Oração e doenças, aborto e STF

Saiu no Diário de São Paulo: Estudos mostram que oração ajuda na cura de doenças graves. “Em um estudo com 455 idosos internados, Koenig observou que a média de internação dos que frequentavam a igreja mais de uma vez por semana era quatro dias. Já os que iam raramente ou nunca chegavam a passar até 12 dias hospitalizados. Outra pesquisa, feita pela Faculdade de Medicina de Dartinouth, revelou que a probabilidade de pacientes cardíacos morrerem após a cirurgia era 14 vezes maior entre os que não participavam de atividades religiosas. Em seis meses, 21 morreram. Já todos os 37 que se declararam extremamente religiosos tiveram alta”.

Isso não é evidência de sobrenaturalidade – até porque, até onde me conste, este efeito se observa independentemente da crença do doente, e pode muito bem ter as suas raízes em mecanismos psicológicos. Mas um amigo trouxe uma provocação interessante: se os que crêem são mais facilmente curados de doenças graves do que os que não crêem, será que a seleção natural não vai levar os ateus à extinção?

Enquanto isso, é noticiado que deve sair a qualquer momento a indicação de Toffoli para o Supremo Tribunal Federal, para ocupar a vaga do ministro Menezes Direito. Quem é José Antonio Dias Toffoli? Infelizmente – mas não surpreendentemente -, é mais um abortista. Que teve a capacidade de se dizer “contra o aborto e contra sua criminalização”.

E é “católico praticante”! Há exatamente um ano, eu escrevi aqui no Deus lo Vult! contra quem julga poder se dizer católico e fazer o contrário do que prega a Igreja, como se esta esquizofrenia espiritual fosse a coisa mais normal do mundo. Infelizmente, não há nenhuma novidade no STF: Lula indica mais um abortista, e mais um católico parece fazer parte do fã-clube das Católicas pelo Direito de Decidir. E, segundo o estudo supracitado, o dr. Toffoli parece ter maior expectativa de vida do que um Richard Dawkins da vida. E provavelmente pode fazer muito mais mal do que o nada ilustre cientista. E é “tão” católico praticante quanto o falecido ex-ministro. É impressionante. Tem coisas que só o PT faz por você.

Assuntos Ligeiros

–  Questão do Enem promove o ateísmo, no Mídia Sem Máscara. A questão pode ser encontrada aqui (é a oitava). Apresentam-se duas posições distintas, de Dom Odilo Scherer e do ateu americano Daniel Dennet. Todas as alternativas são toscas, mas a resposta correta – segundo o gabarito – diz o seguinte: “o arcebispo usa uma lacuna da ciência para defender a existência de Deus, enquanto o filósofo faz uma ironia, sugerindo que qualquer coisa inventada poderia preencher essa lacuna”. Maravilha de educação, não?

– Um texto anti-comunista no site da CNBB – Deo Gratias! Dom Aldo Di Cillo Pagotto reproduziu o Decálogo de Stalin. Verdade seja dita, não consta que Stalin o tenha realmente escrito, mas tais diretrizes deduzem-se, sim, da praxis histórica dos comunistas. Procurando a fonte dele na internet, deparei-me com o seguinte comentário de encantadora lucidez: “esse decálogo está sendo seguido à risca por Lula e sua petralhada”…

– Triste notícia número 1: padre colombiano diz que Igreja é o armário dos gays. “Segundo o padre, 30% dos 120 sacerdotes de Cali são gays”. Rezemos pelo clero.

– Triste notícia número 2: La “triple vida” de Marcial Maciel. No Fratres in Unum: novos filhos buscam direitos hereditários nos bens da Legião de Cristo. “[T]rês filhos de Marcial Maciel nascidos no México disputarão com os Legionários de Cristo para que se reconheça sua existência, assim como seus direitos hereditários sobre os bens do fundador da ordem religiosa”. Rezemos, rezemos mais, pelo clero.

