Magistério da Igreja – Autoridade Mundial

[Após o Papa Bento XVI ter dito, na sua última carta encíclica, que “urge a presença de uma verdadeira Autoridade política mundial”, muitas pessoas rasgaram as vestes e escandalizaram-se, achando que o Papa estaria cedendo ao globalismo moderno, capitulando diante da ONU, adotando posições modernistas, ou qualquer coisa do tipo. Na verdade, o número 67 da Caritas in Veritate não constitui novidade alguma (obviamente) na Doutrina Social da Igreja, como se pode ver pelos documentos abaixo apresentados. Agradeço ao Rodrigo R. Pedroso pela elaboração e envio da coletânea.]

I – Catecismo e Compêndio de DSI

1911. As dependências humanas intensificam-se. Estendem-se, pouco a pouco, a toda a terra. A unidade da família humana, reunindo seres de igual dignidade natural, implica um bem comum universal. E este requer uma organização da comunidade das nações, capaz de «prover às diversas necessidades dos homens, tanto no domínio da vida social (alimentação, saúde, educação…), como para fazer face a múltiplas circunstâncias particulares que podem surgir aqui e ali (por exemplo: […] acudir às misérias dos refugiados, dar assistência aos migrantes e suas famílias…)» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 84: AAS 58 (1966) 1107).

1927. Compete ao Estado defender e promover o bem comum da sociedade civil. O bem comum de toda a família humana exige uma organização da sociedade internacional.

(Catecismo da Igreja Católica)

442 Uma política internacional voltada para o objetivo da paz e do desenvolvimento mediante a adoção de medidas coordenadas mais do que nunca tornou-se é necessária em virtude da globalização dos problemas. O Magistério destaca que a interdependência entre os homens e as nações adquire uma dimensão moral e determina as relações no mundo atual sob o aspecto econômico, cultural, político e religioso. Nesse contexto, seria de desejar uma revisão, que «pressupõe a superação das rivalidades políticas e a renúncia a toda a pretensão de instrumentalizar as mesmas Organizações, que têm como única razão de ser o bem comum», com o objetivo de conseguir «grau superior de ordenação a nível internacional».

443 O Magistério avalia positivamente o papel dos agrupamentos que se formaram na sociedade civil para exercer uma importante função de sensibilização da opinião pública para com os diversos aspectos da vida internacional, com uma atenção especial para o respeito dos direitos do homem, como revela o «o número das associações privadas, recentemente instituídas, algumas de alcance mundial, e quase todas empenhadas em seguir, com grande cuidado e louvável objetividade, os acontecimentos internacionais num campo tão delicado».

(Compêndio de Doutrina Social da Igreja)

II – Magistério Pré-Conciliar

5. Em primeiro lugar, o ponto fundamental é que a força moral do direito anteceda a força material das armas. Portanto, um justo acordo de todos na diminuição simultanea e reciproca das armas, segundo normas e garantias a serem estabelecidas, na medida necessaria e suficiente à manutenção da ordem publica nos países individualmente; e, em substituição das armas, um instituto que possa arbitrar com alta função pacificadora, segundo normas a estabelecer e a sanção a ser combinada contra o país que recusasse submeter as questões internacionais à decisão desse arbitro.

(Bento XV – Carta Dès le début, aos chefes dos povos beligerantes, 01.08.1917)

11. O que aqui recordamos aos individuos a respeito dos deveres que têm de praticar a caridade, entendemos que isso deva também ser estendido aos povos que combateram a Grande Guerra, para que removida, por quanto possivel, toda causa de dissidio — e salvas as razões da justiça –, reatem entre eles relações amigaveis. Não é outra a Lei do Evangelho da caridade entre os individuos da que deve existir entre os estados e nações, não sendo esses senão a conjugação dos individuos singularmente. A partir do momento em que a Guerra cessou, não apenas por motivos de caridade, mas também por certa necessidade de coisas, vai-se delineando uma coligação universal de povos, motivados a se unirem entre si para o atendimento de mutuas necessidades, além de benevolencias reciprocas, especialmente agora com a crescente humanização e com as vias de comunicação admiravelmente multiplicadas. (…)

13. Restabelecidas assim as coisas, segundo a ordem evocada pela justiça e pela caridade, e reconciliados entre si os povos, seria muito desejavel, veneraveis irmãos, que todos os estados, removidas as suspeitas reciprocas, se reunissem numa unica sociedade, ou melhor, familia de povos, seja para garantir a propria independencia, e seja para tutelar a ordem da sociedade civil. Para formar essa sociedade entre povos é de estimulo, entre outras considerações, a necessidade geralmente reconhecida de reduzir, senão abolir, as enormes despesas militares que não podem continuar a ser sustentadas pelos estados, para que assim se impeçam futuras guerras mortiferas, e se assegure aos povos nos seus justos limites a independencia da integridade do proprio territorio.

14. E uma vez que essa federação entre nações seja fundada sobre as leis cristãs, por tudo o que se refere à justiça e à caridade, certamente não será a Igreja que recusará o seu contributo válido, uma vez que, sendo ela o tipo mais perfeito de sociedade universal, por sua mesma essencia e finalidade é de eficacia maravilhosa para irmanar os homens, não somente em ordem à eterna salvação, mas também no seu bem-estar material e os conduz através dos bens temporais, de modo a não perder os eternos

(Bento XVCarta enciclica Pacem Dei Munus sobre a reconciliação cristã de paz, 23.05.1920)

En toda reordenación de la convivencia internacional, sería conforme a las máximas de la humana sabiduría que todas las partes interesadas dedujeran las consecuencias de las lagunas o de las deficiencias del pasado; y al crear o reconstruir las instituciones internacionales, que tienen una misión tan alta, pero al mismo tiempo tan difícil y llena de gravísima responsabilidad, se deberían tener presentes las experiencias que resultaron de la ineficacia o del defectuoso funcionamiento de anteriores iniciativas semejantes. Y, como a la debilidad humana es tan dificultoso, casi podríamos decir tan imposible, preverlo todo y asegurarlo todo en el momento de los tratados de paz. cuando es tan difícil verse libre de las pasiones y de la amargura, la constitución de instituciones jurídicas que sirvan para garantizar el leal y fiel cumplimiento de tales tratados, y, en caso de reconocida necesidad, para revisarlas y corregirlas, es de importancia decisiva para una honrosa aceptación de un tratado de paz y para evitar arbitrarias y unilaterales lesiones e interpretaciones de las condiciones de los referidos tratados.

