Sobre imagens e símbolos, no funeral de D. Eugenio Sales

A foto abaixo foi compartilhada à exaustão ontem tanto no Facebook quanto na blogosfera católica. Pesquisando um pouco, cheguei à sua [mais provável] fonte original que é esta galeria de imagens da UOL, na qual podem inclusive ser vistas outras imagens da alva guardiã do féretro do Eminentíssimo cardeal brasileiro recém-falecido. Ontem, um jornal da Globo também falou sobre ela.

Como sempre, houve entre os críticos da religião quem se incomodasse com o fato de uma pomba branca ter passado tanto tempo ao lado do ataúde cardinalício. Depois das primeiras levianas acusações de montagem terem sido desmentidas pela profusão das fontes testemunhas primárias, passou-se rapidamente às buscas de causas naturais para o fenômeno, não raro chegando a acusações (igualmente levianas) de fraude deliberada. Isto como se nós, os religiosos, tivéssemos em algum momento insinuado que a pomba branca era uma demonstração cabal da existência de Deus ou coisa parecida, ou como se os inimigos de Deus tivessem perdido as aulas básicas de lógica elementar e acreditassem sinceramente, por algum irracional e nonsense ato de fé, que refutar uma demonstração é equivalente a demonstrar a falsidade da tese em análise.

E não é a primeira vez que isso acontece. Coisa idêntica foi feita diante, p.ex., da cruz em pé no meio dos escombros aos quais foi reduzida uma igreja no Haiti quando houve um terremoto, ou diante da pequena imagem de Nossa Senhora das Graças deixada em pé após as enchentes de Petrópolis no início do ano passado. Ou quando foi divulgada uma imagem de um batismo na Espanha na qual a água derramada pelo padre formava uma cruz. Eu aproveito a oportunidade da – belíssima! – imagem dos funerais de D. Eugenio Sales para repetir o que eu já falei algures sobre o assunto.

Em uma palavra, os (auto-intitulados) livres-pensadores têm uma absurda dificuldade em entender um símbolo (ou uma extraordinária má-vontade em aplicar este conceito a assuntos religiosos). É como se a única forma de uma imagem ser verdadeira seria se ela correspondesse perfeitamente à realidade empírica, e – pior! – contendo em si mesma todas as informações necessárias para explicitar sem margem de dúvida razoável a cadeia completa de causas materiais que a produziram. Pior ainda é quando atribuem uma falsa intenção a quem divulga a imagem e, não encontrando nela elementos suficientes para demonstrar aquela alegada intenção, classificam a imagem como falsa e quem a divulga como um enganador.

Por exemplo, a presente imagem da pomba acompanhando o esquife do cardeal. Foi dito – de maneira até inexplicavelmente agressiva – que é perfeitamente possível fazer uma pomba ficar num caixão sem que isto prove a existência de Deus. Oras, mas é claro que é possível, e de incontáveis maneiras: a pomba podia ser treinada, podia ser uma pomba de estimação do cardeal, podia haver algum vestígio de substância (p.ex., farelo de pão) sobre o caixão que a tivesse atraído, ou simplesmente a pomba pode ter ficado lá porque ela precisava ficar em algum lugar e calhou de ser em cima do caixão, etc. Na verdade, isto importa bem pouco, porque o ponto aqui é outro: é a força da imagem de uma pomba branca velando o corpo de um cardeal da Santa Igreja, e a mensagem aqui transmitida não perde o seu vigor dependendo da forma como a cena foi produzida.

Não existem somente as (na falta de expressão melhor) “verdades factuais”. Por exemplo – e este os ateus hão de entender -, quando alguém vê um conjunto de bolinhas e de linhas curvas em certa disposição, sabe que aquilo é um átomo. Pouco importa se o átomo “de verdade” não é exatamente assim (e as “bolinhas”, longe de serem indivisíveis, são formadas por diversas outras partículas sub-atômicas, e os elétrons não descrevem bem movimentos elípticos e são melhor representados por funções de probabilidade, etc.), aquilo é um átomo. Ainda por exemplo (os ateus façam uma forcinha para entenderem esta), aquele quadro que tem na igreja do Senhor do Bonfim em Salvador e que retrata a morte do ímpio não significa que os demoniozinhos são bípedes com caras de monstros e que ficam fisicamente puxando o moribundo para impedi-lo de [até mesmo involuntariamente] estender os braços em direção à cruz que lhe é oferecida. Um sujeito que dissesse que este quadro é “falso” ou “mentiroso” por conta disso não entendeu, absolutamente, qual é o propósito do quadro, e está preso em uma visão tosca de um emaranhado de elementos sensíveis com relação aos quais não tem, absolutamente, a menor visão de conjunto.