– Manifesto da Associação Causa Imperial: A República cai de podre. “Hoje, a política brasileira é indissociável do desvio de dinheiro público, da sonegação fiscal e do uso da má-fé. Praticamente ninguém acredita que seja possível ocupar um cargo eletivo sem recorrer a meios espúrios, antes mesmo das eleições, dentro dos nossos asquerosos partidos políticos, verdadeiras quadrilhas nos quais o saque e a pilhagem são a única lei”. O desabafo da nobreza! Nossa Senhora Aparecida tenha compaixão do Brasil.

Não importunem os ateus!

Acho que eu já disse aqui outras vezes que é melhor ler besteiras do que ser analfabeto – parafraseando o antigo ditado, segundo o qual é melhor ouvir besteiras do que ser surdo. Por isso, nem reclamo mais (tanto) quando me cai aos olhos uma bobagem do calibre deste texto do sr. Claudio Weber Abramo sobre o direito de não ser importunado.

Trata-se de uma infantil reclamação sobre manifestações religiosas em estádios de futebol, que descamba para a já conhecida intolerância do ateísmo militante. O senhor Abramo não quer ser importunado. Por qual motivo, então, ele importuna os outros despejando lixo na internet? “Um ateu que viva num ambiente repleto de evocações a seres incorpóreos, influências etéreas e exortações à ‘espiritualidade’ não pode deixar de indignar-se com a coisa toda”, diz o articulista. Por que ele não vai à China? Lá deve ser o paraíso dos ateus. Ou o que ele quer é transformar o Brasil em uma ditadura atéia onde ele possa viver sem ser importunado? Mas, aí, os cristãos ficariam incomodados… por qual fantástico motivo estes últimos poderiam ser importunados e ele não?

Por qual motivo as manifestações religiosas dos não-ateus incomodam tanto os – assim intitulados – “livres-pensadores”? Em um artigo do João Pereira Coutinho citado aqui ontem, o português dizia: “Conheço pessoas que não fumam. E conheço pessoas que não fumam e não querem que os outros fumem. As primeiras são infelizes. As segundas são miseráveis”. Cai como uma luva para os ateus: existem pessoas que não acreditam em Deus, e existem aquelas que não acreditam e não querem que os outros acreditem. As primeiras, infelizes e, as segundas, miseráveis. O autor do texto ora citado parece pertencer à segunda categoria.

A justificativa dele para a sua posição? “O que está em jogo no caso da propaganda religiosa é o interesse coletivo. Interessa ao coletivo a disseminação de crenças em seres incorpóreos, influências etéreas e assim por diante?”. Ah, então tá. Como muito argutamente notou alguém numa lista de emails, se amanhã o sr. Abramo decidir que eu não existo, os meus amigos ficam ipso facto proibidos de falar em público de mim, porque não interessa ao coletivo. Não sei qual a razão do articulista achar que ele próprio é de interesse público.

Mas o manancial de bobagens parece inesgotável! Chega a ser frustrante ler que “[i]nteiras bibliotecas foram escritas para demonstrar que religião não é uma boa coisa (…) em particular[,] a ofensa que religiões representam à racionalidade, portanto à compreensão do mundo, portanto à capacidade de alterar o mundo”. As duas primeiras ofensas – à racionalidade e à compreensão do mundo – só podem ser uma piada de péssimo gosto. Tal sentença é, ela própria, uma ofensa à racionalidade. A terceira – ofensa à capacidade de alterar o mundo – pode ser verdadeira e talvez revele, afinal, o motivo profundo do ódio do articulista. Talvez ele esteja insatisfeito com o mundo que existe e deseje “alterá-lo”. Como na antiga União Soviética, quiçá. Só que está historicamente comprovado que o mundo inventado pelos sem-Deus não é bonito. Será que deveríamos repetir os mesmos erros de outora, somente para que o senhor Abramo não seja importunado?

Leitura fortemente correlata: A intolerância dos tolerantes! Ou: derrubem o Cristo Redentor e ponham Descartes no lugar.