(Pio XIIAlocução natalina In questo giorno aos membros da Cúria, 24.12.1939)

44. Ya en nuestro discurso navideño de 1939 Nos presagiábamos la creación de organizaciones internacionales que, evitando las lagunas y las deficiencias del pasado, fuesen realmente aptas para preservar la paz, según los principios de la justicia y de la equidad contra toda posible amenaza en el futuro. Puesto que hoy, a la luz de tan terribles experiencias, la aspiración hacia una semejante institución universal de paz reclama cada vez más la atención y los cuidados de los hombres de Estado y de los pueblos, Nos espontáneamente expresamos nuestra complacencia y deseamos que su realización concreta responda verdaderamente, en la más amplia medida, a la altura del fin, que es el mantenimiento, en beneficio de todos, de la tranquilidad y de la seguridad en el mundo.

(Pio XIIRadiomensagem Oggi al compiersi, no 5° aniversario do inicio da guerra, 01.09.1944)

III – Sacro Império Medieval

Que o orgulho da França não venha protestar dizendo que ele não reconhece superior, pois é uma mentira. De direito os franceses estão e devem estar submetidos ao rei dos romanos, que também é imperador. Não sabemos de onde eles tiraram e onde eles puderam encontrar a ideia de sua independência, pois está estabelecido que os cristãos sempre estiveram submetidos ao monarca de Roma e que eles assim devem permanecer.

(Bonifacio VIII, bula Ausculta Fili, 05.12.1301)

IV – Referências Conexas

– Plínio Corrêa de Oliveira, sobre Bento XV, a Liga das Nações e o Sacro Império.

– Dante Alighieri, De Monarchia (original latim, ou nesta tradução para o inglês).

Encerrando o dia

Revelado plano de Hitler para matar Pio XII. “Segundo Freytag von Loringhoven, nos dias 29 e 30 de julho de 1943, houve em Veneza um encontro secreto para informar ao chefe de contraespionagem italiano, o general Cesare Amè, da intenção do Führer de punir os italianos pela prisão Mussolini, com o sequestro ou o assassinato de Pio XII e do rei da Itália”. A reportagem original do Avvenire: Hitler voleva eliminare Pio XII.

Comunicado da Sala de Imprensa da Santa Sé sobre as anunciadas ordenações presbiterais da FSSPX: “não há nada a acrescentar ao que foi afirmado pelo Santo Padre em sua carta aos bispos da Igreja Católica no último dia 10 de março: (…) “Enquanto a Sociedade (de São Pio X) não tiver um status canônico na Igreja, seus ministros não exercem ministérios legítimos na Igreja (…) até que as questões doutrinais sejam esclarecidas, a Sociedade não tem status canônico na Igreja, e seus ministros (…) não exercem legitimamente nenhum ministério na Igreja”. As ordenações são, portanto, ainda consideradas ilegítimas”.

CNBB pede rapidez na aprovação do Estatuto da Igreja Católica. Enquanto isso, parlamentares divergem sobre o estatuto. A mesma lenga-lenga do “Estado Laico”, mas a pérola agora aventada é preciosa: “Eu sou contra porque não há um acordo entre dois estados que não se comparam: um é um estado teocrático e outro é um estado republicano”. São palavras do deputado Ivan Valente, do PSOL.

Juiz ordena prisão de padre e outros 5 pedófilos no México; reparem no título da matéria e no destaque que é dado ao “padre”. Na manchete, ele é pedófilo. Na primeira linha da reportagem, a conversa muda para “seis supostos pedófilos”. Diz ainda a reportagem que “após a detenção a Igreja Católica pediu que o religioso não fosse prejulgado”. Mas a presunção de inocência parece ser um princípio jurídico que não se aplica aos sacerdotes católicos.

– Esta tem mais a cara do Tubo de Ensaio: a Folha noticiou que cientistas revertem evolução e devolvem barbatanas a peixe. Darwin estava certo? Bom, o que os anti-clericais de todos os naipes precisam entender é que, ainda que Darwin esteja certo, isso não muda um milímetro a necessidade metafísica do Deus Criador. Derrubemos os espantalhos.

“Coroação de Nossa Senhora de Fátima” – Pio XII

[O] vosso mesmo concurso imenso, o fervor das vossas preces, o troar das vossas aclamações, todo o santo entusiasmo que em vós vibra incoercível, e, depois, o sagrado rito, que se acaba de realizar nesta hora de incomparável triunfo da Mãe Ssma., evocam ao Nosso espírito outras multidões bem mais inumeráveis, outras aclamações bem mais ardentes, outros triunfos bem mais divinos, outra hora — eternamente solene — no dia sem ocaso da eternidade: quando a Virgem gloriosa, entrando triunfante na pátria celeste, foi atravez das jerarquias bem-aventuradas e dos coros angélicos sublimada até ao trono da Trindade beatíssima, que, cingindo-lhe a fronte de um tríplice diadema de glória, A apresentou à Corte celestial, assentada à direita do Rei imortal dos séculos e coroada Rainha do universo.

E o Empíreo viu que Ela era realmente digna de receber a honra, a glória, o império, — porque mais cheia de graça, mais santa, mais formosa, mais endeusada, incomparavelmente mais, que os maiores Santos e os Anjos mais sublimes, ou separados ou juntos; —  porque misteriosamente emparentada na ordem da União hipostática com toda a Trindade beatíssima, com Aquele que só é por essência a Majestade infinita, Rei dos reis e Senhor dos senhores, qual Filha primogénita do Padre e Mãe estremosa do Verbo e Esposa predilecta do Espírito Santo; — porque Mãe do Rei divino, d’Aquele a quem desde o seio materno deu o Senhor Deus o trono de David e a realeza eterna na casa de Jacob e que de si mesmo proclamou, ter-lhe sido dado todo o poder nos céus e na terra: Ele o Filho Deus, reflecte sobre a celeste Mãe a glória, a majestade, o império da sua realeza; — porque associada, como Mãe e Ministra, ao Rei dos mártires na obra inefável da humana Redenção, lhe é para sempre associada, com um poder quasi imenso, na distribuição das graças que da Redenção derivam.

Jesus é Rei dos séculos eternos por natureza e por conquista; por Ele, com Ele, subordinadamente a Ele, Maria é Rainha por graça, por parentesco divino, por conquista, por singular eleição. E o seu reino é vasto como o de seu Filho e Deus, pois que de seu domínio nada se exclue.

Por isso a Igreia a saúda Senhora e Rainha dos Anjos e dos Santos, dos Patriarcas e dos Profetas, dos Apóstolos e dos Mártires, dos Confessores e das Virgens; por isso a aclama Rainha dos céus e da terra, gloriosa, digníssima Rainha do universo: Regina caelorum, gloriosa Regina mundi, Regina mundi digníssima: e nos ensina a invocà-la de dia e de noite entre os gemidos e lágrimas de que é fecundo este exílio: Salve Rainha, Mãe de misericórdia, vida doçura, esperança nossa.

