Tabagismo e alma humana

Interessante este texto sobre o tabaco e a alma, da autoria de Michel P. Foley (que eu não conheço) e traduzido pelo Márcio Umberto Bragaglia. Basicamente, a interessante teoria do articulista é a de associar diversas “categorias” de fumo – cigarro, charuto e cachimbo – a diferentes “atividades” (ou “partes”, no vocabulário empregado pelo articulista) da alma humana. O cigarro é mais “vegetativo”, o charuto, “sensível” e, o cachimbo, “intelectual”. Vale uma leitura. Destaco um trecho das conclusões do autor:

Mais significativa, entretanto, é a relação entre a raridade numérica dos fumantes de cachimbo na América, e a crise intelectual que o país enfrenta. Se o cachimbo enfatiza um modo de vida intelectual e racional, é de espantar que não possa ser encontrado em um país no qual as escolas substituem a filosofia real pela ideologia do “politicamente correto”, onde a inteligentsia, ao invés de se engajar no pensamento aprofundado, tende para o ativismo irresponsável? É surpresa que o mais famoso fumante de cachimbo dos EUA nos últimos trinta anos seja Hugh Hefner [O fundador e editor da revista Playboy, desde 1953], profeta banal do hedonismo? Não, a era dos fumantes de cachimbo está tão longe de nós quanto o dia em que os filósofos serão reis e os reis irão filosofar – uma realidade triste que a densa neblina azul dos cigarros e charutos é a única a atestar.

A propósito, sobre um outro aspecto do mesmo assunto, vale a pena ler a fúria dos ateus sobre a (suposta) declaração de José Serra sobre tabagismo e ateísmo, e a errata publicada pelo mesmo blog. É o anti-tabagismo como senso comum: ninguém quer ouvir a frase e nem tê-la atribuída a si…

En passant, mas mereciam mais

Justiça decide que símbolos religiosos podem permanecer em prédios públicos. “A juíza Maria Lúcia Lencastre Ursaia, da 3ª Vara Cível Federal de São Paulo, indeferiu nesta quinta-feira o pedido do Ministério Público Federal de retirada de símbolos religiosos de prédios públicos”. Uma lufada de bom senso no judiciário, graças a Deus. O Reinaldo Azevedo também comentou: segundo o articulista, a juíza escreveu

1 – que é natural a presença de símbolos religiosos cristãos num país de formação cristã — isso pertence à nossa história;
2  – que, “sem qualquer ofensa à liberdade de crença, garantia constitucional, eis que, para os agnósticos, ou que professam crença diferenciada, aquele símbolo nada representa, assemelhando-se a um quadro ou escultura, adereços decorativos”;
3 – que estado laico não quer dizer estado anti-religioso. Dando uma pequena aula de lógica e de história à boçalidade do CCC, escreveu: “O Estado laico foi a primeira organização política que garantiu a liberdade religiosa. A liberdade de crença, de culto, e a tolerância religiosa foram aceitas graças ao Estado laico, e não como oposição a ele. Assim sendo, a laicidade não pode se expressar na eliminação dos símbolos religiosos, mas na tolerância aos mesmos.”

Só um “detalhe”: o terceiro ponto, com loas exageradas e imprecisas ao Estado Laico, não pode ser subscrito sem ressalvas. E este mau entendimento pode comprometer tudo…

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Lei antifumo paulista é inconstitucional, diz AGU. “A Advocacia-Geral da União (AGU), órgão que defende e representa a União principalmente em ações no Supremo Tribunal Federal (STF), emitiu parecer anteontem que considera a lei antifumo paulista inconstitucional. O documento, assinado por José Antonio Dias Toffoli, enfatiza que a competência de legislar sobre o uso do cigarro em ambientes fechados é do governo federal e não de Estados ou municípios”.

Não me parece muito animador. Primeiro pelo fato do “posicionamento não ser definitivo” e, segundo e muito mais sério, porque o alegado motivo da inconstitucionalidade está equivocado. A AGU, na verdade, só faz “transferir” o poder ilegítimo dos municípios para o Estado Federal, ao invés de defender claramente o direito à propriedade e as liberdades individuais. E isto é preocupante.