Rejubilar-se com a verdade…

… de onde quer que ela venha! De um comentário feito ao texto sobre ateus e crentes do Ecce Medicus, aqui citado en passant ontem:

[N]ão concordo com esse pensamento absurdo de que “tornar-se ateu é render-se a razão”. Pelo contrário, tornar-se ateu lendo os inflamados livros de Dawkings é tão alienante quanto dizimar na igreja renascer.

Subscrevo in totum.

Encerrando a tarde

Fetos têm memória. Saiu também no NewsBusters. Pesquisadores holandeses “descobriram que fetos de 30 semanas conseguiam lembrar do som por dez minutos, enquantos os de 34 semanas conseguiam lembrar por quatro semanas”.

Igreja apoia golpe contra Zelaya em Honduras e se opõe a Hugo Chávez, mais uma da série “notícias desinformativas”. Só avisando aos navegantes que não existe golpe em Honduras. Mas a frase do cardeal Oscar Rodríguez Maradiaga é excelente: “A coisa mais patriótica que ele [Zelaya] poderia fazer seria manter-se afastado”.

A entediante feminista malufista: leiam. A “velha guarda” do Deus lo Vult! vai reconhecer a Senhora Boring prontamente.

Deus, um desejo: um texto ateu acusando o Cristianismo… daquilo que fazem os ateus! “Mesmo que se ‘convença’ um homem ou mulher que ele(a) está errado(a) com fatos, números, lógica ou qualquer outro tipo de arma cognitiva que se queira usar, não se mata o desejo que ele(a) terá de que a história decorra assim, da forma como eles a veem” – é o típico ateu que tem fé inquebrantável na inexistência divina…

Os ateus. A lei seca. Calvino

– O pessoal da UNA é engraçado. Após eu ter atacado ontem aqui um artigo nonsense sobre a nova encíclica do Papa, fui twittado pelo @UNABr, numa mensagem que, curiosamente, eles apagaram agora, e dizia alguma coisa como “não é a primeira vez que o católico fanático @jorgeferraz critica a UNA com argumentos sem sentido”.

Prontamente respondi-lhes dizendo que tampouco era a primeira vez que a UNA publicava coisas sem sentido para atacar a Igreja. Mandaram-me ler o editorial do blog, dizendo que só atacavam a Igreja “qdo ela dá motivo pra isso”. Respondi: “quando Ela não dá motivo, vocês simplesmente inventam, como foi o caso das duas vezes em que citei a UNA”. Disseram que a “ICAR n tem moral p falar de etica” e mandaram-me ver o documentário que eles tinham postado: trata-se de velharia (aqui, em texto, na BBC) já devidamente refutada há muito tempo (aqui, aqui e aqui), coisa que respondi incontinenti. Para minha surpresa, disseram-me ser “óbvio q o vaticano iria acusar o documentario de falseabilidade”, como se não fosse muito mais óbvio que anti-clericais sem senso moral iriam inventar calúnias contra a Igreja: a defesa d’Ela é simplesmente descartada por ser “da Igreja”, ao passo em que o documentário comprovadamente calunioso é tomado como verdade absoluta, talvez por ser da infalível BBC.

Respondi, em tom irônico: Vai ver, quem tem moral para falar de Ética são os paladinos da UNA, né, os seus textos cheios de “coesão e coerência”… Acho que foi a gota d’água. Em um surto de humildade megalomaníaca, recebi a resposta: “Sim, sou muito mais ético do que qqer padre.  E típico dos religiosos, vc ja começou com as ofensas. Olhe-se no espelho”. E, antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, recebo a sentença: “Em três posts, o fanático católico @jorgeferraz já demonstrou ser um TROLL com ofensas, N alimento trolls. Bloqueado”.

Agora, é engraçado. O pessoal despeja porcaria na internet, em público, e fica melindrado quando eu chamo a coisa pelo nome e mostro o nível do anti-clericalismo tupiniquim. O pessoal me twitta e dá xilique quando eu respondo. Vai entender…

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– Entre Milão e Turim, um padre italiano teve a sua carteira de motorista retida porque não passou no bafômetro. “Ele testou positivo para 0,8 grama de álcool por litro de sangue, enquanto o permitido pela legislação italiana é de 0,5”. O padre havia celebrado quatro missas. No ano passado, falei contra a “Lei Seca” brasileira aqui no Deus lo Vult!, citando inclusive o exemplo dos sacerdotes que precisavam tomar o Sangue de Cristo no altar da Santa Missa. Parece que não é só nesta Terra de Santa Cruz que os padres precisam correr riscos no cumprimento de suas obrigações ministeriais.