É que a sua realeza é essencialmente materna, exclusivamente benéfica.

[…]

Vós, coroando a imagem de Nossa Senhora, assinastes, com o atestado de fé na sua realeza, o de uma submissão [à] sua autoridade, de uma correspondência filial e constante ao seu amor. Fizestes mais ainda: alistastes-vos Cruzados para a conquista ou reconquista do seu Reino, que é o Reino de Deus. Quer dizer: obrigastes-vos a trabalhar para que Ela seja amada, venerada, servida à volta de vós, na família, na sociedade, no mundo.

E que nesta hora decisiva da história, como o reino do mal com infernal estratégia emprega todos os meios e empenha todas as forças para destruir a fé, a moral, o Reino de Deus, assim os filhos da luz e filhos de Deus têem de empenhar tudo e empenhar-se todos para o defender, se não se quer ver uma ruina imensamente maior e mai desastrosa que todas as ruinas materiais acumuladas pela guerra.

Nesta luta não pode haver neutros, nem indecisos. É preciso um catolicismo iluminado, convicto, desassombrado, de fé e de mandamentos, de sentimentos e de obras, em particular e em público.

Anúncio radiofónico do Papa Pio XII aos fiéis portugueses por ocasião da solene celebração da coroação de Nossa Senhora de Fátima, 13 de maio de 1946.

Ligeiro apanhado de assuntos diversos

– Muito boa a matéria do Gazeta do Povo sobre Pio XII: Pontificado de Pio XII pauta visita do Papa a Jerusalém. É com muita alegria que vejo um órgão  de imprensa ter a coragem de publicar uma matéria assim quando todos os demais silenciam e/ou fazem coro ao processo de desinformação histórica perpetrado pelos inimigos da Igreja. É muito reconfortante saber que há jornais sérios, que não se curvam diante da censura anticlerical. Para parabenizar o jornal pela reportagem: leitor@gazetadopovo.com.br – nome completo, cidade e estado.

Príncipe jordaniano agradece valentia moral do Papa; o “príncipe Ghazi Bin Muhammed Bin Talal, primo e conselheiro do rei da Jordânia” fez “um profundo e amplo discurso em inglês”, onde acolheu o Papa “cujo pontificado esteve marcado pela valentia moral para falar e atuar em consciência, muito além das modas do momento”. Muito além das modas do momento – destaco. O empenho do Papa em preservar o patrimônio doutrinário da Igreja – e a importância deste trabalho – é reconhecido até mesmo por quem não é cristão!

– Na mesma matéria, Sua Alteza falou ainda nos “países subsaarianos onde as ‘minorias muçulmanas são submetidas a duras pressões por parte das maiorias cristãs, assim como em outros lugares onde acontece o contrário'” – gostaria muitíssimo de saber que países são esses e a exatamente quais “duras pressões” se refere o príncipe da Jordânia. Alguém faz idéia?

– Feliz dia das mães I: a mulher não foi feita para menstruar tanto. Ela foi feita para estar grávida e amamentar. “Apesar das mudanças de comportamento, o organismo feminino ainda funciona à moda antiga. Com isso, doenças ligadas à menstruação, que antes eram raras, agora são mais frequentes”. Raios, não é que a Igreja estava certa de novo!

– Feliz dia das mães II: Maria Mariana lança livro para contar experiência de criar 4 filhos. Vale muito a pena ler a entrevista concedida à revista Época, da qual destaco (quase tudo): “O valor de ser mãe não está sendo levado em conta. […] Mas eu sonhava com uma enorme mesa de família com aquela macarronada no domingo. […] Amamento há nove anos seguidos. Só desmamo um quando engravido do outro. […] Não acredito na igualdade entre homens e mulheres. Todos merecem respeito, espaço. Mas o homem tem uma função no mundo e a mulher tem outra. (…) Deus preparou o homem para estar com o leme na mão. […] O valor básico da maternidade é cuidar do outro, doar, servir. Nada a ver com o mundo competitivo. Maternidade é tirar seu ego do centro”.

– Por Rodrigo Pedroso, “a estatização da teologia”; fala sobre o projeto do senador Marcelo Crivella para regulamentar o exercício da profissão de teólogo no Brasil. “Ao regulamentar a profissão de teólogo, o Estado adentrará em seara alheia, imiscuir-se-á num campo que não lhe pertence. Tal intromissão representará violação da liberdade religiosa, garantida pelo art. 5º, VI, da Constituição Federal. E, na medida em que a teologia é uma disciplina do intelecto e uma ciência, representará igualmente uma infração da liberdade intelectual e científica, que a Constituição declara ser livre não apenas de censura, como também de licença (art. 5º, IX)”.

Você se lembra desta foto? Fiquei sabendo no blog do Veritatis que o site da Fox News trouxe uma reportagem com o garoto que, quando estava no útero de sua mãe, emocionou o mundo. Hoje ele tem nove anos. E a foto salvou muitos bebês de serem abortados. Muitos tentaram impedir isso: “a Life Magazine tentou comprar os direitos sobre a fotografia para que ela jamais fosse republicada; e o médico que fez a cirurgia chegou a dizer que foi ele quem puxou para fora a mão do bebê. A acusação acabou com a carreira do fotógrafo, mas não abalou sua determinação”. E, graças a Deus, não conseguiram.

– Faço coro ao desabafo do Rafael Vitola; e acredito não ser o único a fazê-lo. “Até quando teremos que aturar a Fé Católica seqüestrada por quem deveria ser seu defensor?” Levantai-Vos, Senhor. Salvai-nos.

Viagem à Terra Santa: oportunidade de resgatar a verdade histórica

O Santo Padre estará, dentro de quinze dias, em uma peregrinação à Terra Santa. Sairá da Itália na sexta-feira 08 de maio e retornará a ela na sexta-feira seguinte, 15 de maio. Está programada uma “Visita ao Memorial de Yad Vashem em Jerusalém”, às 17:45 da segunda feira 11 de maio, onde o Papa fará um discurso; no entanto, há comentários de que o Papa não visitará o Museu do Holocausto, que fica no memorial, e que contém uma foto de Pio XII com um texto que lança dúvidas sobre a atuação do falecido Pontífice durante a Segunda Guerra Mundial.

Sinceramente, os “irmãos mais velhos” não ajudam. Parece que compraram a lenda negra fabricada contra Pio XII muito tempo depois de sua morte; por que motivo existe, num museu, ao que parece com a conivência passiva da comunidade judaica, uma sala [ou um quadro ou sei lá o quê] que denigre a imagem do homem que salvou no mundo mais judeus do que qualquer outro na história?