A majestosa ave ebúrnea posta como atalaia do corpo do eminentíssimo cardeal Eugenio Sales ao longo de todo o cortejo fúnebre não tem verdades metafísicas a comunicar com a autoridade de um emissário dos Céus. Aliás, até mesmo para os católicos, a sua presença não deve ser tomada como um sinal inequívoco de que o egrégio purpurado encontra-se já na Glória de Deus. Mas ela serve, sim, como um sinal de esperança na misericórdia divina; como uma homenagem – justíssima, por certo, independente de quem a tenha preparado – ao general que parte (sobre homenagens, aliás, vale ler o frei Rojão), convidando-nos a continuar aqui na terra o seu trabalho e a oferecer-lhe, como gratidão pelo bem realizado, o sufrágio de nossas orações. Que o Senhor lhe dê o descanso eterno, e a luz perpétua brilhe sobre ele. Descanse em paz, Dom Eugenio Sales.

Nota de Falecimento: Dom Eugênio Cardeal Sales

[Eu soube esta madrugada do falecimento de Sua Eminência Reverendíssima o Cardeal Dom Eugenio de Araújo Sales; reproduzo a pequena nota que consta no site da Arquidiocese do Rio de Janeiro – no qual, a propósito, o cardeal sempre colocava os seus artigos e cujo acervo se encontra agora à disposição, como um legado, aos que por aqui ficamos ainda mais um pouco, deste que era o mais antigo cardeal da Santa Igreja.

A CNBB também emitiu uma nota de pesar. O Deus lo Vult! faz coro às lamentações que ressoam por todo o orbe católico, pedindo à SSma. Virgem, Porta do Céu, que receba D. Eugenio nas Moradas Celestes o quanto antes, a fim de que aquele que tanto lutou pela Igreja cá na terra possa continuar intercedendo por Ela diante de Deus.

Requiem aeternam dona ei, domine,
et lux perpetua luceat ei.

Requiescat in Pace,
Amen.]

Dom Eugenio Sales entra na Glória Eterna

É com pesar que a Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro noticia o falecimento de seu Arcebispo Emérito Cardeal Dom Eugenio de Araujo Sales, no final da noite desta segunda-feira, 9 de julho de 2012.

O corpo de Dom Eugenio chegará à Catedral de São Sebastião às 12h desta terça-feira, dia 10 de julho, onde acontecerá o velório do Cardeal, com missas de duas em duas horas. Na quarta-feira, dia 11 de julho, o Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani João Tempesta, presidirá a Missa Exequial seguida do sepultamento, na cripta da mesma Catedral.

Dom Eugenio de Araujo Sales, o mais antigo Cardeal da Igreja Católica, era Cardeal Presbítero da Santa Igreja Romana, do Título de São Gregório VII. Seu lema, fundamentado na Carta de São Paulo aos Coríntios, foi: “Impendam et Superimpendar”, tirado de 2Cor 12,15: “Quanto a mim, de bom grado despenderei, e me despenderei todo inteiro, em vosso favor. Será que, dedicando-vos mais amor, serei, por isto, menos amado?”

Exemplo de idiotice TL: Cristo, o trabalhador rejeitado!

O infame “cantor” Falcão disse certa feita que “a besteira é a base da sabedoria”. A antológica frase – “antológica”, claro está, porque digna de uma anta – é o título de um dos seus álbuns. Ao humorista brasileiro, contudo, a gente pode ao menos dar um desconto e dizer que ele está deliberadamente procurando fazer piada, que ele não leva a sério as bobagens que diz. Coisa muito diferente ocorre quando estamos tratando de uma publicação religiosa de renome e alcance nacional.