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Via Gustavo Souza: L’Osservatore Romano e Calvino. O jornal oficioso do Vaticano está ficando cada vez pior! É o péssimo artigo do mons. Fisichella lançando confusão entre o movimento pró-vida mundial, são as loas ao presidente abortista dos Estados Unidos da América e, agora, como se não bastasse, decide L’Osservatore publicar panegíricos a um heresiarca!

O texto original, publicado na última sexta-feira, está disponível aqui. Até pensei em traduzi-lo, mas me faltou estômago. Após ler que o protestante francês não suportava, nas igrejas católicas,  as “immagini troppo venerate, reliquie dubbie, nelle quali vedeva non senza ragione una ricaduta nell’idolatria” e que “[l]’organizzazione calvinista è una creazione geniale”, achei melhor deixar para lá. Talvez já esteja mais do que na hora de enviarmos protestos sérios ao Osservatore Romano.

Curtas espinhosos sobre a Caritas in Veritate

– A nova encíclica do Santo Padre, recém-publicada, já está dando o que falar. Como ainda não tive oportunidade de ler da carta mais do que alguns trechos específicos e, mesmo assim, em “leitura diagonal”, não estou em condições de fornecer comentários completos sobre o documento. Mesmo assim, preciso fazer ao menos dois comentários sobre ela que, deixe-se avisado desde já, estarão circunscritos aos estritos limites da minha [falta de] leitura. Peço desde já correções sobre quaisquer erros que eu porventura venha a cometer neles.

– Manchete reducionista número I: Papa exige uma verdadeira autoridade política mundial. Na versão inglesa mais completa e mais nonsense: Pope Endorses “World Political Authority”. Quanto a isso, cabe lembrar que (i) isto é um único parágrafo [o de número 67] dos 79 que compõem a carta encíclica; (ii) o Papa não “exige” absolutamente nada, apenas considera que “urge a presença de uma verdadeira Autoridade política mundial” (itálico no original); (iii) obviamente, tal autoridade não é a ONU, nem a União Européia, nem a OEA, nem nenhuma das organizações existentes na atualidade, e nem mesmo semelhante a elas; (iv) o Papa diz isso expressamente, pois fala na “urgência de uma reforma quer da Organização das Nações Unidas quer da arquitectura económica e financeira internacional, para que seja possível uma real concretização do conceito de família de nações”; (v) o conceito de “Família de Nações” utilizado pelo Papa encontra eco na Cristandade Medieval, e já se concretizou historicamente nos Estados Católicos submissos à autoridade mundial do Vigário de Cristo; (vi) como a Cristandade não mais existe, é necessário – e é isso que o Papa diz – encontrar uma forma, digamos, “natural” de fazer alguma coisa análoga; e (vii) tal autoridade mundial delineada pelo Papa deve obviamente aproximar-se mais do modelo medieval do que do modelo hodierno das Nações Unidas.

– Manchete reducionista número II: Falta de ética e de Deus causaram crise econômica, diz papa, seguida pelo absurdamente pior artigo da UNA que inicia dizendo que o papa Bento 16 adora imolar ateus. Este faz citações erradas da Encíclica, tenta fazer acreditar que o documento é uma espécie de carta anti-ateísmo e, pior de tudo, comete uma distorção tão descarada da idéia expressa por Bento XVI que não entendo como pode ter passado despercebida. O Papa disse que o desenvolvimento humano [integral], sem Deus, “acaba confiado unicamente às mãos do homem, que cai na presunção da auto-salvação e acaba por fomentar um desenvolvimento desumanizado” (Caritas in Veritate, 11). O sr. Marcelo Druyan, prontamente, inventou que o Papa disse terem sido os ateus que geraram a presente crise financeira e defendeu-se da nonsense acusação por ele mesmo produzida argumentando que a crise iniciou-se nos Estados Unidos, cujo presidente era cristão! O samba do crioulo-doido é tanto mais deplorável quanto mais o articulista demonstra estar convicto do mais perfeito encadeamento lógico entre a citação (errada) do Papa, a (inventada) acusação que (supostamente) dela decorre e o (nonsense) argumento que a refuta. Faço coro ao que foi publicado dia desses na Dicta: o novo ateísmo “é de uma estreiteza assustadora”…