Não são todos os judeus, é questão de justiça frisar. A International Raoul Wallenberg Foundation [que não é uma fundação judaica, ao que me conste] está tentando “obter testemunhos de judeus salvos por católicos durante o Holocausto”. Tal campanha é “uma forma de celebrar a presença do Sumo Pontífice na Terra Santa e o abraço fraternal entre católicos e judeus que a mesma simboliza”. Não sei a quantas anda este trabalho, mas sei que o site da IRWF tem abundante material sobre o assunto. Por exemplo: Catholic saved Thousands during HolocaustCatholic diplomat who saved 30.000 refugees was remembered. Dois nomes: Father Marie Benoit [padre capuchinho] e Aristides de Sousa Mendes [diplomata português]; dezenas de milhares de judeus salvos durante a Guerra. Por que essas coisas nunca são lembradas?

Vale também a pena ler o artigo do prof. Valter de Oliveira, chamado Nazismo: Pio XII e os católicos foram omissos?, disponível no seu blog. “A Igreja teve, tem e terá filhos infiéis. Mas, por outro lado, a História aí está para atestar tudo o que, através de seus filhos, fez e faz pelo bem da humanidade”. Se a Igreja possui filhos infiéis, possui também santos em profusão, porque Ela própria é Santa e Santificante. Só uma análise seletiva da história, dando ênfase naquilo que convém e varrendo para debaixo do tapete o que não se coaduna com o próprio preconceito, é capaz de não se deixar convencer por esta verdade. Todo o edifício da difamação histórica anti-católica está assentado sobre esta metodologia de “mostrar o que confirma a minha tese e descartar tudo o que a contraria”. É eficaz, mas não é honesto, e a mentira não pode durar para sempre: há aqueles que não se deixam seduzir por análises irresponsáveis e eivadas de preconceito.

Vai o Papa a Terra Santa – que ele faça uma boa viagem! Que a presença do Vigário de Cristo na terra onde viveu e morreu o Salvador possa trazer abundantes graças para toda a humanidade e, em particular, para os judeus: que o véu que lhes cobre o coração (cf. II Cor 3, 15) possa ser retirado e sua inteligência obscurecida (cf. id. ibid., v. 14) possa ser iluminada pelas luzes do Espírito Santo. E que o trabalho feito por aqueles que estão verdadeiramente compromissados com a verdade histórica possa frutificar e sobrepujar o preconceito anti-clerical que existe em abundância nos nossos dias.

Entusiasmo de cruzados!

Agradeço imensamente ao amigo Rodrigo Pedroso por me ter indicado esta Radiomensagem de Natal do Papa Pio XII. Foi transmitida no natal de 1942, em plena Segunda Guerra Mundial; falando sobre “a ordem e a pacificação da sociedade humana”, este grande Príncipe da Igreja diz em um certo momento:

29. O preceito da hora presente não é lamento, mas ação; não lamento sobre o que foi ou o que é, mas reconstrução do que surgirá e deve surgir para o bem da sociedade. Pertence aos membros melhores e mais escolhidos da cristandade, penetrados por um entusiasmo de cruzados, reunirem-se em espírito de verdade, de justiça e de amor, ao grito de “Deus o quer”, prontos a servir, a sacrificar-se, como os antigos cruzados. Se então se tratava da libertação da terra santificada pela vida do Verbo de Deus encarnado, hoje trata-se, se assim podemos falar, de uma nova travessia, superando o mar dos erros do dia e do tempo, para libertar a terra santa espiritual, destinada a ser a base e o fundamento das normas e leis imutáveis para as construções sociais de interna e sólida consistência.

Aquilo que Pio XII falava à época da Segunda Grande Guerra é também válido para os dias de hoje, pois também hoje o mundo carece da Cruz de Nosso Senhor. Também hoje é necessário que os cristãos se levantem a lutar pelos direitos de Deus e pelos direitos da Santa Igreja, para o bem da humanidade, para a construção de um mundo melhor. Como diz o Papa em outro ponto da radiomensagem, dirigindo-se àqueles que tomam para si esta empresa tão santa e tão necessária, para dar-lhes força e coragem:

57. (…) Vós, cruzados voluntários de uma nova e nobre sociedade, erguei o novo lábaro da redenção moral e cristã, declarai luta às trevas da apostasia de Deus, à frialdade da discórdia fraterna; lutai em nome de uma humanidade gravemente enferma e que é preciso curar em nome da consciência levantada pelo cristianismo.

Sim, é necessário levantar bem alto o estandarte de Cristo e da Virgem, e travar guerra sem tréguas ao mundo que é inimigo de Deus. É necessário declarar luta à carne, ao mundo e a Satanás, a fim de que o pecado seja vencido e o doce odor de Cristo possa se espalhar pelo mundo com as nossas vidas. É necessário ter uma alma de cruzado, corajosa e integralmente colocada de joelhos ao serviço do Rei dos reis e Senhor dos senhores. É necessário marchar sob o comando da Virgem Santíssima, cumprindo com o papel marcado pela Divina Providência no campo de batalha da História, para a salvação das almas e exaltação da Santa Igreja. É necessário, porque Deus o quer! Que este santo grito possa ressoar no mundo mais uma vez, e que a Cruz triunfe, e Cristo impere, para a maior glória de Deus.

Respeitar a Liturgia para participar da Santa Missa

O augusto sacrifício do altar não é, pois, uma pura e simples comemoração da paixão e morte de Jesus Cristo, mas é um verdadeiro e próprio sacrifício, no qual, imolando-se incruentamente, o sumo Sacerdote faz aquilo que fez uma vez sobre a cruz, oferecendo-se todo ao Pai, vítima agradabilíssima. “Uma… e idêntica é a vítima: aquele mesmo, que agora oferece pelo ministério dos sacerdotes, se ofereceu então sobre a cruz; é diferente apenas, o modo de fazer a oferta”.
[Pio XII, Mediator Dei, 61]

O Sacrifício da nossa Redenção, o Sacrifício Propiciatório de um Deus feito homem por amor a nós e que Se entrega ao Pai Eterno em expiação dos nossos pecados: eis a Santa Missa. Não uma simples comemoração, não uma mera lembrança, mas o mesmo Sacrifício da Cruz do Calvário. A Santa Missa transcende infinitamente qualquer coisa que nós poderíamos fazer por nós próprios; n’Ela, é Cristo Sacerdote e Vítima quem é o verdadeiro protagonista.