Trata-se – sim, é ele de novo – d’O Domingo, semanário litúrgico-catequético da Paulus. Desta vez, eu não vou falar das colunas que são publicadas no final [uma delas, aliás, miraculosamente, está boa: a de D. Angélico Bernardino, que tem por título “sejam santos”], mas da primeira coisa que eu ouvi quando a Missa estava por começar. Trata-se do comentário que, no jornalzinho, encabeça os “Ritos Iniciais”, e que é lido imediatamente antes da procissão de entrada. Ontem isto ressoou dentro da Igreja enquanto os fiéis estavam piedosamente esperando a Santa Missa iniciar. O comentário diz, verbis, o seguinte:

Jesus foi rejeitado em sua própria terra por ser trabalhador e filho de Maria, mulher simples da aldeia de Nazaré. Hoje continua sendo rejeitado em tantas pessoas empobrecidas e excluídas da vida social. Celebrando a sua páscoa, somos convidados a aceitar o fato de que Deus nos fala por meio dos simples, fracos e pobres.

O Evangelho da Missa de ontem é o sexto capítulo de São Marcos (v. 1-6), que fala sobre o profeta que não é aceito em sua terra. Obviamente, há um sem-número de meditações que podem ser feitas a partir desta perícope evangélica; à guisa de exemplo, o Presbíteros traz hoje tanto um roteiro homilético quanto uma homilia de D. Henrique Soares, o Evangelho Quotidiano trouxe ontem algumas palavras do Beato João XXIII sobre o “Filho do Carpinteiro”, há a própria Catena Aurea já citada, etc. Comentários a serem feitos, havia-os aos borbotões. No entanto, O Domingo me sai com esta história de que o problema que os judeus tinham com Nosso Senhor era porque Ele era trabalhador!

Cáspita, como assim Nosso Senhor foi rejeitado por ser “trabalhador”? E Ele deveria ser o quê para que fosse bem aceito, desocupado? E que misteriosa característica proletariofóbica específica dos judeus de Nazaré é esta, uma vez que é especificamente lá (e não em outros lugares) que os Evangelhos narram a rejeição de Cristo? E o que as palavras de Nosso Senhor – sobre um profeta não ser bem aceito em sua terra – têm minimamente a ver com esta suposta rejeição trabalhista com a qual O Domingo quer engabelar os seus leitores?

Os fiéis católicos que vão à Santa Missa não merecem esta idiotice. Eles têm o direito de ouvir a palavra de Deus em sua interpretação autêntica e frutuosa que só a Igreja de Cristo é capaz de fornecer, e não esta baboseira estéril de fazer corar qualquer professor de literatura ou de garantir uma reprovação sumária em qualquer avaliação de interpretação de texto. Os fiéis vão à Igreja porque querem ser edificados pela Doutrina Católica, e não enganados com esta empulhação marxista pseudo-católica já velha e putrefata que se esqueceu de que morreu e insiste em assombrar o mundo.

Veja-se como a ideologia é agora colocada acima da hermenêutica mais elementar: de onde foi tirada esta exegese louca de que Cristo foi rejeitado por ser trabalhador? O quê, no texto ou no contexto, dá margem para que seja feita semelhante inferência? Tudo isto só porque Nosso Senhor foi chamado de “carpinteiro” pelos judeus? Ora, por este modus interpretandi obtuso, a gente pode dizer que Herodíades era uma vegan fanática enrustida e pediu a cabeça de São João Batista porque este cometia o terrível crime de comer os gafanhotinhos que são criaturas de Deus.

E ainda concedendo que houvesse nesta única palavra – “o carpinteiro” – alguma conotação depreciativa (que claramente não se depreende do texto bíblico), há tão farto material a respeito do porquê do Messias não ser aceito e é tão eloqüente – prolixa até – a Doutrina Cristã sobre o assunto que é indiscutivelmente uma falcatrua e uma empulhação querer enquadrar a rejeição de Cristo em Nazaré num esquema estúpido de luta de classes onde os trabalhadores são oprimidos e marginalizados! É verdadeiramente impressionante o volume de besteira que a gente é obrigado a ouvir nesta vida; e  (ao contrário do que o Falcão poderia insinuar) não há nenhuma propriedade transmutadora de alquimia retórica capaz de fazer brotar alguma sabedoria desta infamante miséria intelectual.

Sobre a Comissão em Defesa da Vida da Regional Sul 1 da CNBB: nota contra o abortismo do governo Dilma

Grandes feitos têm pequenos começos. O chavão pode ser lugar-comum, mas é bastante adequado para falar sobre a resistência católica ao abortismo petista surgida no Brasil nos últimos anos.