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–  Padres afastados serão ouvidos por dom Saburido. Palavras de Sua Excelência Reverendíssima: “Todos serão bem-vindos na arquidiocese. Todos. Desde que estejam dispostos a trabalhar com amor. Vamos escutar a verdade do outro e perdoar os erros do passado, para reconstruir nossa unidade. […] Muita coisa da época de dom Helder morreu e precisa ser ressuscitada. A igreja precisa voltar a ter um semblante alegre”.

Que a Virgem Santíssima, Onipotência Suplicante, Aquela de quem jamais se ouviu dizer que tivesse desamparado quem se Lhe achegasse com confiança, ponha o Seu valor diante do Altíssimo em defesa de Olinda e Recife. E oremus pro Antistite nostro.

℣. Oremus pro antistite nostro Ferdinando.
℟. Stet et pascat, in fortitudine tua, Domine, in sublimitate nominis tui.
℣. Salvum fac servum tuum.
℟. Deus meus sperantem in te.

Psicologia, índios e cigarros

– O enfoque faz toda a diferença. Lembram da notícia aqui publicada sobre a Associação Americana de Psicologia e o auxílio psicológico para pessoas que queriam refrear os seus impulsos homossexuais? Olhem só como G1 noticiou: Associação Americana de Psicologia repudia ‘conversão’ de gay para hétero! Somente lá no meio do texto é que se pode ler que o relatório “trata com detalhes a questão de como terapeutas devem lidar com pacientes gays que lutam para permanecer fiéis a crenças religiosas que desaprovem a homossexualidade”…

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Após 40 anos, índios do AM retomam cerimônia proibida por religiosos; triste, triste, triste! “A proibição [foi] dos missionários católicos que evangelizaram os índios no século passado. ‘Toda a coisa do índio, danças, vestimentas, a própria língua, era considerada como uma influência satânica’, explica Higino Tenório, líder do povo tuyuka. Com a modernização da igreja, o misticismo indígena deixou de ser pecado, e a cultura começa a ser resgatada”. Não importa o que diga o CIMI; é óbvio que uma cerimônia pagã “que tem chás alucinógenos, ervas estimulantes, benzeduras e invocação de espíritos da floresta” deve ser condenada como o paganismo que é. Infâmia! Beato José de Anchieta, rogai por nós!

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Até tu, São Paulo? Do João Pereira Coutinho, publicado na Folha do dia 18 de agosto. “A última pesquisa Datafolha é sinistra: a esmagadora maioria dos paulistas (88%) aprova a lei antifumo. Só 10% se opõem a ela. Só 2% lhe são indiferentes. Mais irônico é olhar para os fumantes: depois de anos e anos de propaganda e desumanização, eles olham-se no espelho, sentem o clássico nojo de si próprios e até concordam com a lei (77%). Razão tinha Karl Kraus quando afirmava, na Viena de inícios do século, que o antissemitismo era tão normal que até os judeus o praticavam. Péssimo presságio”.

Vício, Virtude, Totalitarismo

Virtude x Vício, texto muito bom publicado hoje no Estadão. Já falei aqui por outras vezes que existe um processo – no meu entender, deliberado – de substituição da Moral Católica, no inconsciente popular, por uma “moral” arbitrária e estranha ao catolicismo; felizmente, parece que não estou sozinho, porque o professor de Filosofia que assina o texto do Estado de São Paulo diz que “[o] politicamente correto apresenta-se, então, como se fosse, moralmente falando, uma forma do bem que estaria enfrentando o mal, no caso, o mau comportamento”.

O professor Denis Lerrer Rosenfield não fala especificamente sobre o cigarro, embora o inclua expressamente; fala também sobre o álcool e alguns alimentos “considerados daninhos ao organismo”. O problema de fundo é o mesmo – a demonização de uma coisa que, em si, é neutra, por causa dos efeitos maus indesejados advindos do seu uso – e tem tudo a ver com a “síndrome de Paulo Cintura” sobre a qual julgo já ter falado algures: a máxima “saúde é o que interessa, o resto não tem pressa” parece ter se transformado em um axioma incontestável dos tempos modernos. Todo católico sabe que saúde interessa, sem dúvidas, mas não é o que mais interessa; a salvação da própria alma é muitíssimo mais importante, por exemplo. Fazem-se, no entanto, de surdos e mudos diante da imposição do culto ao corpo hodierno.