A Igreja sempre insistiu, no decorrer dos séculos, na necessidade de se encarar a Liturgia como um patrimônio de toda a Igreja, de maneira alguma sujeita ao arbítrio de particulares. É importante encontrar a Liturgia – e a Santa Missa em particular – como uma coisa que se recebe da Igreja, e não como um produto de nossa criatividade ou de nossos anseios. A Liturgia é presente legado pela Igreja; de modo algum é obra dos fiéis, e nem mesmo dos sacerdotes celebrantes. Respeitar a Santa Missa é respeitar a Igreja, respeitar a Santíssima Eucaristia, o Santo Sacrifício do Altar.

Não é por acaso que existe uma correlação facilmente perceptível entre o zelo com o qual um sacerdote celebra o Santo Sacrifício da Missa e a sua ortodoxia, a solidez de sua moral, a fecundidade da sua vida de oração; pois desrespeitar as normas estabelecidas pela Igreja para a celebração do Santo Sacrifício da Missa é debochar da Igreja, menosprezar a Eucaristia e negar aos fiéis os tesouros que a Esposa de Cristo, por meio da Liturgia, deseja-lhes dispensar. Ora, quem assim age não é um servo fiel da Igreja e de Jesus Cristo e, por conseguinte, jamais pode ser um bom sacerdote. Quem quiser, portanto, encontrar um sacerdote santo nos dias de hoje, procure-o na devoção ao Santo Serviço do Altar, no respeito às rubricas prescritas pela autoridade competente, na fidelidade inegociável à Liturgia da Igreja.

Faz já quatro anos que a Santa Sé publicou um documento chamado Redemptionis Sacramentum, no qual são estabelecidas “algumas coisas que se devem observar e evitar acerca da Santíssima Eucaristia”. O documento é atualíssimo e, nele, podemos encontrar uma infinidade de coisas que – infelizmente – vemos acontecer com muita freqüência nas missas das quais participamos e que não poderiam acontecer. Só à guisa de exemplo, trago alguns trechos desta instrução tão importante quanto negligenciada, cuja leitura é absolutamente fundamental para todos os fiéis católicos dos nossos dias:

[É] um abuso fazer que algumas partes da Oração Eucarística sejam pronunciadas pelo diácono, por um ministro leigo, ou ainda por um só ou por todos os fiéis juntos. [RS 52]

Cesse a prática reprovável de que sacerdotes, ou diáconos, ou mesmo os fiéis leigos, modificam e variem, à seu próprio arbítrio, aqui ou ali, os textos da sagrada Liturgia que eles pronunciam. [RS 59]

Assim pois, não é lícito negar a sagrada Comunhão a um fiel, por exemplo, só pelo fato de querer receber a Eucaristia ajoelhado ou de pé. [RS 91]

Reprove-se o costume daqueles sacerdotes que, a pesar de estar presentes na celebração, abstém-se de distribuir a Comunhão, delegando esta tarefa a leigos. [RS 157]

É de fundamental importância que todas as prescrições relacionadas à celebração da Santa Missa sejam diligentemente observadas, a fim de que os fiéis possam ter uma correta compreensão do Sacrifício Eucarístico e possam participar de maneira frutuosa da Santa Missa. Já Pio XII dizia ser “necessário (…) que todos os fiéis tenham por seu principal dever e suma dignidade participar do santo sacrifício eucarístico, não com assistência passiva, negligente e distraída, mas com tal empenho e fervor que os ponha em contato íntimo com o sumo sacerdote” (MD 73). Ao contrário do que estamos acostumados a ver nos nossos dias, contudo, “participar” do Santo Sacrifício Eucarístico não tem nada a ver com cantar, bater palmas, fazer leituras, responder ao sacerdote, etc. Participar do Santo Sacrifício da Missa é unir-se ao Sacrifício de Cristo, é oferecer a Vítima Divina presente no altar a Deus Pai “por meio do sacerdote” e “juntamente com o sacerdote” (cf. MD 83), e ainda oferecer-se a si mesmo, unido ao Sacrifício da Cruz do Calvário: para os fiéis, “é necessário que eles se imolem a si mesmos como vítimas” (MD 88).

Sem o conhecimento do que seja o Santo Sacrifício Eucarísitico e sem uma correta e diligente catequese litúrgica, é completamente impossível aos fiéis participarem da Santa Missa, ainda que façam leituras ou sejam coroinhas, cantem no Ministério de Música e batam palmas, chorem e se emocionem com as palavras do padre. Nada disso é participar da Missa. A verdadeira e frutuosa participação é predominantemente interior, que se exprime, sim, por meio de gestos exteriores, mas nem estes gestos constituem a participação em si, nem são quaisquer gestos que são adequados à Santa Missa. E, aqui, voltamos à questão da obediência às rubricas e às determinações que a Santa Igreja dá sobre a Liturgia; fora de um profundo respeito à Santa Missa, à autoridade da Igreja, à Santíssima Eucaristia, é impossível falar em verdadeira participação da Missa.

Esforcemo-nos, portanto, para conhecermos os tesouros da Liturgia da Igreja, para promovermos o respeito exigido às normas litúrgicas promulgadas pelas autoridades eclesiásticas competentes, a fim de que consigamos participar de maneira frutuosa do Santo Sacrifício da Missa. Ofereçamos as nossas vidas a Deus Pai Onipotente, unidas ao Sacrifício de Cristo tornado presente nos nossos altares sempre que um sacerdote celebra a Santa Missa. Conheçamos a nossa Fé, conheçamos o que a Igreja nos oferece, e não aceitemos passivamente que os Sagrados Mistérios dos quais precisamos sejam-nos entregues diminuídos, por ignorância ou negligência de quem quer que seja. Afinal, “o povo católico tem direito a que se celebre por ele, de forma íntegra, o santo Sacrifício da Missa, conforme toda a essência do Magistério da Igreja” (RS 12).

Animadoras notícias de Roma

Três notícias publicadas nos últimos dias em ZENIT são excelentes e merecem ser divulgadas.

Primum, “houve aqueles que tentaram fazer a destruição histórica do Papa Pio XII”, segundo explica o historiador brasileiro José Pereira da Silva. A descomunal onda de difamação que se lançou sobre a figura deste grande Papa da Igreja é já bastante conhecida nos meios históricos sérios. No entanto, e infelizmente, a maior parte das pessoas só conhece o “lado negro” da história, falso e deliberadamente caluniador, que ainda hoje, cinqüenta anos após a morte de Pio XII, apresenta-se como se fosse a mais límpida e cristalina verdade histórica. Nas palavras do professor José Pereira, “domina ainda hoje em alguns meios o lugar-comum que a Igreja não teria feito muito pelos judeus, no contexto da perseguição nazista”.

