieira, eu me lembrava perfeitamente, fora instaurado por conta de uma carta enviada a não-sei-que autoridade oriental, na qual o sacerdote dissertava sobre umas (supostas) profecias de um gajo segundo as quais o rei D. João IV haveria de ressuscitar. Estas referências foram-me suficientes para que eu recuperasse, hoje, a história inteira. Encontrei-a na Revista Semear 2, da Cátedra Padre António Vieira de Estudos Portugueses. O silogismo brandido pelo pe. António Vieira foi o seguinte:

O Bandarra é verdadeiro profeta; o Bandarra profetizou que El-Rei D. João o quarto há de obrar muitas cousas que ainda não obrou, nem pode obrar senão ressuscitando: logo, El-Rei D. João o quarto há-de ressuscitar.

Era exatamente isto. Lembrava-me de como me pareceu, à época, que o pe. Vieira estava a troçar dos portugueses, sustentando diante das fuças dos inquisidores um silogismo cuja premissa maior era gigantescamente questionável sem parecer se preocupar muito com esta singular lacuna argumentativa. Cheguei a pensar, a sério, que o interesse do reverendíssimo sacerdote era somente quanto aos aspectos formais da construção silogística, mais ou menos como Chesterton diz que os unicórnios eram importantes para os escolásticos medievais: “se um licorne tem um chifre, então dois deles têm tantos quanto uma vaca”. De qualquer maneira, lembro-me de que este processo do Santo Ofício evoluiu para coisas que faziam muito mais sentido, como a natureza das profecias ou a Revelação: assuntos propriamente teológicos, de leitura deliciosa cuja mera lembrança agora me dá ganas de ter o livro à mão e me faz refletir sobre o porquê de comprarmos livros. Se me é permitida a metáfora, trata-se de um testemunho – dir-se-ia profético! – do valor das estantes repletas…

Mas qual não foi a minha surpresa quando encontrei hoje, na primeira frase desta matéria do Estadão, esta incrível pérola: o pe. António Vieira foi «[c]ondenado pela Inquisição de Coimbra por fazer duras críticas à exploração dos escravos» (!). Como assim?! Não foi este o motivo do seu processo mais conhecido. Semelhante episódio da vida do sacerdote não consta na sua biografia da Wikipedia e nem em nenhuma outra. O próprio conteúdo da acusação é totalmente nonsense e descabido: como se a Igreja condenasse não os que exploravam escravos, mas os que eram contra a escravidão (!). De onde esta informação absurda foi retirada?

Confesso, desconcertado, não fazer idéia. Ou talvez até faça: trata-se aparentemente de mais um exemplar do velho e esclerosado preconceito anti-clerical, desta deficiência intelectual grave que parece ter uma doentia compulsão por dar crédito – ligeiro e leviano – a qualquer bobagem desabonadora que alguém atribua à Igreja Católica. O fenômeno não é novo. Mas encontrá-lo de novo e de novo, em pleno século XXI, é profundamente desanimador. Melhor me seria ler os autos do Santo Ofício! E melhor fariam certos repórteres em ler, senão processos antigos sobre os quais se metem a falar, ao menos os resultados mais relevantes do Google. Assim passariam menos vergonha.

A vida depende do seu voto – Eleições 2012

Recebi via Facebook a informação de que o “Movimento Nacional da Cidadania pela Vida – Brasil Sem Aborto” estará, mais uma vez, lançando a campanha “A Vida depende do seu voto”. O objetivo, como nos anos anteriores, é coligir informações sobre os candidatos aos cargos minoritários que concorrerão nas eleições deste ano – em particular, a posição deles a respeito do aborto.

O site – http://brasilsemaborto.com.br/– irá disponibilizar os termos de compromisso firmados pelos candidatos. A idéia não é somente conhecer a posição deles: passa também por saber se eles têm a coragem de sustentá-la publicamente ou se, ao contrário, gostam de alardear bravatas aqui e acolá mas, na hora em que são efetivamente cobrados, a covardia fala mais alto e os mantém em cima do muro.

Naturalmente, a questão do aborto não será decidida nas câmaras legislativas estaduais nem nas prefeituras, mas é fundamental ter políticos comprometidos com a defesa da vida também nestas instâncias. Primeiro pela questão política no sentido mais latu (e aliás mais relevante) do termo: quem há de negar a importância de se ter um município pró-vida, uma cidade que proíbe o aborto dito “legal” ou a divulgação de um programa de prevenção ao aborto pela Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj)? Segundo, porque os candidatos aos cargos majoritários não caem do céu: eles vêm justamente das câmaras estaduais e das prefeituras, de onde se vê que, naturalmente, os nossos candidatos ao Parlamento ou à Presidência serão tanto melhores quanto melhores forem os quadros mais “baixos” dos nossos poderes públicos. É portanto fundamental cuidar bem deles.

É importantíssima, assim, e digna do mais entusiasta apoio, esta iniciativa do Movimento Brasil Sem Aborto. Que cada um de nós, na medida de nossas capacidades, possa colaborar para o bom êxito deste serviço tão necessário ao futuro da nossa Pátria. Não queremos que a nódoa do aborto manche o solo desta Terra de Santa Cruz! Cada um assuma o seu papel neste combate; e ninguém julgue já estar fazendo o bastante, pois a batalha é sangrenta e terrível. Que São Miguel Arcanjo nos proteja neste combate.