A análise do texto não é do ponto de vista meramente moral, mas principalmente histórico e político. Fala que esta ingerência estatal nos hábitos dos cidadãos remonta à Alemanha Nazista. “A propaganda nazista não cessava de apregoar a virtude de seus dirigentes, ressaltando que Hitler era antitabagista, enquanto seus inimigos, como Churchill, Roosevelt e Stalin, eram adeptos do fumo, o primeiro, de charutos e os outros dois, de cigarros. […] Na perspectiva nazista, assinalada em sua propaganda, Hitler era um homem virtuoso, que se dedicava a combater o vício, enquanto os seus adversários eram capitalistas ou comunistas degenerados, frutos de uma civilização decadente. Tratava-se, portanto, para ele, de fazer um resgate da virtude, em contraposição aos que se dedicavam ao vício”.

Aqui, falo eu: se Estado arvora-se em guardião da moralidade dos atos – papel que, absolutamente, não compete a ele -, é realmente espantoso que tal Estado torne-se, mais cedo ou mais tarde, totalitário? Não é óbvio? Quem pode o mais, pode o menos: se até mesmo nas consciências e liberdades individuais o Estado pode imiscuir-se, e tal atitude é referendada pelo silêncio ou até mesmo apoio entusiasta dos cidadãos, como será possível impedi-lo de se meter em demasia nas relações sociais, na produção intelectual, nas atividades econômicas, na liberdade religiosa? Se o Estado é guardião do vício e da virtude, e a tal ponto que é capaz não apenas de combater o primeiro e favorecer o segundo, mas de definir mesmo o que é vicioso e o que é virtuoso… como escapar do monstro?

Caiu a Alemanha Nazista com o seu Führer vegetariano e anti-tabagista; no entanto, o saldo foi bastante negativo. Ao fim da Guerra, entre outras coisas, os alemães que se libertaram do jugo de Hitler adquiriram novamente o direito de comer gordura, beber e fumar. Não pensemos que é pouca coisa; foi com a supressão destes simples direitos – que, aliás, pressupõe poderes estatais nada simples e nada pequenos – que começou a ascenção do III Reich. Defendamos o que precisa ser defendido, por pequeno que pareça; a história é testemunha de que grandes erros iniciam-se sempre com [aparentemente] pequenos desvios.

Ligeiro apanhado: Economia, Gayzismo

Não existem crises econômicas, mas crises morais – é o que diz Eulogio López, diretor do Hispanidad. “[O] Ocidente não está deixando de ser o motor do desenvolvimento econômico do mundo porque perdeu o trem tecnológico, mas porque não tem filhos. Ter filhos é um preceito moral mas também uma lei econômica. Sem filhos não há pessoas, não há contribuintes que suportem o Estado de Bem-Estar. É a tautologia de que se não há vitalidade as sociedades morrem. Portanto, o aborto e o conjunto de políticas antinatalistas são os vilões de uma economia sã”.

– Ouvi dizer que o primeiro a sustentar a tese, precisamente contra Malthus, foi um economista chamado Friedrich List. Não conheço nada sobre ele. No entanto, soube por ZENIT que “o economista Ettore Gotti Tedeschi, expoente dos maiores grupos bancários mundiais, indicou o Papa Bento XVI para o Nobel de Economia”. Precisamente por ter escrito com clareza, na Caritas in Veritate, que “que a crise econômica é filha da queda da natalidade”.

– Será que vão escutar o Papa? A julgar por dois economistas do The Economist, espero que sim. Eles dizem que Deus está de volta. A tese deles diz que “la religión está jugando un papel cada vez más importante en la vida pública e intelectual”; queira Deus que isso seja verdade. Quanto aos dois autores do texto, uma informação interessante: “[e]l primero es católico; el segundo se declara ateo”.

– A dra. Rozangela Alves Justino – que está sendo perseguida pela Gaystapo por oferecer tratamento psicológico para os seus pacientes que desejarem largar a homossexualidade – concedeu uma entrevista à Folha que foi publicada hoje (via IHU). Sem papas na língua. O homossexualismo “[é] uma doença. E uma doença que estão querendo implantar em toda sociedade. Há um grupo com finalidades políticas e econômicas que quer estabelecer a liberação sexual, inclusive o abuso sexual contra criança. Esse é o movimento que me persegue e que tem feito alianças com conselhos de psicologia para implantar a ditadura gay”.