Todo mundo sabe que o PT está escancaradamente comprometido com o morticínio de crianças indefesas no ventre de suas mães. E todo mundo sabe que, para os católicos, a defesa da vida não é um assunto periférico que possa ser utilizado como moeda de barganha política em benefício de outros interesses, por justos que estes sejam. Todo mundo sabe que, para os católicos, a rejeição total e absoluta ao aborto é uma das pré-condições mais básicas para que um candidato ou partido político possa licitamente receber o apoio dos que se preocupam em subordinar a contingência da vida em sociedade aos ditames da Eterna Lei de Deus. Corolário imediato disso é que nenhum católico pode apoiar com o próprio voto um candidato ou partido abortista.

Isto é terrivelmente óbvio, mas precisou ser dito às claras. Há dois anos, próximo às eleições presidenciais, três corajosos bispos da Regional Sul 1 da CNBB assinavam um panfleto que nada fazia senão repetir o óbvio. O pequeno documento terminava recomendando (sim, recomendando somente!) os cidadãos brasileiros a «que, nas próximas eleições, de[ss]em seu voto somente a candidatos ou candidatas e partidos contrários à descriminalização do aborto». Isto foi o suficiente para que se instaurasse um rebuliço geral no Brasil.

A então candidata Dilma Rousseff passou a dar uma de doida e a desdizer publicamente, na maior cara de pau, tudo o que dissera antes a respeito das suas posições em relação à descriminalização do aborto no Brasil. Teve inclusive a pachorra de [já em campanha do segundo turno] ir a uma Missa em Aparecida mesmo sem fazer a menor idéia de como se comportar dentro de um templo católico. A hipocrisia, contudo, não funcionou como era esperado e a candidata do PT perdeu uma vitória que era dada por certa no primeiro turno. Passou-se então à perseguição ditatorial escancarada: os documentos da CNBB foram proibidos de serem circulados, inclusive com uma tentativa de invasão (claramente ilegítima) de uma gráfica por militantes do partido e posterior apreensão (igualmente ilegítima) por meio da Polícia Federal dos panfletos que lá estavam sendo produzidos. Mas o estrago foi tão grande que a sra. Rousseff comprometeu-se a, se eleita, não mexer na legislação brasileira sobre o aborto. Aliás, não fosse o seu adversário escolhido a dedo para perder a farsa eleitoral que tem por único propósito conferir um verniz de legitimidade democrática à tirania já instaurada, a sra. Rousseff certamente perderia as eleições. Teria sido divertido.

Hoje, dois anos e sucessivas tentativas de legalização subreptícia do aborto no país depois (STF e anencéfalos, política de “redução de danos” para mulheres que desejam provocar o aborto, anteprojeto de reforma do Código Penal, nomeação de uma abortista escancarada para a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, etc.), mais uma vez se levanta a voz dos católicos. Após circular a denúncia de que o Governo se prepara para implantar o aborto no país via Ministério da Saúde, a Comissão em Defesa da Vida da Regional Sul 1 da CNBB aprovou recentemente uma dura nota contra o Governo Dilma. O Deus lo Vult! recebeu-a por email; trechos da mesma podem ser encontrados na ACI Digital. O texto contundente termina pedindo provas concretas da boa fé da senhora presidente:

Não queremos que a Presidente Dilma faça pronunciamentos por palavras ou por escrito, queremos fatos:

1. A demissão imediata da Ministra Eleonora Menicucci da Secretaria das Políticas para as Mulheres.

2. A demissão imediata do Secretário de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, Helvécio Magalhães, que está coordenando a implantação das novas medidas a serem tomadas por esse Ministério.

3. O rompimento imediato dos convênios do Ministério da Saúde com o grupo de estudo e pesquisa sobre o aborto no Brasil.

Nossos cumprimentos à Comissão em Defesa da Vida da Sul 1, que teve a coragem de tornar públicas estas considerações que são, como bem o sabemos, as mesmas posições que a maior parte da população brasileira tem sobre o assunto. Tendo sido eleita com 55 milhões de votos (o que é bem menos da metade – pra ser exato, apenas 40%do total de eleitores do Brasil em 2010), a senhora presidente parece não estar nem um pouco preocupada em governar de acordo com os anseios da população brasileira. Diante de um governo indesejado pela maior parte dos brasileiros e cujo maior feito nestes dois anos tem sido o descumprimento ostensivo das promessas de campanha a respeito do aborto, é importante que levantemos a nossa voz contra estes descalabros ilegítimos e protestemos energicamente contra o que está acontecendo em nossa Pátria. É importante que a população brasileira saiba o que a presidente está fazendo na presidência do país.

É HOJE: Sorteio de camisetas de Chesterton!

