Comentando notícias empoeiradas

No meio das centenas de mensagens não lidas da minha caixa de emails, encontrei algumas que vale a pena comentar ainda que seja en passant, que já viraram embrulho de peixe mas bem que merecem ser conhecidas:

– Por ocasião da excomunhão dos médicos abortistas de Recife, a sra. Danuza Leão escreveu um texto [15 de março de 2009] sobre a Igreja Católica e o sofrimento. E faz uma triste constatação: “[o]s sacrifícios, tão cultuados entre os católicos (…), eram um grande sinal de amor a Deus”.

Eram…? E não são mais? Na cabeça da articulista, não. Igreja para ela, agora, “só em excursão turística – e assim mesmo só algumas”. O artigo é bem clichê com um monte de acusações nonsense – “ao considerar quase tudo que dá prazer um pecado, não dá para perceber o quanto as mentes católicas são doentes?”, “ai dos que são felizes, dão risadas e gostam da vida”, “[q]uem faz uma jura dessas [jurar amor ‘até que a morte nos separe’] é hipócrita, porque até as crianças do jardim-de-infância sabem que a vida não é assim”, “[s]e o Vaticano se desfizesse de metade de seus tesouros, é bem possível que não houvesse mais fome no mundo”, mas serve para que se constate, com tristeza, como o mundo perdeu o sentido salvífico da dor.

– Saiu n’O Globo [23 de março de 2009] um artigo de um leitor explicando por que a Igreja não é culpada pela proliferação da AIDS. São tempos estranhos, em que a acusação serve como prova cabal de culpa e o acusado precisa se justificar para provar que é inocente. Mas o sr. Yasha Gallazzi escreveu muito bem.

Torna-se, assim, mais simples atacar a pessoa do Papa e desmerecer seus argumentos, em vez de nos debruçarmos sobre o que ele falou. Ao lembrar que a distribuição maciça de camisinhas não foi suficiente para aplacar a disseminação da Aids, Bento XVI não disse nenhuma mentira, nem errou em sua análise. O que fez foi lembrar que o sexo casual e descompromissado é, sim, uma vertente do sexo irresponsável. A camisinha se torna uma espécie de algoz de sua suposta virtude, pois estimula – e isso é inegável – o sexo ligeiro e sem compromisso.

– Uma mulher matou marido, irmã e sobrinhas porque “não queria ver a família sofrer” [16 de abril de 2009]. Muito nobre? Inadmissível? De uma forma ou de outra, são argumentos análogos àqueles utilizados para a defesa do aborto eugênico ou da eutanásia. Às vezes é preciso levar as aplicações dos princípios às últimas conseqüências para que a bobagem resplandeça em toda a sua clareza. Infelizmente, tem gente que nem mesmo assim consegue ver…

– Aplicação concreta do que foi dito acima: Justiça de Goiás autoriza aborto eugênico [09 de abril de 2009]. “Infelizmente, é certa a morte do produto da concepção da requerente, não havendo procedimento médico capaz de corrigir a deficiência do órgão vital”, escreveu o juiz. O que tem [tinha?] a criança? “Síndrome de Kantrell [Cantrell]”, segundo a notícia. Qual a “lógica” do juiz? “Se não tem como curar, a gente mata”. Como um veterinário faria com um cachorro. “Para evitar o sofrimento dos parentes”, como a mulher da notícia anterior. Vinte segundos no Google me mostraram um relato de caso em adulto logo como primeiro resultado. Mas a sanha assassina de alguns não tem limites, não tem paciência: reservar vinte segundos para consultar o Google seria estender por tempo demasiado o sofrimento da mãe…

Conversão de Gramsci

Esta manhã, o [arce]bispo Luigi De Magistris, emérito da Penitenciária Apostólica [literalmente, pró-penitenciário maior emérito], em uma intervenção feita durante a apresentação do primeiro catálogo internacional dos santos, revelou os pormenores das últimas horas de vida do ideólogo do PCI [Partido Comunista Italiano] Antonio Gramsci: “O meu conterrâneo Gramsci tinha no seu quarto uma imagem de Santa Teresinha do Menino Jesus. Durante sua última doença, as irmãs da clínica onde ele convalescia levavam aos doentes a imagem do Menino Jesus para que a beijassem. Não a tinham levado a Gramsci. Ele disse: ‘por que não me trouxeram [a imagem]?’ Trouxeram-lhe então a imagem do Menino Jesus e Gramsci a beijou. Gramsci morreu com os Sacramentos, retornando à Fé de sua infância. A misericórdia de Deus nos ‘persegue’ santamente. O Senhor não Se conforma em nos perder”.
[do blog de Andrea Tornielli]

Instituto del Buen Pastor - Latinoamérica
Mons. De Magistris. Foto: Instituto del Buen Pastor - Latinoamérica

Tive a grata oportunidade de conhecer o Monsenhor De Magistris quando estive em Roma no início do ano; andando de batina e de chapéu saturno, rezando naquela igreja (não me recordo o nome!) que fica na entrada da parte administrativa do Vaticano (onde fica o L’Osservatore Romano e onde os guardas suíços não deixam você entrar), ou recebendo-nos amavelmente no seu apartamento. Atencioso e sorridente, a despeito da idade avançada; tenho boas lembranças dele. João Paulo II escreveu-lhe cartas; ele já ordenou Legionários de Cristo e também Sacerdotes do IBP.

A notícia da conversão de Antonio Gramsci é excelente! Deus ama o pecador e espera o retorno do filho pródigo, a despeito de todo o mal que ele possa ter feito em sua vida. O Pai permanece de braços abertos, até o último momento; nas inspiradas palavras do Monsenhor, é uma santa perseguição da Misericórdia d’Aquele que não Se conforma em nos perder.

A imprensa “desmentiu” a conversão de Gramsci. Não considero a história inverossímil; ademais, julgo que o testemunho das freiras que o assistiram nos últimos dias e de um monsenhor de quem só possuo excelentes referências é digno de mais crédito do que as reclamações dos comunistas italianos. Que a Virgem Santíssima seja em seu favor, e o pensador italiano possa descansar em paz.

Vale a pena ver o que disse o Yashá Gallazzi em seu blog:

Não deixa de ser irônico que um fervoroso seguidor da “Igreja do Marxismo dos últimos dias” tenha sentido, no final da vida, a necessida[de] básica do ser humano pelo perdão e pela misericórdia.

[…]

Essa é a grandeza da fé cristã – que, sim, uniu o mundo ocidental: abraçar fraternalmente até aqueles que se dedicaram a acabar com ela. O amor, sabe-se, vence qualquer tipo de ideologia homicida.

Vejam ainda:

Gramsci e o catolicismo – “Erguei-Vos, Senhor”
A conversão de um pecador – “Igreja Una”