Achei muitíssimo interessante o professor ter trazido um fato, ocorrido na Holanda, que eu desconhecia:

O historiador cita o exemplo dos bispos holandeses, que protestaram abertamente contra a perseguição dos judeus em 1942. Isso provocou a deportação de todos os católicos de origem judaica, como Edith Stein.

«Com toda probabilidade os judeus-católicos teriam sobrevivido, como aconteceu com a maioria dos judeus-protestantes holandeses, se os bispos tivessem agido de outra maneira.»

Portanto, carece completamente de fundamento as acusações de que as coisas “seriam melhores” para os judeus se Pio XII tivesse agido de maneira aberta; é pura “futurologia do passado”, contradizendo inclusive os fatos observados em outros países nos quais tal posição foi tomada. Note-se ainda ser muitíssimo provável que a trágica experiência na Holanda tenha chegado ao conhecimento do então Pontífice, influenciando assim na decisão que ele tomou.

Secundum, foi publicada uma interessante entrevista na qual chama-se a atenção para a fidelidade à Igreja que os párocos devem ter nas suas homilias. Trazendo à tona uma lembrança muito pertinente, o professor Salvatore Vitiello, que leciona Teologia em Turim e em Roma, recordou que a homilia “não por acaso está reservada aos ministros sagrados e não pode ser pronunciada por fiéis leigos, [e nela] exercita-se, de modo particular, o que a Igreja chama de munus d[o]cendi, o dever de ensinar”.

Os fiéis têm o direito, participando da Santa Missa, de escutar o que a Igreja ensina, não o que um sacerdote, em certo momento, pensa ou acha justo.

Que bom seria se este direito dos fiéis não lhes fosse nunca negado! Certamente o mundo em que vivemos seria melhor, se os fiéis católicos tivessem sempre acesso, nas homilias que ouvem, à pureza límpida da Doutrina Católica, fonte de vida verdadeira. São também dignas de menção as seguintes palavras do professor Vitiello:

É absolutamente necessário sair, também no que diz respeito à pregação, do «túnel do relativismo», dessa ditadura que impede anunciar a diferença entre verdade e falsidade, bem e mal, pecado e virtude.

Senhor, dai-nos santos pregadores!

Tertium, para orgulho desta Terra de Santa Cruz, o cardeal Odilo Scherer fez, no Sínodo dos Bispos, pertinentes questionamentos sobre o que é a Palavra de Deus. Empenhando-se no trabalho de destruir o “lugar-comum” (tão disseminado quanto equivocado) que afirma ser a palavra de Deus unicamente a Bíblia, o cardeal lembra que “a Palavra de Deus, por excelência, é o próprio Jesus Cristo”, e que “a Palavra passou aos homens através da Bíblia e também através da Tradição da Igreja”. São, portanto, como sempre ensinou a Igreja, dois os canais da Revelação: as Sagradas Escrituras e a Sagrada Tradição. Disse ainda o cardeal brasileiro:

Nesse contexto, segundo o cardeal, o Sínodo parte de uma preocupação: «que o inestimável tesouro da Palavra de Deus presente na Sagrada Escritura e na Tradição viva da Igreja continue a ser comunicado à humanidade».

«Embora a Bíblia seja o livro mais editado e divulgado, ela ainda é muito desconhecida, ou lida e interpretada de maneira inadequada», escreve.

Que o Espírito Santo continue a iluminar o Sínodo dos Bispos, a fim de que a Doutrina Católica, claramente proclamada, possa atingir todos os homens sedentos da Verdade, para que estes, movidos pela Graça de Deus, convertam-se à Igreja de Jesus Cristo, a Igreja Católica Apostólica Romana, Única Esposa de Nosso Senhor, Única depositária fiel da Revelação, “Coluna e Sustentáculo da Verdade” (1 Tm 3, 15).

Ainda a controvérsia sobre Pio XII

Duas ligeiras coisas sobre Pio XII. Em primeiro lugar, o jornal alemão Der Spiegel publicou uma reportagem bastante tosca – que ganhou eco na mídia nacional (só para assinantes, abaixo reproduzida na íntegra tal como recebi por email) – na qual se questiona o processo de canonização do Servo de Deus. Chegando ao cúmulo de citar John Cornwell, evidente está que a matéria não pode exigir seriedade. Fica só o registro do baixo nível a que chegam os detratores de Pio XII, que por si sós já lançam descrédito sobre a tese que defendem.

Em segundo lugar, comentei aqui sobre um editorial de L’Osservatore Romano publicado logo após as declarações do pérfido judeu no Sínodo dos Bispos. Um amigo teve a gentileza de conseguir-me o texto original, que apresento traduzido, não por ser – como pensei a princípio – uma resposta ao rabino de Haifa Cohen, mas por ser a parte positiva daquilo que o judeu disse [ou devia ter dito] sobre o problema da interpretação das Escrituras Sagradas pelos judeus e pela Igreja. Em particular, o texto tem o mérito de separar muito bem as coisas, ao delimitar – mesmo reconhecendo a existência de um patrimônio comum entre judeus e cristãos – o que é interpretação judaica e o que é interpretação cristã, deixando claro que a primeira não é aceitável para os cristãos. Só atento para o fato de que o traduttore, traditore é particularmente válido quando o traditore em questão sou eu, de modo que quaisquer correções no texto são muitíssimo bem vindas.

Primeiro, pois, o texto de L’Osservatore, e depois o do Der Spiegel.

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Respeito e amor pelo povo judeu

Existe um texto, entre aqueles lidos no primeiro dia do Sínodo [dos bispos], que deixará a [sua] marca. Trata-se do relatório do Cardeal Albert Vanhoye sobre um documento – dentre os mais importantes das últimas décadas – publicado no outono de 2001 pela Pontifícia Comissão Bíblica. “O povo judeu e as suas Escrituras Sagradas na Bíblia cristã” é o título que indica o tema do documento que, não obstante a sua importância, obteve uma escassa circulação na pregação e na catequese católica. Nas três edições [impressas] pela Livraria Vaticana, a tiragem do texto italiano foi de apenas quinze mil cópias. O fato de que um Sínodo se abra explicando um documento surgido, sete anos atrás, por um autorizado estudioso que participou de sua preparação, indica a estreita correlação entre o tema sinodal e o conteúdo do texto; mas ao mesmo tempo propõe a toda a Igreja um ponto de vista [a partir] do qual interpretar [leggere] o diálogo entre judeus e cristãos: aquele da Bíblia.