Atenção! Vai haver hoje um sorteio de duas camisas de Chesterton, cortesia das “Camisetas Chesterton Brasil”.

Para participar, basta curtir a página do Facebook, ajudando assim na divulgação desta iniciativa que tenciona tornar mais conhecido o grande pensador católico. Como disse o Wagner Moura:

Olá, pessoal! As camisetas estão à venda por R$25,00 mais frete. Para concorrer a duas, hoje, basta curtir a página www.facebook.com/camisetaschesterton e torcer! Sim, o ganhador não vai pagar nada e receberá a camiseta no endereço que informar. O sorteio será às 21h como está na imagem. Boa sorte!

Corram que ainda dá tempo!

É a internet intrinsecamente má?

Desde o final do mês passado – mais especificamente, desde o Dia dos bem-aventurados apóstolos São Pedro e São Paulo – a ACI Digital está com um novo formato. O portal católico de notícias aponta aquele que é um dos principais desafios dos nossos tempos:

A Igreja no Brasil e no mundo de língua portuguesa em geral, experimenta uma crescente necessidade de penetrar no campo das comunicações, para promover suas iniciativas, incrementar seu alcance e assim levar a mensagem de Cristo aos fiéis nos diversos meios de comunicação, particularmente, na internet.

Eu lia recentemente a palestra do pe. Spadaro sobre os novos meios de comunicação, e o sacerdote falava algo importante que, contudo, parece-me negligenciado por muitas pessoas. Refiro-me ao fato de que a internet é mais do que um simples meio de comunicação: é um – na falta de termo melhor – ambiente no qual as pessoas de fato existem. Na minha opinião, o grande trunfo da internet sobre os meios de comunicação tradicionais está na interatividade: de maneira contrária ao que ocorre (p.ex.) na televisão ou no rádio, as novas mídias sociais possibilitam – ou, eu diria mais ainda, exigem – que os consumidores de conhecimento sejam também eles próprios, por sua vez, produtores de conteúdo. Este fenômeno é completamente universal, abrangendo dos antigos canais do IRC às listas de email, das comunidades do Orkut aos sistemas de comentários dos blogs e do Facebook. Na internet não apenas se lê, mas também se escreve; não apenas se ouve, mas também se fala. Quem não entender a dinâmica deste mecanismo não vai conseguir entender a internet e, por conseguinte, não vai conseguir aproveitá-la.

A partir do momento em que as pessoas são instadas a se relacionarem na internet, esta deixa de ser um mero canal de busca de informações e passa a ser – de certo modo – uma extensão da existência dos seres humanos. Não é como um livro que se lê ou um espetáculo que se assiste, e sim como uma história escrita colaborativamente e à qual é imperativo impôr alguns traços da própria personalidade; como um ambiente no qual está uma parte de nós mesmos e que, portanto, deve refletir de certo modo um quê de nossa individualidade. Diante da internet – e talvez seja por isso que ela é tão sedutora – tem-se um vislumbre deste deslumbramento criativo de um artista diante de matéria bruta: tem-se a impressão de que é possível moldá-la e, mais, que ela clama por ser moldada. Tem-se esta forte sensação de que é possível modificar este espaço ao nosso redor de forma a transformá-lo n’alguma coisa que podemos dizer “nossa”. Não por acaso “site” significa precisamente – e a grafia assim se manteve no português-pátrio do Além-Mar – “sítio”. É um lugar, virtual por certo, mas ainda assim um lugar, que tem as características dos seres humanos que lá estiverem.

Há perigos, sem dúvidas, é inútil negá-lo. Claro está que um ambiente onde todos têm vez e voz corre o risco de se tornar terreno fértil para toda sorte de futilidades e de ocasiões de pecado. Sobre estas, a propósito, nunca me esqueci de uma história contada por Santo Agostinho em suas Confissões. Na época dele ainda havia lutas de gladiadores no Coliseu, e os cristãos as abominavam. Um amigo do santo, após insistentes convites de seus pares para participar de tais eventos, decidiu certa feita ir. Santo Agostinho o repreendeu, dizendo que esta violência gratuita não poderia fazer nenhum bem; mas o seu amigo o tranqüilizou dizendo que iria somente para satisfazer os seus colegas, pois manteria os seus olhos fechados na arquibancada, preservando-se assim daquela violência brutal que os pagãos da época tinham por entretenimento. E exatamente assim ele fez.