– Reportagem politicamente incorreta ao extremo no Courage Latino: Estilo de vida homosexual reduce más años de vida… que fumar. “[E]ntre 1990 y 2002, los hombres heterosexuales casados morían a la edad promedio de 74 años, mientras que los homosexuales varones “casados” lo hicieron a la edad promedio de 51 años”. E a pergunta inconveniente: ¿Qué justificación existe para condenar el hábito de fumar y aceptar la homosexualidad? A pergunta retórica bem que poderia ser feita com mais freqüência. Quem sabe o mundo acorde, antes que seja tarde.

Diversos

– Um pequeno – mas muito bom! – texto sobre a alma da Dicta & Contradicta: Apenas Letal. “Uma casa é uma pilha de tijolos, mas não é apenas uma pilha de tijolos. Não acredita em mim? Vá aos fundos de uma olaria; lá haverá muitas pilhas de tijolos, mas nenhuma casa. A definição dada responde à causa material, à pergunta ‘do que é feito?’, mas é apenas uma parte da resposta à pergunta mais ampla ‘o que é?’. Faltou o mais essencial: uma casa é definida, antes de tudo, não pelos materiais que a compõem (embora também por eles), mas por seu projeto: ela é dividida em cômodos, cada um com sua função no todo cujo fim último é abrigar e permitir a vida de uma pessoa ou grupo delas. E o que é esse projeto? Ele está desenhado num papel, na planta, mas ele não é o desenho. Tanto é assim que é possível desenhar o mesmo projeto em outro papel com outro lápis, e nem por isso a casa terá dois projetos. O projeto é aquilo que o desenho expressa: a estrutura lógica, racional, da construção: os tamanhos e localizações dos cômodos, onde cada material será usado, a função de cada cômodo, etc. […] Tijolos sem projeto, e projeto sem tijolos, não seriam uma casa”.

Número especial da revista “Brava Gente” sobre o príncipe Dom Pedro Luiz de Orleans e Bragança. Um compêndio de tudo o que aconteceu com a Família Imperial desde o desaparecimento do vôo 447 da Air France; de quebra, uma oportunidade de conhecer melhor a Casa Imperial.

Não há lugar no ministério sacerdotal para pedófilos, como diz Dom Cláudio Hummes. Sem dúvidas, Eminência, sem a menor sombra de dúvidas: eis o verdadeiro discurso do óbvio! No entanto, é de se lamentar que Sua Eminência prefira louvar os sacerdotes por serem homens que “se esforçam pela dignidade humana, pelos direitos humanos, a justiça social e a solidariedade com os pobres”. Data venia, Eminência, não é este o apanágio do sacerdote católico!

– Hoje é dia de San Josemaría Escrivá, e o santo espanhol fala sobre o sacerdócio muito melhor do que o cardeal brasileiro: “Através desse sacerdócio ministerial, que difere essencialmente – e não com uma simples diferença de grau do sacerdócio comum de todos os fiéis -, os ministros sagrados podem consagrar o Corpo e o Sangue de Cristo, oferecer a Deus o Santo Sacrifício, perdoar os pecados na confissão sacramental e exercer o ministério da doutrina in iis quae sunt ad Deum, em tudo e somente naquilo que se refere a Deus”. San Josemaría Escrivá de Balaguer, rogai por nós!

– Uma interessante decisão do juiz Valter Alexandre Mena, da 3ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, ao suspender parte da Lei Antifumo estadual. Vale a pena dar uma olhada na íntegra da decisão, da qual destaco:

Veja-se o paradoxo: o governo federal aumentou a alíquota para os cigarros e a reduziu para os carros, supostamente para reduzir o consumo daqueles em proteção da saúde. Na verdade, trata-se apenas de compensar a perda (1,5 bilhão) com a redução tributária de um setor, transferindo-a para o outro. Ora, os veículos (dada a péssima qualidade do combustível) poluem muito mais e prejudicam muito mais a saúde. E nada indica que haverá redução do consumo de cigarro, porque 40% não pagam impostos (contrabandeados ou produzidos por sonegadores), mas sim estimular a ilegalidade.

Quanto ao tabaco, existem alternativas, há medida intermediária à proibição: de um lado, áreas reservadas ou fumódromos; de outro, a livre escolha dos não-fumantes em frequentar tais ambientes.