O tema da Palavra de Deus é muito caro a Bento XVI, antes é uma chave de leitura para compreender melhor o [seu] pontificado. Os três principais documentos saídos do Concílio [Vaticano II] e após [ele] que se referem à Palavra de Deus – a Constituição Conciliar Dei Verbum (1965), A Interpretação da Bíblia na Igreja (1993), O Povo Judeu e as suas Escrituras Sagradas na Bíblia Cristã (2001) – tiveram um apoio não [apenas] secundário do teólogo e depois cardeal Ratzinger. Os dois últimos foram preparados sob a sua responsabilidade de prefeito da [Congregação para a] Doutrina da Fé e se abrem com um prefácio seu. Apesar disto, enquanto o cardeal Vanhoye lia o seu relatório, Bento XVI sublinhava o texto que escutava. Um pequeno gesto que assinala a importância, para os padres sinodais, de participarem de um tema que o mesmo Ratzinger, quando cardeal, havia definido como «questão central da Fé cristã». Vanhoye contou que levou cinco anos para escrever o documento, e que se trata de um trabalho «realizado com rigor científico e com espírito de respeito e amor pelo povo judeu».

«Sem as Escrituras Sagradas do povo judeu – acrescentou com uma afirmação vigorosa – a Bíblia Cristã não estaria completa. Isto é perfeitamente verdadeiro, mas insuficiente. O Antigo não é simplesmente uma peça entre as outras da Bíblia Cristã. É a base, a parte fundamental. Se o Novo Testamento fosse estabelecido sobre alguma outra base, não teria valor verdadeiro. Sem a sua conformidade com as Sagradas Escrituras do povo judeu, não teria podido apresentar-se como a realização do plano de Deus».

Daqui resulta que «os cristãos podem e devem aceitar que a leitura judaica da Bíblia é uma leitura possível». Mas esta leitura «possível para os judeus que não crêem em Cristo, não é possível para os cristãos, na medida em que implica na aceitação de todos os pressupostos do judaísmo, em particular daqueles que excluem a fé em Jesus como Messias e Filho de Deus». Todavia, as censuras e os textos polêmicos contidos no Novo Testamento em confronto com os [textos] dos judeus, provocados no início do Cristianismo pela oposição dos judeus ao apostolado cristão, «não correspondem jamais a uma atitude de ódio» e «não devem servir de base ao anti-judaísmo». Uma tal utilização com este objetivo é «contrária à orientação de todo o Novo Testamento». Uma atitude de respeito, de estima e de amor pelo povo judeu «é a única atitude verdadeiramente cristã». Não obstante as diferenças, «o diálogo permanece possível, pois judeus e cristãos possuem um rico patrimônio comum que os une». É na direção de um melhor conhecimento recíproco que a Igreja é, assim, convidada a progredir. Trata-se de uma posição que não prescinde do contexto do nosso presente, como o mesmo cardeal Ratzinger escrevia no prefácio ao texto da Comissão Bíblica: o drama do Shoah pôs toda a questão sob uma outra luz.

Com o relatório de Vanhoye, o sínodo deu o sinal de uma posição [di uno stile] de escuta e de abertura, mas [no entanto] também de uma busca racional [ragionata] às respostas dos grandes problemas. O relator geral, cardeal Marc Ouellet, traçou pistas de reflexão para os padres sinodais. Parece pelo menos temerário [intempestivo] querer prefigurar já de início o resultado dos trabalhos sinodais como renovações de proibições ou discussões estéreis. As palavras do Papa deixam, ao contrário, pressentir sábias aberturas pastorais confiantes na Palavra de Deus, «fundamento de toda a realidade».

* * *

Controvérsia sobre Pio 12 se intensifica


Santidade para o papa do Holocausto?

O papa Bento 16 alimentou na quinta-feira passada as especulações sobre a possível beatificação do papa Pio 12, criticado com freqüência por não ter feito o suficiente para combater o Holocausto. O Vaticano tem trabalhado duro para melhorar a imagem popular de Pio.

Normalmente, o processo de beatificação é um negócio a portas fechadas, que acontece dentro do Vaticano, bem longe do olhar do público. Mas não dessa vez. Há meses a Igreja Católica está enviando sinais de que beatificação do papa Pio 12, que comandou a Igreja Católica durante a 2ª Guerra Mundial, pode ser iminente. Alguns historiadores e líderes judeus, entretanto, protestaram contra a atitude, argumentando que Pio 12 fez menos do que deveria para salvar os judeus do Holocausto.

O papa Bento 16 lançou na terça-feira uma saraivada de argumentos em defesa de Pio 12. Falando durante uma missa na Basílica de São Pedro em comemoração ao 50º aniversário da morte de Pio, Bento disse que o pontífice, que se tornou papa em 1939 logo antes do irromper da guerra, “trabalhou em silêncio e em segredo” durante o conflito “para evitar o pior e salvar o maior número possível de judeus.”

Bento lembrou ao público que a ministro israelense de relações exteriores Golda Meir homenageou Pio quando ele morreu em 9 de outubro de 1958. Bento 16 também enfatizou uma mensagem de Natal de Pio para o rádio em dezembro de 1942, na qual ele falou sobre as “centenas de milhares de pessoas que, sem terem cometido nenhum erro, apenas por razões de nacionalidade ou raízes étnicas, foram destinadas à morte ou à lenta deterioração.”

O processo de beatificação, a etapa formal final antes de declarar a santidade, “pode acontecer com alegria”, disse Bento 16 na quinta-feira.

Entretanto, nem todo mundo é tão otimista quanto à perspectiva de santificação de Pio 12. O rabino chefe da cidade de Haifa (em Israel), She’ar Yashuv Cohen, que na segunda-feira se tornou o primeiro judeu a falar diante do concílio de bispos do Vaticano, disse que muitos judeus estavam descontentes em relação a Pio.

“Sentimos que o finado papa deveria ter se posicionado mais fortemente do que fez”, disse numa entrevista coletiva antes de falar ao concílio. “Ele pode ter ajudado muitas vítimas e refugiados em segredo, mas a questão é: ele poderia ter erguido sua voz? E isso teria ajudado ou não? Nós, como vítimas, sentimos que (a resposta é) sim.”

Outros não foram tão diplomáticos. Num livro de 1999 chamado “Hitler’s Pope” [“O Papa de Hitler”], o escritor britânico John Cornwell documentou o papel de Pio antes de se tornar papa, na negociação do “Reichskonkordat”, tratado assinado entre a Alemanha Nazista e a Igreja Católica em 1933. Muitos historiadores argumentaram que esse acordo fornecia ao regime nazista um grau substancial de legitimidade internacional.

Mas a afirmação de Cornwell de que o papa Pio 12 falhou em tomar uma ação séria para salvar os judeus tem sido confrontada e o próprio autor se retratou de algumas de suas alegações mais controversas em relação à suposta aquiescência de Pio.