Pena – escreveu Santo Agostinho – que ele não se lembrou de fechar também os ouvidos. Ao primeiro golpe mutilador que fez o sangue jorrar na areia do Coliseu, a multidão reunida irrompeu em gritos de euforia; pego de surpresa pelo barulho, o jovem amigo do Bispo de Hipona abriu os olhos e, abrindo-os, foi seduzido pela luta. Tornou-se assim, a partir de então, para tristeza do santo e ruína de sua própria alma, um freqüentador assíduo das lutas de gladiadores.

Este exemplo ilustra perfeitamente o que é uma situação de pecado que se deve evitar. Não havia absolutamente nenhum propósito razoável em ir ao Coliseu e manter-se inerte na arquibancada de olhos fechados. Inexistindo (ou sendo mínimo) o benefício da atitude em comparação com o risco que se corre em tomá-la, a boa teologia moral nos ensina que não nos é lícito expôr desta maneira nossa alma a tão graves perigos. Coisa completamente diversa ocorre quando nós temos um propósito razoável em vista, isto é, quando há certa proporcionalidade entre o risco que se está correndo e as boas obras que se deseja realizar. Nestes casos, cabe ao juízo prudencial sopesar os prós e os contras e decidir o que cada um pode fazer e em que medida é lícito fazê-lo.

A internet pertence claramente a esta segunda categoria. Claro está que há perigos – terríveis! – na rede, mas claro está também que a presença dos católicos nela não é sem propósito, muito pelo contrário: tem o objetivo de viver o Evangelho também neste ambiente, criado pelo engenho humano mas existente de fato. Parece-me, desta maneira, exagerada esta reação contra o Facebook, na qual a rede recebe o temível epíteto de “intrinsecamente mau”. Com a devida vênia, isto é um completo absurdo. Primeiro porque apenas atos humanos são passíveis de serem qualificados como “intrinsecamente maus”, e o Facebook é uma coisa evidentemente distinta de um ato humano (pode-se classificá-lo como um ambiente ou até mesmo como uma ferramenta, vá lá, mas jamais como um “ato”). Segundo porque intrinsece malum, segundo a Igreja [cf. Veritatis Splendor, 80], são aqueles atos assim classificados em razão do seu objeto, e o ato de estabelecer relações com outras pessoas – o que é o fim precípuo de toda rede social – não é, sob nenhuma ótica, um objeto mau em si próprio. Relacionar-se para se vangloriar ou para satisfazer a concupiscência, p.ex., é sim moralmente errado, mas o é por conta da intenção [= a vanglória ou a concupiscência], e não do objeto [= a relação entre seres humanos]. Posso facilmente concordar que há nas redes sociais muitas relações fúteis e desordenadas, mas não dá para concordar que sejam intrinsecamente desordenadas as relações entre seres humanos feitas através dos novos meios de comunicação pelo simples fato de serem feitas “através de redes sociais”. Isto simplesmente não faz sentido.

A existência da internet é um fato do qual não é possível fugir e cuja existência não vai deixar de influenciar o mundo no qual vivemos se nós decidirmos fingir que ela não existe. Se a internet, como dizíamos acima, é um ambiente plasmado pela ação dos seus usuários – e me parece evidente que ela assim o seja -, então me parece totalmente sem sentido defender que é uma boa idéia “abandoná-la” à ação dos bárbaros. Muito pelo contrário até: se o ambiente da internet tem as cores dos seus “habitantes”, então é mister povoá-lo de almas nobres que se empenhem em torná-lo mais civilizado. Importa cultivar os sítios virtuais, a fim de que eles dêem frutos saborosos e não somente ervas daninhas. Afinal de contas, não me consta que haja exceção aos ambientes que devem ser perfumados com o doce odor de Cristo que os discípulos d’Ele têm o mandato de espalhar por todo o mundo.

A religiosidade e a hipocrisia

A moda agora parece ser publicar imagens de pessoas que passam sua vida destratando as demais e, depois, vão à igreja como se tudo estivesse muito bem. Em uma palavra, de pessoas hipócritas. Eu não sei se o objetivo é promover uma generalização estúpida e obviamente falsa ou se, ao contrário, o objetivo é pôr em dúvida a capacidade da religião de tornar as pessoas melhores. Somente hoje vi dois quadrinhos diferentes. O que segue abaixo foi tirado daqui (só depois notei a malícia gayzista do quarto quadrinho; vou ignorar por completo esta alusão descabida à homossexualidade e me focar no binômio “pecado” x “religião”).