As discotecas (danceterias) são ambientes de marcante poluição sonora (também prejudicial à saúde, inclusive dos empregados) e freqüentadas voluntariamente pelos que gostam de barulho, sem qualquer proibição em respeito à liberdade individual. Quem não aprecia, não é obrigado a nelas ingressar. Se o faz, pratica ato de opção (alguém dirá que o freqüentador está viciado por dependência química? Ou está apenas ficando surdo?).

Mais de dez anos depois de a lei federal obrigar os empresários a despender recursos na instalação de fumódromos, vem a norma estadual dizer que eles são inúteis e devem deixar de existir em 90 dias.

Recife livre do fumo: 1 ano

Ontem completou um ano a lei (municipal, suponho) que regulamenta a fiscalização da 9294/96 – Lei Federal que proíbe o fumo em ambientes fechados. Algumas reportagens saíram nos jornais locais – como esta do Jornal do Commercio (para assinantes), saudando o fato e apresentando Recife como “exemplo a ser seguido por outras cidades brasileiras”, posto que a cidade “começa a trilhar o caminho da civilidade” e – como diz a manchete – os bares estão “livres da fumaça incômoda”. Vitória do progresso: “Da resistência inicial, reclamações e discursos inflamados contra a lei, os fumantes, carimbados como inimigos número um da sociedade, passaram a entender e respeitar o direito de quem não fuma”.

Uma garota da CBN Recife entrevistou-me anteontem no Shopping Boa Vista; não ouvi o que foi ao ar, mas lembro-me de que eu me segurei para não chamar a lei de nazista e não provocar uma antipatia ainda maior pelos “fumantes mal-educados”. Respirei fundo e disse apenas que a lei era ineficaz no combate ao fumo, que criava “cidadãos de segunda classe”, que estimulava a intolerância, que era desproporcional. Um colega de trabalho ouviu-me e, informando para a sala inteira que eu era contrário à lei anti-tabagista, à hora do almoço, comecei um pequeno arranca-rabo por aqui.

Mantenho: a lei, do jeito que é aplicada, é nonsense. Concordo que exista uma “tensão” entre fumantes e não-fumantes – tensão artificial, criada pela demonização do cigarro feita pelo terrorismo da síndrome do “Paulo Cintura” que acometeu a sociedade nos últimos anos, mas isto são outros quinhentos -, mas não concordo, de nenhuma maneira, que a solução para o “problema” seja simplesmente escantear os fumantes. Afinal de contas, ao que me conste, o Estado dito democrático deveria levar em conta os anseios (lícitos, óbvio, como é o caso) de todos os seus súditos, e não simplesmente escutar unilateralmente uns em detrimento de outros. “Ah, mas os fumantes são minoria”, pode alguém dizer; bom, se somos minoria, então [isto é sarcasmo] por que não temos quotas à semelhança de outras minorias?

Para mim é claríssimo que há uma diferença muito grande entre um elevador e um barzinho aberto, por exemplo – coisa que é absurdamente ignorada pela lei brasileira. Eu estou disposto a ser transigente e aceitar que alguns lugares tenham alguns ambientes livre de fumo, mas espero um mínimo de reciprocidade; o que considero um desrespeito sem tamanhos é sermos obrigados a fumar nas calçadas!

[Aliás, immo, a sanha persecutória dos discípulos de Paulo Cintura é ilimitada e, dados os pressupostos utilizados para justificar o exílio dos fumantes para as calçadas, logo logo vai ser proibido fumar em ambientes abertos e públicos como, p.ex., pontos de ônibus. Afinal, a bendita lei 9294/96 estabelece, no seu artigo segundo, que é “proibido o uso de cigarros (…) em recinto coletivo, privado ou público, salvo em área destinada exclusivamente a esse fim, devidamente isolada e com arejamento conveniente” e, embora “recinto” signifique, a meu ver, “local fechado”, não duvido nada que algum gênio venha com uma interpretação malabarista para incluir “no espírito da Lei” os recintos abertos…]

Mas o problema principal com esta discussão toda não é uma questão de respeito dos direitos dos não-fumantes ou implicância dos fumantes, porque isso importa bem pouco; o que de verdade me irrita profundamente é – como eu acho que já falei aqui – a substituição, no inconsciente popular, da Moral Verdadeira por uma anti-moral, arbitrária e inimiga da verdadeira. Trago um único exemplo bem eloqüente: comentei aqui em novembro passado uma lei aprovada no Rio de Janeiro que multava e cassava o alvará de funcionamento de estabelecimentos que proibissem o “beijo gay”. Já que a lei anti-fumo é Federal, suponho que esteja sendo aplicada na Cidade Maravilhosa também. Ou seja: dois marmanjos se agarrando no bar, pode, e ai de quem proibir. Acender um cigarro, aí não pode, de jeito nenhum, e ai de quem ousar fazê-lo!