Mesmo assim, muitos judeus ainda são críticos em relação ao papel que Pio desempenhou. Sua foto no museu do Holocausto Yad Vashem inclui uma descrição bastante dura.

“Mesmo quando notícias do assassinato de judeus chegaram ao Vaticano, o papa não protestou nem verbalmente nem escrevendo”, diz a legenda.
“Em dezembro de 1942, ele se absteve de assinar a declaração aliada condenando o extermínio de judeus. Quando os judeus foram deportados de Roma para Auschwitz, o papa não interveio.”

A veracidade da legenda da foto foi questionada pelo Vaticano e o museu disse que estaria aberto a realizar uma nova pesquisa sobre o assunto. Os defensores de Pio argumentam que o papa da época da guerra trabalhou duro nos bastidores para proteger os judeus dos campos de concentração nazistas.

O jornal do Vaticano, L’Osservatore Romano, publicou na terça-feira um artigo de página inteira elogiando os esforços de Pio durante a 2ª Guerra Mundial. O jornal também incluía um texto escrito pelo secretário de Estado do Vaticano, Cardeal Tarcisio Bertone. “Se ele tivesse feito uma intervenção pública, teria colocado em perigo a vida de milhares de judeus, que, sob suas ordens, foram escondidos em 155 conventos e monastérios apenas em Roma”, escreveu Bertone.

O padre jesuíta Peter Gumpel, que, como investigador-chefe do Vaticano, passou anos pesquisando sobre o papa para avaliar sua candidatura à santidade, deu sua bênção para a beatificação. Em entrevista ao jornal Süddeutsche Zeitung na terça-feira, Gumpel disse que leu tudo o que conseguiu encontrar, e teve acesso a arquivos do Vaticano que ainda não foram colocados à disposição do público.

“Se eu tivesse encontrado algo incriminador nos arquivos, eu nunca teria assinado”, disse Gumpel ao Süddeutsche. “Afinal, eu tenho muita responsabilidade como o juiz de investigação.”

O caminho para a beatificação do papa Pio 12, que começou em 1967, nem sempre foi direto e sofreu repetidos atrasos. Com o processo de beatificação aparentemente em marcha, alguns argumentam que este é o momento para a Igreja Católica abrir seus arquivos para que os historiadores independentes possam olhá-los.

“Eu gostaria que eles gastassem uma grande porcentagem de seu tempo e esforços para abrir os arquivos, e menos tempo selecionando o que apresentam”, disse Abraham Foxman da Liga Anti-Difamação (ADL) recentemente ao jornal National Catholic Reporter. Foxman e a ADL se opõem consistentemente à beatificação de Pio. “Eles estão protestando demais. Estamos dispostos a suspender o nosso julgamento e o Vaticano deveria suspender o seu (próprio) até que os acadêmicos pudessem examinar abertamente o material e ver o que existe lá.”

50 anos da morte de Pio XII

Hoje, o Santo Padre Bento XVI celebrou uma Capela Papal em comemoração pelo cinqüentenário da morte do Servo de Deus Pio XII. O Fratres in Unum acabou de publicar fotos da celebração. Da homilia pronunciada pelo Santo Padre, traduzo os textos a seguir, bem adequados à recente polêmica envolvendo a figura deste grande Príncipe da Igreja:

A Guerra [Segunda Guerra Mundial] pôs em evidência o amor que [Pio XII] nutria por sua “amada Roma”, amor testemunhado pela intensa obra caritativa que promoveu em defesa dos perseguidos, sem distinção alguma de religião, etnia, nacionalidade ou filiação política. Quando, ocupada a cidade, ele foi diversas vezes aconselhado a deixar o Vaticano para manter-se a salvo, a sua resposta sempre foi idêntica e decidida: “não deixarei Roma e nem meu posto, ainda que tivesse que morrer” (cfr Summarium, p.186). Os familiares e outras testemunhas referiram-se, além disso, à privação de alimento, aquecimento, vestuário e conforto, à qual ele se submeteu voluntariamente para compartilhar a mesma condição das pessoas duramente provadas pelos bombardeios e consequências da Guerra (cfr A. Tornielli, Pio XII, Un uomo sul trono di Pietro). E como esquecer a radiomensagem natalícia de dezembro de 1942? Com voz partida pela comoção, deplorou a situação das “centenas de milhares de pessoas que, sem nenhuma culpa própria, às vezes somente por razões de nacionalidade ou de família, são destinadas à morte ou a uma progressiva decadência” (AAS, XXXV, 1943, p. 23), em uma clara referência à deportação e ao extermínio perpetrado contra os judeus.

Agiu muitas vezes de modo secreto e silencioso justamente porque, à luz da situação concreta daquele complexo momento histórico, ele intuía que somente deste modo era possível evitar o pior e salvar o maior número possível de judeus. Por estas suas intervenções, numerosos e unânimes atestados de gratidão foram a ele dirigidos ao fim da Guerra, bem como no momento de sua morte, pelas maiores autoridades do mundo judeu, como, por exemplo, pelo Ministro do Estado de Israel Golda Meir, que assim escreceu: “quando o mais assustador martírio se abateu sobre o nosso povo, durante os dez anos do terror nazista, a voz do Pontífice se levantou em favor das vítimas”, concluindo com emoção: “nós choramos a perda de um grande servidor da paz”.

Infelizmente, o debate histórico sobre a figura do Servo de Deus Pio XII, nem sempre sereno, falhou em trazer à luz todos os aspectos do seu pontificado multifacetado. Muitíssimos [tantissimi] foram os discursos, as alocuções e as mensagens que manteve com cientistas, médicos, expoentes das categorias de trabalhadores mais diversas, algumas das quais conservam ainda hoje uma extraordinária atualidade e continuam a ser um ponto seguro de referência.

[…]

Caros irmãos e irmãs, enquanto rezamos para que prossiga felizmente a causa de beatificação do Servo de Deus Pio XII, é bonito recordar que a santidade foi o seu ideal, um ideal que não deixou de propôr a todos. (…) Neste nosso mundo que, como então, é assaltado por preocupações a angústias sobre o seu futuro; neste mundo onde, talvez mais do que então, o afastamento de muitos da verdade e da virtude deixa entrever cenários desprovidos de esperança, Pio XII nos convida a voltarmos o nosso olhar para Maria assunta na Glória Celeste. Convida-nos a invocá-la confiantes, para que nos faça apreciar sempre mais o valor da vida sobre a terra e nos ajude a volver o olhar para o objetivo verdadeiro ao qual somos todos destinados: aquela Vida Eterna que, como assegura Jesus, possui já quem escuta e segue a Sua Palavra. Amém!