Eu nem vou falar sobre o risco (ou – pior ainda – o intento) de generalização, uma vez que considero a falsidade desta associação entre fervor religioso e descaso com o próximo evidente para qualquer pessoa que tenha contato real com o mundo. Dita de maneira geral, seria tão-somente uma calúnia grosseira, desmentida à exaustão pela infinitude de pessoas que se esforçam sinceramente por espalhar no mundo o Doce Odor de Cristo, e que se deixaram de tal maneira moldar pela Caridade que a sua vida é, para todos os que com elas convivem, uma doce leitura das mais suaves páginas do Evangelho. Não vou me deter na generalização caluniosa. Ao contrário, acho que vale a pena falar sobre a religião e a sua capacidade de tornar melhores as pessoas.

Há uma história clássica de um navio governado por um capitão cruel que tratava muito mal os seus subordinados. Gritava com eles, humilhava-os, chicoteava-os, era grosseiro e exigente em demasia, sempre disposto a castigar com a máxima severidade as menores faltas dos seus homens. Não obstante, era católico praticante e todos os dias, no navio, mandava celebrar Missa. E todos os dias comungava devotamente. Certa feita, um dos seus subordinados comentou que era um absurdo um homem cruel assim comungar todos os dias, o que foi ouvido pelo capitão. E este comentou: “se eu sou cruel assim comungando todos os dias, imagine como eu não seria se não comungasse!”.

A anedota, claro, é exagerada, uma vez que tal excesso de maus tratos – e de cores tão tetricamente carregadas! – configuraria muito provavelmente um pecado mortal e, portanto, impediria a comunhão eucarística ao nosso mal-amado capitão. No entanto, serve para ilustrar os princípios gerais, que podem ser resumidos no seguinte: se alguém é uma má pessoa tendo uma vida religiosa, provavelmente seria muito pior se não a tivesse. À exceção de algum distúrbio patológico profundamente afim com a psicopatia, o fato é que um religioso hipócrita seria ainda pior se os seus vícios não tivessem nem ao menos que se preocupar em prestar essa “homenagem à virtude” que é a essência de toda hipocrisia. Naturalmente, do ponto de vista subjetivo, esconder a iniqüidade sob um verniz de virtude provavelmente fará com que quem assim procede tenha contas mais graves a acertar com o Justo Juiz n’Aquele Dia; do ponto de vista do mal causado, no entanto, e abstraindo-se do mau exemplo e do escândalo, é fato que a energia gasta em esconder o mal causado poderia perfeitamente ser empregada em causar ainda mais mal, se não houvesse nem ao menos a preocupação de escondê-lo. Para ilustrar, em se tratando da tirinha acima, o último quadrinho poderia perfeitamente conter outra má ação igual a todos os demais se não houvesse uma necessidade (“hipócrita”) de parecer uma boa pessoa.

Isto fica ainda mais claro quando se percebe que a maior parte das pessoas não é “exclusivamente hipócrita”; digo, não utiliza a hipocrisia como um ideal de vida a ser mantido. Para a maior parte das pessoas, a vida é feita de quedas e soerguimentos, de pecado e de conversão: a menina da tirinha (volto a ela!) pode perfeitamente – e, aliás, para ela ser verossímil, é exatamente assim que ela vai agir – lembrar-se, na igreja, de todas as suas más atitudes e começar a ter o desejo de abandoná-las ou, ao menos, praticá-las com menor freqüência. Assim, poderia reclamar menos com a empregada no dia seguinte, e na semana seguinte dar alguma esmola para o mendigo; no mês seguinte ela estaria falando menos mal das outras pessoas, até que um dia ela teria progredido tanto que seria necessário desenhar uma outra tirinha com outras falhas de caráter se ainda se quisesse ridicularizá-la. Mais importante até: se ela não fizesse tal progresso moral, seria por falta de religiosidade e não por excesso dela. A religião, como todo mundo sabe (ou ao menos tinha o dever moral de saber), conclama as pessoas a serem melhores. Não existe uma única prática religiosa que funcione – como a tirinha induz a pensar – na base da teoria machadiana do abre-e-fecha de janelas para arejar a consciência, do “tudo bem” fazer o mal aqui se a gente fizer o bem ali para “compensar”.