Apanhado ligeiro

Pais não revelam sexo de sua criança de dois anos e meio. Na opinião da mãe, “[q]ueremos que Pop cresça com maior liberdade e que não seja forçado a um gênero que o/a moldará”. A criança “usa vestidos e também calças masculinas e seu cabelo muda do estilo feminino para o masculino a cada manhã”. Sinceramente, isso já está ultrapassando todos os limites do ridículo. Sempre me pareceu a coisa mais estúpida do mundo recusar-se a dar educação religiosa para a criança, sob a justificativa de que ela poderia “escolher por si própria” quando crescesse. Parece que eu estava enganado, porque conseguiram fazer uma coisa ainda mais idiota na Suécia. Pobre criança! Será que a mãe dela também vai se recusar a mandá-la à escola para que ela decida sozinha, quando crescer, se quer estudar ou não?

Jovens que matam cão em vídeo confessam crime no RS. Fiquei curioso por saber qual era o crime em que incorria quem matasse um cachorro. Acredito que seja a Lei de Crimes Ambientais (9.605/98). Segundo esta, é crime “[p]raticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados”, e “[a] pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal” (art. 32). A pena? “[D]etenção,  de três meses a um ano, e multa”. Temos, portanto, que os garotos que mataram um cachorro no RS podem ficar presos por até 16 meses, além de pagarem multa (a conjunção é aditiva, e não alternativa). Obviamente, o ato praticado pelos fulanos foi bárbaro e sádico (eles mataram o pobre animal a pauladas, enquanto filmavam), mas gastar tempo e dinheiro com abertura de inquéritos e procedimentos judiciais, que podem culminar em quase um ano e meio de prisão, não é um pouco exagerado para um cachorro morto?

– Mais sobre Honduras: Bispos católicos das Honduras apoiam golpistas (!), na suprema imparcialidade deste jornal eletrônico de Portugal; o avião do presidente deposto, que iria pousar ontem em Tegucigalpa, foi impedido de aterrissar. Uma pessoa morreu nas manifestações. O presidente Lula se diz preocupado com o aumento da violência no país, mas não esconde a sua simpatia – ou, melhor dizendo, o seu apoio entusiasta – ao presidente exilado: “[o]s golpistas têm que entender isso: não é possível aceitarmos mais golpes na América Latina”, “[o governo interino de Honduras] não pode ser reconhecido em hipótese alguma”, e “precisamos procurar uma interlocução, não com os golpistas mas com personalidades [da sociedade]”…

Enfim, um ateísmo com profundidade, artigo da Carta Capital. Onde está esta “profundidade”, é um mistério que me escapa à compreensão; talvez no livro citado pelo articulista, “O Espírito do Ateísmo”, de André Comte-Sponville. Não conheço a obra, mas é importante não confundir o autor com Augusto Comte. Parece ser interessante, porque fala em “espiritualidade atéia” e em “Pentecostes dos ateus, ou o verdadeiro espírito do ateísmo”. Achei engraçado como este “verdadeiro espírito” ateu parece uma caricatura do cristão. Se tiver tempo, ponho uma resenha do livro aqui depois.