É uma completa inversão de valores. Uma colega de trabalho que discordava de mim à hora do almoço disse exatamente isso: que preferia, a um fumante, uma dupla de gays se agarrando ao seu lado num barzinho. É um exemplo encarnado da nova moral politicamente correta: o que é moralmente neutro é execrado e, o que é imoral, é louvado e protegido. Não se pode subestimar o efeito deseducativo e deformador de crescer e viver numa sociedade dessas. Tenha Deus misericórdia de nós.

Acendendo um cigarro

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Vi na Folha de São Paulo que “Mercosul e Venezuela querem proibir anúncios de cigarros”. A idéia nonsense e arbitrária não é novidade; no Brasil, isso já acontece há bastante tempo.

A mesma Folha de São Paulo, em uma outra notícia, questiona o mito de que os fumantes fumam porque são movidos a isso pela propaganda tabagista. Mario Cesar Carvalho, repórter da FOLHA, afirma com muita propriedade: “É claro que a publicidade ajudou o fumo a alastrar-se pelo mundo, e a indústria do cigarro é das que mais investem em propaganda. Mas acreditar que o fumante é um autômato movido a impulsos externos de desejo seria subestimar em demasia a inteligência humana”.

Não estou aqui para questionar ou defender a indústria tabagista, nem para fazer estudos sobre a eficácia (e a moralidade…) da proibição das propagandas na redução do número de fumantes, nem nada disso. No fundo, o problema digno de menção aqui é a substituição, no inconsciente popular, da Moral Católica por uma “moral arbitrária”. Afinal de contas, do ponto de vista moral, qual o problema intrínseco em fumar? Absolutamente nenhum. Os problemas podem surgir quando se fuma “para se exibir”, quando se fuma de maneira exagerada, quando um pai de família deixa de comprar a comida dos filhos para comprar cigarros, etc. No entanto, o problema não está no cigarro, e sim nas atitudes desses fumantes. O tabaco em si é moralmente neutro; o prazer de fumar um cigarro não é intrinsecamente desordenado.

A nova “moral arbitrária” que deseja tomar o lugar da Moral Católica considera as coisas neutras como más e as coisas más como louváveis. Por exemplo, é muitíssimo comum que a demonização do cigarro ande lado a lado com uma simpática afinidade para com as drogas (como a maconha, cujo uso é sim passível de condenação moral porque provoca estados alterados de consciência). No início deste ano, eu li que a Holanda havia proibido o tabagismo, mas isentado os cigarros de maconha desta proibição (!!). É uma completa inversão de valores. O uso do tabaco não é pecaminoso; o uso da maconha, salvo algum caso de prescrição médica ou outro motivo proporcionado, é pecaminoso sim. Do mesmo modo, as mesmas pessoas que consideram o tabagismo uma prática gravemente imoral muitas vezes não vêem nenhum problema no comportamento sexual desregrado dos nossos jovens. A “moral arbitrária” – que bem pode ser chamada uma Anti-Moral – ganha adeptos numa velocidade vertiginosa.

Chesterton disse certa vez que “ter horror de tabaco não é ter um padrão abstrato do que seja certo; é exatamente o contrário. É não ter padrão algum do que seja certo, e colocar certos gostos ou repulsas no lugar”. Do mesmo modo, ser um militante anti-tabagista não é ter um senso moral apurado; é, ao contrário, desconhecer a Moral da Igreja e colocar a Anti-Moral impostora no lugar d’Ela. Claro que ninguém é obrigado a fumar para ser católico; mas o católico pode muito bem fumar, se o quiser, e achar que existe alguma ilicitude moral no fumo em si (em outras palavras, achar que fumar é sempre pecado) não é de modo algum uma idéia católica. É, ao contrário, uma idéia puritana, que precisa ser expurgada porque impede a Moral Católica de ser conhecida, na medida em que coloca uma caricatura em Seu lugar.