Muito pelo contrário, aliás. É completamente impossível – de novo, salvo casos patológicos raros – manter por muito tempo uma prática religiosa que contradiga o estilo de vida que se leva. Mais cedo ou mais tarde, ou se vai abandonar a prática religiosa ou se vai mudar de estilo de vida. Exemplos disso existem aos borbotões no dia-a-dia mesmo dos nossos círculos de amizades. No caso então da garota hipócrita da supracitada tirinha caluniosa, deixem-na ir à igreja ou, melhor ainda, incentivem-na a ir ainda mais à igreja! Mais cedo ou mais tarde alguma coisa vai acontecer e alguma das duas coisas contraditórias ela vai ter que abandonar. E é melhor contribuir para que ela largue a má vida do que para torná-la mais assídua às más ações censuráveis dos primeiros quadrinhos.

HOJE, no Círculo Católico de Pernambuco: pelos verdadeiros direitos humanos!

Recife já está preparado para o Fórum sobre o PNDH-3, que acontecerá logo mais no auditório do Círculo Católico. O evento recebeu notas na imprensa local, tanto na Folha de Pernambuco quanto no Blog do Jamildo.

O primeiro lembra que o príncipe «acredita que os problemas sociais são reflexos de outros problemas, de ordem moral». O Jamildo diz a mesma coisa, de modo mais extenso:

D. Bertrand se posiciona claramente no campo da propriedade privada, livre iniciativa e respeito ao princípio de subsidiariedade, o qual limita o Estado ao âmbito que lhe toca por sua natureza. Tendo bem claro que os problemas sociais não são senão reflexo de outros mais profundos, de ordem moral.

Sim, os problemas da sociedade decorrem de problemas doutrinários. Da mesma forma que a Sã Doutrina influencia positivamente a vida social, desabrochando na bela flor da caridade – bálsamo poderoso para aliviar as conseqüências sociais negativas do pecado humano -, a heresia sempre se degenera em cânceres no tecido social. O fenômeno é tão universalmente repetido que chega a ser previsível. Assim, não existem as (falsas e caluniosas) oposições entre o “conservadorismo” e o “cuidado social”, muito pelo contrário: é preciso pensar com clareza para agir de maneira profícua. O conservadorismo, longe de atravancar o desenvolvimento social, é precisamente o que o possibilita e protege contra as influências nefastas – essas sim desagregadoras – dos erros e das heresias, dos experimentos sociais irresponsáveis, da cupidez de coisas novas que historicamente tanto mal provocou às sociedades e aos povos.

Quanto aos que estiverem hoje à noite no Recife, não percam a oportunidade de participar do evento promovido pelo Círculo Católico em parceria com o Instituto Plinio Corrêa de Oliveira. Ouçamos o que conferencistas tão ilustres – o Dr. Eduardo Barreto Campello, o Coronel da PMESP Paes de Lira e S. A. I. R. o Príncipe D. Bertrand de Orleans e Bragança – têm a nos dizer. E debatamos, sim, os Direitos Humanos, mas os verdadeiros, e não os pseudo-direitos revolucionários e injustos que nos querem impôr na base de canetadas advindas do Palácio do Planalto. Furemos a censura da grande mídia, que – salvo honrosas exceções – está mancomunada com os novos bárbaros inimigos da Pátria: com aqueles que atualmente nos governam e que trabalham pela destruição do Brasil tanto por vias oficiais quanto pelas oficiosas. Levantemo-nos em defesa desta Terra de Santa Cruz, desta Pátria-Mãe Gentil que ora se encontra tão terrivelmente ameaçada. Que a Virgem Aparecida salve o Brasil.

Atenção: Conferência com D. Bertrand é amanhã!

Volto a enfatizar a importância de que tantos quantos compreendem a dramaticidade do atual cenário político brasileiro façam-se presente ao Fórum sobre o PNDH-3 que será realizado amanhã (04 de julho) às 19h00 no auditório do Círculo Católico, em Recife/PE. O evento é gratuito e contará com a presença ilustre de S.A.I.R. o Príncipe Dom Bertrand de Orleans e Bragança e do Cel. Paes de Lira. Como conversávamos ontem, trata-se de uma oportunidade ímpar da qual nós não dispomos toda semana. É portanto imperdível.

É possível baixar os cartazes promocionais aqui (tam. A4) ou aqui (tam. banner). Pede-se ampla divulgação. As inscrições podem ser feitas pelo telefone do Círculo: (81) 3222-4816.

P.S.: É também possível fazer a inscrição diretamente pelo site, clicando aqui.