Curtas de fim de sexta-feira

Bento XVI caminha na corda bamba entre israelitas e palestinos, conforme diz o título de uma matéria-desabafo do pe. Thomas Williams, LC, publicada em ZENIT na última quarta-feira. “Parece que alguns dos ouvintes do Santo Padre – afirma – não se sentiriam satisfeitos com nada do que o Papa possa dizer ou fazer, a ser não que caísse de joelhos suplicando que a terra o engolisse na mais total das vergonhas. […]  Como um equilibrista espiritual, ele tem de oscilar com cuidado à direita e à esquerda, e imediatamente é rotulado como insensível ou mau. […] Parece que muitos observadores não se importam com as verdadeiras intenções do Papa, e passam todas as suas palavras e ações pelo microscópio, em busca de uma falta”.

– Surgem rumores de que o homem que tentou assassinar papa se converteu ao catolicismo e quer ser batizado. “Mehmet Ali Agca, o homem que em 13 de maio de 1981 tentou matar o papa João Paulo II, alega ter se convertido ao catolicismo”. A mesma reportagem diz que o seu ex-advogado é cético quanto à sua conversão. Aqui tem uma entrevista estranha que não sei se é com o próprio Agca ou com o seu atual advogado; são essas coisas confusas que me fazem achar melhor aguardar um pouco para saber se é verdade ou se é boato.

O Estado e o aborto: artigo de Ogeni Luiz Dal Cin, advogado e filósofo. “Ora, como preservar a liberdade – esse o paradoxo do liberalismo – em detrimento da vida, se a liberdade supõe a vida e se a destruição da vida em nome da liberdade destrói a potencialidade da liberdade na vida violada? Destruir o outro antes que possa exercer sua liberdade para não precisar reconhecer-lhe a liberdade? […] De nada adiantou nosso constituinte definir, em cláusula pétrea, o direito à vida, sem nenhuma restrição, e defini-lo como direito superior e independente do Estado, se agora, por uma lei ordinária, na junção de interesses ideológicos e personalíssimos, já se considera casuisticamente mais que suficiente o intuito de legalizar o direito de matar a vida humana, antes do nascimento”.

Cientista nega tese de Anjos e Demônios, mas ninguém liga. “Zichichi, religioso e antidarwiniano, foi o homem que descobriu a antimatéria em 1965. Segundo ele, sua descoberta não pode ser roubada e muito menos contida num recipiente, mas é isso que ocorre em Anjos e Demônios, a nova parceria com a qual a dupla Howard/Hanks espera superar a receita bilionária do O Código da Vinci”. Parece que, não contente em apresentar aberrações históricas, o filme traz também aberrações científicas…

– Aliás, aos que dizem que o filme é ficção e ninguém confunde com a realidade, a própria matéria do Estadão acima citada traz a seguinte declaração do direitor do filme, Ron Howard: “Quando li Anjos e Demônios pela primeira vez, foi o que realmente ficou comigo. Essa sociedade secreta perseguida pela Igreja tinha entre seus integrantes Galileo Galilei e Bernini. O que aconteceu com eles? Os illuminatti existem até hoje? Meu Deus, se eu não me interessasse por isso, com o que mais iria me interessar?”. Se aparentemente nem o diretor do filme sabe que Galileo e Bernini não fizeram parte de Illuminati nenhuma, quanto mais o espectador de cultura mediana!

– Sobre a mesma confusão feita [por ignorância ou cretinice] pelo próprio Dan Brown, vale ler este post do blog do Veritatis que traduz uma entrevista do escritor disponível no seu site: “Sim, parte da informação factual revelada é surpreendente, mas eu acho que a maioria das pessoas compreende que uma organização tão longeva e poderosa como o Vaticano não poderia ter chegado a esse ponto sem guardar alguns esqueletos no armário. Eu acho que a razão pela qual “Anjos e demônios” está criando polêmica agora é que o livro abre alguns desses armários, que a maioria das pessoas nem sabia que existiam”. E então, será que somos nós que não sabemos diferenciar ficção de realidade?

– Escritor inglês ateu, amigo de Dawkins e Hitchens, converteu-se em abril passado ao cristianismo. A. N. Wilson anunciou no início do mês passado o seu retorno à Fé Cristã em um artigo de jornal chamado “por que eu creio novamente”! Da primeira matéria citada: “No han descubierto [seus amigos ateus] – como creen ellos – el tremendo engaño de la religión (…) El problema es que no se han dado cuenta de algo muy sencillo. Quizá es demasiado obvio para entenderlo; tan obvio como los amantes creen que deben estar juntos, o tan obvio como la decisión final del que se fuga”.

Os armários intolerantes

A famosa frase de Chesterton – que cito na sua versão que ganhou mais popularidade, e não na literal proferida pelo insigne escritor inglês, mantendo no entanto intacto o sentido das suas palavras – sobre os ateus, “quando alguém deixa de acreditar em Deus, não é que ele passe a não acreditar em nada; na verdade, ele passa a acreditar em qualquer coisa”, dá a cada dia mostras de ser exata literalmente. Foi com surpresa que descobri o blog da “União Nacional dos Ateus” em um post com um vídeo – elogiado! – da mais inacreditável infantilidade.

Para os que não quiserem (sabiamente) perder oito minutos do seu tempo assistindo-o, conto em linhas gerais: é a história de um menino e de uma cultura de “construção de armários”. Os pais dele o ensinaram a construir armários com duas gavetas, porque era assim que um certo “manual” ensinava. Após o menino encontrar pessoas que construíam armários com gavetas em posições diferentes, ou com mais do que duas gavetas, passa a se questionar e recebe sempre respostas intolerantes dos seus pais. Decidido a ler o manual por conta própria e construir o armário do jeito, literalmente, que ele ensina, fabrica uma coisa totalmente tosca e inútil. É aí que ele percebe (1) que o manual é inútil porque não ensina a construir os armários que as pessoas dizem que ensina e (2) que cada um pode construir o seu armário do jeito que quiser. Moral da história: a Bíblia é inútil, cada um acredita naquilo que quiser e a intolerância religiosa é um terrível mal para a humanidade.

Detenhamo-nos um pouco a aplicar os rigores da lógica a esta puerilidade. Uma metáfora que tenha serventia precisa guardar semelhança com a coisa da qual ela se propõe a ser uma representação metafórica; conclusões tiradas com base em analogias só são válidas se respeitarem as semelhanças e dessemelhanças existentes entre o objeto “original” e o seu análogo. Tudo isso é óbvio. Assim sendo, a pergunta que salta aos olhos ao assistir o vídeo é: o que raios têm a ver os alhos com os bugalhos? Por qual misterioso processo intelectual infere-se, a partir de uma estúpida história sobre manuais e armários, que as religiões são males a serem combatidos pelos “iluminados” ateus?

“São coisas análogas”, pode alguém clamar. Não, não são, é óbvio que não são. Existem armários com duas gavetas, com três gavetas, armários toscos inúteis, armários azuis e vermelhos, armários de diversos formatos, e cada um pode ter o armário que bem entender, e cada armário de cada um é um armário diferente. O “objeto” apresentado pelas religiões – Deus – não é “diferente” para cada uma das pessoas, e sim o mesmíssimo Deus único; ao contrário dos armários – onde a multiplicidade dos objetos comporta perfeitamente que haja diferenças entre eles sem nenhum problema lógico -, a unicidade de Deus faz com que seja uma impossibilidade lógica estarem, ao mesmo tempo, corretas duas afirmações contraditórias sobre Ele mesmo. É a própria natureza do problema enfrentado – ao contrário do problema da “construção dos armários” – que faz com que os distintos conhecimentos sobre Deus sejam mutuamente excludentes: está na essência mesma das religiões serem incompatíveis.

Como uma coisa tão gritantemente óbvia “escapa” à inteligência atéia é um mistério inexplicável. Passa a terrível e incômoda impressão de que os ateus não são capazes de entender aquilo que eles estão, não obstante, empenhados em refutar. A fé dos ateus é uma coisa realmente espantosa, pois – ao que parece – faz com que eles acreditem piamente que Deus é um armário. Esta miséria intelectual chega a ser frustante, e chega até a dar saudade de nomes como o de Augusto Comte; ao menos era possível haver polêmicas de verdades